Um Futuro Escrito em Gelo e Fogo escrita por crownprincess


Capítulo 4
O Sol do Inverno


Notas iniciais do capítulo

Meus amores, muito obrigado pelos comentários e principalmente pela paciência! Fico muito feliz em saber que vocês estão gostando da estória. Mais um capítulo para vocês e boa leitura!



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Os olhos de Jon estavam cansados e fechados na penumbra que tomava conta do quarto, enquanto os músculos exaustos de seu corpo ardiam após a longa jornada que enfrentou durante a travessia de Correrrio até Winterfell. Contudo, não conseguia dormir. Movia-se na cama, e podia sentir as dobras dos pesados cobertores lamberem sua pele, utilizando-os mesmo não sentindo frio. Achava curioso que após ter sido trazido de volta pela Mulher Vermelha, seu corpo não reagia a temperaturas extremas da mesma forma que antes de ser morto, pelo contrário; enquanto os dentes das outras pessoas batiam em suas bocas devido ao clima quase glacial do inverno nortenho, Jon não sentia incômodo algum. O mesmo ocorria quando tomava banho com água quase em ponto de fervura que poderia causar queimaduras terríveis em qualquer outra pessoa, mas que nele não fazia nem mesmo cócegas.

Virou-se para o lado e abriu os olhos, incomodado com o pensamento. Jon sabia que não era natural uma pessoa levantar dos mortos, mas perguntava a si mesmo se aquilo era uma sequela de sua experiência. Teria ele adquirido a capacidade de não sentir nada, como um cadáver? Sacudiu a cabeça, tentando afastar aquilo de sua mente. Ergueu o corpo, sentou-se na cama e encarou o escuro, sentindo-se sozinho. Aquela situação era tão estranha... Até pouco tempo, era o apenas o bastardo de Lorde Eddard Stark, que foi enviado para Patrulha da Noite para passar o resto de sua vida em vigília e impedir que tudo que estivesse além da Muralha passasse para as terras ocupadas pelos homens civilizados. Tinha morrido, ressuscitado e agora era o Rei do Norte e do Tridente, Soberano do Vale, responsável por proteger a vida dos homens e mulheres de mais da metade de Westeros.

Estava imerso em seus pensamentos quando ouviu três leves batidas contra a porta do quarto. Não poderiam ser um de seus homens, pensou. Soldados não possuíam a delicadeza necessária para bater na madeira daquela forma.

― Entre. ― foi a única coisa que Jon disse.

A pesada porta foi aberta e ele pôde ver Sansa entrar em seu quarto segurando um pequeno castiçal com uma mão, enquanto fechava a entrada atrás de si com a outra. Jon viu o fogo das velas iluminar o rosto de sua irmã, mostrando o contraste gritante entre sua pele alva e seus cabelos que possuíam quase a mesma cor das chamas.

― Desculpe-me, o acordei? ― ela perguntou.

― Não. Estou cansado, mas não consigo dormir.

― O que tira o sono do Rei do Norte? ― Sansa sorriu e caminhou até ele o irmão, sentando-se na beira de sua cama ― O que o inquieta tanto a ponto de ser mais forte que o seu cansaço?

― Tantas coisas... ― Jon admitiu ― Tenho que lidar com vários lordes, administrar as terras, os recursos, o dinheiro... E agora que conquistamos as Terras Fluviais, o trabalho será em dobro. Ainda há o Vale e Petyr Baelish...

― Não se preocupe com Mindinho. ― a garota o interrompeu ― Eu lido com ele.

Jon a encarou e cerrou os olhos.

― Já lhe disse que não a quero perto daquele homem, Sansa.

― E eu já lhe falei que não sou mais aquela garotinha tola de anos atrás. ― a expressão de Sansa mudou, e seu sorriso deu lugar a uma linha fina em seus lábios ― Sei muito bem o que Baelish deseja.

― Ele deseja você! Pelo amor dos Deuses! ― Jon levantou-se da cama e caminhou até a janela, que dava uma visão ampla do pátio de Winterfell.

― Exatamente! E essa é a nossa vantagem! ― ela seguiu o irmão e tocou em seu ombro nu ― Ele fará tudo por mim se eu souber como manejá-lo. Sabe muito bem que precisamos do apoio do Vale, e Mindinho controla meu primo Robin. Não devemos confiar em Petyr, mas ele não descansará até que me tenha, e nós dois sabemos muito bem que nunca isto jamais acontecerá. Mas enquanto ele não se dá conta disto, temos que tirar todo o proveito que pudermos da situação.

Jon ficou em silêncio, observando a neve cair no pátio enquanto a irmã falava. Não gostava daquilo, mas sabia que ela estava certa. Odiava a ideia de ter um homem tão sínico e desprezível como aquele tão próximo de Sansa, ainda mais depois de tudo que ela passou ao lado de Ramsay Bolton, mas tinha consciência de que era necessário agradar o regente do Vale.

― Tudo bem, faça como quiser. Mas se aquele homem tentar tocar em um fio de cabelo seu, o matarei com minhas próprias mãos. ― Jon virou-se e encarou os olhos azuis intensos da irmã.

Sansa sorriu e assentiu com a cabeça. Estendeu a mão até o rosto do irmão e passou a ponta dos dedos sobre sua espessa barba negra.

― E você? Já decidiu com quem casar? ― a garota perguntou.

― Não comece com isso. ― Jon a cortou ― Não desejo me casar com ninguém, sabe bem disso.

― Sim, eu sei. Mas agora é Rei, e como tal, é seu dever casar com uma senhora honrada e deixar descendência. Ou pretende deixar o Norte e as Terras Fluviais sem um herdeiro que lhe suceda?

Jon não sabia como lhe responder aquilo. Antes, a ideia de ter um filho lhe causava frios na espinha, pois a mera hipótese de colocar mais um bastardo Snow no mundo lhe parecia terrível. Mas agora as coisas eram diferentes; apesar de ele próprio ser um filho ilegítimo, Jon era Rei, e mesmo que continuasse com seu sobrenome de bastardo, poderia ter filhos e fazer deles Stark de nascença. Sabia que Sansa estava certa em dizer precisava de uma esposa e de um herdeiro, além das adicionais vantagens políticas que um casamento lhe traria. Contudo, não tinha certeza se estava preparado para aquilo.

― Então, quem será? ― Sansa lhe perguntou, inquieta por não ter tido obtido uma resposta do irmão ― Uma das garotas Manderly? Lynessa Flint? Ou talvez Jonella Cerwyn?

― Provavelmente nenhuma delas. ― Jon enfim lhe respondeu ― Talvez eu nunca me case. Talvez o meu herdeiro seja você ou o filho que você terá com um dos lordes, e então a coroa voltará repousar sobre a cabeça de um verdadeiro Stark.

A garota rolou os olhos.

― Não vou me casar com nenhum deles. Você prometeu que não me faria casar com alguém que eu não quisesse, ou por acaso esqueceu? E você é um verdadeiro Stark, filho do falecido Senhor de Winterfell e Protetor do Norte.

― Sou filho de Eddard, mas continuo sendo bastardo, rei ou não. Acha mesmo que algum senhor permitiria que sua filha casasse comigo?

― Acha que Winterfell está abarrotada de pessoas, principalmente mulheres por qual razão? Todas desejam ser rainhas, e não as culpo, já desejei a mesma coisa um dia. ― Sansa deu uma longa pausa ― E eu me casaria com você se não fôssemos irmãos.

Jon riu do que a garota disse.

― Provavelmente eu também me casaria com você. É uma pena não sermos Targaryens para podermos realizar a cerimônia.

Sansa acompanhou Jon e gargalhou, fazendo com que as paredes de Winterfell mais uma vez testemunhassem Starks tendo um momento agradável depois de tanto tempo.

***

O salão estava lotado de pessoas, fazendo com que a mistura de vozes fosse quase ensurdecedora. O tilintar de pratos e copos se mesclava com a música ao fundo, fazendo com que os nortenhos esquecessem por um instante que finalmente o inverno batera em suas portas. Jon observava, ao lado de Sansa, seus vassalos comemorarem a recente vitória que seu exército teve nas Terras Fluviais, que de uma só vez significava a retomada de Correrrio, a derrocada dos Freys e a obtenção de solo bom e fértil para a plantação da comida que os abasteceria pelo resto da estação, além de se mostrar uma chance de ampliar o grupo militar que enfrentaria os Outros quando a hora chegasse.

Jon olhou para sua esquerda e viu Sansa sorrindo, enquanto contemplava a festividade; vê-la tão contente fez o Rei sentir que todo o esforço que despendera na conquista do domínio ancestral dos Tully valeu a pena, pois a felicidade da irmã, junto com a sua missão de deter o mal além da Muralha e encontrar Arya e Bran, era a prioridade em sua vida. Não teve meios de impedir que Sansa sofresse nas mãos dos Bolton, e se sentia impotente por saber das coisas que ela passara e ter sido incapaz de socorrê-la. Contudo, moveria os céus e a terra para tentar compensá-la e a fazer feliz pelo resto de seus dias.

Sua atenção foi roubada quando uma jovem de cabelos louro-esverdeados aproximou-se da mesa principal.

― Majestade. ― a garota fez uma elegante e longa cortesia para Jon ― Alteza. ― fez o mesmo gesto em direção à Sansa, porém de forma mais breve.

― Lady Wylla Manderly. É um prazer vê-la aqui. ― Jon lhe disse.

― É um prazer estar aqui para presenciar o triunfo de Sua Majestade e da Casa Stark. ― um sorriso brotou em seus lábios ― Rezei dia e noite para que os Sete lhe abençoassem com a vitória, e fico muito feliz em vê-lo são e salvo.

― Agradeço pelas suas orações, senhora. E também fico grato aos seus deuses por escutá-las.

― Não faço mais que minha obrigação, meu Rei. A Casa Manderly possui uma dívida enorme com a sua família, e cada inimigo que derrota no campo de batalha prova de que o Norte está novamente nas mãos de uma pessoa competente. ― ela disse.

Jon sempre ficava admirado com a obstinação de Lady Wylla. Ela era tão jovem – talvez tivesse a mesma idade que Sansa – e apesar disto, sempre mostrou uma grande admiração pela Casa Stark. Foi contado a Jon que ela chegou a confrontar os Freys para defender a honra dos lobos após o Casamento Vermelho. E tinha que admitir que ela possuía uma beleza singular devido a seus longos cabelos louros tingidos de verde.

― Muito obrigada, Lady Manderly. ― Sansa interpôs-se na conversa ― Meu irmão nos trará muito mais vitórias, tenho certeza disto.

― Concordo plenamente, Princesa. Jon era o Rei que precisávamos, aquele que unirá os reinos sob a bandeira do lobo gigante. Se os Deuses forem bons e nos ajudarem, talvez até mesmo consigamos conquistar Porto Real um dia. ― os olhos de Wylla brilharam ao pronunciar as palavras.

― Não creio que iremos tão longe, Lady Wylla. Nossos planos agora são outros, assim como o inimigo. ― Jon lhe respondeu.

― Entendo. ― a garota pareceu decepcionada, mas tentou esconder o sentimento ― Minha família apoiará qualquer decisão que tomar, Majestade. Somos seus humildes servos.

― Sei bem disso. A Casa Manderly sempre foi de grande apoio a Casa Stark, e esperamos que a ligação que nos une se fortaleça ainda mais no futuro.

― É o que também espero, Majestade. Do fundo do meu coração.

A garota sorriu e fez uma rápida vênia, voltando, em seguida, para a mesa onde sua família estava acomodada. Jon a observou por alguns instantes e os dois trocaram alguns poucos olhares furtivos, enquanto Wylla lhe dirigia sorrisos faceiros.

― Não me diga que terei que dobrar os joelhos para ela. Por favor, Jon... ― Sansa disse, tocando discretamente no braço do irmão, tentando chamar sua atenção.

― Do que está falando? ― ele parou de encarar a garota Manderly e virou-se em direção à irmã.

― De transformar Wylla Manderly em sua esposa. ― a ruiva revirou os olhos ― Está mais do que na cara que o que ela mais deseja é tornar-se parte de nossa família, e consequentemente virar Rainha.

― Você mesma disse que eu precisava casar e prover herdeiros à Coroa. Bem, posso querer seguir o seu conselho agora...

― Logo com aquela garota? Imagine as cores com as quais ela tingiria os cabelos dos príncipes e das princesas que lhe desse? ― Sansa não conseguia disfarçar seu incômodo

A irmã talvez achasse estar certa, pensou Jon, e concordava que jovem Manderly tinha uma aparência diferente, mas aquilo lhe agradava. Ela era uma garota doce e sincera, além de ter uma imensa devoção e lealdade para com os Stark. Havia também a questão de seu nome. Wylla. Era o nome de sua mãe, aquela que nunca conheceu e da qual seu pai nunca falou. Apenas descobriu como se chamava porque escutou Ned conversar com o Rei Robert sobre as aventuras que tiveram durante a Rebelião. Como seria ter como esposa uma mulher que tinha o mesmo nome daquela que lhe trouxe ao mundo?

Jon abriu a boca para responder à irmã, mas percebeu que as vozes haviam sido silenciadas, assim como a música que antes ecoava alegremente pelo ambiente. Deu-se conta que todos encaravam a entrada do grande salão, e esticou o pescoço para ver do que se tratava. Viu uma garota adentrar a câmara sendo escoltada por dois soldados Stark, e notou que o burburinho recomeçou assim que ela ergueu sua cabeça, deixando o rosto à mostra. Encarou os olhos azuis da garota, que tinha sua cor intensificada graças à pele alva e ao cabelo marrom que estava preso em uma trança que ia até sua cintura; sentiu que aqueles traços lhe eram familiares, e tentou revirar sua mente atrás de alguma informação que identificasse aquela jovem.

Os homens a levaram até a mesa onde Jon estava, e a desconhecida o encarou com um olhar aterrorizado.

― Majestade, essa é Alys Karstark, irmã do traidor Harald Karstark. Ela se autoproclama Senhora de Karhold. ― um dos soldados lhe disse.

― Dizem que ela anda a criticar o reinado de Sua Majestade, alegando que possui melhores pretensões à coroa do que o próprio Rei. Parece que a traição corre no sangue da família. ― o outro homem que a acompanhava se manifestou, cuspindo no chão após terminar de dizer as palavras.

A intensidade do burburinho aumentou, e as pessoas começaram a elevar suas vozes, chocadas pelo que acabaram de ouvir. Jon, por outro lado, lembrou-se de onde conhecera a garota. Recordou-se de vê-la pela primeira vez quando tinha sete anos, numa visita que Rickard Karstark fez à Winterfell; lembrou-se dos esforços que o senhor fez para arranjar um casamento entre Robb e sua filha, e de como ele próprio dançou com Alys quando eram crianças. E agora ele era Rei, enquanto ela era o que havia sobrado da linhagem principal dos orgulhos Karstark.

― Nunca levantei minha voz para falar contra o Rei! ― Alys defendeu-se ― Eu reconheço a autoridade real de Jon, e quem diz o contrário é um mentiroso! A única coisa que desejo é poder obter a herança que me é de direito! A herança dos Karstark, não dos Stark!

As pessoas passaram a falar indiscriminadamente, tecendo comentários a respeito da situação – muitas, inclusive, clamavam pela cabeça de Alys. Jon virou-se para Sansa e percebeu que ela estava tão surpresa quanto ele; chegou à conclusão de que teria que agir rapidamente, ou as coisas sairiam de seu controle.

― Silêncio! ― o Rei bradou, enquanto batia com uma caneca de aço sobre a grande mesa de madeira ― Quero entender o que está acontecendo, e isto será impossível se os senhores não se acalmarem!

O barulho cessou assim que Jon terminou de falar. Os lordes encaravam seu Rei com olhares de curiosidade, esperando saber o que ele diria e o que faria com aquela situação tão embaraçosa na qual foi posto.

― Não condenarei a Senhora Karstark antes de escutar sua versão da história! ― ele disse à plenos pulmões para que todos lhe escutassem ― E também não permitirei que toquem nela até que eu tome uma decisão!

Novamente silêncio. Alys fitou Jon e era possível notar seu alívio, ao qual a menina externou curvando sua cabeça em direção ao Rei.

Jon viu Davos do outro lado do salão e fez um sinal com a mão para que ele se aproximasse. O Cavaleiro das Cebolas obedeceu e cruzou o cômodo, rodeando a grande mesa para ficar ao lado de seu Rei.

― Sor Davos, leve a Senhora Karstark até meu gabinete e me aguarde por lá. Faça de tudo para que ela se sinta confortável e segura, pois pretendo ter uma conversa com ela.

― Como desejar, Majestade.

O homem assentiu com a cabeça e caminhou até Alys, cochichando-lhe algumas palavras. Depois de alguns instantes, a garota o seguiu até a saída do salão, e as cabeças de quase todas as pessoas que ali estavam a acompanhavam enquanto ela caminhava.

― Peço licença aos senhores, mas preciso me retirar para resolver alguns problemas. Deixo-lhes com a Princesa, e espero que aproveitem o resto do banquete. ― Jon tentou forçar um sorriso, mas falhou miseravelmente.

Levantou-se da cadeira na qual estava sentado, e sentiu uma mão segurando seu braço.

― O que vai fazer? ― Sansa lhe perguntou, confusa.

― Confie em mim, irmã. Tentarei fazer o melhor para nos proteger.

A ruiva soltou o braço de Jon e permitiu que ele se fosse. O Rei sentiu os olhares dos nobres lhe perfurando enquanto caminhava pelo salão, escoltado por dois soldados. Sentiu-se melhor quando finalmente saiu do cômodo e tentava entender o que de fato acontecera; num instante estava discutindo com Sansa um possível casamento seu com Wylla Manderly, e em outro Alys Karstark lhe era apresentada como uma traidora. Pensava que sua vida era melhor quando era apenas o filho bastardo de lorde Eddard.

Quando finalmente chegou ao seu gabinete, tomou uma rápida e intensa lufada de ar antes de entrar na sala. Hesitou, mas entrou na saleta e deu de cara com Davos, que o aguardava em pé próximo à porta.

― Majestade. ― ele curvou a cabeça.

― Sor Davos.

Os olhos de Jon passearam pelo ambiente, até que viu Alys encolhida em uma das poltronas, ainda assustada com a situação. Ele dispensou os dois homens que lhe acompanharam, e os instruiu a aguardarem na porta do cômodo e impedir qualquer um que tentasse invadir a reunião.

― Lady Karstark. ― Jon a saudou ― Agora finalmente podemos conversar sobre o que realmente aconteceu.

― O que ocorre é que querem roubar minha herança, e para isto, me acusam de traição... Mas peço a Sua Majestade que não acredite, por favor! ― os olhos de Alys ficaram úmidos, e parecia que ela poderia começar a chorar a qualquer momento.

― Fique calma, por favor. ― o Rei foi até ela e sentou-se na poltrona que ficava em frente àquela a garota estava ― Me diga quem pretende roubar sua herança. Conte-me a história desde o princípio.

― Meu tio-avô, Arnolf Karstark. Ele sempre quis que eu me casasse com seu filho, Cregan, para que tivessem uma reivindicação mais forte à Karhold. ― a garota fungava enquanto falava ― Depois da morte de meu pai e de meu irmão, fui a única que restou da linhagem principal da família, e assim tornei-me a Senhora de minha Casa. Recusei a proposta de casamento de Cregan, e tio Arnolf, que é o castelão de Karhold, começou a incitar as pessoas contra mim, dizendo que eu não podia governar por ser uma mulher e que eu era uma traidora, assim como Harald. Mas juro que pretendia vir até Winterfell o mais rápido possível para jurar lealdade à Sua Majestade, mas não pude! Tinha que lidar com rebeldes dentro de minha própria família!

Alys mal terminou de contar o que aconteceu, e as lágrimas que estavam presas começaram a transbordar. Ela chorava com intensidade, como se tivesse guardado todo aquele sentimento dentro de si por tempo demais. Num impulso, Jon a abraçou, tentando acalmá-la, e sentiu o couro de sua roupa ser encharcado pelo pranto da garota Karstark.

― Não chore, Senhora. ― Jon a consolou ― Está segura agora. Ninguém irá machucá-la aqui.

― Mas eles tentarão, não importa onde eu estiver. ― ela deu um longo suspiro, tentando parar de chorar ― Arnolf não parará até que eu esteja casada com Cregan ou morta. Foi ele quem inventou aquela história de eu dizer que tenho uma melhor pretensão à Coroa do que você. Acho que espera que Sua Majestade me execute como traidora.

― Não farei isso. Não existem razões para executá-la. Ficará aqui como minha hóspede e protegida até que as coisas se acalmem.

― Muito obrigada, meu Rei! ― Alys desceu da poltrona, caindo de joelho aos pés de Jon ― Está salvando a minha vida!

Jon fez um gesto para que ela levantasse, pois lhe incomodava ver as pessoas, especialmente uma garota como a Karstark, ajoelhadas perante ele. Mas ela continuou prostrada, segurando as mãos do rapaz com firmeza.

― Majestade, se me permite falar... ― Davos interpôs-se, dando alguns passos em direção aos jovens ― Tomar Lady Alys como sua protegida não solucionará a questão. A Casa Karstark agiu ativamente para promover a aniquilação dos Starks, e é vista pela maioria das pessoas como traidora...

― Mas eu não fiz nada! Não tenho nada a ver com as barbaridades cometidas por meu irmão! ― Alys tentou defender-se.

― Sei disso, senhora. Mas me refiro aos seus parentes, especialmente ao seu tio-avô. ― o homem virou-se para Jon ― Não se engane, Majestade. Nem todos aceitam o seu reinado e aproveitarão qualquer desculpa para tentar atacá-lo. Se mantiver Lady Alys aqui como mera hóspede, estará dando a eles o pretexto que tanto esperam.

― O que acho que devo fazer então, Sor Davos? Deixar a pobre garota sozinha, à mercê de pessoas que querem machucá-la? ― Jon indagou.

― Não se trata de deixar Lady Alys sem amparo, pelo contrário. ― o homem começou a explicar ― A Casa Karstark é um ramo cadete da Casa Stark, o que significa que um dia, as duas famílias foram uma só. Talvez este seja o momento de reunificá-las novamente e fazer com que o lobo acolha o sol do inverno de uma forma mais definitiva.

― O que quer dizer com isto?

― Que talvez a solução para esse problema seja obtida por meio de casamento, Majestade. Trazer os Karstarks de vez para o seu reinado tornando a Senhora Alys sua esposa.

― Mas... Como isso seria possível? ― Jon perguntou, confuso.

― Confirme a posição de Lady Karstark como a Senhora de Karhold e faça com que o resto da família preste um juramento de lealdade a ela e que dobre os joelhos para o senhor. Em seguida, faça uma promessa de mantê-la protegida e acabar com qualquer um que desafiar o poder da senhora sobre a herança Karstark. ― ele fez uma pequena pausa ― Então se case com ela.

― E eu? O que eu ganho com isso? ― a garota se manifestou, mostrando desconforto por ter seu futuro discutido em sua frente sem ao menos ser consultada.

― Ganha a senhoria de Karhold, a proteção perpétua da Casa Stark e o título de Rainha, além de ter a oportunidade de ser a mãe do próximo Rei. ― Davos lhe respondeu ― E Sua Majestade calará de uma vez por todas qualquer voz que tente levantar uma rebelião, além de conseguir um castelo estratégico para a Coroa.

Jon e Alys se encararam, tentando decidir o que fariam. Ele sabia que precisava se casar e que a garota Karstark era uma excelente escolha, afinal de contas, ela também tinha o sangue dos Reis do Norte correndo em suas veias – consequentemente, um filho que tivessem juntos teria uma reinvindicação mais forte à coroa do que qualquer outra criança que gerasse com outra mulher. Em breve precisaria partir para a guerra e se deixasse um herdeiro, todo o esforço e sacrifício que fizera não seriam em vão; se o tivesse com Alys, ninguém poderia dizer que não havia sangue real na criança, mesmo se acabasse morrendo em combate e a deixasse viúva. Os homens defenderiam e respeitariam o direito de um príncipe metade Stark e metade Karstark, e o nome de sua família não terminaria com ele.

― O que acha disso, senhora? ― Jon fitou a garota nos olhos e perguntou.

Ela desviou o olhar e hesitou, contudo, tinha uma voz firme em sua resposta:

― Gostaria de vê-los tentar usurpar o direito e a herança da Rainha do Norte, meu senhor.

***

Fazia quase um mês desde o anúncio do noivado entre Jon e Alys, e ainda havia pessoas que torciam os narizes para a situação. Lorde Manderly ficara extremamente desapontado, pois esperava que sua neta mais nova fosse escolhida para ser a Rainha. Alguns outros lordes tinham o pé atrás com a garota, pois a tomavam como traidora assim como o resto de sua família. Mas o pior de tudo foi a reação de Sansa. Ela tratava a noiva do irmão com deferência e respeito e não deixava transparecer o seu desagrado para o resto das pessoas; mas para Jon ela não fazia a mínima questão de esconder o quanto estava descontente com a situação.

― Ainda não consigo acreditar que tomou a garota Karstark com futura esposa sem sequer pedir minha opinião. ― ela estava parada, em pé sobre a sacada que ficava sobre o pátio principal de Winterfell.

Ela estava quase imóvel, como se fosse uma estátua de gelo puro. Suas mãos apertavam a barra de madeira da sacada com força e seu tom de voz era retraído. Jon pensou que ali, Sansa parecia mais do que nunca com Catelyn.

― Fiz o que deveria ser feito e não pedirei desculpas por isto. Por acaso queria que eu deixasse Alys nas mãos de Arnolf Karstark para que fosse morta ou coisa pior?

― Sim. Preferia mil vezes que ela morresse, porque se assim fosse, não atrapalharia nossos planos. ― ela o encarou, com um olhar terrivelmente frio ― Ou melhor, os seus planos, já que não faz questão alguma de me incluir nas decisões que afetam diretamente nossa família.

Jon fitou a irmã, completamente chocado com o que ela acabara de dizer. Não reconhecia Sansa quando ela falava sobre outras pessoas com tanto desprezo.

― Você mais do que ninguém deveria entender o motivo de eu estar fazendo isso. Eu só quero impedir que ela sofra o mesmo destino que você sofreu nas mãos dos Bolton!

― Os mesmos Bolton que foram ajudados pelos Karstark na batalha em que você quase foi morto tentando recuperar nossa casa? ― um sorriso de escárnio quebrou a expressão séria de Sansa ― Eles ajudaram os nossos inimigos, abandonaram Robb no meio da guerra... Acha mesmo que pode confiar em uma mulher com sangue de traidores? Não se surpreenda se após ela parir um filho seu, corte sua garganta na calada da noite para colocar a criança no trono.

Ela virou as costas para o irmão e deu alguns passos até a escadaria que dava acesso ao pátio.

― Sansa, por favor... ― Jon a seguiu e segurou seu braço ― Seja razoável. Acha mesmo que Alys faria uma coisa dessas?

― Não sei. Não a conheço, da mesma forma que às vezes penso que também não o conheço. ― respondeu.

O menosprezo de Sansa fazia a alma de Jon sangrar. Ele fizera de tudo para deixá-la feliz, mas parecia que suas ações tinham o efeito contrário – e aquilo começava a lhe irritar.

― O que está acontecendo? Creio que nem mesmo se eu casasse com uma rainha estaria satisfeita! Está com ciúmes porque eu terei outra mulher na minha vida que não seja você? Incomoda-lhe tanto o fato de eu poder ser feliz e que não esteja incluída nesta felicidade?

Jon sentiu a cabeça tombar para o lado quando a mão de Sansa encontrou seu rosto, cansando um estrondoso estalo. A pele ardeu instantaneamente e o rapaz encarou a irmã, incrédulo com o que ela acabara de fazer.

― Você é um estúpido.

Foi a última coisa que Sansa Stark disse antes de virar-se e deixar o irmão sozinho no terraço coberto de neve.

***

O dia de Jon havia sido intenso, cheio de reuniões com os senhores nobres do Norte e das Terras Fluviais para decidir como seria a estruturação do reino, além de audiências com os plebeus para escutar quais eram suas necessidades. A Vila de Inverno começava a ficar cheia e teria que encontrar uma maneira de dividir da melhor forma possível os provimentos que tinha. Havia passado um tempo com Alys, na visita diária que lhe fazia, pois desejava conhecer a noiva melhor antes de se casarem. Descobriu, durante o pouco tempo que ela estava em Winterfell, que era uma garota doce e que assim como ele, havia passado por várias tragédias depois da guerra – o que fazia Jon pensar que, talvez um dia, seria capaz de amá-la como seu pai amou sua madrasta.

Tirou sua couraça e sua camisa, ficando apenas de calça. Caminhou até o espelho e viu as cicatrizes da traição que sofrera estampadas em sua pele. Passou os dedos por elas e sentiu que a pele enrugada e machucada era um pouco mais quente que o resto de seu corpo, além de trazer recordações horríveis. Aquelas marcas eram lembretes constantes de que não podia confiar em quase ninguém, nem mesmo naqueles que haviam jurado lhe proteger.

Escutou a porta do quarto sendo arrastada e pelo reflexo do espelho, viu que se tratava de Davos. Notou que ele tinha uma expressão apreensiva e virou-se para o senhor.

― O que aconteceu? Que cara é essa? ― Jon perguntou, preocupado.

O homem não lhe respondeu, apenas estendeu a mão que tinha todos os dedos completos, lhe entregando um envelope vermelho. O jovem Rei pegou o invólucro e viu as palavras “Para Jon Snow, o Rei do Norte e do Tridente”escritas em tinta preta e caligrafia elegante.

― De quem é?

― Apenas leia, Majestade ― Davos instruiu.

Jon obedeceu e retirou um pedaço de papel, ao qual se pôs a ler:

“Caro Jon,

Quem lhe escreve é Tyrion Lannister, Mão de Daenerys Targaryen, a Primeira de Seu Nome, Rainha dos Ândalos, dos Roinares e dos Primeiros Homens, Senhora dos Sete Reinos, Protetora do Reino, Khaleesi do Grande Mar de Grama, dita Daenerys, Filha da Tormenta, a Não Queimada, Mãe dos Dragões.

Minha Rainha deseja conhecer aquele que ascendeu de mero bastardo à posição de Rei que controla o Norte, as Terras Fluviais e o Vale, para que seja realizado um acordo sobre o futuro de Westeros.

Neste exato momento estamos arquitetando a conquista de Porto Real para expulsar a usurpadora que controla a cidade e assim devolver o Trono de Ferro para a legítima dinastia real e coroar a verdadeira Rainha.

Podemos ir até você ou você poderá vir até nós em Pedra do Dragão – tudo será feito da forma que preferir, como prova da boa vontade que Vossa Majestade tem por seu povo e pela Casa Stark.

Esperamos uma resposta o mais rápido possível, para que mais uma vez, dragões e lobos encontrem um meio termo que possa garantir a paz.

Tyrion Lannister, Mão da Rainha.”

― Daenerys Targaryen? ― a surpresa de Jon era legítima ― Nomeou Tyrion Lannister sua Mão, pretende conquistar o Trono de Ferro e deseja me encontrar?

― Pelo visto sim, Majestade. Admito que são muitas informações em tão pouco tempo, mas deve tomar uma decisão sábia e rápida.

Jon assentiu. Sabia que teria que fazer uma escolha, e uma bem difícil. Se decidisse recusar o convite, colocaria a ele, a irmã e seu povo em perigo, pois só os Deuses sabiam como a tal Daenerys reagiria caso fosse contrariada; se aceitasse e a tentativa de forjar um acordo falhasse, correria o mesmo risco. Estava numa encruzilhada.

― O que acha que devo fazer?

― Bem... Deveria se encontrar com a garota Targaryen, saber o que de fato ela deseja. ― Davos encarou o jovem ― Pelo que está escrito na carta, vocês tem pelo menos um inimigo em comum: Cersei Lannister. Soube que ela possui três dragões, e se desejasse uma guerra, já teria nos atacado. Creio que valha a pena arriscar reunir-se com a tal Rainha.

― Conversarei com os lordes a respeito do assunto, mas sei que tem razão, Sor Davos. Marque um encontro urgente com os líderes das casas nobres e envie rapidamente uma carta com a resposta que escreverei agora.

― Posso perguntar qual será o conteúdo da carta, Majestade?

― Aceitarei o convite de Daenerys Targaryen, mas nosso encontro não se dará em Pedra do Dragão nem em Winterfell. Se eu for até lá, ela poderá tentar acabar comigo; se vier até aqui, pode tentar atacar e saquear o meu lar.

― O que fará, então? ― Davos indagou.

― Mandarei instruções para que nos encontre em Correrrio. Instruirei Lorde Manderly a permitir que ela desembarque em Porto Branco e que as outras casas garantam seu salvo-conduto. ― Jon explicou.

O Cavaleiro das Cebolas assentiu, concordando com a cabeça, e em seguida deixou o jovem Rei sozinho para escrever a resposta. Jon sentou-se em sua escrivaninha, pegou a pena e começou a redigir a carta que enviaria à Pedra do Dragão. Pensou que, depois de tantos anos e após tantos conflitos, finalmente um Stark encontraria um Targaryen. Finalmente o gelo e fogo se conheceriam e temia que o resultado daquilo fosse uma catástrofe.

***

― Gelo e fogo! ― Lyanna bradou ― Mais uma vez isto aparece em minhas visões!

Ela sentiu suas pernas fraquejarem, e caiu nos braços de Rhaegar. Estava tonta, e sua cabeça doía terrivelmente, parecendo que iria explodir a qualquer momento. Sua visão ficou embaçada e todas as forças de seu corpo lhe abandonaram de uma vez. Quando deu-se conta, estava deitada aos pés do represeiro, com sua cabeça apoiada nas pernas do Príncipe de Pedra do Dragão, que segurava firmemente sua mão.

― Finalmente acordou! ― Rhaegar disse, aliviado ― Como se sente, Lyanna?

― O que... O que aconteceu? ― a garota abriu os olhos lentamente, e a luz do sol, mesmo fraca, fazia com que sua vista doesse.

― Você desmaiou e ficou alguns minutos inconsciente. Se não tivesse acordado logo, eu teria procurado por ajuda.

― Está maluco? ― ela levantou-se bruscamente, e sentiu uma pontada aguda nas têmporas devido ao movimento ― Ninguém pode saber que está aqui! Meu pai e os meus irmãos o matariam se soubesse disto.

― Nenhum senhor seria capaz de matar o príncipe herdeiro do Trono de Ferro, minha querida. ― ele respondeu, um pouco presunçoso demais ― Mas se tivessem coragem, valeria a pena da mesma forma. Salvar a sua vida é mais importante do que qualquer coisa.

Lyanna corou com aquilo; não se via, mas sentiu o rosto esquentar. Perguntou-se se Rhaegar percebeu, mas o Príncipe não fez nenhum tipo de comentário a respeito daquilo.

― Tenho que saber como vai ser o encontro entre meu sobrinho e sua irmã. ― ela disse, virando-se para a árvore e esticando a mão em direção ao rosto esculpido.

― Não verá mais nada, pelo menos não por hoje. ― Rhaegar segurou seu braço, impedindo-a de seguir em frente ― Desmaiou, Lyanna. Sua mente deve estar exausta, e seu corpo está cobrando por isto.

― Estou perfeitamente bem. Eu consigo fazer o que...

A Stark não conseguiu completar sua frase, sentindo suas pernas cederem. Foi aparada novamente por Rhaegar.

― Viu? Se não fosse tão teimosa, saberia que não pode esforçar-se tanto. ― ele disse, enquanto a segurava em seus braços ― Vá para casa e durma, descanse bem. Amanhã nos encontramos novamente para descobrir como se deu a reunião entre Jon e Daenerys.

Lyanna balançou a cabeça, enfim concordando com o Targaryen. Ela realmente estava cansada, pois havia absorvido informação demais para um só dia.

― Você estará esperando por mim aqui amanhã?

― Eu a esperarei pelo tempo necessário, onde e quando quer que seja, minha senhora. ― Rhaegar sorriu e fez com que o coração de Lyanna perdesse o compasso.


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Notas finais do capítulo

Espero que vocês não me matem por ter feito o Jon noivar com a Alys hahaha Mas juro que é super necessário para a estória. Gostaram? Não esqueçam de comentar para dizer o que acharam do capítulo. Beijos!



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