A Herdeira de Zaatros escrita por GuiHeitor


Capítulo 7
Capítulo 6




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Trigésimo sétimo dia do primeiro mês, ano 7302

 

Cena I – O Retorno do Humano-duente.

15 horas e 44 minutos. Reino Anão – Ruthure. Q.G. dos Guardiões das Chamas.

 

—Híbrido humano-duende, Manuel Cairi. Recrutado no sexagésimo segundo dia do primeiro mês do ano 7301. -Recitou o homem de um metro e meio e aparentemente dezessete anos para que fosse identificado. Na verdade, ele já passava dos setenta anos, mas conservava a juventude bem como o temperamento adolescente por ser meio duende. A espécie vive cerca de duzentos e cinquenta anos, e isto fazia com que Manuel envelhecesse e amadurecesse mais lentamente.

—Manu, velho de guerra! -Saudou Darius, abrindo espaço para o homenzinho entrar e abraçando-o forte em seguida. -Bem vindo, cumpriu sua missão?

—Veja você mesmo… -Manuel abriu a pequena bolsa que trazia ao lado do corpo e mostrou o animal. -Ainda não escolhi o nome. Ela e eu já temos o elo completamente estabelecido.

—Depois escolheremos um nome. Venha, vamos ver os outros.

Eles percorreram os túneis até chegarem a um ponto onde a caverna se abria na parte superior permitindo que a Estrela Astral iluminasse o grande espaço. Ali estavam todos os membros do clã que haviam chegado até então: Ezerk, Urak, Hilda, Kira, Luzabell e Razatte.

—Irmãos, Manu acaba de chegar com a cascavel-camaleão. -Anunciou, Darius. -Tarefa concluída!

 

***

 

Cena II – Mau Presságio.

16 horas e 11 minutos, Reino Kvarbrakoj – Kaotheu. Palácio Real.

 

—Rei Rujavo, é uma honra recebê-lo novamente em meus domínios. -Rei Néfor saudou o aliado com um firme aperto de mãos.

—Assim como é uma honra, para mim, voltar a Kaotheu. -Ambos tinham interesse na reunião que se daria e isso justifica a demasia de cortesia de ambas as partes.

Encontravam-se apenas os dois reis na sala dos tronos: Rujavo, de Ruthure; e o anfitrião, Néfor, de Kaotheu. Como previra Tarzo, o chefe de estratégia kaotheno, o Rei Anão veio para negociar.

—Sejamos diretos, Rujavo. Que objetivo o traz a Kaotheu? -Néfor cortou.

—Desejo expor nossa posição sobre o conflito religioso que rodeia não só nossos reinos, mas também os outros quatro. -Rujavo, como sempre, foi ardiloso. O pronome usado por ele discretamente força a ideologia Infiel de Ruthure sobre Kaotheu, onde a população tem opiniões bem divididas no que diz respeito a Harkuos.

—Entendo, imaginei que viria. Aceita? -Néfor perguntou, estendendo uma garrafa de vinho e um cálice a Rujavo.

—Apenas se for uma dose grande.

Copos foram enchidos e ambos se sentaram à mesa. Rei Rujavo em uma cadeira adaptada a sua estatura de anão, e Rei Néfor de frente para ele, no outro extremo da mesa. A discrepância de altura entre os dois era imensa, isso sem mencionar os braços sobressalentes do Rei Kvarbrakoj.

—Certamente sabe que os Guardiões das Chamas foram expostos. -Começou o anão. -Em breve a União Real será convocada novamente e temos de escolher de qual lado estamos para proteger nossos interesses. -Um gole grande.

—Diz “nossos interesses”, Rei Rujavo, contudo o maior interessado é você.

—Como? Perdoe-me, mas grande parte de Kaotheu, assim como você mesmo, compartilha dos mesmos ideais que eu e meus ruthuranos.

—Está equivocado. Pouco menos da metade do meu reino e eu compartilhamos de seus ideais. -Rei Néfor ria por dentro. A tomada de lado a favor dos anões sem dúvida alguma será oportuna para ele, mas, como fora instruído por seu estrategista, tiraria o máximo de proveito da condição de Rujavo.

—Então pretende manter-se oculto em vez de se posicionar contra Aquela Mulher e atuar de maneira mais ativa na guerra se achega? -Rujavo debochou com um riso de desdém. -Com todo o respeito, mas, para rei da raça mais forte, é um tanto covarde.

—Engano seu, Rujavo. Desejo apenas fazer da vontade da maioria de meu povo também a minha. -Mentiras. Um rei é um rei e em momento algum um rei como Néfor daria voz ao povo e não aos próprios interesses. -Além do que, não cairei em esquemas de manipulação.

O Rei Anão ferveu por dentro, mas conteve a cólera e apenas disse:

—Compreendo. Já que não desejas mostrar aos demais reinos tua real posição, farei isso sozinho. -Rei Rujavo engoliu o restante do vinho e sorriu cinicamente ao deixar a mesa. -Ainda assim, fique à vontade para também se manifestar e ajudar efetivamente a causa.

—Mandarei um aviso quando a hora chegar… até lá, boa sorte. -O Rei Kvarbrakoj deixou a mesa e acompanhou o Rei Anão até os portões do palácio. -Ah! Quase me esqueci… Kaotheu carece de maior mobilidade. Caso queira expandir as ferrovias de Ruthure até aqui, retorne para discutirmos o acordo. -Eis a deixa! O preço para que Néfor apoie os Anões. O conselho de Tarzo sendo seguido.

—Ferrovias não são rentáveis no deserto, Néfor. -Rujavo notou que houve ali um pedido descarado de propina. -A areia, sob a ação do vento, soterraria os trilhos.

—Não havia pensado por esse ângulo… de qualquer forma, agradeço a visita, companheiro.

 

Tornaram a apertar as mãos e Rujavo se foi, andando possesso pelos Jardins de Areia até seu transporte, estacionado do outro lado das grades. Rei Néfor tampouco estava contente, a escolha da ferrovia realmente fora burrice. Mas ele tinha a impressão de que voltaria a ver Rujavo para tratar dos mesmos assuntos e isto o acalmava.

Ele se virou, rumo a sala do trono, e não viu o que se passou em seguida: nos Jardins de Areia, um novo monumento apareceu no local onde havia uma duna que o vento levara. Tratava-se de um Kvarbrakoj, caído de joelhos, com uma faca cravada nas costas. Dois braços davam apoio para que o corpo de pedra não tombasse completamente na areia, um tocava a ponta da lâmina que lhe rasgara o peito e, o último, estendia-se para trás em uma débil tentativa de alcançar o cabo do punhal a fim de removê-lo.

 

Um presságio de traição.

 

***

 

Cena III – Velhos Conhecidos.

18 horas e 15 minutos, Reino Humano – Feltares. Divisa de Feltares com Ramavel.

 

Cícero Hidra, este é um grande nome entre os magos e feiticeiros. Mesmo não tendo nem trinta anos, Cícero é um prodígio em magia. Assim como qualquer feiticeiro, nunca precisou dedicar horas ao estudo da magia. A mente e a criatividade são as maiores armas de quem se encontra nessa condição e, sendo assim, basta pensar ou desejar algo para que a mágica aconteça espontaneamente.

Um mago, para produzir fogo, deve usar runa, talismã ou algum feitiço pronto. Um feiticeiro apenas pensa “fogo”.

O mago estuda magia. O feiticeiro nasce e é magia.

 

Cícero estava pronto para deixar a casa na qual morava sozinho quando o viu. Na verdade ele o sentiu. Sabia que era Kaegro dentro daquela carruagem e podia notar a presença da mente arrogante do velho mago.

Fugindo de novo, velhote?”—Cícero disse telepaticamente ao rival.

No mesmo instante o condutor puxou os arreios e parou os cavalos. Kaegro desceu espumando de raiva. Ele nunca conseguiu evitar um conflito e não seria hoje o grande dia.

O feiticeiro ria enquanto o mago se aproximava. Na estrada, o condutor da carruagem chamava por Kaegro e era ignorado.

 

—Curve-se diante de seu superior, Kaegro! -Cícero mantinha os braços cruzados, não fez nenhum esforço, e o mago, ainda assim, caiu de joelhos antes de chegar a cinco passos de distância. Dominação telepática. -Hora de se aposentar, velho. Cadáveres não fazem mágica.

Kaegro, ainda de joelhos, abriu os braços e, de trás da capa, saiu um par de chakrams zunindo a toda a velocidade em direção ao telepata.

Chakrams são armas incomuns. Trata-se de dois aros de metal com lâminas serrilhadas. O uso deles é, predominantemente, para combate corporal, pois, uma vez que sejam arremessados contra o inimigo, perde-se a arma; só que Kaegro é um mago especializado em magnetismo e isto permite a ele lançar os aros sem tocá-los, como agora, e depois os recolhê-los sem que tenha de ir buscá-los.

O feiticeiro parou um dos chakrams e desviou o segundo para longe com um mero gesto das mãos.

—Acha mesmo que vai me ferir com isto? -Cícero gargalhava com o chakram na mão. -Arma porca, usada por brutos. -Ele começou a aquecer o aro, que ficou incandescente antes de fundir e derreter por completo. -Pensei que até mesmo os medíocres dos magos não precisassem recorrer a arsenais primitivos e sem qualquer poder arcano… é mesmo uma vergonha.

—Vá para o Inferno da Morte! -Gritou o velho mago, lançando um potente raio sobre Cícero, atingindo-o na cabeça e deixando-o desacordado. O xingamento fala sobre a Morte, um dos seis demônios. O inferno, nada mais é do que o lugar onde o demônio reside. Em resumo, Inferno da Morte é o lar do demônio que personifica a morte.

O feiticeiro não esperava o golpe. A maior fraqueza de Cícero Hidra era, justamente, subestimar os inimigos e, mais uma, vez cometeu o erro de se sentir invencível e abrir a guarda para receber um golpe cru e de fácil bloqueio.

—Nos veremos novamente, tenho certeza. -Kaegro já estava de pé, ao lado do feiticeiro caído. -Até lá, uma lembrança…

O velho mago, então, pisou com toda a força e raiva que sentia no nariz de seu inimigo, partindo-lhe o osso e sujando-lhe o rosto com sangue e terra. Kaegro é muito maior que Cícero e também muito mais forte fisicamente. Um dos benefícios de ter sangue gigante nas veias.

—Senhor! -Gritou Júlio. Ele tentava conter os cavalos, assustados com o estrondo do raio. -Precisamos ir, deixe-o!

—Já vou, maldito! -Kaegro gritou de volta.

E ia mesmo, porém se virou uma última vez para ver o corpo inconsciente de Cícero…

—Ainda não foi o bastante.

…e atear fogo sobre a casa do feiticeiro.

 

Da casa só sobraram cinzas, nem o esqueleto se manteve erguido.

 

***

 

Cena IV – A Chegada do Telepata.

18 horas e 07 minutos, Reino Anão – Ruthure. Q.G. dos Guardiões das Chamas.

 

—Humano, Cícero Hidra. -Anunciou-se o homem ao atravessar a ilusão de caverna desmoronada. -Recrutado no vigésimo dia do primeiro mês, ano 7302.

Cícero tinha a pele levemente bronzeada e o corpo esbelto, vestia um manto cor de âmbar. Ao remover o capuz, exibiu grandes e intimidadores olhos na mesma cor das roupas, cabelos pretos não muito grandes em caracóis e o sangue seco no nariz quebrado.

—Entre. -Convidaram Luzabell e Razatte.

As bruxas fingiram não notar o estado do novato e o acompanharam até a câmara ampla com abertura para o céu onde todos discutiam estratégias desde o início do dia.

—Cícero, seja bem-vindo. -Ezerk o saudou. -Falta apenas mais um Guardião chegar.

—Obrigado e desculpe-me pelo atraso. Tive alguns… contratempos no caminho. -Disse coçando o nariz.

—Atraso? -Darius zombou. -Targus mora neste reino e ainda não deu as caras.

—Cícero, estamos repassando alguns planos. Cada um de nós é indispensável para uma ou mais etapas de cada missão. O líder do clã estava entusiasmado para agir, e também receoso. -General Zeto comandará os peões no momento da guerra e liderará todos vocês aos ataques de destruição antes disso. -Ezerk indicou Urak ao falar.

—Certo, continue.

—As Bruxas Siamesas são o cérebro das operações. Quando elas mandarem correr, corra; quando mandarem matar, mate. -As bruxas estufaram o peito, embaladas pelo ego.

—Entendido.

—Darius é o espião e o canalha do grupo. A atuação dele será em missões à parte das nossas, na maioria das vezes. -Darius riu da descrição. -Ele roubará itens que nos serão úteis, enganará donzelas e coisas do tipo. O baixinho ali se chama de Manu. -Curioso Ezerk se referir a Manuel como baixinho, afinal, sendo ele mesmo um anão, é bem mais baixo que um híbrido humano-duende. -Ele vai usar as habilidades duendes para neutralizar as ameaças animais que venhamos a encontrar no caminho, bem como para controlar nossa mascote e arma.

—E a pequena ali? -Quis saber Cícero, curioso, apontando para a filha do General Zeto.

—Ela é Kira, uma bruxa. Trabalhará nas mágicas de proteção e ataque junto com você, com as Bruxas Siamesas e com o aliado que ainda chegará.

Kira acenou com duas das quatro mãos em cumprimento ao novato.

—Agora preste atenção porque esta é a parte onde você não pode deixar brechas. -A cigana se chama Hilda Saorum, ela conduzirá a missão sem sair daqui e você nos passará as informações. Sua primeira tarefa é destravar a mente dela a sua entrada para que tenha acesso completo.

O feiticeiro e a cigana apertaram as mãos e Ezerk continuou com a explicação:

—Sua segunda tarefa é bloquear minha mente. De forma que apenas você tenha acesso aos meus pensamentos.

—Como? Porque deseja isso?

—Suponhamos que eu, o líder, o homem que sabe absolutamente todos os passos que o clã dará, seja capturado por inimigos. Eu não os direi nada, mas isso não os impede de ler minha mente, encontrar este quartel-general e exterminar todos vocês sem grandes dificuldades enquanto dormem. É por isso que preciso que a feche.

—Compreendo. Por favor, continue.

—A última parte se aproxima da anterior. A Rainha Conaro se uniu a nós e é outra que deve ter a mente lacrada. -Ezerk suspirou. Evidentemente preferia poupar a Rainha Anã do que viria pela frente. -Ela participará das missões disfarçada, com o nome de Miragem.

—Sei onde quer chegar. -Cícero cortou a explicação. -Ela precisa ter a mente fechada para que, em caso de captura, não descubram que ela é a rainha, contudo há brechas. Mesmo que eu crie uma proteção telepática... no momento em que removerem a máscara, verão que estão com a Rainha Conaro em mãos.

—Brilhante conclusão! O que precisa fazer é ainda mais complexo neste caso.

—Conte-me.

—Você deve deixar uma trava na mente da rainha. Faça com que ela, ao vestir o disfarce, ative a trava e que só destranque a mente se ela mesma a remover…

—…Desse modo, mesmo que a apanhem e removam-lhe a máscara, ela esquecerá de tudo que viveu como Miragem. Nenhum vestígio sobrará. A aparência continuará igual, contudo a mente alterada despistará os possíveis suspeitas de conspiração… no máximo pensarão que ela fora hipnotizada ou que se trata de uma sósia. -Concluiu Cícero. -Senhor, meus parabéns, é um plano à prova de falhas! -Cícero estava radiante em se unir aos Guardiões das Chamas e se sentir importante, mesmo sendo um iniciante.

—Obrigado, senhor Hidra, deve parabenizar, porém, as verdadeiras mentes por trás desta engenhosidade: Luzabell e Razatte Korian, as Bruxas Siamesas.

—Não foi nada. -Disseram elas. -Apenas um bom uso do Charme.

—Um de seus Charmes Élficos é Inteligência? -Cícero perguntou e teve como resposta acenos positivos das duas cabeças.

—Para mim, está claro o motivo de serem o cérebro do clã.

 

***

 

Cena V – Ideias Traiçoeiras.

20 horas e 30 minutos, Reino Anão – Ruthure. Palácio Real.

 

Como de costume, a noite estava quente em Ruthure. O satélite Raus lançava sua luz morna sobre a terra cheia de cinzas vulcânicas e, novamente, um mensageiro externo chegava ao reino; desta vez para um anúncio particular à família real. Era um gigante em terras de anões; a relação entre as duas espécies pode ser descrita por qualquer adjetivo, menos como amistosa.

—Majestade. -O gigante cumprimentou Rei Rujavo. -Venho trazer um informe de meu Rei, Danan Pujo. Suponho que o tenha recebido por contato telepático…

—Não, não o recebi. Prossiga com sua missão.

—Bom, então devo ser eu a passar a mensagem. -O gigante pegou o papiro na bolsa desenrolou-o e transmitiu a mensagem:

 

“-Ramavel, em nome de Rei Danan Pujo, convoca todos os membros de autoridade da União Real, assim como seus auxiliares de menor patente, a comparecer ao Reino Gigante, no trigésimo nono dia do primeiro mês, deste ano.

O motivo: transmitir o informe da Deusa Harkuos, entregue a todos os que se encontravam no Pátio Sagrado no momento do fato. A comunicação com a Deusa se deu através do Monumento de Jade de Harkuos, exatamente ao meio-dia do trigésimo sétimo dia do primeiro mês, ano 7302.

O rei que não puder comparecer e não nomear um representante a assembleia terá a participação vetada das decisões posteriores acerca do assunto.”

 

—Uma reunião daqui a dois dias? -Rujavo alisava a barba crespa enquanto pensava no assunto. -Diga ao Rei Danan que será uma honra.

—Como não foi definida uma hora específica para a assembleia, a mesma terá início ao meio-dia, podendo-se iniciar antes, desde que todos os convocados se encontrem presentes. -O mensageiro não se sentia confortável em Ruthure, além de ser um lugar hostil à presença dele, era quente demais para a fisiologia gigante.

—Com licença, Rei Rujavo. -Disse o gigante ao fazer uma reverência breve. -Devo voltar ao meu reino.

—Muito bem, pode-se retirar, gigante. -Rei Rujavo consentiu e o mensageiro se foi.

 

Rujavo se levantou do trono e caminhou pelo imenso salão, de piso e paredes em tonalidades rubras, de um lado para o outro pensando sobre a convocação. Vez ou outra deixava risos curtos escaparem.

—Meu rei… -Chamou Rainha Conaro do alto de seu trono. Ela se manteve quieta durante toda a conversa, como sempre acontece na cultura anã: a mulher só fala quando se dirigem diretamente a ela, ainda que seja rainha.

—Pois não, minha rainha.

—Gostaria de saber o que te inquieta.

—Inquieta? -Debochou ele. -Não, não, muito pelo contrário. Gostaria de saber o que me conforta.

—Sim... -Concordou ela, sem entender a real intenção presente nas entrelinhas da fala do marido.

—Como lhe contei hoje cedo: o Rei de Kaotheu recusou meu convite para expor nossas reais intenções.

—Ainda não compreendo como isto o acalma, meu rei.

—A convocação da União Real me acalma. -Explicou Rujavo.

—Por que?

—Ora, Néfor não terá escolha. -Rujavo exibia todos os dentes em um sorriso vitorioso. -Eu mesmo tomarei a decisão por ele no dia da assembleia.

—Planeja contar aos seis reinos que apoia os Guardiões das Chamas?

—Exato, e com isso mostrar a todos que não só Ruthure, mas também Kaotheu os defende. Néfor não terá opção, será obrigado pelas circunstâncias a assumir seu lado.

—E se ele negar, meu rei?

—Conaro, pense! -Normalmente seria agora que Rujavo se aborreceria com a vagareza de raciocínio da esposa, porém estava contente demais para se zangar com pouco. -Tenho provas mais que incontestáveis da participação de Kaotheu nessa empreitada. Se ele negar, basta mostrá-las.

—Estupendo, é um excelente plano, meu rei!

 

***

 

Cena VI – O Último Guardião.

Meia-noite, Reino Anão – Ruthure. Q.G. dos Guardiões das Chamas.

 

Uma nova batida na porta da caverna indicava a chegada do último membro de elite do clã. Era o velho que morava nas falésias de Ruthure; de onde se podia ver, ao longe, o Reino Gigante, Ramavel. O mago necromante.

—Humano, Targus Oel. Recrutado no primeiro dia do quarto mês, ano 7301. -Apresentou-se ele com a característica voz fraca de quem está à beira da morte.

Urak, sem dizer nada, abriu a porta e deu passagem para que o mago seguisse na frente. Targus não é uma boa companhia para ninguém, todos os outros o evitam. Este é o preço de ser mestre em necromancia, só os mortos suportam sua companhia.

Ele seguiu para a câmara aberta arrastando o manto pelo chão da caverna, matando com o toque toda a relva que estivesse entre o chão e seus pés. Apenas Ezerk estava no local.

—Bem-vindo, Targus.

O necromante nada disse, fez apenas uma mesura.

—Antes de mostrar seus aposentos, preciso esclarecer sua função nesta guilda.

—Como queira.

—Vou direto ao ponto: o senhor fornecerá contingente quando os soldados que nos enviarem já não forem suficientes.

—Fala de levantar um exército de cadáveres?

—Precisamente. E também está encarregado e autorizado a ressuscitar todo e qualquer aliado de elite que venha a perecer, tomando-lhe o controle sobre corpo e habilidades, para que nenhuma baixa comprometa o desempenho do clã na batalha final. Deixe os mortos mortos, somente os acorde no momento da guerra.

Urak se arrepiou ao imaginar algum dos amigos, ou si próprio, como um fantoche, sendo mantido “vivo” e dominado pela magia de Targus.

—Como queira… -Repetiu o velho.


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