Precisamos Falar Sobre James escrita por nywphadora, nywphadora


Capítulo 29
28. Precisamos falar sobre a véspera




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[Terça à noite]

Lily estava sentada nos degraus de entrada de Hogwarts. Algumas luzes ainda estavam acesas, sendo a única iluminação da fachada. Alguns alunos e professores da peça estavam fazendo ensaios extras e resolvendo o que estava pendente para a peça que se aproximava cada vez mais.

Mesmo com a pouca luz, conseguiu sentir uma sombra à sua frente e levantou o olhar, séria.

— Olá — disse.

A mulher sentou-se ao seu lado, também séria, parecendo estremecer somente pela visão do lado de fora de Hogwarts.

— Olá, Lily — respondeu Mary.

— Eu não esperava por sua mensagem — ela disse, sem conseguir olhá-la.

— Sim, eu posso imaginar.

Elas permaneceram em silêncio, observando a garagem quase vazia de Hogwarts. Lily pôde jurar que tinha escutado uma coruja piar de algum canto entre as árvores.

— Então voltou para a cidade? — tentou puxar assunto.

Mesmo vendo que ela não tinha cicatrizes ou feridas abertas, olhar para ela a fazia se lembrar exatamente daquela noite. Dos gritos, das risadas daqueles supremacistas e dos machucados, tanto internos quanto externos que ambas sofreram. Era uma realidade que não esperava encarar outra vez.

— É difícil seguir em frente — disse Mary — O meu psicólogo acha que voltar para cá e encarar de frente o lugar, as pessoas, que isso pode me ajudar.

— Entendo — Lily assentiu.

— Fiquei sabendo que vai acontecer um evento daqui a algumas semanas.

— É só uma peça de teatro.

Mary concordou com a cabeça, voltando a olhar para a frente.

— É aberto ao público? — perguntou — Talvez seja divertido.

— Sim, sinta-se à vontade para vir, se quiser — Lily apressou-se em responder, sorrindo para ela.

— Eu soube que... Snape estava fora.

A sua afirmação soou mais como uma pergunta.

— Ele estava, mas não vai mais nos incomodar — disse Lily, mordendo o lábio.

Não quis mencionar as mensagens, nem o fato de que quase infartou quando recebeu a sua mensagem mais cedo, achando que podia ser Snape novamente.

— Mas incomodou? — perguntou Mary, percebendo que ela escondia algo, como que dizendo que ela aguentava a verdade.

— A presença dele era incômoda. Você sabe como é.

Ela concordou. Se tinha algo que ela sabia como era, era ter que ver o rosto de seus agressores.

— Eu quase não tive como te agradecer, naquela época — Lily viu Mary abaixar o rosto, como se estivesse contendo as lágrimas — Se não fosse por você...

— Você não precisa me agradecer por isso — interrompeu-a — Foi apenas sorte eu estar lá.

— E essa sorte me salvou. Eu fiquei revivendo essa noite por todos esses anos, pensando no que poderia ter acontecido. O julgamento foi tão difícil, o reconhecimento... Ter que relatar o que aconteceu para advogados de defesa que só queriam jogar na minha cara que eu não deveria andar sozinha à noite.

Lily podia imaginar como era. Sempre foi mais fácil culpar as vítimas do que educar e recriminar os agressores.

— Eles vão gostar de te ver de novo — ela comentou — Essa peça é para nos lembrarmos dos anos anteriores, estamos quase nos formando, e ter você aqui vai fazer muito bem a todos.

— É inacreditável que vocês já vão se formar — Mary negou com a cabeça — Eu perdi um ano. Meus pais acharam que era melhor para mim... Mas ficar em casa era pior. Eu não sei se isso faz sentido.

— Não existe uma fórmula para lidar com isso. Você sabe como se sentir melhor — respondeu Lily.

— Eu fiquei pensando em quantas pessoas passaram por isso. Quantos estupradores estão soltos, quantas vítimas foram culpadas... — ela soprou uma mecha de cabelo cacheado que caiu em seu rosto — Eu quero ajudá-las.

— Não haveria ninguém aqui melhor do que você para fazer isso.

Ela deu um sorriso tímido na sua direção, e então riu, parecendo achar graça de alguma coisa.

— O que foi? — perguntou Lily.

— James tem sorte de te ter como namorada.

Elas ouviram um barulho e olharam para trás. O ensaio parecia ter acabado e James estava pegando as correntes com o cadeado para trancar o portão da escola. Os professores foram direto para os seus carros, e os alunos caminhavam tranquilamente, conversando. Pôde ver a sombra de Hestia sentando-se para esperar os pais buscarem-na, Marlene e Sirius estavam abraçados conversando.

— Nos vemos, Lily.

Mary levantou-se e foi embora antes que os outros se aproximassem o suficiente para enxergar quem ela era.

— Ficou me esperando? — James sentou-se onde Mary estava antes, parecendo surpreso.

— Claro, estava sem carona — disse Lily, levantando-se.

Ele riu e seguiu-a até o carro dele.

Ela sentou-se no banco da frente, encostando a cabeça na janela, sentindo-se cansada pelo dia agitado. James começou a buzinar, e eles puderam ver Sirius e Marlene correndo para não serem deixados para trás. Assim que entraram e sentaram-se no banco de trás, começaram a rir.

Aquela seria uma memória que gostaria de manter em sua mente.

 

[Sábado de manhã]

Lily não precisava lidar com o mistério de como tinha parado em sua cama desde que cresceu e ficou pesada demais para a sua mãe parar de levá-la adormecida do sofá da sala para o quarto e passar a acordá-la para que ela mesma fosse. Imaginava que Marlene passava muito por aquela crise existencial quando tomava algumas.

Nem tentou perguntar aos seus pais ou a Petúnia. Decidiu apenas virar de lado na cama e esperar o despertador tocar. E então ela percebeu que ele não iria tocar porque era sábado.

Ficou olhando para a parede por algum tempo, antes de levantar-se.

Era o dia da peça!

Jogou uma água na cara, escovou os dentes e trocou de roupa rapidamente. Pegou a sua mochila, que tinha parado de abrigar livros desde o começo da semana. Tinha passado os dias indo cedo para o colégio e voltando tarde para casa, ensaiando as falas com James e ajudando a arrumar os bastidores, além de encontrar com Mary esporadicamente na lanchonete dos gêmeos Prewett durante o horário de almoço.

Sua irmã estava com a porta do quarto fechada, então imaginava que ela estivesse dormindo. Encontrou com sua mãe lavando as mãos na pia da cozinha, mas seu pai também não devia ter acordado ainda, ou estava no escritório.

— Mas já vai? Está cedo — Doralice disse, assim que percebeu-a ali, na sala.

— Preciso — respondeu Lily, pegando um pacote de biscoitos para comer no caminho.

— Não está se esforçando demais em uma peça que nem vai atuar?

Ela deu de ombros, sem querer explicar-se.

— Nos vemos mais tarde, mamãe — disse, antes de sair.

Uma moto passou cantando pneu e estacionou bruscamente a alguns passos de onde ela estava. A motorista tirou o capacete e gritou:

— Sirius pegou o carro do James e está vindo aí. Corre!

Lily atravessou a rua apressada, pegou o capacete reserva e segurou-se na amiga.

— Ui! — disse Marlene, girando a mão no acelerador — Segura firme.

Assim que chegaram em Hogwarts, tiraram os capacetes e desceram da moto. Marlene estacionou-a em um canto e elas correram para dentro da escola. Conseguiram escutar o motor do carro de James, antes de fecharem as portas de entrada de Hogwarts.

Elas sentaram-se nas últimas poltronas do auditório, abaixadas para ficarem escondidas de James e Sirius, quando eles entrassem.

— Eles vão usar o power point, a televisão ou a tela no lugar dos panos brancos? — perguntou Lily.

— A televisão — Marlene apontou para o televisor, que estava virada para o público e posicionada em cima do palco — Quem vai ficar na sala de controle cuidando da iluminação vai ser a Bertha. Eu vou dar um jeito de aparecer lá com o pendrive quando for a hora. Já está tudo combinado.

Lily podia sentir o frio na barriga de ansiedade de esperar para ver o plano sendo posto em prática.

— Hoje essa história acaba, Lils — disse Marlene, piscando para ela — E sabe o melhor? Eu conferi a lista de presença da peça na mesa do escritório da professora McGonagall. Os pais da Dorcas e os pais do James marcaram presença.

— Os pais dela? — deixou o queixo cair — Mas eles só viajam!

— Pois é. Eles virão para prestigiar a protagonista.

A professora Trelawney falou em um tom mais alto, chamando a atenção das duas. Ela e McGonagall estavam discutindo algum detalhe do figurino de Dorcas.

— Se você quiser que eu dê uma customizada no vestido dela... — Marlene tentou.

— Já conversamos sobre isso.

Lily levantou o olhar, vendo James e Sirius entrarem no auditório.

— Abaixa — sussurrou, escorrendo da ponta da cadeira até o chão de madeira polida.

Marlene seguiu o seu exemplo, parecendo divertir-se muito com aquela situação que ela mesma tinha criado.

— Precisava roubar a moto dele? — perguntou Lily.

— Eu não roubei, peguei emprestada.

Deixou escapar uma risada, ainda escutando Trelawney e McGonagall conversarem no palco. Deu um grito de susto quando sentiu dois braços puxando-a para cima.

— Achamos vocês — disse James, sorrindo maliciosamente.

Marlene tentou fugir por baixo das cadeiras, mas Sirius também a pegou.

— Você acha mesmo que pode pegar a minha moto e sair impune disso? — ele perguntou.

— Não! Sirius, não! — Marlene gritou, enquanto ele tentava pegá-la no colo.

Qualquer coisa que James planejasse fazer com Lily ficou esquecido. Eles ficaram observando os amigos, rindo entre si.

A professora McGonagall apenas revirou os olhos, decidindo que não valia a pena desperdiçar seu tempo em tentar fazê-los se comportar.

 

[Sábado à tarde]

Como nos dias anteriores, quando chegou na pausa para o almoço, Lily sentou-se na mesma cadeira perto da porta da cozinha da lanchonete dos gêmeos Prewett.

— O de sempre? — perguntou Gideon, sorrindo para ela, já acostumado com sua presença.

— Ainda não. Estou esperando a Mary — ela respondeu, também sorrindo para ele.

O ruivo olhou para o relógio de cenho franzido.

— Parece que alguém está atrasada — ele comentou.

Lily deu de ombros. O celular estava em cima da mesa, qualquer vibração seria facilmente percebida.

— Vamos, vou trazer algo para você aguentar a fome — disse, afastando-se.

Tentou dizer que não precisava, mas ele não ficou para escutá-la.

A irmã mais nova deles, Molly, estava no balcão escrevendo concentrada em um caderno. Perguntou-se se seria algum trabalho para a faculdade, as finanças do negócio familiar ou talvez estivesse só desenhando para passar o tempo. Olhou ao redor, pensando que, se estivesse no lugar dela, com certeza estaria escrevendo alguma crônica sobre os clientes. Sobre como aquele casal parecia bem irritado, por exemplo. Qual seria o motivo? Alguma Dorcas se meteu em suas vidas?

O celular vibrou.

 

Mary MacDonald

Online

 

Lily, você pode me buscar? (13:20)

O meu carro parou no meio da estrada (13:20)

Tive que levar no mecânico (13:20)

 

Lily respirou fundo, olhando ao redor. Estava realmente sem muita sorte naquele dia. Seu estômago reclamou.

 

Mary MacDonald

Online

 

Certo, onde você está? (13:22) ✓✓

Estacionamento do shopping (13:22)

 

Lily levantou-se de sua cadeira, lamentando por ter que esperar mais um pouco para comer.

— Eu tenho que ir, foi mal — disse a Gideon, antes de sair.

Por sorte ele não estava com a comida que tinha prometido levá-la, ou não teria coragem de negar.

Olhou para os dois lados da estrada e considerou pedir a James uma carona, mas ele estava ocupado demais com os ensaios. Como estava sem dinheiro, aproveitou a promessa de primeira corrida gratuita do Uber e foi até o shopping.

O motorista entrou na garagem, parecendo irritado por não poder simplesmente deixá-la em uma das portas de acesso, e arrancou assim que ela desceu do carro.

Se todos os motoristas eram assim, não entendia como que Alice gostava de usar esse aplicativo. Talvez fosse só porque ele não receberia nada pela corrida.

 

Mary MacDonald

Visto por último hoje às 13h25

 

Mary (13:30) ✓

Eu já cheguei (13:30) ✓

Em qual setor você está? (13:30) ✓

 

Lily guardou o celular, olhando ao redor.

Não lembrava de ter um mecânico perto do shopping. Será que tinha sido ali que seu carro resolveu emperrar?

Sentiu algo gelado em sua nuca e paralisou, ao escutar um som que ela estava familiarizada por causa das séries policiais que assistia.

O som de quando o bandido destravava a arma.

— Não grita. Entra no carro.

Snape.

Ficou parada e ele segurou-a pelo braço, sempre à sua frente para que pudesse apontar a pistola na sua cabeça, guiando-a até o carro de Mary, que estava amarrada e amordaçada no banco traseiro do carro.

— Se tentarem alguma gracinha, as duas morrem.

Ele não estava brincando.

Snape soltou a arma, mas Lily levou a ameaça a sério demais para tentar fazer alguma coisa. Puxou uma corda, como fez com Mary, e amarrou os seus pulsos e tornozelos bem apertado. Não pegou um pedaço de pano para amarrar a sua boca.

— Temos muito o que conversar, Lily — ele disse, justificando a sua escolha.

Louco.

Os seus olhos mostravam uma loucura que fez Lily temer por sua vida como nunca antes.

Quanto tempo na cadeia ele tinha planejado aquele sequestro? Qual era o seu plano? Terminar o que começou?

Sentiu-se entrar em pânico. Ninguém sabia onde ela estava, onde Mary estava. Ele a levaria para os seus amigos? Eles estavam soltos, pelo que ela se lembrava.

— Tentei? Você viu? O que você sabe sobre isso? Não era Malfoy quem estava lá no centro de tudo? Mas não foi ele a quem você denunciou. Ele saiu da cadeia, sabia? O rico pagou advogados, enquanto eu estou marcado para morrer aqui.

O rico pagou advogados.

Oh meu Deus.

Já tinha planejado isso quando resolveu pedir para voltar a estudar em Hogwarts? Ou isso foi depois que ela cansou-se de suas chantagens por telefone e fez com que ele fosse expulso?

Tinha fugido da prisão ou tinham pagado um advogado para ele? Um advogado que o fez sair de lá para cumprir o que Malfoy e a sua trupe de nazistas queria desde o começo. Ou ele tinha fugido com a ajuda dos mesmos nazistas. Talvez tivessem subornado os policiais, tinham dinheiro para isso.

Mary olhou assustada para ela.

Tinha sido ela a mandar a mensagem com a arma apontada para sua cabeça? Ou foi Snape que digitou fingindo ser ela? Tinha a sequestrado ali no estacionamento ou ele quem a levou até lá?

Snape ainda a olhava, como se esperasse uma resposta.

— O que você quer de mim? — Lily perguntou, por fim, tentando não expressar todo o medo e ódio que sentia.


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