Proibido para menores de 70 anos escrita por Gabi Wolf, Giovanna Wolf


Capítulo 3
Capítulo 2- Segurem as calças e pé na tábua!


Notas iniciais do capítulo

Como vão chapas? Mais um capítulo quentinho foi acrescentado!



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Realmente eu estava certo quando eu disse que eu nunca tinha conhecido realmente um lar de idosos. Foi uma experiência inesquecível.

O vovô nos colocou em um dos velhos sofás empoeirados e mudou o canal da velha TV doada. Foi um pouco deprimente, eu admito. Não tinha Nickelodeon ou cartoon. Ao invés disso, tínhamos que nos contentar com a globo ou canal de esportes. E, na minha opinião eu não sabia o que era pior: ouvir um monte de fofocas de famosos ou ver um monte de formiguinhas correndo atrás de uma bola...

Seja como for, estávamos assistindo a TV quando um velhinho negro me chamou a atenção, descendo as escadas do andar de cima. Em sua boca ele levava desajeitadamente um cachimbo de madeira, e andava por meio de uma bengala feita do mesmo material.

Então, ele sentou-se em uma mesa de madeira, onde tinham alguns velhinhos reunidos jogando baralho- o que incluía o nosso vovô Bento.

De onde eu estava, consegui ouvir uma parte da conversa:
— Esse Fernando Collor! Roubando nosso país! Como deixam esse patife cafona governar nosso Brasil ?!? – uma velhinha com uma boneca reclamou.

— Que isso mulher?!? Patife é pouco!- outro velhinho argumentou.- Esse cabra vai arrebentar o Brasil e como se não passasse, é um tremendo de um cafona!

— Calma Seu Jorge !- uma das enfermeiras interferiu, ao entrar no aposento.- Hora do remédio...

— Remédio? Eu tô ótimo de saúde! Não preciso de remédio coisa nenhuma sua careta.- Seu Jorge levantou-se da cadeira e foi para o que eu achava ser uma cozinha, seguido da enfermeira.- Eu é que pago seu salário!

Decididamente, eu preferia não envelhecer.

Alguns poucos minutos depois, eclodiu uma briga naquela mesa. Cartas voaram para todo lugar e um velhinho quase acertou a cabeça de outro com uma bengala. Era uma pancadaria à beça, como dizia minha vó.

E quando eu achava que isso não bastasse, uma enfermeira saiu gritando da cozinha, com o que parecia ser um frasco de remédio na mão. Até Valentina, que estava distraída brincando com seu celular, se assustou.

— Acudam! Acudam! É o Seu Jorge- ela falou entre um grito e outro.- Ele caiu no chão e agora não quer levantar!!!

Corremos todos para a cozinha, onde vi uma das piores cenas da minha vida. Seu Jorge estava estendido no chão, completamente morto e bastante branco, como se tivesse virado o próprio Gasparzinho. Se ele estava fingindo ou não, isso eu não sabia.... Mas se estivesse ele iria merecer um prêmio de Hollywood de melhor ator.

— Meu SENHORIZINHO DO CÉU!!!- a enfermeira balofa parecia desesperada enquanto sua companheira checava os sinais vitais do velho homem.

A outra balançou a cabeça negativamente. Ele estava realmente morto.

— O que está acontecendo Nicolas?-  Valentína surgiu atrás de mim, curiosa como a própria Alice.

— Um velho bateu as botas...- respondi, sem tirar os olhos da vítima, enquanto uma das enfermeiras ligava para a ambulância.

— Mas eu não estou vendo as botas dele!- ela reclamou.- Nicolas, ele não tem botas!

— Ai meu Deus do céu...- suspirei. Ela era burra ou o quê?!? – Ele morreu, Valentína, morreu!!

— Mo-Morreu?- e abriu o berreiro lá mesmo. Como eu detestava aquela menina! Como se não bastasse a tragédia que havia ocorrido, agora teríamos uma trilha sonora: uma criança chorando como se tivessem arrancado um doce da mão dela.

Chamaram a ambulância para o pobre velho. E enfim, todo aquele pesadelo havia terminado. Valentína, de tanto chorar, havia desmaiado de sono no sofá, abraçada ao seu ursinho. Eu e vovô sentamos no sofá, com aquele velhinho negro.

— Nicolas, quero que conheça meu amigo.- vovô me apresentou o outro velhinho negro.- Esse é o Barnabé.

Barnabé? Como o sítio do pica-pau amarelo? Realmente, eles tinham bastante semelhanças... Quem sabe ele não era dublê da personagem?

— Oi.- cumprimentei-o.

— Olá mocinho. Como vai?- ele perguntou, solícito, para depois tragar um pouco do seu cachimbo.

— Bem- tossi com a fumaça densa entrando pelas minhas narinas, me dando um pouco de alergia.

Então houve outro silêncio até que uma das enfermeiras cismou com Barnabé, pedindo que ele não tragasse seu cachimbo, alegando que aquilo iria trazer um monte de doenças no pulmão e outras mais que eu nem sabia o nome... Ele finalmente se rendeu e enfiou aquela coisa no bolso, um pouco hesitante.

— Essas mulheres... Não mudam nunca. Sempre irritantes e mandonas.- ele resmungou.- Não é a toa que elas estão no topo da cadeia alimentar. Pobres homens, levados pela beleza das águas agitadas...

Eu não fazia ideia do que ele estava falando.

— Hoje foi o quinto desse mês...- vovô suspirou.

— Precisamos dar no pé, antes que o próximo seja esse pobre homem que vos fala.- Barnabé disse.

— Já conversamos sobre isso Barnabé...- vovô alertou o amigo.

— E você nunca muda de ideia... Será que não pensa em nada? Onde estão seus sonhos seu velho acomodado e caduco?- acho que aquilo era como um “amigo” na língua dos velhinhos.- Ainda há muito a se viver e há mais que um caixão a nossa espera... O que há de tão errado em querer ser livre como éramos quando jovens?

Vovô meditou um pouco e enfim respondeu:
— Você tem razão, mas como vamos sair daqui Barnabé?- vovô questionou. –Há muitas pessoas que querem nos ver trancafiados aqui! Uma fuga seria quase impossível...

Barnabé limpou seu velho cachimbo e declarou:
— Eu tenho um plano. Hoje à noite.

— Um plano? – vovô Bento indagou, um pouco curioso.- De fuga?

— Operação pé na tábua.- Barnabé batizou a ideia maluca.

— Pé na tábua?- perguntei um pouco confuso.- Vocês realmente estão pensando em fugir desse lugar? Mas vovô, e a mamãe? E o papai?- o cutuquei.

— O garoto tem razão.- vovô mudou de ideia.- Minha filha conta comigo.

— Conta para vender sua velha casa... Que você e sua querida esposa suaram para conquistar. Você acredita de verdade que eles deixaram Nicolas e Valentína porque se importam com você? Pare de sonhar...- Barnabé suspirou.- Esses adultos querem nos ver mortos e estão ansiosos para colocarem suas mãos cobiçosas nos nossos bens. Escuta: Por acaso, sua filha veio te ver alguma vez, sem exigir algo de você Bento?

Infelizmente, tinha que admitir que Barnabé estava certo. A mamãe só falava com o vovô quando ela queria um favor dele, e dessa vez não foi diferente.

— Você está certo de novo seu velho astuto.- vovô respondeu.- Pois bem, está na hora de fazer algo útil com meus netos. Vou leva-los conosco. Vou ensina-los o que é viver de verdade... Longe da tecnologia e desses canais infantis que não servem para nada.

— Ei vovô!- reclamei.- Eu gosto da Nickelodeon. Tem Bob Esponja...

Ninguém me ouviu.

— Então pois bem. Vamos a operação pé na tábua. Estou nessa!- Vovô concordou e eu sorri. Eu sabia que ele sempre fazia a coisa certa.


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