A Herdeira de Zaatros escrita por GuiHeitor


Capítulo 19
Capítulo 18




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Octogésimo terceiro dia do segundo mês, ano 7302.

 

Cena I – A Infiltrada.

01 hora e 38 minutos. Reino Gigante – Ramavel. Mansão dos Efinm, dos Anilya e dos Mosfey.

 

—Saudações, senhorita Ladelu, senhor Iros… -Disse a voz à imagem dos dois, exibida pelo espelho psíquico. -Tenho informações importantes.

—Dóris, pode nos tratar pelo primeiro nome. -Falou César.

A jovem olhou ao redor, certificando-se de que estava sozinha. A mansão vivia cheia, afinal pertencia a três famílias. Tal organização de família é comum entre os gigantes; casais diferentes se tornam amigos e dividem uma casa e até mesmo os cônjuges uns com os outros. A bigamia é muito bem-vista em Ramavel, é prova de uma grande aliança ou amizade entre os casais.

—Os Gigantes planejam um ataque aos Anões. Aço Voador evocará, de alguma forma, uma nevasca para enfraquecê-los antes de tentar subjugá-los.

—Quando isso será feito? -Perguntou Ônix.

—Não sei dizer. Se reunirão antes do amanhecer para decidirem se a estratégia da feiticeira é viável. -Dóris então virou o espelho para dois desenhos. Um anel e um colar. -Estas são as armas mágicas de Aço. O anel se transforma em qualquer outra arma, de espada a arco e flecha; enquanto o colar emana uma aura que petrifica os inimigos. -Concluiu, voltando a olhar para o vidro.

—Muito bem, o aviso está gravado em meu espelho e será transmitido aos reis e rainhas envolvidos na Salvaguarda Legítima. -Disse César.

—Algo mais? Precisa de algum recurso? -Indagou Ônix, sempre muito solícita.

—Eu gostaria que, se pudessem, avisassem minha mãe que estou aqui. Só para tranquilizá-la.

—Isso pode comprometer o disfarce. -César comentou, mais para si do que para os outros. -Contudo entendo a preocupação. Direi a ela que está em treinamento comigo e não pode vê-la.

—Obrigada, é o bastante.

—Diga-me seu nome verdadeiro e o de sua mãe para que eu escreva a carta. -Pediu Ônix. -Soará mais formal partindo de alguém sem envolvimento direto com os treinamentos.

—Bem pensado. Sou Vívian Cann, filha de Velma Cann.

 

***

 

Cena II – O Dragão, O Grito e O Adeus.

05 horas e 48 minutos. Reino Anão – Ruthure. A caminho da caverna do dragão.

 

Os Guardiões das Chamas seguiam para uma nova missão potencialmente suicida. Hilda, da fortaleza, dava instruções a Cícero o tempo todo. Na maioria das vezes, coisas sem sentido como “Peça a Kira que colha a flor amarela ao lado da moita” ou “Chute o próximo monte de seixos”.

—Não posso dar mais detalhes. Nem eu mesma sei com clareza o que representam estas coisas, fazem parte do processo. -Disse Cícero, repetindo, com a voz da cigana, as palavras que ecoavam em sua cabeça após Ezerk perguntar o porquê de tudo aquilo. -Essas ações estão gerando… como posso dizer… boas vibrações.

 

Cada um recebera um Inferno Congelado antes de deixarem o lar. Usaram cavalos da Guarda Anã até certo ponto, dali em diante iriam a pé. Estavam seguindo para o extremo sul do reino, aproximando-se da caverna da criatura, quando Ezerk disse:

—Todos aqui dependem um do outro para completar a tarefa. Miguel, faça por onde e será recompensado. Manu, tenha coragem. Darius, não se exiba, enfrentará um dragão, não confunda com cortejar uma moça. -Ele então parou e tomou nas mãos o machado que trazia nas costas. -Saquem suas armas, vistam as armaduras e trajes.

Os demais seguiram as ordens do líder. Urak estava assustador; usava uma armadura completa, seu elmo tinha chifres encaracolados e, no topo, uma penugem vermelha como um capacete de gladiador. O martelo firme nas mãos. Ezerk e Miragem seguiam o mesmo estilo do General. Darius deixara o arco em casa, armava-se com as adagas gêmeas, porque as flechas não penetrariam as escamas do semideus. Kira e Manu tinham uma combinação de couro e aço como armadura. Ela havia maquiado os olhos com tinta preta, cobrindo toda a cavidade ao seu redor e, partindo do meio das pálpebras inferiores, um risco que descia pelas bochechas até a metade do rosto. Miguel vestia a mesma roupa do dia que atacou Darius: todo de preto com uma capa azul-marinho. Targus, Cícero e as Siamesas também não se preocuparam com proteções e vestiam mantos comuns e largos que favorecessem os movimentos.

 

Então, à porta da caverna:

—Ele deve estar dormindo. -Supôs Ezerk. -Repassando o plano: não toquem em nada lá dentro. Se roubarem um grão de areia que seja do tesouro do dragão, não viverão para contar a história. Todos entendidos?

O clã assentiu e o líder continuou:

—Pelos Deuses Antigos, não fiquem na mira da boca da criatura, nem deem bobeira andando por baixo de sua barriga. Cuidado com a cauda também, vale lembrar. -Ele parou de falar tentando recordar de mais alguma coisa a informar. -Garras está pronta, Manu?

—Está.

—Prestem atenção. Darius, é com você! -Disse Ezerk ao desatento. -Garras carregará dentro de seu estômago três Infernos Congelados; o de Manu, o de Urak e o meu. Ela dará um jeito de ser engolida pela fera e, uma vez dentro dela, regurgitará as bombas. Nosso trabalho é fazer o bicho se agitar até que uma delas exploda e, com isso, detone as demais.

—Por que Garras não leva todos os Infernos Congelados? -Perguntou Cícero.

—Podemos precisar para fugir caso algo não saia como previsto. -Explicou o líder. -Com essas pernas de anão não vou muito longe correndo. -E riu.–Falando sério agora, Miragem e Miguel vão, assim que Garras voltar, invisíveis até as narinas do dragão e atirarão lá dentro seus Infernos Congelados. A movimentação de vocês pode acordá-lo, então corram para longe dele assim que tiverem feito.

—Entendido. -Responderam os dois em uníssono.

—Acho que é tudo, Manu… -Falou ele, entregando sua bomba ao híbrido e sendo copiado por Urak.

Garras engoliu com facilidade as três esferas. Transformou-se em serpe logo em seguida e foi voando para a caverna.

Era um grande buraco no chão. As pedras na entrada estavam chamuscadas e havia algumas carcaças de animais retorcidas ali. Emanavam um cheiro forte de podre.

 

A mascote do clã se viu cara a cara com o gigantesco dragão vermelho. Era da raça alada. Dormia em posição similar a uma galinha: cabeça sob uma das asas e sentado sobre as patas traseiras. Baforava uma fina fumaça de suas narinas e, ao respirar, o som ecoava por todo o lugar, lembrando um rosnado.

Como a boca estava fechada, Garras entrou pelo nariz. Ainda na forma de serpe, encolheu as asas e rastejou para dentro da fera. Deixou a primeira das esferas presa com muco no fundo do esôfago; descendo um pouco mais, para o estômago, liberou ali as duas restantes e fez o caminho de volta sem ser notada. O dragão era tão grande que ela pôde entrar e sair sem que ele sentisse qualquer desconforto.

Uma vez de volta aos braços do dono, foi parabenizada com louvor por todo o clã.

 

—Miguel, Miragem, é a vez de vocês. -Chamou Ezerk.

Imediatamente os dois se tornaram invisíveis e avançaram para a entrada da toca. Tiveram medo no início e pensaram em voltar, mas acabaram seguindo em frente. Contornaram a cabeça e subiram pela cauda, passando pelo dorso para chegar ao rosto do animal. Ali ficaram visíveis e fizeram uma contagem regressiva para atirar as bombas ao mesmo tempo pelas narinas. Jogaram e voltaram a ser invisíveis assim que o fizeram. O dragão se agitou levemente, engasgou e tossiu, mas tampouco acordou. Os dois, a anã e o elfo-duende, voltaram a respirar aliviados. Entretanto, quando pularam para o chão, fizeram as moedas, taças, joias e tudo o mais que havia de tesouro ali tilintar. Ao ouvir o ruído do ouro, a fera abriu um imenso e sonolento olho verde; Miguel e Miragem não pensaram duas vezes antes de debandarem a toda velocidade para fora da caverna. O bicho, na verdade, fechou os olhos e voltou a dormir sem notá-los.

 

Para a fase dois, Hilda lhes disse para que os mágicos fossem na frente, isto é, Targus, Bruxas Siamesas, Kira e Cícero.

—A cigana nos pediu para entrar atirando. -Disse o feiticeiro, com os olhos tomados por uma luz amarela. -Cada qual o mais forte que puder, acabou de acrescentar.

—Ela sugeriu algum alvo específico? -Quis saber Targus.

—Mirem na cabeça, peito ou asas… ah, Targus, convoque os fantasmas, mande que eles puxem o dragão para baixo, reduzindo assim os movimentos dele.

—Entendido. -Respondeu o necromante.

—Depois dos mágicos, irão os bárbaros: Urak, Ezerk e Miragem; e, por fim, os demais: Darius, Manu e Miguel.

—Por fim, os peso-pena. -Corrigiu Darius.

—Você precisa fazer piada o tempo todo? -Alfinetou Miguel.

—É espontâneo. Mas, e você, é tedioso assim mesmo ou teve aulas?

—Cresça, Darius. -Cortou o elfo-duende.

—Ah, um ótimo conselho vindo de alguém que mede um metro e meio. -O elfo zombou entre risadas. -Sem ofensas Manu.

—Não me ofendi. -Rebateu, seco.

—ORDEM! -Gritou o General. -Não estamos a passeio.

O sorriso de Darius murchou e o de Miguel surgiu maldoso, saboreando a bronca dada ao irmão.

—Luzabell e Razatte, vocês lideram o primeiro grupo. -Continuou. -Eu comandarei o segundo e… -Urak interrompeu o que dizia por um momento. -Darius o terceiro. Espero não me arrepender disso.

—Qual é? Eu sou um ótimo líder! -Queixou-se o ladino, girando as adagas nos dedos.

—Manu, controle-o caso necessário. -Arrematou o general.

 

Antes de invadirem explodindo tudo como Hilda havia recomendado, o clã parou à entrada para estudar não só o oponente, mas também o terreno. O dragão pertencia à raça dos alados, logo as patas dianteiras eram como as de um morcego: pequenas e ligadas às asas por membranas. As traseiras eram bem maiores e musculosas. As garras eram pretas, compridas e afiadas. Os chifres, brancos como pérola, cresciam para trás da cabeça, de onde se curvavam para baixo em seguida para a frente, terminando cada qual em uma ponta afiada ao lado do maxilar da criatura. Media por volta de cinquenta metros. Não era possível ver os dentes, pois tinha a boca fechada. A cauda corpulenta terminava em um chifre em forma de seta.

A caverna parecia favorecer-lhes. O teto alto estava recheado de estalactites pontiagudas as quais seriam ótimas brocas naturais para derrubar sobre um dragão adormecido. Não se via o chão, a grossa camada de ouro e pedras preciosas escondia a terra. Detrás do bicho, parecia vir uma corrente de ar. Certamente existia uma saída alternativa daquele buraco.

 

—Disparem no teto acima dele. -Coordenaram as Siamesas. -Vamos usar a geografia da gruta a nosso favor. AGORA!

Exceto Targus, que incitava os fantasmas sobre o dragão, todos os mágicos golpearam o teto com raios, bolas de fogo e, no caso de Kira, ondas de som, desta vez criadas por uma flauta com a qual substituía o chocalho usado outrora.

—Como resultado, algumas pedras e quatro enormes estalactites se desprenderam, ganhando velocidade em direção ao solo. Uma delas atingiu o animal na ponta da cauda, prendendo-a no chão. Duas caíram sem atingi-lo diretamente, esta função coube aos estilhaços.

Agora, a tempo da última chegar, o semideus havia despertado. O dragão esmurrou a última rocha com a pata dianteira, até então tida pelo clã como algo frágil. Ao golpeá-la, os escombros se projetaram sobre os Guardiões das Chamas. Como eram a linha de frente, quase todos os mágicos foram atingidos e nocauteados. Apenas Kira escapou. Urak se atirou entre a filha e a rocha e, com uma poderosa rotação do martelo, reduziu o pedregulho do tamanho de uma ovelha a pequenas pedrinhas.

Quase sem magia, restava agora ao clã torcer para que os Infernos Congelados explodissem logo. Darius mandou que seu pelotão retirasse os caídos da caverna, e assim fizeram. Enquanto a segunda frente lutava contra o dragão, Manu instruía Garras a se transformar em Keneau e levar os desacordados para o lado de fora.

O dragão fazia o impossível para soltar a cauda da pedra. O grupo dois, os bárbaros, atacavam-no com tudo o que podiam. Evitar o fogo era complicado. A fera cuspia as labaredas continuamente durante muitos segundos, obrigando-os a correr e saltar o tempo inteiro para evitá-las. Miragem não podia confundir o dragão com as ilusões, ele estava muito acima disso. Optou, então, por tornar-se invisível e perfurá-lo ente os dedos na tentativa de diminuir seus movimentos ou ao menos de torná-los dolorosos. Surtiu resultados, medíocres, mas, ainda assim, surtiu. A parte difícil era evitar os pisões e coices da fera.

Enquanto isso, Darius, Manu e Miguel protegiam os mágicos desacordados como podiam, até que Garras os levasse a um lugar seguro. O anel de Manu foi muito útil nessa questão. Kira também lutava para manter um campo de força que envolvesse os aliados. Uma vez que todos estavam a salvo, cada um procurou um meio de desnortear o dragão: Manu e Garras eram a atilharia pesada, a cascavel-camaleão havia, inclusive conseguido ferroar o semideus, valendo-se de sua forma de escorpião gigante, na sola da pata traseira esquerda. Darius cobria o irmão, Miguel, enquanto este metralhava com seus sais a criatura escamada.

Urak há muito havia perdido a marreta. Arremessou-a contra a bocarra do dragão enquanto este a abria e se preparava para uma nova salva de chamas. Como saldo, conseguiu trincar um dente e ferir a língua da criatura. O fogo não será mais um grande problema daqui em diante. Ezerk ainda possuía o machado de dois gumes, um tanto cego depois de tantos golpes contra as escamas vermelhas quase indestrutíveis.

Então, o jogo pareceu virar completamente a favor do clã: as Bruxas Siamesas surgiram na entrada da gruta, correndo loucas, com seus característicos passos de caranguejo, em direção ao semideus e lançando sobre ele uma forte luz branca que o ofuscou por alguns segundos. Os demais aproveitaram a oportunidade para flanquear o bicho e tentar dominá-lo de uma vez por todas. Aí a vantagem se inverteu novamente:

O dragão soltou a cauda presa pela estalactite e, com um golpe do poderoso músculo, mandou as Siamesas, Darius, Miguel, Ezerk e Urak para a lona. Ali jaziam caídos sobre o ouro do animal, quando Cícero, da entrada, falou para Kira, Miragem, Manu e Garras:

—Todos para fora! -Gritou ele tão alto que as veias da testa e do pescoço se esbugalharam por baixo da pele morena. -Hilda está dizendo que será Kira quem matará o dragão! SOZINHA!

Todos correram para fora. Foram instruídos a seguir sem questionar as instruções da cigana.

Como que por milagre, Urak começava a despertar. Cícero repetiu as ordens e, junto com Garras, o General carregou os aliados para fora. Kira, olhou o dragão enquanto ele a encarava. Ele parecia dar a jovem bruxa uma chance de se arrepender e sair de sua toca. Mas Silêncio sabia o que deveria ser feito e sentia medo. Não era o medo de morrer que a preocupava e sim o de fracassar e deixar os Guardiões das Chamas desamparados. Contavam com ela.

Do lado de fora, Cícero ergueu uma densa proteção ao redor de todos. O General chorava enquanto tentava reanimar Darius. Sabia que o cunhado/amigo/irmão estava fora de risco, mas temia pela filha. Queria alguém a quem se escorar naquele momento de tensão.

Kira, carinhosamente apelida como Silêncio pelo tio/padrinho, a bruxa do som de apenas dez anos de idade, completaria onze dali a três dias, carregava todo o fardo de assassinar um semideus. Ali, olhando nos olhos do dragão, que antes eram verdes, porém agora estavam azul-piscina, ela sabia o que deveria ser feito. A criatura afastou o rosto, erguendo o pescoço. Preparava-se para soprar fogo sobre a bruxa. Ela atirou para longe a flauta usada como arma durante o combate. Removeu teatralmente a echarpe do pescoço, prendeu os cabelos louros com um nó firme para trás e alisou a pele tatuada com uma runa. A Runa Grito se acendeu lilás, assumindo depois um tom mais escuro e denso de roxo. A híbrida humana-kvarbrakoj esperou pelo movimento do semideus; ele parecia querer poupá-la. Ela só queria destruí-lo. Nada pessoal, apenas ordens a serem seguidas. O dragão encheu os pulmões de ar, aprontava-se para o sopro de fogo. Silêncio fez o mesmo, pondo para dentro todo o ar que cabia.

Então vieram as chamas. Era como ser grelhado na boca de um vulcão, um calor indescritível, um fogo mágico e divino que amaldiçoa tudo o que toca. Kira Zeto abriu a boca e externou o maior grito de Zaatros. Quando a magia da híbrida e a chama do dragão se cruzaram, parecia que a caverna ruiria sobre a cabeça dos dois. O som foi insuportável, o semideus ferido na língua e envenenado por Garras não poderia sustentar o fogo por mais tempo, mas Kira tinha um estoque imenso de voz implorando para ser despejado fora. Um minuto depois, as labaredas começaram a perder força, a voz de Silêncio, porém, mantinha o mesmo poder e avançava, incidia rumo à cabeça do dragão, galgando centímetro a centímetro o espaço entre os dois até finalmente se chocar contra a fera. De imediato o que aconteceu foi o seguinte: dentes e chifres racharam sob a intensidade do som, depois os olhos implodiram e, por fim, o grito detonou um dos Infernos Congelados anteriormente postos dentro das narinas do dragão. A explosão foi surreal, não arremessou Kira para trás devido ao monstruoso som do grito, o qual repelia a onda de choque da detonação da bomba. Após a primeira detonação, seguiram as subsequentes: outra na narina, uma no pescoço e as duas últimas deixadas no estômago do semideus.

Então a gruta começou a desabar. O teto ruía em grandes rachaduras das quais pedregulhos se desprendiam a cada segundo. O dragão jazia morto e mutilado pelas explosões em um verdadeiro retorcido de carne boiando em um lago de sangue. Seu tesouro apodrecera e enferrujara até desaparecer. A caverna fora reduzida a uma montanha de escombros. Kira não havia saído.

 

O clã escavou os destroços como pôde. Encontraram os restos esmagados do dragão e de Kira. Foi uma vitória com muitas perdas. Garras se serviu da carne do dragão, tornando-se um também. Urak e Darius, bem-dizer, haviam morrido junto com a jovem bruxa.

Naquele mesmo dia, o elfo atacou e surrou Hilda. Culpava-a pela morte da sobrinha, culpava a todos que permitiram uma criança de dez anos de idade medir forças com um semideus de, no mínimo, dois séculos de vida. A cigana passa bem, tem alguns inchaços e hematomas no rosto e nos braços, mas nada que ponha em risco sua vida. Ezerk apartou a briga, passou horas conversando com Darius e Urak. O General estava devastado, Kira era sua única filha.

Queria fazer uma cerimônia no dia seguinte, contudo, a conselho de Ezerk, decidiu adiar para dali a três dias. Para o octogésimo sexto dia do segundo mês, dia no qual aconteceria o décimo primeiro aniversário de sua filha se ainda estivesse viva.

 

***

 

Cena III – A Nuvem de Tempestade.

13 horas e 19 minutos. Reino Gigante – Ramavel. Divisa com Ruthure.

 

Sete séculos de experiência pura em feitiçaria se punham à prova sobre aquele mar. Apenas quinhentos e noventa e nove quilômetros de água salgada separavam gigantes de anões, ramavenos de ruthuranos. Dali era possível ver ao longe a silhueta de Ruthure, seus vulcões e montanhas imensos.

Aço Voador flutuava sobre o oceano. Os olhos dominados por uma luz azul enquanto a feiticeira convocava a nevasca. Os braços abertos, as mãos envoltas no mesmo brilho azul, a cor do seu mana. Sem demora, o céu escureceu, as nuvens se aglomeraram encobrindo a luz da Estrela Astral. A neve veio em seguida, um floco aqui outro acolá. Depois vieram os raios, os trovões, o agito das ondas e as chicotadas da ventania.

A mulher, cujo nome era desconhecido, sorria. Sempre conseguia tudo o que desejava. Não foi diferente com o plano trocar a defesa pelo ataque direto. Quando chegasse a hora, ela iria sozinha para o Reino Anão e exterminaria todos os Infiéis que pudesse. Estava em seu destino e em sua maldição ter sucesso sempre e para sempre, até que alguém descobrisse seu verdadeiro nome. E este era um segredo guardado a sete mil chaves por ela.

O vento emaranhava seu cabelo crespo, ela tampouco pouco se importava. Içou voo, direto para o centro da tormenta, embrenhando-se no meio da tempestade e dominando-a com a mesma maestria de um encantador para com suas serpentes. Fê-la rumar para Ruthure, lá causaria estrago automaticamente. Uma nevasca em uma terra vulcânica, a ironia perfeita e a tática de guerra apropriada para debilitar os anões tão indefesos ao frio. Após dois ou três dias de neve, Aço Voador invadiria as Terras Vulcânicas e traria consigo a morte aos Infiéis de Ruthure. Kaotheu seria a parada seguinte da tormenta, onde extirparia para sempre a escória que renega a Deusa Harkuos e mancha o mundo do qual Ela é dona. A única mancha que deixarão depois da chacina será a de sangue sobre a terra.


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