WSU's Aracnídeo escrita por Gabriel Souza, WSU


Capítulo 8
Capítulo 7: A verdade




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Soldado Fantasma

 

Observo ao lado do Aracnídeo a apreensão dos dois homens que detivemos a poucos instantes, a polícia chegou rápido ao local, algo haver com testemunhas verem o terrorista conhecido como Aracnídeo, muito provavelmente.

— Alguém já disse que você é muito calado? Agora eu entendo por que o chamam de fantasma. — diz Aracnídeo.

— Alguém já disse que você fala demais? — Eu indago sarcástico.

— Bem... algumas vezes... acho que estamos empatados. — Ele diz.

Me levanto e saio da beirada:

— Isso não é uma brincadeira garoto — olho melhor o local onde estamos para ter certeza de que não tem ninguém nos vigiando — As pessoas que se envolvem no mundo do crime não brincam, então leve as coisas a sério — Me silencio por alguns segundos antes de concluir — Bem, isso se você quiser continuar sendo o Aracnídeo.

O Aracnídeo também se levanta e vem em minha direção:

— Eu levo a sério. Eu só acho que você deve "brincar" um pouco — Ele  dá uma ênfase maior na palavra brincar — se divertir sabe, se encher de tristeza e solidão não é bom para ninguém — Ele estende a mão em minha direção — Bem, a gente ainda não se apresentou formalmente. Meu nome é Jonas.

 

Aracnídeo
12:40

 

Depois da última noite, me senti dividido entre continuar tentando esquecer as minhas semanas agindo como vigilante da cidade ou retornar a tentar salvar pessoas por toda Recife. Bem, isso é algo complicado, na verdade, meu coração diz uma coisa, mas a cabeça outra.

Preciso de alguém com que eu possa me abrir, e infelizmente, tirando o Rafael eu só conheço uma pessoa com a qual eu me sinto livre, Bia. É estranho já que eu mal falo com ela, mas ela sempre me passa uma sensação de confiança e conforto. É isso aí, eu preciso falar com ela, é a única forma que que tenho de me decidir.

Ando pelos corredores do colégio, procuro Bia, ela nunca sai logo após o toque, ela tem frescura com esse negócio de sair logo que toca, segundo ela, ela não gosta de ficar imprensada numa multidão de gente saindo ao mesmo tempo.

Depois de um tempo, a encontro andando a passos apressados indo em direção à biblioteca do colégio.

— Ei Bia! — Ela se vira em minha direção ainda procurando quem foi que a chamou. Quando finalmente me aproximo eu concluo — Ei, preciso de uma ajuda sua.

— Olha Jonas, não dá agora ok? Eu tou correndo aqui, eu preciso concluir aquele trabalho sobre os lobos cerebra.. — Ela diz.

— Trabalho? Lobos cerebrais? Desde quando nós temos um trabalho sobre lobos cerebrais?

— Não vai me dizer que você não fez?  — Ela indaga.

— Eu não lembro de nenhum trabalho... — coço a nuca tentando me lembrar de algum trabalho que tenha deixado passar.

— Pois tem um trabalho, de biologia e o tempo para fazer está acabando, se você quiser você pode fazer comigo e quando a gente acabar você me diz o que quer dizer. — Ela diz.

Merda, eu tenho que fazer um trabalho? Logo agora?.

— Claro, por mim tudo bem.

 


******

 


  — Ok, trabalho feito, agora você pode me ajudar? — pergunto.

— Claro, o que foi? — Ela sorri timidamente.

— Será que a gente poderia ir para a piscina? Tipo. Lá é vazio uma hora dessas, e você sabe, não tem gente. E... merda — O que eu tou falando? — Bem, é que... O que eu quero falar com você não dá para ser falado aqui sabe... onde tem gente e... você sabe.

Percebo as bochechas de seu rosto ficarem rosadas, cara, com certeza ela pensou outra coisa.

— Ah... tá, por mim tudo bem. — Ela responde.

 

 


******


  — Tudo bem, o que vou lhe mostrar agora é meio assustador certo? — Ainda meio nervoso eu respiro fundo, respiro numa tentativa de me acalmar mais, e encontrar coragem para falar o que deve ser falado:

— Por favor não se assuste — Fecho meus olhos. Descobri recentemente que meus olhos mudam de cor caso eu me concentre ou perca o controle, eles saem do usual castanho claro para um azul frio e sem vida que me permite enxergar melhor as coisas.

Abro os olhos e vejo cada detalhe de seu belo rosto, desde o cabelo longo e castanho-caramelo, suas pequenas sardas quase imperceptíveis, até sua mudança de expressão, de uma expressão calma e amigável para uma assustada ao perceber a coloração em meus olhos. Ela recua.

— Eu preciso te contar uma coisa. — dou um passo à frente me aproximando dela — Eu sou o Aracnídeo.

 

 

******

 

Explico rapidamente tudo o que aconteceu desde que eu misteriosamente ganhei meus poderes, o medo de assumi-los, a sensação de grandiosidade, a falha em minha primeira ação como Aracnídeo, minha ascensão e queda, e por último, o meu encontro com o vigilante conhecido como Soldado Fantasma, um andarilho da escuridão, um cara que impõe medo pela sua simples presença. Conto detalhadamente a sensação que eu senti ao perder o controle sobre mim e o meu medo de perder de novo.

— Você tem medo de perder o controle? Entendi isso. Mas, por que você me contou isso? — indaga ela.

— Sinceramente? Nem eu sei, eu só... eu... sinto que posso confiar em você sabe? Sinto que por alguma razão você é a única que pode me ajudar agora. Eu acho que você merece saber a verdade sabe... e...você é sempre calada, calma e eu juro que nunca te vi com raiva — Me levanto sem tirar o olhar de seus olhos que tentam fugir dos meus constantemente — Eu sempre perco o controle quando estou com raiva, e ultimamente... eu tou sempre com raiva. — dou uma pausa, é difícil admitir — Por algum motivo não sinto esse medo, essa raiva dentro de mim quando estou com você.

Ela fica corada novamente e abaixa a cabeça rapidamente, enquanto afasta o cabelo do rosto.

— Eu tenho raiva... — Bia abaixa  ainda mais a cabeça, ela não consegue manter contato visual direto comigo mesmo — Eu só não desconto nos outros.

Fico em silêncio.Ela está certa, eu desconto minha raiva nos outros. Eu...

— Eu tenho fé de que você conseguirá encontrar um jeito de se controlar... que você será um bom herói e uma boa pessoa, pois para ser herói você antes tem que ser uma pessoa melhor. — Ela continua.

Mostro um leve sorriso:

— Eu acho que eu consigo isso, não deve ser tão difícil assim.

— Espero... por quê às vezes as pessoas merecem mais que a verdade, merecem ter sua fé recompensada, e eu tenho fé em você Jonas.

 

 

 

20:00

 

Chego ao local onde tinha marcado com o Soldado na outra noite. Ele me prometeu ensinar alguns truques caso eu aparecesse aqui hoje. Bem, até o momento nenhum sinal dele, deve estar atrasado.

Sento-me na beirada do prédio para observar minha cidade, nesta hora da noite ela está bem movimentada, as luzes dos carros indo e vindo me mostram que existem outras pessoas por aí, pessoas com suas crenças, com seus objetivos com suas paixões...  com suas vidas.

— Chegou cedo, parabéns. — Me viro rapidamente e vejo um vulto sair das sombras, um homem, um soldado:

— E aí? Quer começar com o que hoje?

 

 


******

Tento acertar um soco em seu rosto, mas ele defende usando seu ante-braço esquerdo, em um movimento veloz ele tenta uma joelhada em minha barriga, graças à minha visão levemente melhor do que a de um humano, eu consigo perceber o movimento e defender com a mão direita — Mesmo com seus poderes — Ele me acerta um chute nas costelas — Mesmo com esses reflexos — Outro golpe certeiro do soldado, agora ele acerta uma cotovelada em meu rosto — Essa força — Ele bloqueia minha investida — Você não consegue me derrotar — Me distraio e caio no chão após receber uma rasteira.

— Você tem poder mas não sabe usar — Ele estica sua mão, mesmo relutante estico minha mão aceitando sua ajuda para me levan... uma joelhada no peito!! Golpe baixo... — Não confie em seu adversário — solto teia em seu rosto para atrapalhar sua visão.

Rolo para trás e me recomponho. — Esperto... Mas muito previsível vindo de você. — Ele desvia de meu soco mesmo sem enxergar. Quem é esse cara?

  — Aquilo... Foi golpe baixo!— reclamo.

O soldado tira as teias de seu rosto. Ele retruca:

— Se você acha que seus inimigos lutarão com honestidade, me desculpe te trazer a realidade garoto, mas isso não vai acontecer... e o meu papel é te mostrar isso.

Fecho meus olhos, quando reabro-os vejo as coisas mais detalhadas, minha visão aracnídea está ativada. Corro para cima do Soldado em busca de uma brecha em sua defesa. Tento um chute lateral em sua barriga, está desprotegida, ele defende, antes mesmo que ele possa se vangloriar por sua ótima defesa me impulsiono com a única perna livre saltando e acertando um chute em seu rosto.

O soldado cambaleia, defesa quebrada. Acerto dois socos rápidos em seus rosto, em seguida tento mais um chute dessa vez na perna esquerda dele, acerto e tiro seu equilibrado. Ele fica de joelhos no chão. Para finalizar tento dar uma espécie de voleio, para meu azar o Soldado se recupera facilmente do meu último golpe e segura meu ataque com ambas as mãos me fazendo cair no chão.

— Você tem que ser mais inteligente em combate — Levo um golpe na barriga e em seguida sou chutado para longe. — Não ganhe confiança demais em uma batalha, falta de confiança resulta no fracasso, mas o excesso dela também. — Me levanto com raiva. Mais uma onda de raiva tentando sair de mim, explodindo, gritando.

Sinto minhas unhas se alongando e virando garras. Tento me controlar o máximo que posso, mas não sei se surtirá algum efeito.

Dou dois passos para trás, a dor me derruba mais uma vez, sinto a sede de sangue crescer, sinto desejo por isso. Me levanto pronto para atacar o homem à minha frente, mas antes mesmo que possa atacar sou atingido por algo, um tiro me atinge no braço esquerdo, caio no chão, o sangue verde escorre pelo meu braço e antebraço. A dor me trás de volta.

— Que porra foi essa? Você está doido? — grito.

— Não, só que você tem uma regeneração bem avançada, te vi se curando ontem, você nem percebeu, mas se feriu no braço e antes mesmo da luta acabar já estava recuperado — Ele guarda a pistola no coldre — Você vai se recuperar.

— E se você estivesse errado...?

— Aí você só levou um tiro que deixará uma cicatriz para contar história. — Ele para um pouco, analisando o ambiente novamente, cara estranho. — Descanse um pouco e se recupere, de meia noite iremos ao Porto.

— Porto? Fazer o que no Porto?

Ele me encara, seu olhar é uma mistura de pena e determinação.

— Derrotar o homem que o fez desistir de ser o Aracnídeo, eu vou te ajudar a enfrentar seu medo, mas você terá de encontrar o seu próprio caminho para o auto-controle.

Derrotar o homem que me derrotou? Ele está falando do John Soares?

— Por que você está me ajudando?

— Digamos que eu sei bem o que é não estar no controle de si mesmo.

 


   Soldado
00:03

 

Consigo enxergar três homens reunidos numa área vazia do Porto de Suape, Recife. Eles conversam sobre algo que não consigo discernir. Um carro preto para próximo a eles, dele um homem de cabelo grisalho desce calmamente, é John Soares, o nêmese do Aracnídeo, o qual ainda não apareceu.

Me aproximo, preciso encontrar uma forma de ouvir o que esses quatro estão discutindo, não deve ser nada bom...

— Eae.

Me viro subitamente, esse verme não pode chegar assim do nada, atrás de uma pessoa.

— Cala a boca e se abaixa. — respondo com frieza.

 — Ah sim, está tudo bem comigo também soldado gasparzinho, obrigado por perguntar. — Ele fala.

Ignoro o comentário inútil do meu aliado.

— Não consegui ouvir muito bem. Mas pelo que entendi estão discutindo algo sobre uma transferência de alguma nova mercadoria. — Aracnídeo se aproxima de mim — Não sei o que é, mas temos que impedir isso agora. — faço uma pausa — Porém, com certeza devem ter outros capangas por aí que aparecerão assim que dermos as caras.

— Certo. — Ele engole em seco — Faremos assim, eu vou lá, surro alguns idiotas, você aproveita a brecha, localiza os capangas escondidos e destrói seja lá o que eles estejam negociando.

Olho para o garoto ao meu lado. Ele não é um completo retardado, está disposto a se arriscar.

— Certo. Somente espere um pouco. Quero saber o que estão negociando antes de intervir.

Dito e feito, mal termino de falar e John faz um sinal para uma área aparentemente vazia, mais atrás no amplo Porto. Luzes de farol se ascendem e uma van se aproxima. Ela para próximo dos quatro líderes.

O motorista e o passageiro descem da van, abrem a porta traseira do veículo de onde saem algumas mulheres e crianças acorrentadas. Vocifero:

— Vermes.

— Eles estão fazendo mesmo o que acho que estão fazendo? — pergunta Aracnídeo.

Ignoro-o. Esses malditos tem a cara de pau de negociar crianças e mulheres? Quem eles pensam que são? Não, não podemos intervir de qualquer jeito, se tentarmos uma ofensiva sem pensar  em uma estratégia estaremos em desvantagem, eles têm reféns.

— Garoto, precisamos de um novo plano.— silêncio — Garoto?

— Eu já disse o quanto eu odeio pessoas como vocês? — Fico parado vendo o imbecil saltar de um carro e cair com seu famigerado pouso de herói no chão. — Não? Pois é, eu odeio!

Garoto idiota. Será que não percebeu que acabou de colocar a vida dessas pessoas em risco?

Capangas surgem de todos os lados, devem ser uns trinta homens, homens armados dos pés à cabeça, todos com suas armas apontadas para o garoto fantasiado na frente deles.

— Eu não tinha pensado bem sobre o que fazer depois de falar isso, mas... — Ele salta soltando teia em um guindaste e se lançando para longe da mira dos homens — Com certeza não era ser alvejado por vocês idiotas.

O garoto sabe se virar, preciso tirar essas pessoas daqui enquanto isso, depois posso me concentrar nesses capangas.

 

 Aracnídeo

 

Ser o principal alvo de mais de trinta caras não é a coisa mais legal do mundo. Qualquer descuido e tchau Jonas, foi bom te conhecer, mas você teve uma morte das mais idiotas do mundo heroico.

Analisando minha situação e o ambiente onde estou, consigo observar algumas caixas gigantescas, contêineres e guindastes, isso será ótimo para conseguir me locomover com rapidez e escapar dos tiros. Salto em direção a um contêiner e fico cara a cara com um dos homens da operação.

— Eae cara beleza? — Ele tenta levantar a arma contra mim, por sorte sou mais rápido e tiro-a de sua mão antes que ele conclua sua ação — Você prefere correr ou se borrar? Nenhuma das duas é... — Ele tenta me socar, mas eu me agacho evitando um gancho de direita bem no rosto — das coisas mais honrosas a se fazer né, mas pelo visto... — acerto um soco em sua barriga — caras como você não ligam para honra, moral ou qualquer coisa do tipo. — Um soco certeiro abaixo do queixo e o homem a minha frente fica no chão— Foi legal conversar com você.

 

 

   Soldado

 

Sou forçado a fazer alguma coisa após a grande estupidez que o Aracnídeo acabara de fazer, pego uma pistola do bolso e coloco um supressor de som, o famoso silenciador, ele não fará com que os tiros se tornem inaudíveis, mas pelos menos chamará menos atenção para minha localização.
Vejo o garoto enfrentando alguns homens, levanto a arma e disparo na virilha de um, um a menos.

Com seu grito de agonia os outros se distraem e o Aracnídeo se aproveita. Pelo visto não é tão idiota assim. Me distancio em busca de uma posição estratégica para abrir fogo sem ser visto. Um local que me permita enxergar melhor o ambiente e ao mesmo tempo seja de difícil acesso, seria bastante útil.

Vejo um guindaste, é alto o suficiente para que eu ganhe uma boa visão do que está ocorrendo aqui, corro até ele, subo. A vista de cima é abrangente, consigo enxergar Aracnídeo enfrentando alguns homens, o moleque leva jeito. Alguns ficam vasculhando entre os contêineres, provavelmente me procurando. John Soares está mexendo na mala de um carro, ele está longe, não posso acertá-lo nem se usar minhas brechas, os reféns estão próximos a ele. Todos acorrentados, mulheres e crianças, esses miseráveis vão pagar pelo que estão tentando fazer.

Vejo um desses desgraçados se aproximando pelas costas do garoto, ele tá longe demais para eu ter uma boa precisão de disparo, para minha sorte eu não preciso de precisão no momento do disparo, atiro, a bala corta o ar, uma brecha se abre em frente ao projétil que desaparece e ressurge logo atrás do homem armado, ela o acerta e ele cai no chão.

Um a menos. Um dos deles me avista, tenta atirar em minha direção, mas abro uma brecha fazendo seu próprio disparo acertá-lo.

Mais um. Outros homens me avistam após esse último tiro, cerca de dez. É hoje que vou me danar.

  
   Aracnídeo

 

Lutar contra alguns caras que carregam armas é complicado, o motivo? Eles estão armados, um tiro no peito, cabeça ou qualquer parte crítica do corpo e adeus Jonas, foi bom te conhecer. Por sorte eu não estou sozinho hoje, o Soldado Gasparzinho está comigo, esse cara é um maluco inveterado, mas mesmo assim é bom ter sua companhia, ou quase-companhia, num momentos desses.

Eu acerto golpes em alguns homens enquanto ele, do alto de um guindaste atira nos caras que eu deixo passarem despercebidos, é uma boa aliança, uma boa tática de combate, imagina se eu conhecesse alguém de patente mais alta do que um Soldado?

 

 


******

 

Vejo Soares próximo a um grupo de cinco crianças e três mulheres, todos acorrentados enquanto ele analisa uma agulha estranha, bem é melhor eu ficar longe disso, e impedir seja lá for que ele planeje fazer. Ele precisa pagar também pelo o que me fez, ninguém me humilha e sai de boa para contar história, eu sou Jonas Ferreira, o Aracnídeo e não um cara qualquer.

Me aproximo de John sem que ele perceba, é uma ótima oportunidade de atacá-lo e acabar de uma vez por todas com isso. Infelizmente uma coisa me chama a atenção, faz um tempinho que não ouço nenhum disparo do Soldado e pensando bem, não há ninguém tentando me derrotar já há algum tempo também, merda, vou ter que verificar por onde o meu fantasminha preferido anda.


    Soldado

 

Inicialmente dez homens tinham vindo até mim, tive certa dificuldade, mas no geral foi fácil lidar com eles, infelizmente nossa briguinha atraiu a atenção dos outros, mais ou menos vinte deles se aglomeraram à minha volta, seria mais fácil se eu não estivesse sentindo um pouco de exaustão, usar minhas brechas causa certo cansaço, mas é algo suportável.

Olho ao meu redor, não há nenhuma brecha por  onde eu possa sair, bem, ainda bem que eu posso criar minhas próprias brechas. Levanto minha perna num movimento que seria como um chute no ar, mas graças às minhas capacidades meus pés acertam o rosto de um homem careca que estava cinco metros de distância, ele cai no chão e eu sorrio comigo mesmo.

Mesmo passando por tudo o que passei para ter esses poderes, eles ainda podem ser úteis, servir para algo além de dor e sofrimento. Chuto outro homem que se aproximava de mim com um canivete em mãos. Bem, algo além de dor a inocentes, coisa que esses caras não são.

Escuto o som de um tiro e antes que possa perceber de onde ele veio sou atingido nas costas pelo projétil, cambaleio perdendo o equilíbrio e o senso de direção, antes que possa me recobrar levo uma coronhada no rosto. Logo depois um soco, um chute, outro chute, todos os homens aproveitaram a brecha na minha postura e vieram com força total para cima de mim. Claro, esse não era o plano inicial, provavelmente achavam que o tiro me mataria, por sorte ele acertou meu uniforme, o que me causou dor, mas nenhum ferimento sério.

— Vocês não querem me ver irritado.

Cinco deles correm em minha direção, levo socos e chutes de todas as direções. Mesmo sendo alguém com capacidades físicas muito acima de uma pessoa comum eu sinto cada soco e chute que é desferido contra mim. Por alguns instantes me deixo levar pelos ferimentos de repetitivos golpes contra a mim. Então que lembro de meu objetivo aqui, o motivo de ter vindo e a minha única razão de permanecer de pé hoje, tenho algo a fazer e não serei detido por alguns idiotas de armas.

Me esforço para criar múltiplas brechas, cinco pares delas para ser mais preciso. Cinco brechas ao meu redor e a mesma quantidade próximo a cabeça de cada um de meus agressores. No momento em que eles tenta me socar e chutar seus golpes atravessam as brechas e eles acabam por acertar a si mesmos.

— Uma dica, seus idiotas. — observo os homens que estão caídos próximos de mim — Nunca se deem como vitoriosos antes da hora.

Escuto um tiro abafado por um silenciador nas minhas costas, rapidamente crio uma brecha e evito que o tiro me acerte.

Ainda faltam alguns caras com o qual eu preciso lidar. Faço uma postura de combate e espero algum sinal de ataque de qualquer um de meus adversários. De repente um deles sai rapidamente do chão. Olho mais para cima e enxergo o responsável, Aracnídeo. Todos os capangas se distraem voltando suas atenções para o jovem rapaz mascarado acima deles.

— Você gosta de atrair as atenções para você. – comento.

Ele salta do local donde estava num movimento rápido que se encerrar com seus dois pés acertando o peito de um homem.

  — Fazer o quê. Eu gosto disso.

Acerto três socos rápidos em outro inimigo.

— Vá atrás do Soares. Eu cuido do resto.

— Beleza Tiozão. — Ele responde saltando.

Tiozão? Jonas... vá capinar um lote garoto metido.

 

 

     Aracnídeo
 

 

Finalmente reencontro Soares. Ele está sozinho, próximo a um grupo de mulheres e crianças acorrentadas, não posso deixar que ele saia daqui livre. Salto na sua frente impedindo que continue seu caminho de fuga, ou seja lá o que ele pretende fazer.

— Você respira água? Ou só ares? — falo.

Um sorriso se abre no rosto do velho homem a minha frente. Eu odeio esse sorriso:

— Achei que fosse mais inteligente garoto.
 

— E eu achei que você fosse mais machão. Mas pelo visto é um covarde que está fugindo. — abro um sorriso sarcástico no rosto — Acho que ambos nos decepcionamos.

Ele continua sorrindo. Que ódio.

— Quem disse que eu estava fugindo? — Ele responde.

Faço um xingamento rápido e tento atacá-lo. Infelizmente fracasso em minha tentativa. Ele desvia de meu golpe, logo em seguida pega rapidamente uma seringa de seu bolso. Tento acerta-lo novamente. Sucesso. Ele tropeça e cai no chão ainda com a seringa em mãos.

— Não parece tão durão agora. Dessa vez sou eu quem vai te tirar do pedestal. — sorrio.

Ele sorri e aproveitando que eu me distraí para rir de sua cara acaba injetando seja lá o que tinha na seringa em minha perna. Dou dois passos para trás, me sinto estranho, seja lá o que isso for, age rápido, até demais.

— Mas o quê...

Caio de joelhos, meu corpo está mais pesado do que jamais foi. Soares se levanta e me chuta no rosto. Sinto o gosto de sangue em minha boca.

— Perdão. O que estava dizendo mesmo? — Sou levantado como um boneco pelo homem de cabelo grisalho à minha frente — Não da para entender muito bem quando você fala de boca cheia — Ele acerta um soco em meu maxilar — De sangue.

Sinto a dor de cada golpe desferido por Soares, de alguma forma ele me drogou, de novo, minhas forças se esvaíram. Meus reflexos que antes me ajudavam a desviar de golpes e disparos agora não são o suficiente para me prevenir de um soco de um homem de cabelos brancos. Após diversos socos, chutes, joelhadas e cabeçadas Soares finalmente cessa.

— O que foi garoto? Levanta. Vem mostrar quem é o herói. Ou já aceitou que você não é nada além de um verme desprezível. A merda de um corrompido que não merece nada mais do que ser dissecado em um laboratório assim como todos o seus. — Ele faz uma pausa — Qual é mesmo a palavra? Ah, lembrei. Iguais. Como seus iguais malditos corrompidos. — Ele me chuta novamente, um dente voa de minha boca. — Vocês são a desgraça da humanidade. Nada de bom vem de algo corrompido.

Sinto um calor em meu corpo, uma onda quente de raiva e ódio floresce dentro de mim, cresce como um tsunami, se aproximando cada vez, aumentando a cada segundo, prestes a arrasar tudo à sua frente.

— Não. — Me levanto. Minha força não é a mesma de antes, mesmo com essa recarga de poder derivada de meu ódio pelo homem a minha frente eu continuo sofrendo os efeitos da droga que ele injetou em mim — Nada de bom vem de alguém como você, alguém que merece morrer.

Ainda com dificuldade me aproximo de Soares, tento acerta-lo, ele defende, tento um chute com a perna esquerda, mas ele se esquiva. Tento outro com a direita e dessa vez consigo feri-lo. Ele cai para o lado, suas feições são de terror, alguém que está com medo, eu sei por que, eu sou um monstro, mas ele é pior do que um monstro. Eu não posso perdoá-lo.

— Esse é seu fim. — falo.

Ele começa a rir histericamente, uma risada digna de um palhaço do crime e isso me irrita mais. Sinto garras crescerem em meus dedos, estou cada vez mais aracnídeo e menos humano.

— Não — Jonas. Esse nome foi um baque. — Esse é o seu fim.

Ele puxa uma pistola do bolso e atira em mim. Caio de costas no chão. Ferido, o sangue verde sai de minha barriga. A transformação regride me deixando na forma natural.

— Você se superestima muito garoto. — Sou puxado para próximo à duas mulheres acorrentadas — Acredita que pode fazer algo importante. Pior. Você acha que é alguém de importância. Sinto lhe dizer garoto, mas não, você não é nada. — Ele aponta a arma para a minha cabeça. Estou sem forças para me defender, não há mais saída, fecho meus olhos e espero pelo meu fim — Adeus Jonas Ferreira — Apenas escuto o som de uma bala sendo disparada.

 

 

 

    Soldado

 

Abro os olhos. Me levanto e analiso os arredores. Tudo o que vejo são homens caídos ao chão, alguns muito feridos, outros inconscientes e pouquíssimos mortos. A dor e o cansaço derivados do esforço que eu fui obrigado a fazer esta noite são sentidos. Meu braço direito dói bastante, minhas pernas estão cansadas, mal me mantenho em pé, claro, isso está sendo ampliado graças ao cansaço de ter aberto tantas brechas. Devo ter sido um pouco imprudente, mas foi necessário, pessoas dependiam disso.

Me movimento lentamente na direção da qual eu vi Jonas seguir da última vez, algo me diz que o garoto precisa de ajuda. Enquanto cambaleio vacilante rumo ao meu objetivo consigo avistar um homem, John Soares, ele está com uma arma apontada para alguém no chão, ele está mirando no garoto! Apresso meu passo, tento me aproximar o máximo possível de ambos para impedir que Soares mate o Aracnídeo. Minha fraqueza temporária me vence e eu acabo por tropeçar em mim mesmo, caio no chão e uma memória me vem à tona.

"Eu olho para o céu estrelado da noite, estar ao lado de Jonas me faz lembrar minha antiga vida, uma delas, mais precisamente, me faz relembrar de um antigo companheiro, alguém que já se foi há algum tempo, e que levou parte de mim com ele.

— Você quer que as pessoas saibam a verdade sobre você, não é? — digo. — Que todos saibam que você não é a ameaça que estão espalhando por aí.

Ele sorri.

— Na verdade não, eu não ligo mais para isso, desde que eu fui derrotado por aquele cara, eu aprendi algumas coisas — Jonas sorri — Eu aprendi a dar valor aos meus amigos, eu perdi por um tempo a amizade de meu melhor amigo, desisti de ser herói pouco depois e ele veio até mim e me ajudou, mesmo nós estando brigados, se preocupou comigo e veio até mim. Sabe, ele e você me mostraram que eu devo ser um herói não porque isso trás fama ou por culpa, mas sim por que isso é o certo, eu devo isso as pessoas, mesmo elas não confiando em mim atualmente, elas colocaram fé em mim, mas não correspondi. E eu aprendi com uma garota que... — Jonas olha para as estrelas — As pessoas merecem mais que a verdade, merecem ter sua fé recompensada."

Sim Jonas, você não está errado, mesmo te xingando por dentro e talvez te maltratando, você tem toda a razão, você teve fé em mim, quando simplesmente poderia me julgar e me deixar de lado... talvez seja por essa razão que você e ele se parecem... Mas não vou permitir que tenham o mesmo destino.

Eu tenho fé em você garoto e não vou falhar novamente. Levanto-me. Ainda fraco devido ao cansaço eu saco uma pistola do bolso, a única que sobrara. Tento mirar. Fracasso. Preciso abrir uma brecha, uma última brecha por hoje. John estica o braço para Jonas, parece estar dizendo as últimas palavras. Atiro, uma brecha se abre em frente ao projétil que desaparece e reaparece logo em seguida acertando a cabeça do outrora vivo John Soares.


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Notas finais do capítulo

A primeira etapa da aventura de Jonas está chegando ao fim.
Amanhã será postado o epílogo da primeira temporada de Aracnídeo.



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