Reino da Magia escrita por semita13


Capítulo 2
O que é que um feiticeiro faz?


Notas iniciais do capítulo

Passamos a conhecer o ambiente em que Nicolas vive e um de seus melhores amigos, Wendel, um velho bêbado que irá solucionar algumas de suas dúvidas... ou deixá-lo ainda mais confuso.



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Na taverna as horas passam e muitos nem percebem. Wendel, um senhor magro, barba por fazer e cabelos despenteados diverte um grupo perto do balcão. A sua frente encontra-se uma mesa e apoiando os cotovelos nela está um garotinho que se mostra bem interessado nas estórias daquele velho bêbado. Ele ouve tudo atentamente, ri das piadas, mesmo das sem graça, e fica sério com comentários que para os outros não soava mais do que fofoca entre vilarejos. Seu pai está no balcão, limpando copos e distribuindo bebidas. A noite lhe parece lucrativa, mas ver seu filho feliz era mais recompensador que todo dinheiro que pudesse arrecadar.

—Olhe só o Nick! Tão feliz como um pintinho no lixo. – diz Arthur, enquanto passa o pano sobre o balcão.

—É verdade, mas aconteceu... - diz Rose, do outro lado do balcão, perto dele.

—O que foi Rose? Você me parece preocupada. - Arthur se aproxima dela.

—É que... Aconteceu uma coisa estranha.

—Com o Nick?

Ele se mostra curioso e preocupado e se aproxima mais, tão perto que podia sentir a suavidade daquela pele mesmo sem tocá-la. E para Rose sentir aquela respiração quente próximo de seu pescoço a fazia tropeçar nas palavras. Parecia que a conversa estava mudando de rumo. Ela retribuía aquele olhar. Talvez fosse a bebida ou a euforia de uma noite feliz. O certo é que tudo estava bem até voltarem para a realidade.

—É sobre aquelas coisas estranhas que a gente conversou outro dia, lembra?

—É! Ele anda muito esquisito ultimamente - diz Arthur. Ele sabe o que Rose está insinuando - Precisamos ter uma conversa com ele.

—Está bem! Mas deixe ele se divertir essa noite. - pede Rose. Arthur concorda, sinalizando com a cabeça.

Os dois ficam observando Nicolas do balcão. E ao final de uma estória acompanhada por risos, Nicolas faz uma pergunta ao velho amigo Wendel.

—... E ela parecia tão feia que até uma bruxa teria pena dela, ah! Ah! Ah! Nem um feiticeiro conseguiria salvá-la. Só Deus na causa. Ah!Ah!Ah!

—Mas bruxa e feiticeiro não é tudo uma coisa só?

Wendel aproveita a pausa e toma mais um gole de sua bebida. Então volta sua atenção para o garoto.

—Ouça bem, filho, que é pra você não ter dúvidas. Fica até de aviso pra quando você encontrar uma coisa dessas pela frente. Uma bruxa é uma mulher e um feiticeiro é um homem, viu?

—Mas não existem feiticeiras e bruxos? - pergunta o garoto, mais confuso ainda.

—Bem... É que a maioria das bruxas são mulheres. Criaturas fracas na fé, fáceis de serem enganadas.

—Discordo plenamente, Wendel! - contesta Rose - Os homens é que são fracos, já que sempre se rendem aos nossos encantos. Ah! Ah!

—É! Mas não antes de tomar uns bons tragos. Ah!Ah! - retruca Wendel após outro gole de bebida - E se for uma mulher feia, além da bebida também tem que tomar muita coragem. Ah!Ah!Ah!

—O Véi, não muda de assunto não! - insiste Nicolas - Já que pode ser tanto homem quanto mulher, me diz então o que é que um feiticeiro faz?

—Veja bem... Eles fazem coisas do tipo... Que a gente não faz, entendeu? - todos se mostram confusos, mas Wendel continua - Veja bem, veja bem... Eles podem fazer coisas inexplicáveis para a cabecinha humana entender do tipo: aparecer fogo sem nada pra queimar, fazer uma vaca voar do nada... Aliás, eu já vi uma vaca voar! Já contei essa estória pra vocês?

Alguns riam das lorotas do velho bêbado, mas Nicolas continua no assunto.

—E o que mais?

—Mais? Bem... - o velho toma outro gole da bebida - Eles podem fazer um homem ficar paralisado dos pés a cabeça, imóvel, feito uma estátua. E aí...

—E aí?

—E aí eles lançam seus feitiços. Falam palavras esquisitas: ABDUM CABRUM BUMBUM! E a pessoa fica enfeitiçada e a mercê da bruxa... - mais um gole -... Ou do feiticeiro. Ouvi casos em que eles matam crianças para fazerem suas poções. Você sabe que a guerra tem deixado muitas crianças órfãs, que ficam vagando pelas estradas escuras, sozinhas. Muitas desapareceram, vítimas de rituais macabros ou...

—Ou viraram grumetes! Ah! Ah! – se manifesta um senhor mais ao fundo, abraçado com uma das mulheres da taverna - Deixa de inventar, velho bêbado!

—Grumetes? O que é isso?

—Nã... Esquece o que esse tolo diz! São crianças que são levadas para trabalhar para os militares nas guerras, mas isso não vem ao caso, Nick. Se bem que, nas mãos dos militares ou das bruxas o destino delas é o mesmo, né? Ah! Ah! Ah!

—Pare com isso, Wendel, vai acabar assustando o garoto. - comenta Arthur.

—Desse jeito amanhã terei que trocar os lençóis da cama dele! Ah! Ah! - diz Rose.

A estória continua e apesar das risadas e brincadeiras, Nicolas percebe que algumas coisas se relacionam com fatos estranhos que acontecem com ele. Wendel aumenta o clima de suspense e passa a acrescentar casos reais a suas estórias.

—Pois é! O incêndio no orfanato de Folkland, aqui, pertinho de nós! As criaturas da noite precisam de mais vítimas para suas poções e feitiços. Ouvi dizer que nem a fogueira pode acabar com elas. Viu o caso do Vilarejo de Kolkingham? Já se passou quanto tempo, sete anos? Dizem que queimaram uma inocente, que o Auto de fé não adiantou, pois coisas ruins continuaram acontecendo naquele lugar. Coisas sombrias acontecem nessa época. Bruxas e feiticeiros são assim, eles podem nos enganar, Nick, acredite em mim!

—Assim como?

—Bem... São pessoas, apesar de que em alguns casos podem se transformar em animais. Usam roupas diferentes, esquisitas... Misturam roupas, cores, umas mulheres com gostos esquisitos. Ah! Ah! Ah! - pausa para mais um gole - Dizem que andam à noite cobertas por um manto para tamparem aqueles trapos horríveis. Ah! Ah! E o rosto delas, vixe! Têm umas marcas feias, parecem pinturas antigas, com a cara amassada, verrugas e feridas. Eu conheci uma pessoa assim.

—Bruxa? - pergunta Nicolas.

—Não, minha ex-mulher! Ah! Ah! Ah! Ah! – risadas se multiplicam pelo recinto - Se fosse bruxa poderia ter feito uma magicazinha pra mudar a cara, né! Mas a coitada não tinha nem talento pra isso. Ah! Ah! Ah!

—Eu acho que você está exagerando... - retruca o garoto, mas muitos não lhe dão atenção. Nicolas procura se aproveitar da situação. - E esses feiticeiros, eles podem fazer aparecer luz ou... Outra pessoa assim como eles?

—Luz? É claro! Eles podem fazer as mãos brilharem assim, feito um farol. Ah! Ah! - diz Wendel, mostrando as palmas das mãos para Nicolas, fazendo movimentos circulares.

Uma lembrança do passado vem à mente de Nicolas, que fica pálido. Certo dia, no quarto, se sentindo muito sozinho devido a mais uma desavença com os garotos do vilarejo, ele se prostrou de joelhos ao lado da cama e entristecido, juntou as mãos pedindo a Deus que o ajuda-se a ter alguém, um amigo. De repente feixes de luz esverdeados saiam pelas brechas de seus dedos entrelaçados. Ele até achou que em vez de Deus outra coisa ouviu seu chamado. A partir daquele dia, Nicolas ganhou um amigo, batizado de Lucas. Imaginário, mas um amigo que passou a acompanhá-lo e sempre aparece para ajudá-lo. Wendel continua lhe assustando.

—Outra pessoa? Isso é brincadeira pra eles, garoto! Podem fazer cópia fiel de qualquer um. Até de você! Já pensou Arthur, se você tivesse que tomar conta de dois Nicolas? Ah! Ah! Ah! Ou de um irmãozinho dele, hein, hein? Ah! Ah! Ah!

          Arthur e Rose, meio que envergonhados, soltam uma risada que não é compartilhada por Nicolas, que parece ter encontrado suas respostas. Percebendo a expressão em seu rosto, Rose acha que a brincadeira de Wendel tenha sido inconveniente.

—Acho que está na hora do Nicolas dormir, não é?

—Bem... - Arthur olha para ela e depois o encara - É verdade, filho. Vá pro seu quarto!

—Só mais uma pergunta, Véi Zuza!

—Ah! Ah! Ah! - Wendel sempre acha graça toda vez que Nicolas o chama assim - Fala filho!

—O que acontece com o feiticeiro e com as pessoas que, que vivem com ele, que o conhecem?

Wendel ia tomar outro gole, mas desiste. O riso e a expressão alegre desaparecem de sua face.

—Estão entre nós, as criaturas da noite! O que eles mexem é coisa de Deus e que não podem ser feitas pelo homem. A pessoa é capturada e perde a posse de todos os seus bens, até das roupas que veste. Depois ela é obrigada a confessar seus crimes. E olha garoto! Existem várias maneiras cruéis, desumanas, de se fazer uma pessoa confessar até o que não fez. Então eles cortam o cabelo, tiram sua barba... Enfim, desfiguram o infeliz para quebrarem a imagem daquela pessoa para que ninguém mais se lembre como ela era. E por fim, o Auto de fé. A fogueira é usada para não deixar nenhum vestígio do dito cujo sobre a terra. E com certeza também é o destino daqueles que vivem ou conhecem alguém assim. Todos são condenados, mesmo que não saibam fazer nada de magia, feitiço ou sei lá o quê. Ouvi dizer que muitos enriqueceram a custas de inocentes que foram para a fogueira. Aqueles que mexem com coisas proibidas pagam o preço. Aconteceu no passado, acontece agora... BUU!

Ele dá um susto em Nicolas e todos riem. Por alguns segundos o garoto permanece sério, mas depois também solta um sorriso. Talvez para que os outros não percebessem sua preocupação.


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Notas finais do capítulo

Parece que Nicolas finalmente encontrou suas respostas. Pena que não foi de uma fonte tão segura. Uma coisa é certa, é hora de tomar uma decisão.



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