Amy! escrita por Kcoruja


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

Hey, leiam as notas finais please



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Lúcia voltou para a cozinha pouco depois me deixando sozinha com as crianças, comecei a observar o jeito delas, me olhando de lado e conversando baixinho como se dissesse um segredo. É engraçado o jeito inocente das crianças, é como se elas achassem que ninguém vai notar olhares e cochichos, mas acima de tudo é realmente a inocência em não ter a intenção de machucar e ofender alguém, fazer aquilo por maldade; Elas simplesmente fazem por fazer sem intenção nenhuma de nada. Ser criança é isso é o ser sem preocupação e sem maldade, é ter consciência de quem se é sem ser. Feliz daquele que mantêm o jeito de criança apesar dos anos completados.
Observei os primos da Lily por tempo suficiente para saber, que aquelas menininhas estavam doidas para me encher de perguntas.
A cabeça da menorzinha balançava sem parar, e as bochechas coradas, ela não queria fazer alguma coisa, e de uma forma estranha isso a deixava muito fofa. Estranha essa vontade de morder e apertar algo que é fofo, li em algum lugar que tem haver com o lugar do cérebro que esses sentimentos e ações ficam, mas ainda não entendo como é possível gostar de algo através da violência mas de uma forma absurda era o que eu tinha vontade de fazer nesse momento, apertar essa menina fofa até os olhos dela saltar. A mais velha com um olhar astuto demais para a idade me desarmou de alguma forma, eu conheço aquele olhar, eu vi ele milhões de vezes no espelho. Me senti velha demais ao pensar que essa menina vai dar trabalho.
Meu momento de analise social foi interrompido por Lúcia que me chamou na cozinha, antes de levantar e ir em direção a cozinha eu observei as meninas por mais um segundo, e achei engraçado as tentativas da Duda de falar meu nome, e o jeito fofo que ela balançou a cabeça para os lados desistindo. Isa, a mais velha me olhava de um jeito tão astuto que por alguns segundos duvidei da idade dela, olhar de criança que não vai permanecer criança por muito tempo, olhar que carrega o mundo e os misterios, e uma curiosidade palpável, a vontade de descobrir tudo. O mesmo olhar que vi no espelho por tantos anos.
Segui em direção da cozinha e observei Lúcia lidar com as panelas, ela é mais nova que eu, já é mãe, tem uma casa, uma família e panelas cheias da comida que ela mesmo fez, e eu? A duas semanas aprendi a lavar pratos. Essas doces diferenças que o mundo proporciona as pessoas, imagina que chato se todos no universo tivessem a mesma vida e experiências que eu? Quão monótono tudo seria?
Balancei a cabeça afastando as idéias que queriam se fixar na minha mente e me aproximei da pia, a esponja e o detergente delicadamente repousados em uma espécie de alicerce de parede, me convidavam a ajudar, em silêncio comecei a lavar as louças depositados lá.
" Você não precisa fazer isso."
" é o minimo que posso fazer."
" o que te fez escolher essa vida? Você não é muito mais velha que eu, por quê deixar a sua casa, sua família pra trás e seguir sozinha rumo a algum lugar?"
" Felizmente a aparência engana, sou uma quantia boa mais velha que você, tenho 21 para falar a verdade."
Ela me olhou enquanto eu pensava em como responder a pergunta, ela não disse nada nesse espaço de tempo, e de uma forma estranha o silêncio me impelia a falar. Mesmo que eu não soubesse o que ou como.
" Eu não sei, eu achava que sabia o por quê mas parece que eu nunca soube, digamos que eu não tinha nada que valesse a pena para me fazer ficar. Gosto da estrada, gosto de conhecer pessoas diferentes, com vidas diferentes, gosto disso, conhecer as história que fazem parte da história do Brasil."
" Entendo... Mas me diz, por que sozinha? Não seria mais seguro ter alguém do lado?"
" depende do que você considera segurança, tem aquele ditado né, antes só do que mal acompanhado, e eu concordo com ele, é melhor estar sozinha do que com pessoas que não são aquilo que você precisa."
Enquanto o silêncio se fazia presente, eu comecei a me perguntar a razão daquilo, a razão disso tudo, eu não tinha parado para pensar nisso, por que ficar sozinha? Não deixa de ser realidade o que eu disse mas no fundo bem no fundo, talvez seja fundo demais para admitir que eu não quero ninguém por quê simplesmente todas as pessoas que eu tive ao meu lado apenas fingiram comigo, talvez exista um tempo para todos, que deixa um limite tênue para permanecer ao lado de alguém e o meu caso esse tempo se esgota mais rápido, talvez seja o tempo suficiente para se envolver, eu me envolve fácil com as pessoas e ficar ao lado de alguém significa sofrer no final, acho que eu não estou mais disposta a isso. Não sei como Lúcia consegue, tão nova e tão presa a padrões ela tem alguém, tem um marido, e se o amor acabar?
" Isso não é assustador?"
" o quê? Ser mãe?"
" Também, ser mãe tão nova e ser casada, e se um dia você acordar e descobrir que não ama ele mais?"
" isso não vai acontecer, a gente já passou por coisa demais juntos para o amor ainda ser o único sentimento, não é mais o amor que era antes da isa nascer, admito, agora é diferente, existe mais maturidade e mais coisas envolvidas, muitos sentimentos além do amor fazem um casal. Quando eu escutava Cazuza na minha época 'rebelde' eu me perguntava como alguém podia querer um amor com sabor de fruta mordida. Eu queria o desespero, a loucura. Como alguém poderia se contentar com menos que isso? Então eu conheci o Júlio, eu tava bêbada demais para lembrar de um nome no dia seguinte e minha mãe desesperada demais por eu ter fugido de casa mais uma vez, foi uma época difícil pra nós duas e eu não facilitava sabe. Aqueles amigos que de amigo mesmo não tem nada adoravam a rebeldia de quem fugia de casa depois do pai morrer e deixava a mãe chorando na sala com um terço na mão rezando para eu voltar bem. Foi complicado, mas enfim eu conheci ele e por incrível que pareça um cara mais velho respeitou uma menina que tinha de 11 para 12 anos e estava completamente bêbada. Ele tinha acabado de fazer 18 era aquele cara bonito mas exótico magrelo, barba mal feita e viciado em video game. É meio estranho mas ele conversou comigo até as 6 da manhã e quando eu comecei a melhorar ele me levou para casa, apé mesmo, ele não tinha carro nem nada, me deixou na porta com a minha mãe avisando que ele voltava de tarde para ver como eu tava. Sabe o mais estranho disso tudo ele voltou, voltou todos os dias por 6 meses, a gente conversava na calçada de casa até anoitecer. Nesse meio tempo eu parei de fugir e encontrar meus amigos, ele pararam de ver graça em mim e me deixaram para lá, acho que no dia que contei isso para minha mãe ela mandou rezar uma missa em agradecimento. Enfim, a gente começou a namorar, ele arrumou um emprego, começou a virar gente, não virava noites em claro jogando, a gente foi se apaixonando de forma calma e previsível quase uma fruta mordida mesmo, e então veio o desespero a loucura a vontade de ficar perto, e no meio desse desespero veio a isa, foi assustador sim admito, eu não tinha um útero completamente formado era bem fraquinha, o medico me entupiu de remédio e vitamina para ver se eu aguentava pelo menos até os 7 meses, acabei levando até o final mesmo, a isa nasceu tão grande tão forte e esperta que quando eu olhei para ela eu sabia que a melhor escolha que eu fiz foi ir naquela festa. Depois de um ano quase a gente mudou para essa casa, e começamos a viver de verdade a nossa vida."
"Mas você não tem medo de errar? De falhar? fazer algo errado com elas? Acho que é por que a ideia de ser mãe me assusta mas eu sei que não seria capaz."
" tenho certeza que seria, o medo é que faz as mães serem mães. A minha sempre me disse isso e eu nunca acreditei. Hoje eu tenho medo, medo de tudo, ligo para coisas que eu não tava nem ai a 4 ou 5 anos. Me importo com a educação, com a violência, eu choro de medo quando vejo uma reportagem falando sobre pedofilia ou estupro, me preocupo com doenças que eu nem sabia que existia, não só por elas mas por mim também, hoje eu presto mais atenção no transito e tenho medo de ir a alguns lugares, por que eu sei que se acontecer algo comigo elas iam sofrer. Eu tenho medo que elas passem pelo que eu precisei passar para crescer, por vezes minha vontade é pegar o mundo e colocar na peneira, deixar preso tudo de ruim e só entregar para elas o que é bom. Hoje eu entendo o tanto que minha mãe rezava, e admito que eu tenho medo de não o fazer o suficiente, não rezar o suficiente. Eu sou mãe, não por quê pus uma criança no mundo, mas por me preocupar e tentar fazer um mundo melhor para elas. Eu tenho sim medo de errar e não ser boa, mas também tenho a certeza que elas me amam e isso salva tudo,bsabe no final da noite quando elas dizem baixinho um 'te amo mamãe' antes De fechar os olhinhos e dormir, nossa isso paga tudo."
Enquanto ela falava eu peguei me perguntando se um dia a minha mãe rezou uma ave-maria sequer por mim, foi triste perceber que não, ela não é do tipo de mulher que reza, que troca fraldas, não é do tipo que é mãe, acho que se ela pudesse ela tinha pago alguém para me carregar por nove meses. Ela só pôs no mundo, só isso. E isso é tão triste, quantas pessoas a mais pararam para pensar nisso no quanto a falta de amor e zelo faz as pessoas deixarem de ser mães ou pais, o meu pai também é outro nunca foi capaz de um carinho, "carinho para quê? Já te dei um presente hoje, já paguei isso para você hoje." Quantas vezes ouvi isso? O suficiente para saber que dinheiro não compra nada. Balancei a cabeça afastando todas essas idéias e lembranças, ando tão nostálgica novamente, acho que isso é falta de coisas para pensar.
" Amy? Se importa de pegar os pratos para mim e por na mesa?"
Fui em direção ao armário que ela apontava e comecei a abrir as portas até achar os pratos, coloquei eles em cima da mesa e fiquei observando a morena de cabelos longos e lisos mexer nas panelas, as meninas pareciam com ela, exceto pelo olho o dela é esverdeado e o das meninas castanho. Tão nova, tão bonita.
" Não me olha desse jeito, da para ver que você tá com pena. Eu amo ser mãe, amo minha vida, não precisa pena, eu tô feliz, eu sou feliz quase todos os momentos."
A frase morreu na boca dela em um sussurro, tinha algo errado ali, a tristeza que tomou os olhos dela denunciava isso, tem algo muito errado aqui.
" o que aconteceu?"
" Nada."
" Você tava toda feliz agora pouco, e agora tem esse olhar, eu posso não entender muito bem a tua vida e tuas escolhas, mas eu sei escutar, e tá na cara que você precisa falar."
Ela desligou o fogão poucos segundos depois e puxou uma cadeira e se sentou me indicando a outra, nesse momento eu percebi que o assunto era sério e complicado. Sentei olhando fixamente naqueles olhos verdes e enxergando a tristeza neles, seja lá o que ela fosse falar deixava uma certeza no ar que me invadia, de uma alguma forma esse momento vai mudar algo na minha vida de uma forma.
" a alguns meses as coisas aqui começaram a mudar."
" Ele não está te batendo, forçando, não sei, eu posso te ajudar, seja la o que ele estiver fazendo."
" O Ju? Não, calma garota. Ta tudo bem com a gente. Ele é um perfeito cavalheiro, os problemas são outros aqui em casa. A Duda, a algum tempo começou com uma dormição, e com manchas roxas espalhadas pelo corpo, a primeira coisa que fiz foi tirar satisfação na creche, achei que eles estavam machucando ela com apertões eu sou mãe, sei o quanto a curiosidade dela é irritante. Mas então o sono virou desmaios e quantidades assustadoras de sangue saindo pelo nariz. É eu sei, me assustou muito também, e as teorias que a gente cria sem querer são as piores. Então o médico pediu uma quantidade enorme de exames, acho que foi ai que as coisas se complicaram, os exames são caros, as suspeitas do médico urgentes, e infelizmente o sus não colabora. Faz um mês que tô esperando, e nada. Meu patrão me deu férias para cuidar dela, mas não tem o que fazer. Esperar ela acordar dos desmaios, fazer as vontades dela e estancar o sangue."
Ela mal terminou de falar e ouvimos um grito da isa. Acho que não correu nem um milésimo de segundo e Lúcia estava lá, com aquele corpo pequeno no colo, jogando a cabeça dela para trás tentando fazer aquele monte de sangue parar de escorrer. Isa desceu a escada correndo com um pano. Eu podia sentir o desespero no silêncio das duas, um desespero contagiante. Lá olhando aquela cena como mera intrusa, observando o sofrimento alheio, eu podia sentir o desespero em mim, ele crescia sufocante e assustador. Lembrei sem querer de quando eu dei uma bolada na cara da Lily na aula de educação física, acabei quebrando o nariz dela, lembrei do desespero que senti e do quanto eu chorei. Acabei indo parar no hospital junto com ela pelo estado de nervos que fiquei.
Lúcia é guerreira, não é simplesmente uma criança que foi obrigada a ser mãe, não ela é uma mãe qualquer, talvez seja a melhor que já conheci. Enquanto ela embalava a pequena cuidadosamente tentando acalmar ela da crise de choro que se seguiu, observei ela puxar isa e abraçar ela pelos ombros e depositar um beijo casto em sua testa, os olhos fechados tentando conter as lagrimas que eu sei que ela não podia deixar cair, e que eu como observadora deixei cair, não uma ou duas, várias, incontroláveis demonstrações do quanto eu me envolvi.
Fiz aquilo que não podia, me tornei parte de uma história, de tantas historias no mundo para fazer parte tinha que ser justo essa meu Deus? Justo aquela que meu interior grita que não vai ter um final feliz? Eu queria ser lembrada, eu sei, mas não quero ser lembrada como a estranha que minha mãe ajudou antes da minha irmã morrer.
Esse pensamento me causou calafrios, eu vou ser isso? Não, um egoísmo incomum me tomou, não quero ser lembrada assim. Já basta dessa minha incapacidade de reagir a essas situações.
" Duda? Vem com a tia My vem? Vamo tomar um banho."
O olhar de Lúcia correu até mim nesse momento, por aquele olhar notei que ela esqueceu da minha existência. O olhar assustado me denunciou a recusa que vinha a seguir, antes mesmo dela poder negar me vi insistindo.
" Eu posso fazer isso, fuca tranquila você precisa trocar de roupa, sinto muito não sei cozinhar, quero te ajudar, depois do almoço a gente continua aquela conversa."
Ela assentiu, e vi a Duda olhar para ela num pedido silencioso de permissão, e depois jogar os braços para o meu lado. Foi então que senti as lágrimas voltarem com força total, me obriguei a fechar os olhos com força, eu não ia chorar mais. O rosto vermelho com pequenos espaços com sangue seco, e alguma espécie de prasta de sangue meio coagulado. Parecia um filme de terror mas era apenas a vida real sendo pior que qualquer imaginação. Peguei ela no colo e isa foi na frente me mostrando onde era o banheiro, tirei a roupa suja dela e equilíbrio a água numa temperatura morna, quase fria. Rosa fazia isso quando eu me desesperava, ou machucava, e de uma forma estranha o sangue parava de sair, rosa dizia que o corpo achava que era uma cachoeira e que tudo estava em paz. Minha mãe dizia que essa água fechava os poros e fazia bem pra pele. Sempre gostei mais do que a Rosa dizia. Duda não reclamou da água fria, só me perguntou o por quê. Não evitei sorrir dizendo o mesmo que a Rosa sempre disse:
" É igual uma cachoeira, quando você tá debaixo daquela água o teu corpo fica com a certeza que está tudo bem; agora tá tudo bem."
Ela assentiu enquanto eu lavava calmamente o sangue dela. Talvez eu possa ser mais que apenas uma estranha, talvez eu seja melhor que isso, eu quero e posso ajudar.
Me perdoa meu Deus, por não entender o teu meio de fazer as coisas. E obrigada por me deixar entender isso agora.


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Notas finais do capítulo

Então gente, como vão? Então sei que demorei muito a postar mas é explicável eu juro, comecei a faculdade esse mês e já tô tão atolada em trabalhos que eu ando sem tempo até de tomar banho (OK exagerei) mas ainda assim ando sem tempo, vou começar a programar as postagens mas estou com poucos capítulos essa parte da história tá difícil de escrever mexe comigo! Mas enfim, espero que me perdoem e não desistam de mim. Até logo!



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