Vidas cruzadas escrita por slytherina


Capítulo 10
Família




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Dean saiu para cavalgar. Precisava extravasar, abrir seu coração, confessar seus pecados e obter absolvição. Se não do padre, ao menos de sua consciência. Gostaria de se aconselhar com sua mãe, mas a mente dela era simplista. Iria escolher o caminho mais lógico e desenxabido. Não era isso que ele queria. O que ele faria? Por um lado desistira de uma conquista certa, porque o homem era um pai de família. É verdade que estava apaixonado, mas quanto tempo duraram suas paixões? Uma noitada? Um final de semana? Tivera relacionamento mais duradores com amigos com benefícios, do que com suas paixões fugazes.

E Jimmy? Eles se davam bem, é certo. Tinha um lado selvagem naquele lindo anjo de asas partidas, e isso o prendia a ele, mas … ninguém é perfeito. Ele ainda descobriria algo irritante e inaceitável sobre seu belo parceiro, que iria fazê-lo se afastar e nunca mais procurá-lo. O que havia de errado com você, Dean Singer, que sempre procurava defeito em tudo, e motivo para terminar relacionamentos? Talvez fosse ele, Dean, o traumatizado. Dean riu ante o pensamento. Não, ele era apenas um solteirão boa-vida, que não queria dar adeus a seu dolce far niente.

Após queimar neurônios decidiu não se casar. Ainda. Preferiu se acostumar com a idéia de ter Jimmy por perto, e se conhecerem melhor, de verdade, e não apenas ao corpo um do outro. Por isso passou a frequentar a casa de Jimmy e ele a sua. Viajavam juntos para passarem o final de semana na Califórnia ou Nova York, e inclusive marcaram férias para o Havaí. O que era ridículo, pois ambos não trabalhavam, ocupando cargos decorativos nas empresas dos pais. Jimmy, por uma boa razão, tinha problemas psicológicos, mas Dean não tinha desculpas, era um playboy.

As famílias tentavam tornar aquilo oficial, por isso viviam marcando jantares, almoços, recepções, com o intuito de sacramentar a união dos dois homens, mas Dean ficava irritado com aquela pressão, e Jimmy apenas ria. Tanto fizeram, que Jimmy marcou o enlace para dali a um ano, tendo posto o anel de compromisso no dedo de seu agora noivo, diante de convidados da alta sociedade. No dia seguinte, foi anunciado nas colunas sociais, o noivado dos herdeiros Dean Singer e Jimmy Novak, gays assumidos. Dean tomou um porre, não exatamente para celebrar.



     Enquanto Dean colocava a corda no pescoço e a apertava um pouco mais, a cada dia. Sam retomou sua vida de antes. Ruby e o bebê receberam alta hospitalar e voltaram para casa. Eles o chamaram de Alaistair. Era um bebê calado, com grandes olhos azuis, que gostava de mirar fixamente, e aprendeu a reconhecer papai e mamãe desde cedo. Sam cercou mãe e filho de cuidados, substituindo Ruby em tudo, exceto amamentar.

Lilith a princípio ficou encantada com o novo membro da família. Um bebezinho precioso e delicado, mas ao perceber que seus pais viviam 24 horas por dia para cuidar do novo entezinho, esquecendo-se dela, foi tomada por um sentimento estranho, em que se misturavam ciúmes, raiva, rejeição e revolta. Ela teve necessidade de destruir alguma coisa, para extravasar sua frustração. E a princípio, quebrar seus lápis de cor aplacou sua ira.

Ao perceber o que estava acontecendo, Sam dedicou tempo extra para ela. Conversavam, brincavam e passeavam. Por precaução marcou uma consulta com uma psicóloga infantil. Ruby não deu importância à birra da filha, dizendo apenas que a fedelha era muito mimada, e que deveria ser castigada por quebrar seu material escolar, pois isso funcionara com ela. Sam ponderou que nesse caso, sua esposa estava errada.

Ruby o perdoou por sua infame escapada, mas ainda tinha curiosidade em saber quem era sua rival. Quanto ao período em que passou internada no hospital, ela o creditou totalmente a Sam. Sabia que ela e o bebê poderiam ter morrido, e não perdia ocasião em lhe atirar isso na cara. Ao que seu maridinho sempre respondia "Sinto muito! Isso nunca mais irá se repetir."

Um belo dia, Sam viu uma notícia nas colunas sociais do jornal local: "Dean Singer e Jimmy Novak, ricos herdeiros, noivam em recepção de gala". A foto dos dois homens ilustrava o artigo. A lembrança do encontro fatídico ainda o assombrava. Ele não culpava Dean pelas consequências, mas a si mesmo. Ficou um pouco perturbado ao se dar conta que se encontrara com um homem gay, e que inclusive sonhara com ele, mas ao constatar o quão absolutamente bonito o outro era, se viu justificada a forte impressão causada.

Sam obrigou-se a não pensar mais no assunto.



      Certa manhã, Sam estava entregando caixas de verdura em um supermercado, quando se deu conta que alguém o estava observando. Num relance seu olhar foi apanhado por Dean Singer, encostado ao caminhão da fazenda de sua mãe. Sam ficou encabulado e nervoso, mas acenou para ele e deu um pequeno sorriso. Contrariamente ao que esperava, Dean não se aproximou. Assim que o empregado retornou de entregar o pedido, ele entrou no caminhão e se despediu com um toque no chapéu de cowboy que usava. Sam ficou decepcionado. "Para um cara que queria ser meu amigo, esse aí parece que quer me ver pelas costas." Isso estragou seu dia, e até Ruby notou seu estado de humor. Ele deu a desculpa de que estava cansado.

Cuidar de seu rancho dia e noite, para sobreviver e sustentar sua família, era sua vida. Havia se casado com a mulher de seus sonhos. O fato dela ser perigosa, e virulenta como uma víbora, era apenas um tempero a mais no casamento. Seus filhos eram seus maiores bens e o legado que ele deixava para o futuro. Não havia do que se queixar. As humilhações e exclusão social ficaram no passado, não influenciando em nada a sua situação atual, mas ele não conseguia diminuir a amargura que sentia, por perder a oportunidade de ter a amizade de Dean Singer. Era como se ainda o xingassem de "otário" e "pirado", pelos corredores e ruelas. Consolou-se dizendo que afinal de contas vinham de classes sociais diferentes, e não poderiam se misturar. Era a vida.

Dean também ficou perturbado por encontrar Sam, novamente. Ele estava pouco a pouco capitulando ante a idéia de se casar com Jimmy, pois desistira de Sam. Só não conseguia diminuir a tristeza infinita que o afligia, e um tantinho de remorso que sentia, por estar de certo modo enganando seu noivo. Ele foi ao minibar da sua mãe e serviu-se de alguns drinks. Fazia tempo que não se embriagava, e ele considerou aquele um motivo justo. Entornou uma garrafa de rum e outra de conhaque. Já estava abrindo um velho whiskey, quando sua mãe tomou a garrafa de sua mão.

"O que houve agora? Por que essa necessidade de se afogar em álcool, Dean?" A matriarca perguntou.

"Ixo não é … da xua conta." Ele respondeu com a voz embolada. "Minha vida não é … da xua conta." Ele avançou sobre a mãe para tomar a garrafa, sem sucesso, perdendo o equilíbrio. Quis se segurar nos móveis, mas caiu sentado no chão.

"Eu sei que não mando na sua vida, filho, mas me preocupo com você." Ellen ficou observando o filho no chão, todo desajeitado e com a cabeça tombando. Sentia raiva e ao mesmo tempo pena. Queria ajudá-lo e também lhe dar uns tabefes, por se comportar como um alcoólatra. Resolveu sentar-se em um sofá por perto. Olhou para o filho criticamente, e resolveu abrir artilharia pesada. "Jimmy não merece isso de você. Ele é um sujeito decente, honrado e fiel. O melhor homem de todos. O melhor que você jamais encontrará na sua vida. E o que você oferece a ele? Bebedeiras e queixumes? Seja homem ao menos uma vez, Dean, e pare de agir como um garoto mimado, que faz birra porquê não pode ter o que deseja."

Dean olhou para ela. No meio de seu torpor alcoólico, ele sabia que a mãe tinha razão, por outro lado, ele se revoltava no íntimo de seu ser por ser manipulado a oficializar um relacionamento, contra a sua vontade. "Eu não … preciso … me casarr . Eu não … quero me casarr. Eu não … quero … lhe dar netoss. Eu não … quero nada dixo." Ele falou arrastado. Sentindo a língua pesada, de difícil controle. Sem ter nenhum motivo começou a chorar. Sentiu o rosto banhado em lágrimas, e coriza entrar na boca. Queria continuar contestando a mãe, mas apenas um nome lhe saía da boca. "Sammy ... Sammy …"

Ellen ficou exasperada e penalizada pelo estado do filho. "Dean! Ainda com essa estória do Sam? Minha nossa senhora! Tire esse homem da cabeça, filho!" Ellen levantou-se e foi juntar o filho do chão. Assustou-se ao receber ajuda. Mãos fortes suspenderam Dean e o ampararam, levando-o em direção ao seu quarto.

Era Jimmy.

Ellen colocou a mão sobre a boca, temerosa de que Jimmy tenha escutado algo do diálogo deles. E se esse fosse o caso, aquele casamento estava condenado a não se realizar.


    Tarde da noite, Dean acordou com náuseas. Correu para o sanitário e vomitou a alma. Durante sua provação, ele sentiu mãos fortes o amparando, e ternas carícias nas costas que procuravam amenizar seu sofrimento. Foi ajudado a voltar para a cama, onde Jimmy ficou acariciando seus cabelos, e lhe dizendo que tudo iria ficar bem pela manhã. Ele fechou os olhos e entregou-se de bom grado aos cuidados de seu noivo.

Acordou algumas horas depois com muita dor de cabeça, e Jimmy lhe serviu uma beberagem esquisita, que ele garantiu que era muito bom para curar ressacas. Dean o olhou ternamente, sentindo-se indigno de tanto amor.

"Você é um anjo dos céus, Jimmy. Eu não mereço você. Só mereço o fogo do inferno."

"Não mais. Eu te tirei do fogo do inferno, e te trouxe para o paraíso. Só não me peça por virgens, pois elas são raras." Ambos riram.

Ficaram se adorando com os olhos.

"Quem é Sammy?" Jimmy perguntou à queima-roupa.

Dean ficou lívido. Respirou fundo e resolveu enfrentar o fim de seu relacionamento com o noivo. "Um homem por quem me apaixonei. Ele é casado, e eu me afastei para não prejudicar seu casamento. Chocado?"

"Um pouco. Você ainda quer casar comigo?" Jimmy perguntou placidamente.

"Eu ainda tenho chance?" Dean perguntou nervoso, erguendo-se da cama de sopetão, o que fez a dor de cabeça voltar lancinante. Ele gemeu e se deixou arriar novamente na cama. Jimmy voltou a acariciar seus cabelos, enquanto beijava o canto de sua boca.

"Você tem todas as chances comigo, Dean. Estou apaixonado por você, mas não vou te obrigar a ficar comigo. Se você ainda quiser tentar, podemos viver juntos, construir um relacionamento baseado em confiança e respeito mútuos." Jimmy continuou acariciando seus cabelos. "Além é claro, de muito sexo." Ambos riram.

"Eu quero, Jimmy. Encontrar você foi a única coisa certa que eu já fiz na vida. E eu não quero te perder. Não, mesmo." Dean beijou a mão de Jimmy que estava sobre seu peito.

"Promete que nunca vai me chamar de Sammy?" Jimmy perguntou num fio de voz.

Melhor do que promessas vazias, Dean segurou o outro pela nuca e o beijou apaixonadamente.

Eles se casaram no tempo previsto e foi o casal mais lindo que já apareceu nas colunas sociais.

 


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