Protegida por um Anjo escrita por Moolinha


Capítulo 9
Nove




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Quase caí para trás quando ele me disse aquelas duas últimas palavras: “Minha casa”. Caramba, dá pra acreditar? Eu estava diante da casa do meu anjo da guarda no meio da noite, não é estranho?

E, isso me fez pensar que eu já estava parecendo meio “íntima” para estar indo à casa dele desse jeito. Sei lá, não havia ninguém na casa dele.

— Não brinca! — Pisquei de forma confusa.

Seus olhos verdes se cravaram aos meus e então fiquei um tanto perturbada. Dei um passo involuntário para trás e sussurrei baixinho “certo”, mas tenho certeza que ele não ouviu.

— Você é muito estranha, Bells.

Odeio quando ele me chama de Bells.

— Obrigada. — Respondi com minha voz esganiçada — muita gente diz isso ao meu respeito. Acostumei-me. Mas, não acha estranho sair por aí entrando na casa dos outros no meio da madrugada? Digo. Essa era sua casa, mas agora é dos seus pais e dos seus irmãos e eu sou apenas uma desconhecida.

Seus olhos brilhantes se cravaram no meu rosto em forma misteriosa, macabra e um pouco, fantasmagórica. Como se ele quisesse fazer mais alguma coisa, além de me assustar e me mostrar sua casa gigante. Ao meio do nosso contato visual, ele abriu seu sorriso malicioso branquíssimo, exibindo seus caninos ligeiramente pontudos e covinhas ao redor de suas bochechas.

Senti uma coisa estranha no estômago, mas nem me preocupei em saber. Estava ocupada demais explorando os extremos dos olhos verdes de Jimmy.

— Eles foram jantar fora essa noite. — Sussurrou, como se alguém estivesse nos vigiando.

Porque ele tinha que fazer aquilo toda hora? Sabe, sorrir com... Não sei, como se simplesmente achasse graça de tudo o que estava acontecendo conosco. Tipo, nem toda garota do mundo tem um anjo da guarda gatão, tem?

Sabe, ele me olha e sorri como se achasse graça de me proteger e, não consigo nem respirar quando aqueles olhos brilhantes cravam aos meus.  É admito, todas às vezes em que ele fez isso, sinto minhas mãos transbordarem de suor e meu coração a ponto de sair pela boca.

Tudo isso é porque não tive a chance de ficar tanto tempo com um garoto. Nunca nenhum garoto olhou para mim tão imperativamente e nunca nenhum sorriu pra mim de um jeito tão gostoso e charmoso. Nunca convivi diariamente com um menino. E tudo mudou, com o fato dele morar comigo, no meu apartamento.

Jimmy me puxou para a porta principal e disse numa voz cavernosa:

— Suba as escadas. É a quarta porta bem á direita.

— Ei! Isso é uma invasão de domicílio e de privacidade.

Ele passou a mão pelo cabelo preto e plumoso.

— Ei, não esqueça que eu moro aqui. — Ele me empurrou.

— Você morava. — Murmurei, erguendo a mão direita.

— Bom, Senhorita Keaton, se eu não morasse aqui, não teria tomado algumas garrafas de cerveja bem à beira da lareira. — Ele sorriu.

É, e eu também.

Quando ele abriu a porta branca, a sala de estar gigante foi a primeira coisa que fui capaz de visualizar. Ela estava cheia de sombras e o tapete no chão — que era de pele de urso, ou de algum outro animal peludo — dava um ar de ausência na sala, repleta de móveis antigos e elegantes. A lareira, por sua vez, estava com chamas baixar, provocando apenas o barulho tranquilo dos estalos dos gravetos que Jimmy havia colocado lá mais cedo.

— Bem-vinda. — Ele sussurrou em meus ouvidos, bem atrás de mim. Senti seu hálito quente penetrar sobre meu corpo. Era uma sensação gostosa. No entanto, eu estava tão atenta reparando o ambiente no qual Jimmy viveu que quase pulei Um km de tanto susto.

Olhei o piano bem na minha frente, e continuei andando.

— Bela casa — murmurei. E quando vi que as garrafas de cerveja que Jimmy havia bebido em cima da mesa de centro, continuaram falando — Você, um... Quer assustar sua família?

Ele deu um risinho abafado, aproximando-se de mim.

— Eu costumava fazer isso. Beber, sacou? Todo dia eu deixava tudo do mesmo jeito. Mas é divertido assustar meus pais e minha irmã. Eles acham que quando saem de casa, eu fico aqui.

— Assim como você faz comigo, não é? Antes de se materializar. E poxa, Jimmy Fields, você é muito cruel.

— Você nem imagina o quanto. — Ele fez sua mesma trajetória. Sorriu maliciosamente e me fitou com seus olhos de esmeralda. E eu, claro, fiquei como sempre: com aparência de mongoloide.

— Certo. No tempo em que você não está grudado em mim e nem me protegendo, você fica enchendo a cara e se aquecendo na lareira?

— Bom, é... Mais ou menos isso. Gosto de ficar aqui na minha casa e fazer as mesmas coisas de antes. Mas, não te mostrei meu lugar, ainda.

Ele me encaminhou para a escada em espiral e fomos parar, logo  na quarta porta á esquerda. Ou, seja, o quarto dele.

E, quando ele abriu a porta e se jogou na cama como se não tivesse morto, senti uma coisa estranha no estômago, outra vez.

— Seu quarto. — Adivinhei.

Ele colocou seus braços no pescoço, como se estivesse apenas relaxando.

Suas pernas se cruzaram.

E não vou te enganar não, em. O quarto era realmente uma zona. Sério, o quarto estava uma bagunça só. Nem consegui enxergar meus pés, de tanta coisa jogada no chão. Livros, CD’s, meias, DVD’s, cadernos roupas e acredite, restos de comida. Mas afinal, quarto bagunçado é coisa típica de qualquer menino, não é?

Talvez os pais dele quisessem fazer o que a maioria dos pais fazem quando perdem os filhos: ”deixar do jeito que ele deixou antes de morrer”.

— Bom, é aqui. — Ele sorriu de forma que me confortou, fazendo-me sentar em sua cadeira de rodinhas.

Olhei a bagunça em volta.

— Você fica nessa bagunça? — Fiz cara de nojo, tirando uma meia do monitor de seu computador.

Ele riu e me jogou um travesseiro. A sorte foi que me esquivei.

— É meu habitat natural, Bells, algum problema? — Ele arremessou seu porta Cd’s, que por acaso me acertou bem na minha cabeça.

— Ai! — Gemi, massageando minha cabeça. — Bem, esse cheiro de queijo também fazer parte do seu habitat natural? Sabe, do seu ambiente?

Ele pegou uma meia azul e jogou pela janela, que estava aberta.

— Não, me desculpe. — ele fez cara de nojo, assim como eu. — Eu tenho o cheiro bom, quer provar? — Ele balançou suas sobrancelhas para cima e para baixo.

— Não, obrigada — hesitei. — Mas, porque vem pra cá? Tipo, é uma tremenda bagunça, e o cheiro, nossa, nem preciso comentar. — A porta de vidro que dava para a sacada estava aberta, e um ar gélido penetrou diretamente em mim, fazendo-me bater o queixo.

Ele deu de ombros.

— Cara, eu apenas gosto de ficar aqui. — Ele fitou o teto — No que diabos eu estava pensando quando entrei naquele ônibus para fazer aquela prova? Eu não costumava fazer provas. E quando finalmente fui fazer a droga da prova, eu simplesmente morri!

— No ônibus incendiado? — Perguntei, ao acaso. Sabe, eu nem pensei em fazer essa pergunta. Simplesmente perguntei do nada.

Ele que estava deitado, se sentou, com os olhos atentos em mim.

— Sim! Como você sabe?

— Bom — dessa vez, escolhi atentamente as palavras no qual eu iria usar — eu li a matéria no jornal, há algum tempo. E, um cara salvou Ana, minha irmã.

Os olhos de Jimmy se arregalaram, como os olhos de um falcão.

— Ana!? — Pela primeira vez, ele que sempre foi tranquilo, estava com sua voz extremamente trêmula.

— Sim. — Parei de me rodar na cadeira de rodinhas e deixei meu rosto há uns oito centímetros de distância do rosto de Jimmy.

Ele me olhou aterrorizado, como se eu estivesse comendo vidro.

— A garotinha ruiva, chorona. Ana! Ela vive com você, ela vive dentro do quarto, brincando.  Fui eu! Eu que a salvei quando o ônibus estava sendo assaltado. Eu a salvei, ela e a garota loira.

Joguei meu cabelo todo bagunçado para trás e voltei ao tempo.

Na manhã do primeiro dia de aula em que eu vi a foto do cara bonitão com expressão estrangulada, segurando a perna, que estava ferida, era ele! Jimmy Fields estava no jornal do sábado e eu só o vi na segunda por causa de Ana. E, quando o vi, no quarto. Tudo se encaixou, como um quebra-cabeça de 500 peças. Ele tinha sido morto por ter feito o bem. Por ter salvado Ana e a babá dela. Por isso que ele foi mantido refém com os outros passageiros. E por isso, que morreu queimado.

— Oh meu Deus! É minha irmã.

— Que diabos?

Ficamos ambos sem palavras. O que poderíamos dizer, estávamos pasmos com a situação. Era tão estranho. Sabe, agora, tudo fazia sentido. Ele era o garoto do jornal. Simplesmente inacreditável. Por isso que Ana não entrava no meu quarto quando ele estava lá me assustando. Ela deveria sentir algo estranho. Assim como eu senti, quando o vi pela primeira vez, materializando-se em minha frente.

O mais estranho, era que Jimmy deveria estar protegendo Ana, e não a mim.

E, no nosso momento de silêncio total, observando fotos no criado mudo e na parede verde-escura do quarto de Jimmy, descobri uma coisa ainda mais estranha. Ele e Louise — é a Louise, minha amiga — estavam pousando sorridentes em uma foto em algum lugar ensolarado, que fazia o sorriso de ambos brilharem.

Arregalei os olhos, como uma coruja.

— Louise? — Minha voz soou tensa.

— É — ele olhou para a fotografia — minha irmã.

— Inacreditável. — Murmurei, boquiaberta.

 


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