Entre Dois Mundos escrita por Benihime


Capítulo 11
Bonecas e a dança interrompida




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Zoey

Paramos na frente da casa e olhei em volta, procurando por uma certa loira. Ela não estava à vista. Deve estar lá dentro, pensei. Carregando o prato com o chester para a ceia, entrei atrás de meus avós.

Na área, vi a loirinha irritante sentada ouvindo música. Ela não me viu. Coloquei o chester na mesa e aproveitei a oportunidade para dar uma boa olhada em minha amiga. Ela parecia mais madura do que quando nos conhecemos e pela primeira vez me dei conta do quanto realmente gostava daquela garota.

Balançando a cabeça para me livrar desses pensamentos, fui até minha melhor amiga. Ela me viu e imediatamente veio ao meu encontro, me envolvendo num abraço de urso.

— Sua vaca! — Disse ao se afastar — Não me liga, não manda mensagem ... Tem noção do quanto eu fiquei preocupada? Tive que falar com a sua avó pra saber que você estava bem.

— Desculpe, loira. Foi semana de provas finais, fiquei estudando direto. Nem olhei pro meu celular.

— Você pega pesado demais, Z. — A loira declarou. — Vem, vamos dar uma volta e relaxar.

Caminhamos por toda a rua. A casa onde o pessoal se reuniu naquele ano era perto do centro, então aproveitamos e escapulimos para olhar as lojas. Passamos em frente a uma loja de bonecas.

— Olha só, Z! — Adaline exclamou, puxando de leve minha mão, que ela segurava, me fazendo parar de andar. — Essas bonecas são tão lindas! Podemos entrar e dar uma olhada?

— Não sei, não, Addie ...

— Por favor, Zo! — Minha amiga me encarou com cara de cachorrinho pidão. — Por favorzinho. É Natal.

— Tecnicamente, ainda falta uma semana.

— Ah, deixa de ser chata, vai!

— Ok, sua chata. — Cedi finalmente. — Vamos entrar.

Adaline praticamente disparou para dentro da loja, olhando em volta com curiosidade. Eu a acompanhei e, quando a senhora atrás do caixa me viu, abriu um sorriso enorme e veio me abraçar.

— Zoey! — A italiana baixinha exclamou.  — Como vai la minha ragazza? Pensei que nunca mais fosse aparecer!

— Desculpe, tia Cheska. — Respondi. — Ando sem tempo por causa da escola.

— Assurdo! — Minha tia exclamou com uma gargalhada. — As férias já começaram, bambina, você precisa vir me fazer companhia.

— Virei, tia, eu prometo. — Garanti. — Ah, eu trouxe uma amiga hoje. O nome dela é Adaline.

Molto felice di conoscerti, Adaline.

Pensei que eu teria que traduzir, mas Adaline me surpreendeu ao aceitar o aperto de mãos de Francesca com um sorriso e dizer:

Il piacere è mio, signora.

Seu italiano podia melhorar na pronúncia, mas ela falava com cadência e fluidez, o que era muito mais do que eu esperava. Francesca olhou para mim com aqueles olhos astutos brilhando, cheios de malícia.

Conduzi minha amiga pelas prateleiras da loja. O cheiro de porcelana, misturado ao cheiro do incenso de rosas que minha tia sempre queimava, transformava aquele lugar em um dos mais aconchegantes do mundo, pelo menos para mim.

— Olha só essa aqui — Adaline comentou — Parece tão real!

Olhei para a boneca que ela apontava, um bonito modelo que parecia um bebê de verdade. Não consegui deixar de sorrir, como sempre admirada com o talento de minha tia.

— Francesca é a melhor no que faz. — Eu disse — Cada boneca dessas é única, inclusive vem numeradas. São feitas à mão nos fornos atrás da loja.

— Como sabe tanto sobre isso?

— Tia Cheska vem me ensinando desde que eu era criança. Claro, ela tem muito mais talento do que eu, então as minhas criações só ficam na parte de trás.

— Eu ... Queria ver algumas das bonecas que você fez. Isso é, se estiver tudo bem.

— Claro que sim. — Respondi. — Vem, eu te mostro.

 

Levei Adaline aos fornos na parte de trás da loja. O isolamento naquela parte era tão pesado que fazia todos os sons desaparecerem.

— Uau. — Minha amiga olhou em volta, impressionada. — Nunca estive em um lugar como esse.

— Vai por mim, não é tão bom quando os fornos estão acesos. Você não ia querer experimentar essa parte.

Apontei para uma pequena prateleira perto da porta na parede oposta, onde uma dúzia de bonecas estavam arrumadas organizadamente. Algumas eram sinceramente grotescas, outras não eram tão ruins.

 

— Não entendo por que manter essa aqui guardada. — Ada comentou, apontando para uma graciosa bailarina de porcelana. — Podia vender. É linda.

— A porcelana ficou fina demais, ia se partir em dois dias.

Minha amiga assentiu e passou delicadamente o dedo sobre uma das primeiras bonecas que eu fizera, um bebê que saíra horrivelmente deformado, mais parecendo um alienígena.

— Essa tem lá o seu charme. — Ela comentou jocosamente. — Falando sério, Z, não acho que devia desistir. Está na cara que é uma coisa que você gosta.

Suas palavras me emocionaram, fazendo-me olhar de novo para ela, que aninhava outra boneca nos braços. Era um modelo que imitava uma criança pequena, de dois ou três anos. Eu a havia feito para dar de presente, mas minha mãe detestou. Fiquei tão magoada que joguei a boneca fora, mas minha tia a guardou.

Naquele momento, Adaline a aninhava delicadamente contra o peito, afastando os cabelos negros da boneca de seu rosto para poder vê-lo melhor. Ouvi minha amiga arquejar ao ver os olhos cor de rosa de minha criação, da cor de flores de azaléia.

 

Ela ergueu o rosto para me olhar, seus lábios entreabertos para perguntar algo, mas nunca teve a chance de falar. Em um segundo eu já estava na sua frente, meus braços formando um círculo ao redor de sua cintura. 

— Pensei que você nunca faria isso. — Adaline disse, colocando delicadamente a boneca de volta na estante e então se voltando de novo para mim.

— Pois é. — Respondi com um sorriso. — Eu também.

 

Minha amiga riu e ficou na ponta dos pés, passando os braços por meu pescoço.

— Aquilo no meu aniversário não foi nada, Addie. — Declarei, puxando-a para mais perto de mim. — Agora sim vou te mostrar o que é um beijo de verdade.

— Cala essa boca e me beija logo, sua vaca.

Ri e coloquei um dedo sob seu queixo, erguendo delicadamente seu rosto até que estivesse na posição correta, e então a beijei. De verdade dessa vez, sem me conter. Adaline retribuiu de modo desajeitado, porém com tanto desejo quanto eu.

Meu celular, no bolso traseiro do meu jeans, vibrou, quebrando a magia entre nós. Era uma mensagem da minha avó, avisando para voltarmos logo porque a ceia ia começar a ser servida. Isso foi como um balde de água fria, fazendo com que nossos corpos se separassem.

— Anda, Addie, temos que voltar. — Falei. — Já estão servindo a ceia.

Adaline não discutiu, simplesmente fez que sim com a cabeça. Peguei novamente a boneca de olhos cor de rosa e a coloquei em seus braços, vendo sua expressão se anuviar em confusão.

— É sério, Z? — Ela inquiriu. — Tem certeza?

— Tenho sim. Afinal, você é a única que gostou dela. — Respondi, sorrindo. — Feliz Natal, Ada.

Minha amiga abraçou com delicadeza a boneca contra o peito. Demos tchau para minha tia, que insistiu para que eu voltasse logo, e em seguida estávamos de volta à casa onde estava sendo realizada a reunião.

Sentamos lado a lado, uma servindo a outra, sempre conversando. Era como se os assuntos entre nós nunca acabassem, uma das coisas que eu mais amava na nossa relação. Depois que comemos, o pessoal resolveu fazer um "baile".

— Podem ir pro andar de cima e jogar videogame se quiserem, meninas. — Clarissa, a dona da casa, disse.

Subimos e ajeitei o console para jogarmos. Ada, para minha surpresa, se acomodou com a boneca que eu lhe dera no colo antes de pegar um dos controles. O jogo era Mortal Kombat IX, um dos meus preferidos, e ganhei de lavada todas as partidas.

— A gente bem que podia dançar. — Minha amiga sugeriu depois de mais algumas partidas.

— Eu não sei dançar, loira.

— Não é tão difícil. — Ela se pôs de pé e me estendeu uma das mãos. — Eu te ensino. Vem, Z. Vai ser divertido. 

 

Verdade seja dita, foi mesmo fácil seguir suas instruções, e logo eu estava dançando. A batida rítmica do grave que vinha do andar de baixo nos convidava a rebolar, a chegar mais perto, e foi exatamente o que fizemos.

— Isso mesmo, Z. — Addie sorriu como uma mãe orgulhosa. — Não pense, só aja.

Eu me sentia poderosa como nunca na vida. Num impulso abracei Adaline por trás, prendendo-a de costas para mim. Ela ofegou de surpresa, mas pareceu gostar.

— Faz alguma coisa. — A loira disse enfim, depois de alguns segundos de silêncio.

 

 

— O que você quer que eu faça?

— Qualquer coisa.

Minha mão soltou seu braço e encontrou sua bochecha, virando seu rosto para que nossos lábios pudessem se encontrar ... Devagar, seus olhos se fecharam ...

— Adaline, hora de ir. — Ouvimos o pai dela gritar.

— Já vou, papai. — Ela sorriu para mim. — Tchau, Z.

Ada me soltou e acompanhou o pai para se despedir de todos da festa. Sorri comigo mesma, relembrando aquele momento eletrizante em que ficamos presas nos olhos uma da outra.


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