Espírito de Revolução escrita por GilCAnjos


Capítulo 13
O Jeito Difícil


Notas iniciais do capítulo

Saudações, pessoal! :) Vamos a mais um capítulo, em que Connor navega na Aquila pela primeira vez. E não deixem de ler o aviso nas notas finais do capítulo!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/717741/chapter/13

A princípio eu estava bastante ansioso para navegar. Com exceção da viagem fretada que Samuel Adams me arranjara de Boston para a Fazenda, eu nunca havia navegado pelo mar por um longo período. Logo descobri, no entanto, que os dias no navio eram parados, e chegavam a ser entediantes, visto que a paisagem era sempre a mesma. A higiene era pouca, a comida era horrível e ficar nos conveses inferiores era claustrofóbico. Mas havia algo na viagem que me entusiasmava, em parte por causa da vivacidade dos marujos. Estavam sempre felizes, cantando, jogando cartas, bebendo, brigando entre si. Eu entendi o que levava aqueles homens a escolher a vida de lobo-do-mar: a sensação de explorar o inexplorado, descobrir o imprevisível. Poderia haver calmaria em um dia e tempestade no seguinte.

Às vezes, o Sr. Faulkner me deixava manobrar o timão da Aquila, e aquela era outra sensação fantástica: a ideia de que simples movimentos de minha mão poderiam fazer aquele navio, uma obra tão grande e poderosa, correr por várias e várias milhas era ao mesmo tempo desconcertante e persuasiva.

Após uma semana, nós havíamos enfim feito a curva no Cabo Cod e chegado a Martha’s Vineyard. Assim que ancoramos no porto local, Faulkner mandou Lawrence, seu braço direito, começar a comprar e instalar canhões na Aquila. Enquanto isso, Faulkner e eu fomos a uma estalagem no centro da cidadezinha. Ele dirigiu-se à atendente atrás do balcão, que tinha mais ou menos a mesma idade que ele.

 — Ah, senhorita Mandy! Você ainda continua tão encantadora quanto eu me lembrava!

A mulher fez uma expressão de surpresa.

 — Ora, ora! Bobby Faulkner... Depois de todos esses anos, você navega todas essas milhas até Vineyard apenas para me fazer elogios?

 — Nós procuramos os irmãos David e Richard Clutterbuck.

 — Oh, eu vou bem, obrigada — respondeu, irônica, enquanto apontava para dois homens brancos sentados em uma mesa num canto da estalagem.

Nós dois nos aproximamos dos sujeitos, que ao nos ver tomaram uma expressão de surpresa e apreensão. Um deles tinha cabelo curto e uma barba no queixo, e o outro era careca.

 — Robert Faulkner — disse o careca, zombeteiro. — Onde diabos você esteve?

 — Pensei que já estava morto — comentou o outro.

O lobo-do-mar sorriu e falou, enquanto sentava em uma cadeira:

 — Desculpem-me por tê-los deixado daquele jeito, rapazes, mas ninguém podia saber aonde eu estava indo... Andam trabalhando muito?

 — Meh... Pulando de contrato em contrato por enquanto — respondeu o que tinha barba — Nada fixo.

 — Ótimo! Estamos precisando de oficiais de artilharia. O que acham de trabalhar comigo de novo?

Os marujos se entreolharam.

 — Acho que nós estamos dispostos a mais algumas pancadarias, não é, David? — disse, falando com o irmão careca, que deu uma risada.

 — Vocês verão, a Aquila é uma embarcação esplêndida. Estamos carregando-a com armas no momento.

Parei de ouvir a conversa por um momento e olhei em volta. Uma das mesas na estalagem me chamou a atenção. Nela sentava um rapaz bem-vestido, com vinte e poucos anos, conversando com um homem mais velho, que eu reconheci dos quadros no porão da Mansão Davenport: Benjamin Church. Um Templário. Ao vê-lo, logo ali, não pude deixar de lembrar tudo aquilo que os Templários representavam, e aquilo que fizeram com minha mãe. Eu tinha que acertar assuntos com ele. Perguntar sobre Haytham seria demais; afinal, ele era o maior líder do grupo. Decidi que perguntaria sobre Lee. Aproximei-me de Church.

 — Onde está Charles Lee? — perguntei, tentando soar o mais ameaçador possível.

Church e o outro olharam para mim, estranhando-me. Qualquer tentativa de ameaça parecera não surtir efeito.

 — Não gostei do seu tom de voz, selvagem — disse o cirurgião.

Nesse momento, o rapaz mais jovem se levantou e ficou em pé à minha frente, mostrando a sua altura imponente. Ele ia me ameaçar, mas o Sr. Faulkner botou uma mão em meu ombro, e com a outra fazia um gesto para o homem se acalmar

 — Ei, Biddle, é melhor não fazer isso!

O tal de Biddle olhou para ele, surpreso, com um sorriso debochado:

 — Bobby Faulkner virou ama-de-leite agora? E de um moleque selvagem ainda por cima? Haha, que bom que você finalmente percebeu que é um marinheiro de merda!

 — De merda? — Robert se sentiu ultrajado. — Quando você ainda usava fraldas, eu já estava afundando navios bem maiores que aquela sua banheira!

 — Ah, e naturalmente agora é a vez da sua reputação afundar! Não bastasse aquela derrota humilhante em 65!

 — Mas é claro, eles haviam me dado uma chalupa velha pra comandar!

 — Com um capitão desses... Dê-me uma chalupa velha e eu faço o dobro do que você fez.

 — Só porque você não sabe manejar um navio de verdade!

 — Não sei manejar... Há! Faço milagre com qualquer embarcação! Mande tudo o que você tiver, lhe garanto que eu aguento!

 — Foi o que sua mãe disse na última vez que eu a vi!

 — Não fale da minha mãe, seu marujo de água doce!

 — Não me chame de água doce, seu...

 — Não, não, não, cavalheiros! — Quem dizia isso era Mandy, a atendente da estalagem, colocando-se entre os dois homens. — Não briguem dentro do meu bar, ou melhor, não briguem! Bobby, pegue seus amigos e vá embora!

Faulkner lançou um último olhar ríspido a Biddle, e então falou a mim e aos irmãos Clutterbuck:

 — Vamos, rapazes. Os canhões devem logo estar prontos.

Mais tarde naquele dia, a Aquila já navegava de volta a Davenport. Eu estava parado na mureta do navio, tentando não enjoar, quando o Sr. Faulkner se aproximou e me perguntou:

 — Percebeu o que eu fiz com Biddle, Connor?

 — O quê?

 — Insultei a mãe dele durante a briga. Esse é o segredo para vencer qualquer discussão. — completou, bebendo um gole de uísque. — O que diabos você fez pra provocar aqueles sujeitos, rapaz?

 — O homem mais velho era um líder da Ordem dos Templários. Eu o identifiquei e resolvi tirar satisfações.

 — Satisfações? Que satisfações, caramba? Você pensou que iria simplesmente ameaçar o coitado e ele abriria a boca?

Aquela acusação me deixou desajeitado.

 — Talvez. Eu não sabia o que esperar.

 — Tudo bem. Mas na próxima, vá com calma. Com os Templários, cuidado nunca é demais. Qual era o nome dele?

 — Benjamin Church.

 — O cirurgião?

 — Sim.

 — Minha nossa, quem diria que ele é um Templário. E pensar que minha ex-esposa já fez uma consulta com ele...

 — Espere... — Eu disse, confuso. — Você foi um Assassino durante anos e não sabia disso?

Faulkner se mostrou um pouco constrangido.

 — Veja bem, garoto, eu penso em mim primeiro como marinheiro. Ser um Assassino... são só formalidades pra mim. Na época da Guerra, eram o velho Achilles e os outros que cuidavam da inteligência. Eu apenas cuidava da frota. Sou mais o lado da força bruta da Irmandade.

 — Claro. E quem era o homem com quem ele falava? Vocês parecem ter uma inimizade.

 — Ah, se eu pudesse contar com quantas pessoas eu tenho inimizade... O jovem insolente era Nicholas Biddle. É um ninguém, ao contrário do que ele iria querer que acreditasse. Navega pela Marinha Real como oficial júnior.

 — O que será que Church e ele discutem?

 — Bem, rapaz, não sou um Assassino especialista, mas acho que esse é o tipo de informação que você teria descoberto se os bisbilhotasse, em vez de abordá-los querendo uma peleja.

Abaixei a cabeça.

 — Certo, sinto muito. Os canhões já estão prontos?

 — Sim. Todos os trinta, posicionados e prontos para atirar. Pretendo um dia colocar mais, mas por enquanto trinta servirão. E, veja bem: mesmo com todos esses canhões, a Aquila continua rápida como o vento! Dominaremos o mar novamente!

Abri um sorriso a ele.

 — Admiro seu otimismo, Sr. Faulkner.

E traçamos o caminho à Fazenda Davenport. A viagem parecia tranquila até que, em um dia, com o navio já em alto-mar, um ruído estranho foi ouvido a bombordo.

 — O que foi isso?

 — Parecia um tiro, Sr. Faulkner! — disse um dos marujos. — Uma bala de canhão, que ou queria nos acertar mas errou a mira, ou queria só dar um mergulho mesmo.

 — Ou um sinal para nós — comentou David Clutterbuck.

 — Veremos. Onde está a luneta? Alguém me arranje a maldita luneta!

Após receber a luneta de um tripulante próximo, Faulkner olhou os arredores e prendeu sua atenção em um ponto enevoado ao longe.

 — Pelas barbas de Netuno!

 — O que está acontecendo? — perguntei.

 — Veja por si mesmo — disse, enquanto me entregava a luneta. Vi um navio menor que a Aquila, junto a outros três ainda menores. Os quatro pareciam vir em nossa direção. — Aquela flotilha hasteia a bandeira negra. Piratas. — completou Faulkner, com um tom sério.

 — Isso é mau. — falei.

 — Mau? Que nada, garoto! — exclamou ele, feliz. — Isso é ótimo!

Faulkner subiu ao lado do leme, e então gritou para chamar a atenção dos marinheiros.

 — Atenção, cavalheiros! Nós acabamos de virar alvo de piratas. E nós enfim veremos este navio em ação! Todos a favor de lutar contra eles, gritem “Aye”!

 — Aye! — ouviu-se, uníssono.

 — Assumam os postos! Clutterbucks, abasteçam os canhões! Preparem os giratórios! Timoneiro, aproxime-nos do inimigo! Vejamos se esta fera ainda ruge!

 — Aye!

O navio começou a virar para bombordo, enquanto os marinheiros iam às armas cantando. Dirigi-me ao sr. Faulkner e perguntei:

 — Nós vamos mesmo batalhar? O que eu faço?

 — Ah, é mesmo, você não tem experiência. Assuma um dos canhões. Você vai gostar, é como o seu arco-e-flecha. Exceto que em vez de um arco, temos um tubo de ferro de meia tonelada, e em vez de uma flecha, uma bola de chumbo capaz de mutilar um urso.

Por toda a minha vida eu nunca entendi metade do que saía da boca do Sr. Faulkner.

 — Ou talvez eu poderia apenas observar e aprender.

 — Se prefere assim, fique à vontade, Connor.

Quando já havíamos chegado perto dos navios, um deles atirou seus canhões laterais, enquanto o maior atirava os frontais. As balas fizeram alguns rombos pequenos no casco da Aquila, mas nada grave. Enquanto isso, os nossos próprios canhões estavam sendo apontados, e atiramos. Nossas balas atingiram três dos navios, um dos quais afundou logo em seguida. Isso porque um dos nossos marinheiros operava um canhão giratório, que era menor e com uma mira mais ampla. Ele havia disparado bem em um barril de pólvora do navio inimigo, o que causou uma explosão e o levou para o fundo do mar.

A batalha prosseguiu por mais dez minutos. A Aquila disparou seus canhões frontais, acertando em cheio um dos mastros do navio maior. Os piratas mais uma vez atiraram, mas a Aquila era rápida, e, após desviar, não tomou nem metade do dano pretendido. Com uma segunda salva de balas, outro dos navios pequenos afundou.

 — Troquem para a metralha! — ordenou sr. Faulkner.

Então trocamos as balas convencionais pelas metralhas, que eram menores, feitas para acertar os marujos em vez do navio. As metralhas foram soltas pouco antes do navio maior tentar chocar-se contra o casco da Aquila com seu aríete. Em seguida, pudemos ver piratas gritando de dor e de pavor no convés.

Não demorou muito para que afundássemos o navio. A embarcação restante fugiu rapidamente. A batalha fora rápida, não sei se para a alegria ou para a tristeza de sr. Faulkner.

 — O que é bom sempre dura pouco. — disse ele, triste.

Alguns dias depois, de volta à Fazenda, Achilles me recebeu na Mansão Davenport com uma expressão desaprovadora.

 — Duas semanas fora... E nem mesmo uma despedida antes de ir. O que tinha na cabeça, Connor?

Gaguejei.

 — Eu... Mas... — Abaixei o olhar, envergonhado. — Me desculpe.

 — Que não se repita então. — Achilles respondeu, austero. — Chega de enrolação. Vamos ao escritório.

Ao andar até lá, o velho apanhou uma caixa de madeira em um móvel próximo. A caixa tinha meio metro de largura e aparentava ser pesada. Quando Achilles depositou-a em cima da escrivaninha, pude perceber que a insígnia dos Assassinos estava desenhada em volta de sua fechadura. Achilles sentou-se na cadeira atrás da mesa e pôs-se a falar.

 — Você sabe que... no dia em que você foi viajar com Faulkner sem a minha permissão, eu estava em Gloucester buscando uma encomenda, não?

 — Sim.

 — Pois bem. — Ele falou, empurrando a caixa em minha direção. — Eu havia levado alguns antigos esquemas dos Assassinos para o alfaiate e o ferreiro do vilarejo, e... Isto é seu. Imaginei que você se sentiria mais confortável vestindo algo da sua própria cultura, então pedi a eles que colocassem detalhes iroqueses no produto final.

Intrigado, me aproximei da escrivaninha, abrindo a caixa. As primeiras coisas que vi dentro dela eram três armas. A primeira era uma machadinha, que, como Achilles dissera, aparentava ser iroquesa, com uma diferença: sua lâmina de aço era vazada. De imediato notei que ela havia sido feita desse modo para que seu formato lembrasse a insígnia da Irmandade. Ao empunhar a arma, percebi o quanto era leve. Sua lâmina, ao mesmo tempo, parecia afiada e mortal.

As outras duas armas eram braçadeiras de couro que também levavam o símbolo assassino. De cada uma delas, pendia um pequeno anel amarrado a um barbante. Observei as braçadeiras, curioso, e notei que, escondida na parte inferior de cada uma delas, havia uma lâmina. Tratava-se de um par da clássica lâmina oculta dos Assassinos.

O último item era alguma peça de roupa, dobrada dentro da caixa embaixo das armas. Retirei-a e estendi-a à minha frente. Era um manto bege com detalhes azuis. Seu corpo parecia apenas um casaco colonial com detalhes indígenas, mas havia um traço distinto naquele manto. Em seu topo, um capuz pontudo, que levava o desenho de uma águia bordado em sua extremidade. Aquele era obviamente o típico manto de um Assassino, parecido com o de Achilles que estava no porão. E, se o velho estava me dando um manto...

 — Leve-os ao seu quarto e vista-se. Você está pronto.

Subi as escadas para ir até meu quarto. Vesti o manto e prendi as lâminas ocultas em meus pulsos. Prendi o anel de cada uma ao dedo anelar; eu sabia que aquele era o mecanismo para ativar a arma. Prendi a machadinha no coldre em minha cintura e, após pronto, subi o capuz do manto. Após tanto tempo, eu mal podia acreditar. A sensação de vestir o manto era incrível. Ele era imponente e emanava poder de si. Desci as escadas de volta ao escritório, onde Achilles me esperava, apoiado em sua bengala. Ao me ver de manto e capuz armado, ele esboçou um de seus raros sorrisos. O velho se aproximou de mim e começou a discursar.

 — Houve um tempo em que fazíamos cerimônias para ocasiões como essa. Mas eu acredito que nem eu nem você somos desse tipo, sem falar que nem há mais razão para tal. Então vamos direto ao ponto: você tem suas ferramentas e treinamento. Força e sabedoria. Alvos e objetivos. E agora tem seu título. Repita para mim os dogmas do nosso credo. O Credo dos Assassinos.

 — “Mantém tua lâmina longe da carne inocente”. “Esconde-te em plena vista”. “Nunca comprometas a Irmandade dos Assassinos”. “Nada é verdade, tudo é permitido”.

 — Muito bem — disse, colocando a mão em meu ombro. — Já faz quase três anos desde que você bateu àquela porta exigindo treinamento. Eu te ensinei muito bem desde então. Como Mentor da Irmandade das Colônias do Norte, eu te dou as boas-vindas, Connor. A partir de agora, você dedicará sua vida a proteger o livre-arbítrio da humanidade. Você... é um Assassino.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Bem, com esse capítulo, Connor é iniciado oficialmente na Irmandade, e aqui eu acabo a parte 1 da fic. Então, por causa disso, vou tirar umas duas semanas de folga antes de postar o próximo capítulo e começar a parte 2.
Não se preocupem, os próximos capítulos já estão escritos, mas eu quero adiantar mais alguns antes de postá-los. O próximo está marcado para o dia 31, e quando eu postar ele vou avisar o dia em que começo a parte 2.
Desculpem pela interrupção no meio da fic, mas se eu não o fizer, vou acabar ficando sem capítulos para postar, o que significa que os próximos seriam apressados e eu não teria tempo de revisá-los, o que apenas faria mal à qualidade da fic.
De qualquer modo, se estiverem gostando da história até o momento, não deixem de comentar suas impressões e, se possível, divulgar a fic. Sei que já disse isso, mas o apoio de vocês é muito importante! ^^



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Espírito de Revolução" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.