O vento era típico do cais e fazia com que meu chapéu preto tentasse voar à qualquer custo. Um ano depois de mais responsabilidades, um casamento e uma gravidez, eu seguia sendo um desastre.

— Você não muda! — Disse Rachel, tentando arrumar meu chapéu.

— E você sim? — Perguntou Audrey. — Vocês duas não sabem ter um dia normal... Ou um chapéu normal.

Nós duas rolamos os olhos e rimos.

— E você tem dias normais demais, não é, Senhora Escritora? — Perguntei, com um sorriso sarcástico.

— Sim, eu tive. E estamos aqui porque não os quero mais, então vamos! — Disse, apressada, ao caminhar ao navio.

— Eu não vou correr! — Disse alto, alisando a barriga de seis meses, agora protuberante e redonda.

— Dá para acreditar? — Rachel encarou minha barriga e riu. — Seu último ano foi... Diferente.

— Diferente? Fui promovida à editora executiva, me casei dois meses depois, Diane nos contou que estava grávida depois dos quarenta, o que levou, um pouco depois disso, à Alex e eu sermos tecnicamente promovidos à editores chefe e agora estou tendo um descanso merecido. Ufa!

— E agora, vamos respirar por dez dias nesse cruzeiro que Audrey inventou. — Suspirou, percebendo a brisa do mar à medida que nos aproximávamos. — Não estou reclamando!

— Ela também precisa respirar. Acho que quando diz que precisa disso para ter inspiração, também é uma espécie de fuga para tentar se reconciliar com Jonas. — Olhei, de relance, para trás, vendo Ryan, Peter e Jonas lidando com as malas.

— Acho que tudo vai ficar bem. Ele também precisa se distrair. Os meninos irão ajudar nessa parte. — Sorriu ao parar em frente ao navio. — E também Stacey e Paul, que como sempre estão atrasados.

— Stacey e Paul, com certeza será a parte que ela quer usar para o seu próximo livro. Eles são... Icônicos.

— Icônicos, Senhora Editora? — Provocou.

Uma boa risada antecedeu os meninos se aproximarem de nós, também com as suas risadas, resmungos e piadinhas internas, que nem em mil anos entenderíamos.

— Vocês estão carregando roupas ou corpos dentro das malas? — Provocou Peter enquanto entrávamos.

— Estamos carregando tudo o que somos aí dentro. — Audrey apontou as malas. — Nossos rostos estão aí dentro, nossa pele também!

— Vocês são lindas sem maquiagem e não precisam de nada disso. — Ryan beijou o topo da minha cabeça.

— Diz isso porque não sabe como sou quando acordo. — Audrey rebateu e rimos.

— Chegamos! Chegamos! Hey, nos deixem passar! — Gritou Stacey ao ser barrada na entrada. — Nossas passagens? Oh, sim, me desculpe, estão aqui. — Entregou e, logo em seguida, abriu seus braços em nossa direção, deixando sua mala cair. — Agora sim! Estou aquiiiii.

Seu grito era alto e estridente. Nada, nesse mundo, poderia ser tão barulhento e único como aquela mulher. Rachel e Peter riram enquanto recebiam os primeiros abraços, esperando que Paul também se juntasse à nós com o seu andar tão único e galanteador.

O plano, a partir dali, seria conhecer nossos quartos — os quais fazíamos questão de que fossem vizinhos uns dos outros — e em seguida descermos para comer e beber algo. Tudo o que o bebê e eu pensávamos era nessa atividade, então toda a minha pressa e foco se resumiu à isso.

— Isso é como uma viagem de formatura! — Disse enquanto começava meu segundo prato de frutos do mar.

— Uma viagem de formatura aos trinta. — Paul completou enquanto palitava os dentes e observava a vista. — Gosto disso.

— Com a maturidade e a fidelidade certas. — Peter sorriu, tocando o queixo de Rachel.

— Minha viagem ds formatura foi ótima, meu joelho ainda era bom. — Respondeu Jonas, com amargura.

— Podemos construir novas memórias agora. — Audrey passou os dedos pelo seu cabelo engomado. — Certo?

Ele assentiu com a cabeça e a mesa se silenciou por um momento, antes que retornassem as conversas paralelas entre casais.

A comida estava deliciosa e não era apenas meu desejo acentuado que o dizia. Meu foco estava inteiramente nisso, até que as conversas paralelas se reiniciaram e pararam ao ouvirem Audrey.

— Certo, antes de começarmos a viagem de verdade e vocês tracem planos de passeios para quando o navio atracar nos portos ou até mesmo aqui dentro, quero comunicar que estão todos convocados para me inspirarem à escrever um novo livro. — Disse, pensativa. — Dois, talvez.

— Não é para isso que estamos aqui? — Rebateu Stacey.

— Sim e não. — Apoiou as mãos na mesa. — A ideia original, quero dizer, o esboço, era de que gostaria de ter vocês para servirem de inspiração para o próximo livro, mas a minha ideia final é bem maior do que isso. Quero vocês como meus heróis e heroínas. Quero publicar a história de vocês, como tudo começou!

— O que você disse? — Rachel riu, com seu rosto sempre expressivo e confuso. — Não posso ser uma protagonista, não aconteceu nada demais na minha vida.

— Você está completamente enganada. — Acenou com a cabeça negativamente. — Você veio para New York sozinha, encontrou um amor, ele era um poeta secreto! A história de vocês é linda, do começo ao fim, mas preciso saber cada detalhe do cara do apartamento ao lado.

Todos riram.

E eu levantei a mão.

— Estive no meio da história dela e posso te ajudar à organizar.

— E você não só vai me ajudar com isso, mas me contar a sua história, porque na sua, foi puro destino!

— Sem dúvida! Era como se Ryan fizesse parte da minha história antes mesmo de sabermos.

Sorri com o beijo leve que ele me deu no topo da cabeça. Podia ver seu sorriso doce e aberto, mesmo que eu estivesse de olhos fechados.

— O livro de vocês seria algo como... — Iniciou, pensativa. — O cara... Da sala ao lado, coisa assim.

— Eu era o cara da sala ao lado. — Sorriu, como apenas ele poderia.

Ryan e eu concordamos com a ideia porque mesmo que nossa história não tenha começado ali, foi aquela pequena sala de fotografias e edições que deu o pontapé inicial. Foi o lugar onde não poderia mais deixar de vê-lo e onde descobri quem ele realmente era.

O irmão misterioso, o fotógrafo mais competente e indiscutivelmente...

O amor da minha vida.