Além do Espelho escrita por Moon


Capítulo 8
A garota em apuros


Notas iniciais do capítulo

Olá, leitores
Perdoem os meus atrasos e, por favor, não desistam de mim D:
Minhas aulas recomeçaram semana passada, então agora eu tenho muitas coisas para fazer. Muitas mesmo. Então postar um capítulo à cada 5 dias se tornou totalmente inviável para mim, infelizmente. Então, a partir de agora, eu vou tentar postar uma vez por semana. Eu realmente queria conseguir continuar no mesmo ritmo, mas não adianta prometer algo que eu sei que não conseguirei cumprir.
Sem mais delongas, espero que gostem do capítulo c:



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Estava escuro, e o cheiro da fumaça irritava o nariz de Charlie. A menina abriu os olhos e percebeu que não estava mais em seu quarto. Aparentemente, não havia nada queimando perto da menina, que se levantou e percebeu que também não usava mais as roupas que tinha vestido antes de ir dormir, junto com Alice, que não estava junto dela. Suas mãos estavam sujas de fuligem e seu vestido, antes bonito e bem armado, tinha partes queimadas e rasgadas. Ela olhou em volta e percebeu que aquela parecia a pequena floresta que rodeava a casa onde estivera em um de seus sonhos, onde não era Charlie, e sim, Mary. Estava sobre o que uma vez havia sido “sua” casa. O terreno era levemente elevado onde a menina estava, graças ao acúmulo de cinzas. Ela conseguia ver móveis parcialmente queimados e algumas das grossas colunas da casa ainda de pé, mas todo o resto havia sido consumido. Charlie se lembrou que sua mãe estava dentro da casa e não conseguiu conter o choro mais uma vez. Será que sua mãe havia realmente morrido?

Charlie se sentia mais angustiada do que já estivera em toda a sua vida e ansiava em encontrar respostas. Queria poder ver sua mãe mais uma vez e salvá-la do que quer que estivesse acontecendo. Queria leva-la para casa, deitar no seu colo e conversar como nunca haviam feito antes e agora, se arrependia de nunca ter feito. Ela queria sua mãe de volta e faria qualquer coisa que pudesse para conseguir isso.

Após se recuperar, Charlie seguiu a trilha por onde havia corrido em seu último sonho, quando vira a casa em chamas e sua mãe gritando da janela. Seu corpo estremeceu ao se lembrar disso, mas a menina logo tirou esses pensamentos de sua mente. Alguns minutos depois, chegou ao final da trilha, que parecia ser algum tipo de centro de cidade antiquado. Havia uma praça circular e algumas lojas em volta dela. O céu começava a mudar de cor, pois o amanhecer estava vindo. Algumas pessoas começavam a aparecer pela praça, onde a menina havia se sentado e pretendia pedir ajuda. Tentou lavar um pouco as mãos no chafariz onde estava sentada, e a fuligem logo saía por seus dedos. Olhou-se no reflexo da água e percebeu que tinha uma expressão horrível, como se houvesse passado as últimas três noites sem dormir. Além da fuligem, aquela tintura branca excessiva também saía pelos seus dedos, deixando amostra sua pele negra. Escondeu-se em um canto da floresta para tirar a armação de seu vestido, que além de pesada era inútil. Rasgou a sobra de tecido, deixando seus tornozelos à mostra, pois pensava que quanto melhor arrumada parecesse, mais chance teria de que alguém a ajudasse. Voltou para o chafariz, e começou a retirar a tintura branca também de seu rosto, mas ao redor da menina, parecia haver algo de errado.

Mais pessoas começavam a se aglomerar no centro da cidade, grande parte delas olhando feio para Charlie, como se a menina estivesse cometendo algum crime. Então, depois de um longo tempo, ela finalmente entendeu o que estava acontecendo. Não iria encontrar ajuda alguma por ali.

Todas as pessoas negras que a menina via passando por ela pareciam maltratadas. Nunca com roupas vistosas, ou ao menos decentes, mas sempre vestindo trapos. Expressões sofridas, carregando fardos pesados. Algumas mulheres pareciam um pouco melhor vestidas, mas andavam sempre atrás do que pareciam ser suas amas. Os negros a olhavam com admiração, e os brancos, com repulsa. “Onde está o dono daquela escrava que está na praça? Será que fugiu?” , a menina ouviu alguém dizer. Achou melhor sair dali, antes que fosse presa e forçada a trabalhar, como fizeram com seus antepassados. Mal havia se levantado, e sentiu alguém puxando seu braço com força.

—Qual é o seu nome, escrava? –Disse o homem. Parecia ter por volta de quarenta anos, bem vestido. Tinha um tom de voz orgulhoso e imponente, de quem nunca aceitaria silêncio como resposta, nem de quem considerava como seus “iguais”.

— Mary. –Respondeu a menina. O homem cravou as unhas no braço da garota, que deu um grito de dor.

— Mary, senhor, para você. Quem é seu dono?

—Eu não tenho donos, não sou escrava –Respondeu a menina, olhando nos olhos do homem com uma raiva que nunca havia sentido antes.

— Não minta para mim, pois nessas terras nunca haverá um negro solto por aí caminhando como se fosse uma pessoa normal. E mais uma vez, para você é senhor. E terá que aprender bons modos, pois agora eu sou seu dono. E logo vou lhe ensinar uma lição. –O homem disse isso com um tom de voz e um jeito de olhar que sabia bem o que significava. Mesmo sem viajar no tempo, ainda era uma mulher. E mesmo depois de mais ou menos duzentos anos, os modos dos homens pouco mudaram em relação às mulheres.

O homem começou a arrastá-la pelo centro da cidade, onde haviam várias pessoas olhando, mas nenhuma delas se pronunciavam. Algumas pareciam até mesmo sentir prazer em ver a situação deplorável da menina. Pessoas riam e se deliciavam com a situação. Pessoas diziam que ela teve o que mereceu por ter fugido e mentido para um homem branco. A menina havia começado a chorar. Nunca havia passado por uma situação como aquela, como se fosse propriedade de alguém, como se não tivesse sentimentos. Como se não fosse uma pessoa. Tudo que ela desejava era que aquilo fosse um sonho, mas a dor que ela sentia no braço em que o homem a segurava era real.

  –Michele, o que faz aqui? Por que esse homem está te puxando pelo braço? –Disse um outro homem, também branco, que se referia claramente a ela. Parecia ser um pouco mais descontraído que o outro, mas agora estava com uma expressão ameaçadora no rosto. –Porque você está maltratando a minha escrava? Quem lhe deu o direito de tocá-la? –Disse ao homem que puxava Charlie consigo.

  – Essa escrava é sua? –Disse o homem que segurava Charlie pelo braço. –Eu a encontrei vagando sozinha na praça e quando falei com ela, me disse que não tinha dono. Para mim, era óbvio que havia fugido. Aliás, você devia educá-la melhor. Se um escravo meu falasse desse jeito comigo, logo ele estaria no tronco.

  –Ah, ela vai aprender sua lição, pode deixar. Muito obrigado por tê-la encontrado, senhor. Até mais ver. –Disse o homem mais novo. –Vamos, Michele. –Disse o homem, pegando em seu braço com delicadeza e piscando para ela. –Você tem muito trabalho a fazer.

 Assim que adentraram a trilha da floresta, que era diferente da que levava à antiga casa de Charlie, o homem soltou seu braço, pois não havia ninguém vendo os dois.

—Olá, meu nome é George. Creio que você não seja dessa época, pois não fala nem se comporta como as pessoas daqui. Demorei um pouco para me acostumar, mas com o tempo você vai também. Mas precisa tomar mais cuidado se quiser sair viajando para lugares que não conhece. Poderiam ter acontecido várias coisas muito ruins com você se eu não tivesse aparecido.

—Como você sabe que eu sou uma Viajante?

—Como eu disse, seu jeito de se comportar e falar não é típico daqui. E nenhum negro daqui sairia fazendo a loucura que você fez. Poderia ter morrido. Então, foi fácil de deduzir.

—Então tá... Obrigado por ter me salvado. Eu sinceramente não faço ideia de como vim parar aqui. Eu já estive aqui antes, num sonho, mas tudo parece muito mais real agora e parece que o tempo passou. Eu aparentemente era branca e morava numa casa que foi destruída pelo fogo. Minha mãe desapareceu na vida real e eu acabei vendo ela aqui. Só que ela estava na casa que foi incendiada, e eu não sei como encontra-la aqui. Eu nem sei se isso tudo é verdade. Não sei nem porque estou contando tudo isso para você, já que é um desconhecido e..

—Você precisa ficar calma –Interrompeu o homem. Parecia não ter mais de trinta anos, e aparentemente estava disposto a ajudar a garota. –Você pode me descrever a sua mãe?

—Ela era um pouco mais alta que eu. Pele mais escura e cabelos cacheados. Olhos cor de mel, nariz largo. Gentil. Acho que isso pode te ajudar.

—Aparentemente, ela trabalhava na mansão Du Coteau. Ela foi incendiada porque eles eram abolicionistas, embora ainda mantivessem escravos. Todos os moradores morreram, exceto você. Creio que eles tenham mandado você fugir, mas acho difícil que sua mãe tenha conseguido correr também. A casa era toda de madeira, então foi consumida pelo fogo muito rápido. Desculpe.

—Você não precisa se desculpar, só me ajudou com isso tudo. Muito obrigada. Ainda tenho esperanças de que vou conseguir encontrar a minha mãe. Se a encontrar antes, diga a ela que sua filha a está procurando. Meu nome verdadeiro é Charlotte. Tenho 17 anos e moro no Rio de Janeiro. O nome dela é Noemi. Isso deve ser o suficiente para ela acreditar em você. Eu não duvido muito que vá voltar aqui um dia desses então...

Tudo ficou preto. O sonho se dissolveu completamente em questão de segundos. Charlie ouvia uma música longínqua, que já conhecia a muito tempo: Seu despertador. Aquela era a pior hora possível para a menina acordar, já que estava prestes a saber como encontrar o garoto, caso retornasse ao sonho. Nem ao menos perguntara seu nome. Charlie se levantou e não encontrou Alice ao seu lado. A menina devia ter saído mais cedo para pegar suas coisas em casa. Eram sete e meia da manhã. O senhor Marcos chegaria para busca-las em uma hora.

A menina foi até o banheiro, tirou suas roupas e entrou no boxe do chuveiro. A água, gelada, levava embora o sono melhor que qualquer outra coisa. Escorria pelo seu corpo, trazendo uma sensação de frescor maravilhosa mas, quanto mais a menina pensava sobre o sonho, mais estranho e sem sentido ele parecia. Olhou para o próprio reflexo no chão do boxe, e não estava mais com a mesma expressão do sonho, mas parecia aflita. Como sua mãe estaria presa em um sonho?

Colocou suas roupas e foi comer. Precisava falar sobre aquilo com o senhor Marcos. Alice havia levado sua chave mas, por sorte ou azar, Charlie ainda tinha a chave de sua mãe, intocada sobre o móvel da sala. Tudo parecia fazer cada vez menos sentido para ela, e sua esperança parecia prestes a deixa-la.

Alice chegou dez minutos antes do horário combinado para as duas saírem. Trazia uma mochila enorme que parecia ter muitas coisas dentro. Largou a mochila na sala, as duas sentaram no sofá e Charlie começou a contar o ocorrido durante seu sono. Assim que acabou, ouviu uma buzina do lado de fora da casa, de um carro onde estavam o senhor Marcos e Heitor. Trancou a porta, e as meninas seguiram até o carro. Mal tinham entrado, e Charlie logo começou a falar.

—Senhor Marcos, acho que tenho atravessado espelhos enquanto durmo.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado do capítulo (E que ele tenha valido a espera)
Críticas construtivas são sempre bem vindas, e elogios também ^^
Até o próximo capítulo c:



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