Os Utensílios do Caos escrita por Quorra Rider


Capítulo 3
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas, aqui é a Quorra!
Esse capítulo pode ser considerado pura enrolação por alguns de vocês, mas eu sugiro que prestem uma atenção especial nele, porque, talvez, e apenas talvez, hajam dicas sobre o que vai acontecer nos próximos capítulos aqui. Só tô dizendo...

Hoje realmente não tenho nada demais para falar então vejo vocês nos comentários e espero que gostem!



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Woodbridge, Virgínia – maio de 2034

O telefone celular de Lia começou a tocar exatamente no meio da aula de Física. O professor se virou para trás lentamente, girando sobre os calcanhares com as costas curvadas e o giz imóvel na mão direita. O olhar atrás de seus óculos não era amigável, mas mudou para levemente surpreso quando viu a garota loira segurando o aparelho cor de cereja no alto enquanto ele tocava rock em um volume que, provavelmente, era o máximo, em meio ao silêncio absurdo da sala de aula.

— Posso sair para atender? – Perguntou ela, sem escrúpulos. Era claro para todos que Lia não tinha nenhum tipo de respeito para com o professor de Física, embora respeitasse a todos os outros. Também era claro que May, a jovem que sempre fazia par com ela nas aulas, estava tentando não rir da falta de pudores da melhor amiga.

Elas, juntas, poderiam se passar pelas “garotas populares do colégio”, se quisessem; ambas loiras, ambas magras, ambas atléticas, uma de olhos verdes e a outra de olhos azuis, uma de cabelos lisos e a outra, cacheados, extremamente simpáticas com todos os alunos. Mas elas não queriam esse estereótipo. Primeiramente, porque May era quem tinha dinheiro, enquanto Lia obviamente não podia se dar ao luxo de comprar camisetas por cinquenta dólares; e, em segundo lugar, Lianne Marshall tinha fama de louca.

Não o tipo de louca que jogava ovos na casa do ex-namorado, ou se pendurava nos ônibus que passavam na rua, e sim o tipo de louca que via coisas e ouvia vozes. Ninguém ali conseguia provar que ela era louca, no entanto, então todos se equilibravam entre a dúvida e a simpatia.

— Srta. Marshall, devo lembrá-la de que é proibido o uso de aparelhos celulares nesta instituição de ensino? – O professor não economizou na gramática ao falar.

— Não – respondeu a garota. – Eu lembro perfeitamente. É uma ligação urgente e, sejamos sinceros professor, nem eu, nem o senhor queremos que eu fique nesta sala de aula.

Foi o suficiente para alguns dos outros alunos começarem a rir baixo. O velho professor suspirou, olhou profundamente para ela e, por fim, atirou o giz em sua direção, errando a cabeça da loura por centímetros enquanto dizia:

— Vá.

Atirar o giz na aluna se provou tanto desnecessário quanto inútil, uma vez que a maior parte dos alunos começou a rir e Lia desapareceu da sala pela porta dos fundos em menos de cinco segundos com a mochila em um dos ombros. Todos sabiam que ela não ia voltar naquele dia. Talvez não voltasse por uma semana, talvez mais. Ninguém se preocupava com a menina louca. Ela sabia se virar.

E, de fato, Lia foi para a saída de incêndio, fechou a porta atrás de si e atendeu o telefone falando:

— Não me venha com outra viagem de última hora, Dallas.

Não se preocupe, meu bem. Essa viagem não é de última hora. Embora, realmente, seria bom irmos o mais rápido possível dessa vez— a pessoa do outro lado da linha respondeu.

— Do que está falando Libras? – A jovem se apoiou no corrimão da escada de concreto, observando a vastidão do gramado que ficava ao redor do colégio. Ninguém a procuraria ali. Nunca procuravam.

Por acaso May está com você? — Libras Dallas indagou, parecendo um pouco mais séria.

— Não. Qual é o problema, Dallas? Fale de uma vez.

Precisamos encontrar um livro antes dela, ou antes das fadas, dá na mesma. Se minha pesquisa estiver certa, ele está na biblioteca do Instituto de Xangai. Devemos ir depois de amanhã.

— Pare! – Interrompeu a outra. – Do que diabos está falando? May não tem nada a ver com as fadas e, se quer dizer que ela tem só porque é uma mundana com Visão, então eu também tenho, porque sou igual a ela. E o que quer ganhar roubando um livro de dentro de um Instituto? Você vai morrer!

É exatamente por isso que eu preciso que você esteja comigo. Você é melhor que eu em roubar coisas, então não vai morrer.

— Não!

Escuta, Lia! Você não está entendendo. Sobre a May, não é o que parece, nada nela é o que parece. Ela está mantendo contato com fadas da Corte Seelie e quer pegar o livro para fazer algo que com certeza não é bom. Posso te explicar tudo em detalhes quando você chegar aqui, mas, por favor, só dessa vez, confie em mim. Tenho oitenta anos de idade nas costas e sei que, se ouvir os sussurros certos no Submundo, vou conseguir a informação certa.

Lia suspirou audivelmente. Começou a descer as escadas e tentar se lembrar dos métodos que devia usar para destrancar um cadeado de bicicleta sem precisar da chave.

— O que os sussurros dizem desta vez?

Por enquanto, dizem que as coisas estão prestes a ficar interessantes entre as fadas e os Nephilim.

Mesmo sabendo que Dallas não podia ver, a garota fez uma careta. Seu relacionamento com os Caçadores de Sombras de Woodbridge não era bom desde que descobriram que ela causara uma briga de bar entre um Ifrit e um licantrope só para roubar o dinheiro deles. Ela caminhou até as bicicletas de alguns alunos, nos fundos da escola, e começou a inspecioná-las em busca do cadeado mais fraco.

— Tudo bem, mesmo eu, que não simpatizo com nenhum deles, sei que isso não pode ser bom. Mas você não ouviu apenas sussurros, estou certa? Seria impossível saber algo útil apenas com sussurros.

Certa. Victor veio aqui e me contou o que ela está planejando — a mulher falou. Lia encontrou o que queria e prendeu o celular entre o ombro e a cabeça para vasculhar a mochila em busca de suas ferramentas.

— O que Victor tem a ver com isso? – Questionou.

May pediu para ele ajudá-la com um feitiço, quando ela tiver o livro. Um tipo ilegal de feitiço.

— Sem querer soar crítica, linda, mas eu já vi você fazer um monte de feitiços ilegais. Acho que a única coisa que nunca vi você fazer foi matar alguém.

Se você tivesse me conhecido na época do Ciclo, pensaria duas vezes antes de dizer isso.

— Na época do... o quê?

Esquece. Só vá para o lugar marcado amanhã e eu vou estar lá com um portal. Aí nós vamos para minha casa e eu explico tudo de um jeito que você não pense que eu quero dominar o mundo.

— Mesmo que você quisesse, Dallas, eu duvido que você seria capaz de uma coisa dessas.

Chata.

— Também te adoro, tchau.

Lia desligou o celular e terminou de burlar o cadeado, então guardou as coisas na mochila, pegou a bicicleta e começou a pedalar na direção da própria casa. Sabia que sua mãe não a questionaria por estar chegando vinte minutos mais cedo que o normal, pois não era incomum que ela fugisse do colégio na última aula do dia. Também sabia que colocaria a bicicleta de volta no lugar no dia seguinte, então o dono não deveria se preocupar.

Mas aquelas coisas não se comparavam a todo o resto que ela sabia. Sabia que via coisas que não deveria; sabia que Libras Dallas era uma feiticeira que cuidava de um Santuário em Nova York; sabia que ninguém sem o dom da Visão conseguia enxergar as torres gigantes do Instituto; sabia que Victor Rauntmann era o Alto Feiticeiro de Woodbridge; e, por fim, sabia que sua mãe, seu irmão e May deviam ser os únicos mundanos com Visão além dela na cidade toda.

Costumava haver mais um homem, mas ele desapareceu, e gente como eles não tinha o direito de fazer perguntas sobre pessoas desaparecidas.

A jovem começou a pedalar mais rápido quando se encontrou no asfalto. Os cabelos louros voavam para trás, alguns cachos emoldurando as faces marcadas com sardas quase invisíveis na pele levemente bronzeada um mês após o Spring Break. Ela parou diante de uma bifurcação na rua, pensou nas consequências de pegar o caminho mais curto – o que sempre escolhia – e o mais longo – que quase sempre evitava. Mas, naquele dia, precisava pensar.

O mais longo, então.

Não demorou para o asfalto impecável ser substituído por pedras, buracos e rachaduras das quais ela quase nunca conseguia desviar. Haviam poucas casas ali, nos arredores da cidade, a maior parte delas ficava à direita na rua sem saída, devido ao medo do bosque à esquerda. Estavam certos em temê-lo. E, claro, exatamente no fim da rua, estava o orfanato. Era lá que Lianne queria chegar.

Desceu da bicicleta e a empurrou pelos últimos metros até a escadaria que levava à porta da frente. Se sentou nos degraus, observando as ervas daninhas onde havia sido o jardim, o portão de ferro enferrujado que ela costumava comparar aos portões de um castelo e a placa sobre ele, quase caindo, onde estava escrito “Orfanato católico Padroeira de Virgínia”. Lembrava-se de uma vez em que subira na placa porque queria ver melhor o bosque e Irmã Hannah tivera de chamar os garotos mais velhos para a tirarem de lá. Depois do jantar, os dois jovens de dezessete anos a procuraram e a agradeceram por tornar o último dia deles no orfanato mais interessante.

Ela nunca se sentiu tão mal depois de ouvir aquilo, principalmente porque, na época, tinha certeza de que acabaria da mesma forma. Quem iria querer adotar a menina diagnosticada com esquizofrenia? Quem iria querer bancar os remédios e as consultas periódicas, ou ouvi-la falar sobre como a fada que viu no parque era mal-educada?

Sabrina Marshall quis.


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