Amy! escrita por Kcoruja


Capítulo 11
Capítulo 11


Notas iniciais do capítulo

Aqui estamos nós... boa leitura gente!



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Dizer que eu sabia onde estava era a mais completa e descarada mentira pois eu não tinha a mínima ideia, quando acordei meio grogue pelo pouco tempo de sono que tive estávamos em frente a um motel, mas pelo sono que eu estava nem me importei. Os quartos foram divididos de uma forma bem estranha, aposto que a portinha falante também achou, um casal num quarto, dois homem em outro, duas mulheres em outro, e novamente dois caras.
Eu estava com tanto sono que apenas esperei a Ju abrir a porta e me joguei na cama, meio atravessada meio torta e voltei a dormir. Em determinado momento da madrugada um sonho estranho me acordou, parecia capitólio mas eram meus pais que estavam lá me jogando na água e tentando me afogar, eles queriam a minha morte a qualquer custo, talvez estivessem conseguindo e por isso acordei.
O quarto escuro denunciava o horário da madrugada, um peso se fazia presente em meu corpo, ainda desnorteada olhei para o lado e me peguei observando por mais tempo que o necessário o rosto tranquilo e a respiração quase inaudível da Ju, o corpo dela totalmente preso ao meu era o real motivo do peso e do pesadelo provavelmente. Com calma afastei o corpo dela de cima do meu, eu definitivamente não queria interromper o sono tranquilo e belo do furacão ao meu lado.
Minha visão aos poucos se acostumou com a pouca iluminação e eu podia me localizar. Achei o banheiro facilmente considerando que era apenas uma porta de vidro a única que existia no local fora a da saída, não tive pudor algum em tirar aquele biquíni que estava me incomodando e me enfiar no chuveiro, naquele banheiro sem tranca eu me preparei para a nova vida, limpei de mim todo resquício daquele choro e raiva de mais cedo, e assim eu admiti o quanto sou fraca, me perdi pelos meus caminhos, me perdi dentro de mim e me deixei aprofundar e aproximar da Amy. Quem chorava encolhida no chuveiro não era ela, era eu, a Julia, ninguém ia ver mesmo, portanto me permiti sofrer e chorar tudo que não chorei, não era raiva agora, não a raiva que me tomou no quarto do Rino. Agora era apenas a solidão o abandono, o medo do futuro e a tristeza de saber que quem eu mais amei, quem deveria me proteger, me procurar, me amar incondicionalmente não pensou duas vezes antes de atestar a morte de quem eu era, não quis saber o que aconteceu, não me procuraram, não cuidaram ou esperaram a minha volta.
Talvez por ingenuidade ou por soberba, não sei, mas eu imaginei que se eu decidisse voltar em algum momento, eles estariam me esperando na porta prontos a me acolher, assim como o pai do filho pródigo o esperou. Em uma paralela não relacionada com a fé, eu me imaginei sim sendo aguardada com ansiedade, todos bem diferentes do que eram, um pai presente, uma mãe amorosa e eu, a filha que iria apreciar a vida feliz junto com meus pais. Não sei, não sei, tudo anda tão diferente agora. A TPM, o natal, tudo tão próximo me faz querer o colo da Lily, meus momentos mais feliz foram com ela, deitada no quarto que ela dividia com o irmão mais novo comendo brigadeiro queimado na panela manchada da casa dela, assistindo comedias românticas e imaginando quando seriamos nós ali. E agora aqui estou, não é um romance, não é uma comédia, nem sequer uma aventura cheia de significado é mais, é apenas um mero drama de uma garota perdida que não Sabe mais para onde ir.
Eu mori no papel mas minha vontade incontrolável nesse momento é morrer de verdade, por um fim nesse abismo que eu mesma cavei.
As lágrimas caiam descontroladas e se misturavam rapidamente a água, atestando o quão frágil eu estava nesse momento; perdida assim dentro de quem eu fui e olhando para quem eu queria ser. Eu tinha a certeza de estar me perdendo, mas eu não sabia o que fazer para voltar a ser quem eu quero. Eu que desisti da fé que me guiou até Joana para conhecer o mundo, eu que sai de casa para ver as histórias que a história não conta, me perdi. Não sou mais a garota que queria o mundo para descobrir o fundo da alma humana, agora eu sou apenas uma perdida, a alma perdida que Knae foi, a alma perdida que a turma da van azul é, eles tem um destino pelo menos.
Eu sou um nada perdido no meio de tudo, tudo que eu queria era fazer parte do todo. Eu queria poder ser diferente, ter histórias para contar ser a história de alguém, queria saber que um dia alguém vai olhar para trás e sorrir contando para os netos alguma anedota que eu fiz parte, eu quero ter o que contar para os meus netos, quero inspirar alguém a ser melhor, a não se contentar com o pouco, a não se contentar com a ausência. Quero poder ter os melhores concelhos do mundo para dar mesmo quando não estou dando concelhos assim como Jorge e Joana fizeram. E olha o que consegui com isso? Chorar no banheiro de um motel de quinta, sofrer pela presença da saudade e da solidão, apenas isso. Será que o filho pródigo chorou quando viu que o mundo não era exatamente o que ele imaginou? Eu chorei e sei que vou chorar mais mil vezes enquanto essa for a minha escolha.
E agora? Eu me pergunto sem parar isso. E agora? O que eu faço? Como vou seguir enfrente? E agora? Nenhuma resposta. O silêncio só é quebrado pelo barulho do chuveiro.
E agora? Agora eu levanto, ergo a cabeça e desligo o chuveiro, pego uma toalha e deixo a Júlia lá em recanto novo, enterrada onde ela tem que estar, agora eu sou Amy novamente. Agora eu espero o mundo seguir o rumo e tudo se acertar sozinho, não sozinho não com a ajuda de Deus, a esperança dele ser o pai que vai me esperar de braços abertos quando tudo acabar não morreu. Não importa o catecismo da igreja, não importa as palavras do pajé, não importa o grito do pastor. Nenhum nome importa realmente quando se trata da fé. Os nomes separam. Sei que minhas escolhas são erradas, e sei que não sou nada para me comparar com o filho de Deus, mas se até Jesus andou pelo mundo a procura dos corações e ele buscou apenas amar, talvez eu não esteja fazendo algo tão errado.
No quarto Ju permanecia dormindo profundamente, me peguei pensando em quanto tempo faz que eles não aproveitam uma cama, dado o fato que eu vi eles contando moedas para fazer compras.
Minha bolsa jogada no canto me deu uma ideia que já nem era mais novidade. Peguei a minha roupa meio seca que provavelmente está fedendo e vesti. Peguei meu celular olhando as horas 5:12 da manhã, hora de pegar estrada.
Joguei a bolsa nas costas e sai do quarto número 13 em silêncio, desci até onde as placas apontavam a saída. Parei por alguns segundos observando o portão sem saber como sair, então um barulho me assustou, uma voz meio distorcida falava comigo.
"qual é o número do quarto moça?"
"é... 13."
"Um momento"
" Uma pernoite certo? Daqui a duas horas vão servir o café da manhã, não quer esperar?"
" Minha amiga vai ficar dormindo"
" quem vai quitar o quarto?"
" Eu, são quatro quartos, viemos em um grupo de amigos, quero quitar o deles também."
"Certo só um momento."
" R$ 170"
Peguei o dinheiro na carteira r aguardei o troco, rezando mentalmente para que essa mulher realmente quitasse e não cobrasse nada deles. Em pouco tempo a gavetinha se abriu e meu troco chegou, o enorme portão se abriu lentamente. Antes de eu sair ouvi ela agradecendo e dizendo um volte sempre cheio de sono.
Quantas histórias será que essa moça já viu trabalhando em um motel? Aposto que não são poucas.
Na rua, que mais parecia uma avenida caminhões passavam a todo vapor me dando saudade do Jorge, mesmo a mulher dele sendo meio assustadora ele é um cara legal, e ele me ajudou, sou incapaz de esquecer das pessoas que me ajudaram. Segui o caminho contrario aos caminhões eles normalmente vão para longe das cidades, e se eu quero conhecer a alma humana e o que ela é capaz de conhecer meu caminho é em direção a pessoas não a estradas, e enquanto o tempo estiver assim. Bom, sem sol escaldante e sem chuva repentina eu sei que consigo ir longe.
Não sei a que distancia fica a cidade e nem sei qual cidade é essa que me aguarda, mas eu sigo em frente. Ando algum tempo até a minha dedução mostrar que realmente faz sentido, nas minhas costas sinto levemente o calor do sol me tocar, estava amanhecendo uma manhã bem quente diga-se de passagem. E a minha frente eu sabia que começava uma vila ou cidade, estava longe mas eu sabia que existiam pessoas habitando por ai.
Um frio percorreu da espinha até a barriga, e isso me fez suar frio. O que será que isso significa?
Tentei ignorar essa sensação desconhecida e segui meu caminho, sol se aquecia leve e gradativamente nas minhas costas, hoje vai ser um dia quente, tenho certeza disso. Por alguns segundos me perguntei se a turma já tinha acordado, se sabiam que a conta foi paga, será que eles vão lembrar de mim daqui a algum tempo? Não sei, tenho medo de saber a resposta e me decepcionar, fazer o que? Tento manter a pose de inabalável mas só eu sei o quanto tem me machucado esse caminho. Nos raros momentos de felicidade eu até consigo esquecer os pontos ruins da minha escolha, mas em momentos como esse em que estou sozinha, sem nada interessante para pensar eu sinto meu peito se inundar de lágrimas que eu tenho que engolir pra não chorar. Viver assim é difícil, tenho certeza que não sou a única no mundo que tem que fazer isso, sei que as minhas dores talvez não sejam tão grandes assim, mas para mim são. Cada um sabe a intensidade da sua dor, cada um sabe o quanto pesa, mas cada um sabe de si, e não do outro, acho que é por isso tanta incompreensão com as dores da alma, ninguém é capaz de enxergar aqueles machucados que sangram dia e noite na alma.
As casas que pareciam distantes agora estavam próximas, deixando evidente que eu estou em algum lugar, mas que lugar? Isso ainda é uma incógnita. Aquela sensação de algum tempo atrás parece mais forte, o que será que me aguarda? Esse jeito ruim deve ter algo para me dizer. Parece que a cada passo que eu dava a sensação piorava, meu passos pareciam cada vez mais distantes do chão, e o arrepio permanecia inabalável, eu não estava apenas suando frio eu estava literalmente com o sangue congelado no corpo, parecia que nem sangue eu tinha na verdade. Minha visão meio sem foco, acabou se dissipando em determinado momento. Tudo aconteceu tão rápido que eu nem fui capaz de sentir meu corpo caindo no chão.
Minha cabeça estava pesada e o braço doendo, mas de certa forma isso não tinha tanto a minha atenção como deveria, as vozes distantes tinham a prioridade no meu cérebro lento.
" E se ela nunca acordar?"
Disse a primeira voz baixo o suficiente para parecer um sussurro.
" Pior, se ela acordar e matar todo mundo?"
Disse a segunda voz, sem a menor cautela de falar baixo.
" Duda, para com essa bobeira."
" Mas é, olha como ela é branca, parece até que brilha, ela pode ser uma parente mal dos Cullens."
" Vampiros não existem Duda, se existissem não iam brilhar, queimariam no sol. Tipo o Drácula."
" Mas no crepúsculo eles brilham."
Enlouqueci só pode. Dessa vez foi rápido, nem vi quando aconteceu. Forcei meus olhos a se abrirem mas a claridade me fez fechar eles rapidamente e jogar a mão no rosto.
" Shiu, ela tá acordando, mãe, o mãe... A garota ta acordando."
Pouco depois eu ouvi o ruido das cortinas se fecharem. Só então tive coragem de abrir o olho novamente, a visão embaçada e as lembranças desconexas deixavam uma confusão iminente no ar. Onde eu estou? O que aconteceu? Eu estava em uma casa isso era bem óbvio no momento, mas o que aconteceu? Eu não lembro de nada, apenas da sensação ruim e distante.
" Você não é uma vampira é?"
Olhei para o lado assustada, então notei duas crianças, duas meninas bem parecidas na verdade, uma era um pouco maior, mas não duvido que a diferença de idade seja bem pequena dois anos no máximo. Dava para saber que era a menorzinha que tinha perguntado, além da expressão de expectativa dela a da outra garota demonstrava incredulidade.
" Não eu não sou uma vampira por que?"
Achei melhor responder, mas o sorriso enorme no meu rosto deixava a certeza do quanto aquela situação é engraçada.
" Eu já disse isso para ela, mas ela não acredita, essa menina boba."
" Isa, não fala assim com a sua irmã, desculpa as meninas. Estão na fase dos vampiros, a Eduarda descobriu o crepúsculo a uns dois meses desde então todo mundo para ela é vampiro, já a Isabella é viciada naquele filminho do hotel Transilvânia. E ficam discutindo por isso. Meu nome é Lúcia, como você se chama?"
" Eu Sou... Amy."
Por um segundo eu me esqueci quem era agora e quase disse Júlia. Meu Deus o que tá havendo comigo?
" o que aconteceu? Como eu vim parar aqui?"
" Você desmaiou a alguns metros daqui, meu marido saiu para trabalhar e viu você caída, ele pensou em chamar o samu mas não tinha tempo para esperar eles, então te trouxe para cá. O que houve com você? Não foi drogas ou nada do tipo né, você não tem cara de quem usa mas nunca se sabe."
" Eu não sei, marido? Você é casada?"
Eu estava mais confusa que nunca, essa garota não deve ter mais de 17, como assim ela é casada? Imaginei que talvez ela fosse a irmã mais velha das garotas, mas pelo jeito ela é a mãe. Ela me sorriu com os lábios mas também com os olhos castanhos brilhantes, gosto de pessoas assim, que sorriem com os olhos elas trazem tanta sinceridade e tranquilidade que nos conquistam de primeira.
" Eu sei, sou meio nova demais para isso, para tudo isso na verdade, mas não me arrependo um segundo das minhas escolhas."
Ela dizia isso tranquilamente olhando para as meninas brincando no outro sofá, eu sei que olhar é esse, eu já vi ele, mesmo nunca sendo direcionado a mim, eu vi na vó da Lily, vi na Joana, no Jorge quando falou dos filhos, vi no Barata olhando pra bruxa e vi no Neto, todos eles, cada um deles transbordava amor pelo olhar, cada um de um jeito, cada um na sua forma única de amar, mas me atrevo a pensar que nenhum eles tinham um sentimento tão grande quanto ela, Lúcia ama as filhas, ama muito. E não precisei de mais que 5 minutos para descobrir isso.
Ela me olhou novamente, dessa vez sem curiosidade mas com preocupação, coisa de mãe imagino.
" O que você sentiu antes de desmaiar?"
" Não sei direito, só um jeito ruim, parecia que final colocado gelo no meu sangue, e não conseguia enxergar direito, por quê?"
" Quando foi a última vez que você comeu sua doida?"
" Sei lá... Ontem a tarde eu acho."
" quer morrer ou o que?"
" Do que você tá falando?"
" Você teve uma crise de hipoglicemia, eu desenvolvi isso quando engravidei, se eu passo mais de duas horas sem comer quase morro, você passou mais de 18 horas provavelmente, não sei como não passou mal antes, espera vou arrumar algo para você comer."
Ela saiu rapidamente da sala deixando as meninas olhando para mim, Fechei meus olhos novamente, acho que eu nunca me senti tão fraca e vulnerável na vida, é como se cada movimento meu estivesse em câmera lenta e meus músculos estivessem pesados. Eu inalava profundamente aquele cheiro doce do chocolate, não sei bem de onde vinha mas ele penetrava em meu nariz desde o momento em que acordei, é como um elixir pronto para me dar força.
" Espero que você goste de bolo de chocolate, tá meio quente ainda mas tenho certeza que está bom."
" mamãe eu também quero."
" Só depois do almoço."
Eu observei ela lidar com as crianças por algum tempo antes de me animar a comer o bolo. Quando o fiz foi quase instantâneo, na segunda garfada eu já me sentia melhor e acabei devorando aquele bolo rapidamente, eu sequer havia notado que estava com fome, estranho isso.
" Então Amy o que te trouxe aqui?"
" Onde é aqui?"
" você não sabe onde está? Isso é no minimo estranho, quem é você afinal?"
" sou meio que uma andarilho, gasto minha vida andando pelos lugares e descobrindo a historia das pessoas."
"Isso é meio estranho, então você não tem nada? Mas pelo menos você tem para quem voltar não tem?"
" Acho que nunca tive. Me diz, quantos anos você tem?"
" 17, a Isa faz 4 em alguns dias, e a Duda tem 3, imagino que essas iam ser as proximas perguntas, não precisa fazer essa cara, tô acostumada, foi precipitado, eu sei, sou nova demais, mas como te disse não arrependo de nada, elas são as melhores coisas que a Vida poderia me dar."
" Mas e a tua vida? A escola, a diversão, teus sonhos, tudo?"
" Eu tenho tudo que eu quero aqui, eu ainda to estudando, pretendo fazer faculdade também, eu trabalho num supermercado, me divirto entre as bonecas e as brincadeiras delas, ouvindo histórias e assistindo filmes de criança, as vezes eu e o Júlio saímos pada danças, beber se divertir, eu vivo normalmente, só tenho alguns deveres maiores que a maioria na nossa idade, e meus sonhos hoje em dia se resumem aos sonhos delas e isso me faz feliz. A vida não é um conto de fadas para ninguém, não tem que ser, só tem que deixar as pessoas felizes por alguns momentos, e por incrível que pareça com elas quase todos os momentos são felizes."
Olhando aquela garota com a vida de uma mulher eu me senti perdida e torta. Onde foi que eu me enfiei.


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Notas finais do capítulo

Então gente, quero muito avisar que a partir de agora a história vai começar a tomar rumo... Talvez um rumo meio ruim, mas espero que vocês não desistam da Amy... Enfim dêem suas opiniões!



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