Yuri

Olá! Meu nome é Yuri Katsuki, um japonês de 24 anos, e eu estou indo para o Brasil pela primeira vez!

Foi tudo muito rápido, para falar a verdade. Mas, se for para pensar bem, sempre é muito rápido quando se trata de Viktor e seus planejamentos. Em um momento, estamos curtindo nossas férias e trocando amassos no sofá; no outro, ele me avisa que tem essa pequena apresentação para fazer em São Paulo! “Nada demais”, ele dissera, “apenas uma cortesia pelos Jogos Olímpicos que será muito bem paga!”.

É bom lembrar que, atualmente, as Olimpíadas não incluem patinação no gelo em sua programação, reservando-a apenas aos Jogos de Inverno (que não rolam em países tropicais), mas o evento de quinta-feira serviria apenas como uma homenagem à atletas famosos de todo o mundo e, é claro, Viktor estava entre eles.

ー Você poderia se apresentar comigo, Yuri ー ele sugerira enquanto fazíamos as malas para a viagem.

ー Acho que seria uma surpresa desagradável para eles ー eu havia comentado, com uma pitada de amargura no tom de voz ー esperam pelo grande Viktor Nikiforov e recebem o porco japonês de brinde…

ー Você é duro demais consigo mesmo!

E era verdade, claro. A baixa auto-estima e a insegurança eram sombram que pareciam nunca me deixar em paz, nem mesmo num momento de tranquilidade como aquele. Comentei isso com Viktor, esperando algum conselho sábio de técnico ou companheiro, mas ele ficou alguns instantes em silêncio. Os olhos azuis como safiras fitava meu rosto, mas pareciam ver algo a mil léguas de distância.

Então meu namorado estalou os dedos, como se tivesse um insght brilhante. O rosto sorria com ansiedade.

ー Você precisa relaxar de verdade, Yuri ー exclamou ー e não vai conseguir fazer isso aqui nessa terra fria, onde só tem eu ou o Yurio por companhia.

Como se o Yurio nos visitasse com frequência, pensei.

ー E o que está pensando em fazer? ー foi o que eu disse no lugar de reclamar ainda mais.

ー Vou comprar ingressos para as Olimpíadas! ー e seu sorriso foi tão largo que me conquistou imediatamente, as bochechas estavam rosadas e seu rosto era o retrato da felicidade ー imagine como será divertido de todos formos juntos. Uma semana de festa e esporte no Brasil!

Franzi o cenho.

ー Espere… todos quem?

E lá estavámos nós, sete patinadores de gelo profissionais e os respectivos convidados, fazendo check-in no aeroporto de Moscou. Bastou algumas ligações de Viktor para que todos viessem correndo para a Rússia como um bando de desesperados por sol e férias ー exceto por Sala e Michelle Crispino, que já estavam comemorando o feriado em Roma.

Então sobrávamos nós: Yuri (eu); Plisetsky (a quem chamamos de Yurio, para não confundirmos os nomes); meu noivo, Viktor Nikiforov; Chris Giacometti, carregado com seu glamour e sensualidade exagerados; Otabek Altin, que veio acompanhado de Yurio (os dois estavam muito juntos ultimamente, aliás); J.J. e sua namorada, Isabelle e, por fim, meu melhor amigo, Pichit Chulanont.

Éramos um grupo realmente disperso naquela madrugada ー nosso vôo era bem tarde ー e mal conseguíamos nos reunir para um check-in apropriado. Viktor e eu estávamos um ao lado do outro, já com nossos passaportes em mãos e conversávamos baixo.

ー Tem certeza que Maccachin vai ficar bem? ー eu perguntei novamente. Sabia do extremo afeto de Vik pelo animal e deixá-lo deveria estar sendo bem difícil para ele.

ー Greta vai cuidar bem dele ー Greta ia limpar nosso apartamento às sextas e ficou encarregada de cuidar do bichinho também, fazendo o básico como alimentá-lo e dar-lhe banho ー não quero que você se preocupe com nada, Katsuki.

Yuri revirou os olhos, mas estava sorrindo.

ー Você que manda, Nikiforov.

ー Hey, vocês! ー era o Yurio, irritadiço e de mau humor como sempre estava. Veio em nossa direção com suas duas malas com estampa de felinos diferentes, arrastando-as sem o menor jeito; os cabelos louros, cor de areia, estavam bagunçados como se ele não tivesse tido tempo de arrumar ー quem vai fazer meu check-in?

ー Ninguém, Yurio ー Viktor lhe respondeu sorrindo ー estamos de férias, Yakov não está aqui para ser babá de ninguém.

ー Eu vou te mostrar a babá, seu…!

ー Algum funcionário do aeroporto pode te ajudar ー sugeri antes que os berros do adolescente russo chamassem a atenção de alguém. Querendo ou não, éramos responsáveis por ele, por sermos maior de idade, e deveríamos ajudá-lo do jeito que podíamos (obviamente, ficar discutindo era uma má ideia!) ー ou melhor ainda: Vik termina o meu e eu posso te ajudar.

ー Tá ー resmungou uma última vez.

Quando estava tudo okay, esperamos pacientemente nas cadeiras cinzentas de espera, observando o painel com os horários dos vôos. Estávamos indo para Guarulhos, onde pegaríamos um ônibus alugado pelo Viktor para nos hospedar em um hotel próximo ao local de apresentação. Aparentemente, todos ali se tornaram convidados de honra para o evento de patinação depois da brilhante ideia do russo de tirar férias no Brasil.

ー É verdade que o Katsuki tem parentes em São Paulo? ー J.J. quem perguntara. Pelo o que notei, estava stalkeando meu Facebook havia uns quinze minutos e não parava de fazer perguntas pessoais ー acabei de ver no Google que existem vários bairros japoneses lá devido à imigração e…

ー Só por causa disso você acha que vou ter parentes por lá? ー indaguei, perplexo.

ー Só foi uma curiosidade!

ー Já fui ao Brasil umas três vezes ー era Chris falando, após tirar uma selfie com a língua de fora ー as mulheres são simplesmente maravilhosas e…

ー Você pode ser um pouco menos machista?! ー Isabelle o interrompeu, cruzando os braços. Ela estava muito bonita e parecia uma modelo profissional, com seu vestido rodado azul e unhas pintadas de vermelho ー a primeira coisa que você precisa falar sobre o turismo em um outro país tem que estar relacionado à sexualidade feminina?

J.J. abraçou os ombros da noiva.

ー Essa é minha garota.

ー Cara, você acabou de super estereotipar a nacionalidade japonesa ー disse eu, de repente, ficando irritado com o assunto.

ー Ah, relaxem aí ー Chris cruzou as pernas como se estivesse na própria casa ー estava só comentando.

ー Gente, vamos tirar uma selfie! ー Pichit se empurrou contra mim, com o braço esticado e o celular em mãos. Talvez quisesse salvar minha vida de uma discussão nada agradável ou talvez não quisesse perder o hábito de tirar uma selfie a cada cinco minutos. Tentei dar um sorriso confiante, mas fiquei parecendo algo como uma galinha.

Já Chris e J.J. sabiam mesmo como dar um sorriso.

ー Yurio! Otabek! ー Pichit chamou os dois jovens, que estavam comprando lanches no pequeno quiosque do aeroporto. Eram os únicos longe do grupo, além de Viktor, que já estava meia hora no telefone, resolvendo alguma coisa da apresentação ー veiam tirar foto com a gente!
ー Não tiro fotos ー disse Otabek com o rosto sempre sério, enquanto os dois se aproximavam.

ー Eu tô comendo, cara ー Yurio retrucou dando uma profunda mordida no sanduba saudável que comprara ー sossega aí.

ー O que é que tem nisso aí? ー Pichit quis saber.

ー Comida.

ー Tá, isso é bem óbvio.

Chris remexeu nos próprios bolsos, como se procurasse por alguma coisa, até que ergueu algumas notas de dinheiro no ar com uma expressão de vitória no rosto.

ー Quem quer comprar um chocolate para mim?

ー Alguém aqui tem cara de empregado?! ー Yurio retrucou, delicado como um trator.

ー Diz o moleque que nem consegue fazer o check-in sozinho…

ー Você tá de sacanagem, né princesa? ー Yurio estava quase se erguendo na cadeira, esmagando o próprio sanduíche com as mãos e com o rosto vermelho de raiva.

ー Ah, pega leve. Yuratchaka ー Chris mordeu o lábio como se quisesse provocá-lo ー poucos conseguem resistir ao meu charme…

ー Charme do cocô do cavalo do bandido, você quer dizer!

Mas ー por alguma benção divina ー os dois não tiveram tempo de terminar a discussão. A voz feminina fez o anúncio do nosso, inundando todo o espaço, para que todos escutassem. Na mesma hora, Viktor chegou. Nunca me senti tão aliviado ao ver aqueles olhos azuis brilhantes e aquela boca em formato de coração.

ー Vamos lá, amores! ー disse, todo empolgado ー Brazil, here we go!