Fragmentada escrita por DrixySB


Capítulo 5
Meias verdades


Notas iniciais do capítulo

Mais sofrimento e uma revelação...



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Ainda era difícil de assimilar. Era como se ela houvesse acordado em um universo paralelo.

Cansada de ficar naquele quarto, encarando as paredes de vidro, e sendo observada com curiosidade pelos agentes que ali passavam (sentindo-se um animalzinho preso em uma jaula no zoológico), ela decidiu levantar-se e sair para dar uma volta na base.

Fitz conversava com outro agente em um dos corredores quando a avistou dando um passeio.

— Jemma, o que está fazendo? – ele perguntou, preocupado, deixando seu interlocutor para trás e caminhando na direção dela.

— Eu já falei que estou bem – Jemma parou diante dele, com os braços cruzados e uma postura altiva – não há motivos para continuar me mantendo naquele quarto como se eu fosse uma enferma. Eu perdi a memória, mas sou fisicamente capaz de fazer qualquer coisa.

Fitz abriu a boca para replicar, mas nada lhe veio à mente. Ela estava certa afinal.

— E tem outra coisa: eu quero saber exatamente qual é a minha posição na hierarquia da SHIELD.

O engenheiro ponderou por alguns momentos antes de responder.

— Você é a diretora.

Ela revirou os olhos, ainda de braços cruzados.

— Estou falando sério, Fitz!

— Hey, Diretora Simmons! – outra agente se aproximou, dirigindo-se a ela – é bom ver que está de pé e o tiro não causou danos mais graves. Com licença, senhora – e com aquela sentença, a agente se afastou.

Jemma ficou sem reação por um instante, encarando as costas da agente que se distanciava, então tornou a olhar para Fitz que ostentava um sorriso quase infantil em seu rosto.

— Por que está me revelando a verdade em doses homeopáticas?

As feições de Fitz se alteraram bruscamente, seu rosto nublou-se. Não era aquilo que ele esperava ouvir.

— Jemma...

— Não! Sabe qual é a minha impressão? Que você não quer que eu saiba. Que prefere que eu fique no escuro até minha memória voltar novamente!

— Jemma – ele disse novamente, as mãos a frente do corpo, como se clamasse por calma – eu entendo que está com raiva, mas isso não é motivo para... Bem, pra que você fique... – ele não conseguiu completar a frase, mas Simmons entendeu onde ele queria chegar. Fitz baixou o olhar, sentindo-se insuportavelmente angustiado – eu não quero esconder nada de você. É só que é tão difícil escolher as palavras certas para te contar... Assim como é difícil pra você compreender.

Ele estava certo. A bioquímica fechou os olhos, repreendendo a si mesma mentalmente, enquanto tocava a ferida ocasionada pela bala que passou de raspão pelo lado esquerdo da cabeça.

— Me perdoe... – ela disse com sinceridade – acho que estou com transtorno de stress pós-traumático. Tenho rompantes de raiva... Está sendo difícil de controlar.

O engenheiro a encarou com um semblante complacente, mas, ao mesmo tempo, atormentado.

Ambos desviaram o olhar um do outro no instante que se seguiu, até que uma ideia cintilou na mente de Fitz.

— Eu vou te mostrar uma coisa – ele disse sorrindo e a puxando pela mão. Jemma encarou a mão dele na sua. Provavelmente foi um gesto involuntário. Nem ele havia se dado conta, até pela maneira casual com que a tocava e a guiava pela mão.

Quando Jemma deu por si, estava em um laboratório. Um laboratório que lhe parecia estranhamente familiar como todo o resto.

— Este é o nosso laboratório.

Com um brilho de surpresa e entusiasmo no rosto, Jemma caminhou até o meio do ambiente, olhando em volta e para cada canto, procurando capturar cada detalhe, como se fosse a primeira vez que estivesse ali. E, de certa forma, era. Jemma parecia uma criança conhecendo um parque de diversões.

— É claro que é – ela sussurrou – só poderia ser – ela se voltou para Fitz com um sorriso genuíno. Fitz sentira falta daquele sorriso. Era aquele que tomava conta de sua face sempre que estava prestes a encarar um novo e excitante desafio. O mesmo de quando ambos entraram para a equipe de Coulson – é a minha cara. Parece ter sido feito...

— De acordo com as suas especificações, sim – ele completou a sentença por ela.

Jemma continuou sorrindo e, vagarosamente, deu uma volta em torno de si mesma para melhor contemplar o laboratório. Era um sonho concretizado.

Depois daquele minuto de intensa apreciação, o olhar de Jemma ficou distante de repente. De costas para Fitz, ela encarava uma mesa que pressupôs ser a do engenheiro, enquanto um pensamento perpassava sua mente. Ela virou-se na direção daquele que, agora, era seu marido.

— Fitz, há quanto tempo somos casados? – ela perguntou subitamente.

O sorriso de Fitz se desfez, cedendo espaço a uma expressão vagamente receosa.

— Dois anos.

Ela assentiu.

— E nós moramos aqui? Na base?

Fitz fez que não com a cabeça.

— No começo do nosso relacionamento, sim...

— Isso quer dizer que temos uma vida fora daqui?

— Bem, é...

Jemma mordeu a parte interna dos lábios, estranhando o tom reticente e lacônico do engenheiro. 

— Em uma casa? Um apartamento? – ela continuou, inquisitiva.

— É... Um apartamento... Nós morávamos aqui no começo... Depois alugamos um apartamento. Na verdade, o alugamos ainda antes de nos casarmos.

— E então...? – ela arqueou as sobrancelhas, querendo saber mais.

— Então nos casamos e continuamos morando lá.

Jemma o fitou de modo penetrante. Ele ainda não estava lhe contando tudo.

— Me leve até lá.

Fitz estacou, engolindo em seco.

— Não acho que seja uma boa ideia... Quer dizer, você ainda está em fase de recuperação, deve ficar em observação por mais um tempo. O doutor não recomendaria que saísse da base.

— Ele disse isso? – ela alteou a voz, seu tom soando pungente.

— Bem, não... Mas é óbvio...

— Acontece que eu já me sinto perfeitamente bem, apesar da amnésia – retrucou – deixe-me conhecer a casa onde eu vivo. Onde moramos juntos.

Fitz desviou o olhar, como se procurasse alguma saída, uma solução pelo chão do laboratório. Jemma entendeu de imediato, respirando fundo e contando até dez mentalmente em uma tentativa infrutífera de não perder a calma.

— Você não quer me levar até lá – ela tornou a cruzar os braços – pode me dizer por qual razão?

Como não obteve resposta, apenas os olhos perdidos de Fitz indicando que ele procurava por uma justificativa qualquer, Jemma mandou às favas seu autocontrole e a contagem mental e explodiu em um novo rompante de ira.

— Como eu disse, você não quer me contar nada. Apenas me dizer meias verdades porque não quer que eu saiba – ela gritou as palavras, não se importando se havia agentes passando pelos corredores externos ao laboratório.

— Não é isso, eu...

— É isso, sim, Fitz! Você não quer me contar. Prefere esperar que minha memória volte. Como sempre, optando pela solução mais prática e favorável. Você não mudou nada, não é? Sempre com a mente aberta em relação à ciência, mas fechada e restrita no que diz respeito às pessoas. Sequer consigo entender como te convenci a fazer parte de uma equipe tática da SHIELD, já que você sempre preferiu a segurança do laboratório. Como eu consegui? Vai me dizer? Porque está na cara que fui eu quem te trouxe para cá. Você e seu jeito fácil e cômodo de fazer as coisas. Muito me admira que alguém com tanto medo, tão aterrorizado pelo que há além das paredes de um laboratório, tenha se tornado um agente de campo – ela deu uma risada temperada de acidez e sarcasmo – é mesmo uma realidade alternativa – finalizou, abandonando o recinto e deixando Fitz para trás, sem lhe dar a oportunidade de dizer qualquer coisa.

Não fazia diferença, no entanto. As palavras dela o atingiram feito dardos venenosos. Aquilo foi o bastante para lhe dar a certeza de que a perda de memória de Jemma era um mal necessário. Talvez, tudo o que eles tivessem vivido naqueles últimos anos fora mesmo um grande equívoco do qual o universo estava lhes dando a chance de escapar.

A culpa por não ter sido capaz de evitar que ela se machucasse, o terror de perdê-la, a insegurança quanto aos sentimentos dela e a todo o seu relacionamento, haviam voltado à tona. Talvez Jemma merecesse, de fato, algo melhor.

Talvez ele tenha sido mesmo uma última escolha. Um destino ao qual ela havia simplesmente se conformado...

Pela primeira vez desde que tomou conhecimento da amnésia de Jemma, ele não as evitou. Permitiu que as lágrimas deslizassem livremente pelo seu rosto, sentindo que não era merecedor do coração de sua eterna parceira de laboratório. Afinal, se ele tinha medo de lhe contar sobre o que julgava ser a coisa mais importante de suas vidas - temendo especialmente a sua reação - então ele não era bom o suficiente para ela.

*

Jemma quis bater a cabeça com força na parede, mas tinha medo que isso causasse danos ainda mais severos e irreversíveis à sua memória. Ela não quis dizer tudo aquilo. Falou em um momento de raiva. Fitz não era medroso...

Até onde havia lhe contado, ele a salvara no fundo do oceano, lhe cedendo o oxigênio... Mas dizia que ela é quem fora corajosa por não abandoná-lo. Fitz também havia lhe resgatado de outro planeta, descobrindo, após uma busca incessante de meses, um meio de trazê-la de volta...

Certamente, ele havia amadurecido muito. Superado seus medos e aversões.

Se ele não queria lhe contar toda a verdade, é porque havia algum motivo... Algo muito forte.

Já era tarde da noite quando ela tornou a caminhar pelos corredores da base e encontrou Fitz na sala comunal, sentado no sofá com o olhar perdido e as mãos enfiadas nos bolsos da calça. Ela se amaldiçoou quando percebeu o quanto o rosto dele estava vermelho...

Ela tomou coragem de se aproximar e sentar ao seu lado. Fitz estava tão imerso em seus pensamentos mais aterradores, perdido nos lugares mais sombrios de sua mente, que não notou sua presença até que ela se sentou.

Jemma suspirou.

— Me desculpe pelo que eu disse mais cedo. Eu realmente não queria dizer nada daquilo... Eu fui terrivelmente estúpida. Estou com raiva de mim mesma e isso não justifica tratar ninguém mal, especialmente você – ela tocou o joelho dele, mas Fitz não se moveu, sequer proferiu alguma palavra – Por favor, diga alguma coisa – ela pediu em um tom súplice.

Ele continuou com o olhar distante e apenas ergueu os ombros dando a entender que não sabia mais o que lhe falar.

Ela cerrou os olhos, triste e desapontada consigo mesma.

— Tudo o que eu queria saber é... – ela tentou novamente – por que, Fitz? Por que não quer me levar até nosso apartamento? Eu só quero... Saber mais sobre a nossa vida. Não posso sentar aqui e esperar a minha memória voltar como em um passe de mágica. Até mesmo porque não acreditamos em mágica.

Fitz sabia que ela estava certa, mas não foi sem certa relutância que ele tirou o celular de dentro do bolso e procurou por uma foto específica na galeria de imagens.

Sem dizer uma palavra, estendeu o aparelho para ela. Jemma o tomou em suas mãos, hesitante. Ela encarou a foto por um longo instante, desorientada demais para proferir algum som que não fosse o de sua respiração entrecortada.

— Acho que é melhor que você saiba disso antes de ir para lá – Fitz falou finalmente, ainda sem olhar para ela.

Jemma ainda permaneceu mais algum tempo, boquiaberta, encarando a foto no celular do engenheiro. A imagem trazia ela, Fitz e uma criança de não mais do que alguns meses de vida entre eles. Todos sorriam, genuinamente felizes, em uma típica foto de família.

Um dos mistérios havia sido desvendado. E Jemma não poderia estar mais surpresa.


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Notas finais do capítulo

* Atendendo a pedidos;
* Porque estava mais ansiosa para postar do que os leitores para lerem;
* E porque hoje eu estou boazinha (ou não)

;)



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