Dois dias depois foi uma confusão só. Chorei tanto nas outras noites que aquele dia não dormi direito e acordei um lixo, e melhor que não dormir na maior parte da noite e acordar se sentindo um lixo, é acordar atrasada para a aula.

Corri feito uma desesperada, e quando fui atravessar a segunda rua em direção ao colégio, nada melhor que ser atropelada. Por uma BICICLETA!

Quebrei o pé. Podia ter quebrado qualquer coisa, o braço, algum dedo da mão, mas não, foi justamente o pé. Que raiva eu senti no momento!

Enfim, o cara (filho da mãe querida dele) ficou tão preocupado comigo que não deixou eu ir pro colégio e me levou direito pro hospital, no colo! Eu deveria ter ficado linda toda machucada sendo carregada por um cara vestido de ciclista com aquele capacete amarelo e azul, aqueles óculos violeta e aquela roupinha colada, sem mencionar a pochete super estilosa.

Me botaram um gesso branquinho e disseram que isso só iria tirar depois de um mês mais ou menos.

Eu faltei à escola, mas não iria faltar minha aula de harpa também. Já tinha matado demais aquele mês. E eu precisava falar com David.

Quando cheguei, ele passou por mim e me deu oi e... estava diferente. Não irritado, ou decepcionado. Estava... ansioso. Fiquei com medo daquilo, mas não falei nada até me chamar. Corri (de muletas) pra não ter de passar aquilo de novo, aquela tensão naquele corredor estreito e comprido. Não era tão estreito, não era tão comprido, então eu passei rapidinho por ele. E David foi falando antes mesmo de fechar a porta:

-Larissa, eu preciso falar uma coisa.

-David, eu que preciso dizer.

-Por favor, esqueça tudo aquilo que eu disse pra você na ultima aula. Eu não deveria ter dito aquelas coisas horríveis pra você, e nem tudo daquilo é verdade. Por favor, Larissa, me perdoa, eu ainda amo você, amo muito, e não quero que nada mude entre eu e você. Por favor, Larissa.

Eu preferia que ele continuasse a me odiar...

-David... eu preciso confessar uma coisa. – David parou por um momento, me olhando seriamente, mas apenas disse:

-Diga.

-Eu... devo pedir desculpas, por tudo que fiz você e o Andrew passar. Fui egoísta, e mereci tudo aquilo que você disse para mim. E mereço mais ódio ainda agora. Eu já decidi David. E...

-Decidiu por Andrew, não é?

-David...

-Eu sabia. Eu tinha certeza disso. E quando disse que precisava confessar... parecia que isso tudo já tinha sido combinado. – David dizia tudo isso amargamente, caminhando e jogando os braços no ar.

-Me desculpe. Eu gosto de você, David. Eu realmente gosto de você. Mas Andrew... é quem eu amo, e quem eu sempre amei, do inicio ao fim. Me desculpe. – Eu já iria chorar novamente, mas David de repente segurou meu rosto, com aquele jeito suave e delicado dele, passando os dedos em minhas lágrimas.

-Não, não, não. Larissa, meu amor, não chore. Ta tudo bem. – Ele então me abraçou – Eu continuarei sendo seu amigo. Se você me permitir, é claro.

-Isso é injusto. Você merece mais!

-Muitas coisas não são justas nessa vida, meu anjo.

-Quer mesmo ser amiga desse monstro?

-Você não é um monstro, Larissa. É apenas uma pessoa normal... com sentimentos normais.

-Desculpa, David. Mas eu não posso... eu amo Andrew. Não deveria, mas o amo.

-Desculpas aceitas – Disse ele, sorrindo para mim – Agora limpe essas lágrimas e vamos voltar para a aula. Faz um bom tempo que não toca harpa de verdade, não é?

Voltamos para a nossa aula normal, e David tentava agir normalmente, mas eu percebia sua tristeza. Eu percebia, tinha culpa, e não podia fazer nada.

Quando estava indo embora, David me abraçou fortemente, quase me derrubando, riu quando tentou me segurar e disse:

-Bem, eu prefiro que você tenha escolhido o Andrew do que qualquer outro estranho por aí.

-O que aconteceu no fim de semana que vocês agora são tão amigos, hein?

-Coisa de homem, eu acho. – Ele ria, o que me deixou mais calma. Pelo menos David ainda tinha senso de humor.