Eyes On Fire escrita por Brê Milk


Capítulo 31
Chapter 28: O outro lado da moeda


Notas iniciais do capítulo

"Bring me out
Come and find me in the dark now
Every day by myself I’m breaking down
I don’t wanna fight alone anymore"

— Ashes Remain (On My Own)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/709638/chapter/31


Alec Volturi

 

Presenciara o caos e a destruição durante todos os séculos que tinha de existência. Vira impérios serem construídos e derrubados mais do que podia se lembrar. Experimentara do mais absoluto desespero de todas as suas vítimas, e pensara que nunca sentiria aflição maior do que as das vidas que sugava, mas ali, com aquela notícia, percebeu que estava completamente errado.

Era sufocante a sensação que fazia um grande incômodo corroer seu interior e apertar seu peito ao ponto de fazê-lo querer gritar para aliviar a pressão. Era um sentimento atormentador, incoerente e enfurecido. Porque era assim que Alec Volturi estava: além da fúria genuína.

E o motivo era simples: A Evern havia sido levada.

 

— Era o ex-namorado dela, eu tenho certeza — Disse Gaz Julions, pela terceira vez, limpando o sangue nas mãos e no rosto com uma toalha que Esme tinha o entregado. Ele não estava muito diferente de Alec no quesito da raiva. — O cara surgiu no meio da luta com o recém-criado e levou Brooke e Renesmee. Mas antes de leva-las, deixou Brooke ir até o quarto fazer-não-sei-o-quê e eu tentei impedi-la, mas eu estava ocupado demais evitando que o vampiro arrancasse a minha cabeça. Mas era ele, o tal do Luke.

 

Alec assentiu, trincando a mandíbula. Seus olhos se estreitaram enquanto fitava o Julions coberto de sangue. Era estranho: o dissera para matar alguém há alguns dias atrás. E ele acatara a ordem, embora não com a pessoa da espécie certa. Mas tinha feito um bom trabalho com o recém-criado que conseguira invadir a mansão.

Alec havia ido até a mansão naquela noite para pressionar Gaz com exatamente aquele assunto. Ao chegar na propriedade, encontrou uma luta na floresta travada pelos Cullen e um quebra-quebra vindo da casa. O Volturi escolheu verificar a casa, esperando uma luta particular.

Foi com surpresa que se deparou com o Julions de pé, em posição de ataque, sangue para todos os lados e os membros arrancados fora do que um dia fora um recém-criado, espalhados pelo cômodo.

Como um animal selvagem. Um predador. O vampiro assassino que deveria ser. Gaz aceitou sua natureza naquela infeliz situação, ainda que por pouco tempo, mas aceitou. E Alec teria ficado satisfeito se não estivesse tão empenhado em encontrar sua la tua cantante.

 

— Eu o matarei por sequestrar minha filha! — Edward rugiu, andando de um lado para o outro pela sala destruída, as roupas rasgadas pela luta de outrora e prestes a arrancar os tufos de cabelo.

 

— Entre na fila, Cullen — respondeu Alec.

 

O leitor de mentes parou abruptamente a caminhada e se virou para ele.

 

— Depende de qual fila você está falando, Alec. A para matar o ex-namorado de Brooke ou a para matar ela própria. Já estou cansado da minha filha sempre ser arrastada para as confusões que essa menina causa! No momento em que eu colocar meus olhos nela...

 

— Você não fará nada. Não encostará em um fio de cabelo da Evern. Não a irá dirigir a palavra, tão pouco machuca-la — O interrompeu Alec, o rosto pétreo em uma expressão ameaçadora. — Porque no momento que você fizer isso, ou cogitar a possibilidade de fazer isso, você estará declarando guerra contra os Volturi, contra mim. E eu retribuirei o gesto na sua preciosa filha, e sabemos que ela e a Evern possuem laços afetivos fortes o suficiente para causar um grande sofrimento em ambas. Então espero que tenha sido claro.

 

 

 

Edward rosnou, mas não insistiu no assunto. Ao invés, ele apenas designou um olhar colérico ao Volturi e virou as costas, berrando algo sobre não ficar de braços cruzados e ir procurar a filha.

Em seguida, deixou a sala de estar e a mansão e foi se juntar aos outros Cullen do lado de fora, que vasculhavam as redondezas atrás de pistas que indicassem a direção que Brooke e Renesmee haviam sido levadas.

Alec esfregou a testa, sentindo a frustração aumentar, assim como sua preocupação. Algumas horas já haviam se passado e o fim da madrugada se aproximava do lado de fora. Ele passou as mãos pelo cabelo e rangeu os dentes, chutando um pedaço do que um dia fora o sofá. Espuma e madeira voaram pelo cômodo, aterrissando em um estrondo na cozinha. Alec sentiu os olhares de Gaz e Kian cravados em si, mas os ignorou.

 

— Por que diabos Demetri está demorando tanto? — Indagou em voz alta, checando brevemente o celular para ver se tinha mensagem. Sem resposta.

 

— Ele deve estar chegando — disse Kian, entediado. — Se acalme, amigo.

 

Alec o fuzilou.

 

— Eu estou calmo.

 

Claramente.

 

— O que você está sugerindo, Kian?

 

— Nada específico. Apenas que você vai surtar nos próximos minutos se não receber alguma notícia sobre Brooke Evern.

 

— Ela é uma parte da missão, tenho que protege-la — Afirmou Alec, rápido demais.

 

— Não perguntei os seus motivos — rebateu Kian, elevando as sobrancelhas.

 

O silêncio se instalou. O Volturi se enrijeceu e pensou em algo para responder, mas se encontrou desarmado. Sem respostas. Contra a parede. E percebeu que tinha sido pego na encruzilhada que vinha se formando e que até então se negava a enxergar.

 

— Bem, de qualquer maneira, esperar pelo rastreador não é a única forma de descobrir o paradeiro das garotas — Pronunciou o Archetti, após um momento constrangedor. — Sei de outra bem mais rápida e segura de funcionar.

 

Alec deixou de lado o incômodo que sentia.

 

— Que forma? Fale.

 

O feiticeiro descruzou os braços e se afastou da parede, se aproximando com passos deliberadamente lentos e dramáticos de Gaz, se colocando ao seu lado.

 

— Ele.

 

— O Julions? — perguntou Alec.

 

— Eu? — perguntou Gaz, ao mesmo tempo.

 

Os dois vampiros se entreolharam.

 

— Sim. Ah, deixe-me explicar — falou Kian. — Como vocês sabem, eu sempre estive observando e acompanhando a vida de Brooke. É o meu dever saber tudo sobre ela, o que consequentemente me faz saber tudo sobre as pessoas da vida dela. Eu estava presente na noite do clube, e ao que parece, vocês esqueceram do que esse rapaz...

 

— Meu nome é Gaz.

 

—... Esse rapaz chamado Gaz, pode fazer — Kian balançou a cabeça. Então continuou: — Ele soube que Brooke estava precisando de ajuda na noite do clube por causa da conexão mental e sensitiva que eles têm. Brooke está conectada com você, Gaz, assim como está conectada com os outros recém-criados por ser quem ela é. Por isso eles conseguem se comunicar com ela, e você também. Eu acho.

 

— Você acha? — Alec bufou.

 

— Sim, amigo. Mas tenho quase certeza de que estou certo — O Archetti deu de ombros e olhou para o Julions. — Errei em alguma parte?

 

— Não errou — Gaz respondeu com o cenho franzido. — Mas como podemos ter certeza?

 

O feiticeiro revirou os olhos.

 

— Faça o teste. Tente se comunicar com Brooke agora. Como você conseguiu da outra vez?

 

— Eu não sei. Apenas ouvi a voz dela me chamando dentro da minha cabeça.

 

— O que você está ouvindo agora?

 

— Nada. Está tudo normal na minha mente agora. Eu não... não sei o que fazer para acontecer. Quer dizer, deveria ter uma alavanca ou algo do tipo como nos filmes e séries, certo? Na realidade é totalmente diferente.

 

Kian abriu a boca para falar, mas Alec o interrompeu quando avançou na direção de Gaz e o segurou pelo colarinho da camisa, o empurrando até a única parede de pé e o levantando no ar. Em seus olhos, a irritação cintilava.

 

— Não estamos na porcaria de um filme ou na droga de uma série, Julions. Isso aqui é a vida real, e nela, sua amiga está desaparecida e precisando de ajuda — rosnou Alec, o sacudindo. — Então é melhor descobrir o que fazer e como entrar em contato com ela antes que seja tarde demais e eu perda a paciência.

 

— Por quê? — rosnou Gaz, como resposta. Seus olhos estavam um tom mais escuro do que o normal. — Por que está tão preocupado com o que acontece com a Brooke? Ela não é nada sua, então não há razão desse comportamento vindo de você, Volturi.

 

Alec pensou em ataca-lo, mas isso só os faria perder tempo. Por isso optou por solta-lo e se afastar.

 

— Você está certo; a Evern não é nada minha. Nada além de uma obrigação que desprezo, mas que não deixa de ser importante. E sim, eu estou preocupado como qualquer outro estaria por não cuidar bem de sua obrigação — Elucidou, apontando o dedo em riste para o Julions. — Então é de se esperar que eu deseje encontra-la, assim como você. E se você pode fazer isso, então faça. Ou não consegue? Será que você é um vampiro da sua espécie tão defeituoso assim?

 

Foi a vez de Gaz rosnar e agarra-lo pelo pescoço. Seu semblante se tornou sombrio e assustadoramente raivoso.

 

— Não fale sobre o que você não sabe. Se for possível localizar a Brooke, então eu farei isso.

 

— Prove — Cuspiu Alec.

 

O Julions grunhiu e o soltou, o empurrando para longe. Em seguida, se virou para o feiticeiro.

 

— O que eu tenho que fazer?

 

— Hum... — Kian refletiu durante alguns instantes, olhando cautelosamente para os dois vampiros. — Tente pensar nela. Pense sobre tudo o que você sabe e conhece de Brooke Evern e materialize a imagem dela em sua mente. Por favor, feche os olhos, Gaz.

 

Gaz assentiu e fechou as pálpebras.

 

— O que eu faço agora? — perguntou ele.

— Você consegue visualiza-la em sua mente?

— Sim. Completamente. Isso é fácil.

 

— Certo. Agora imagine uma corda comprida. Em uma ponta está ela, e na outra está você — Comandou Kian. — Essa corda é o elo de conexão entre vocês dois, e para fazer funcionar você precisa diminuir a distância dessa corda e alcançar Brooke. Tente alcança-la. Pense nela, chame ela, sinta ela.

 

— Isso aí é difícil — murmurou Gaz, encrespando o cenho.

 

— Tente. O que você acha que poderia ser o elo entre vocês dois?

 

Alec, que estava afastado observando tudo, bufou. O Archetti o lançou um olhar de censura.

 

— Bem, amizade... — O Julions pigarreou.

 

— Muito bem, então! Use o elo da amizade de vocês para encontra-la. Se eu estiver certo, você é a bússola que aponta na direção da Brooke. A alcance, Gaz Julions.

 

O loiro respirou fundo e ficou imóvel, os músculos tensionados.
Alec e Kian aguardaram no silêncio, ambos com os olhos fixos no Julions. Quase dez minutos depois, veio a primeira reação:

 


— Não está funcionando — disse Gaz, bufando, os olhos ainda fechados.

 

— Continue tentando! — O Volturi e o Archetti ordenaram ao mesmo tempo.

 

— Eu vou! — resmungou Gaz. Ele calou-se e voltou a se concentrar. Desta vez, levou apenas alguns instantes: — Eu acho que... — Arfou. — Eu consegui! Eu alcancei Brooke!

 

— Onde ela está? — Indagou Alec, apressadamente.

 

— Eu não sei. Não consigo ver claramente, apenas... detalhes.

 

— Pois então encontre alguma coisa, Julions. Descubra onde ela está!

 

— Eu já disse que não sei! Eu não...

 

Gaz interrompeu-se e gritou, cambaleando para frente e segurando o ombro direito como se algo o tivesse acertado e estivesse doendo. O Volturi o segurou antes que ele atingisse o chão com estilhaços.

 

— Brooke... — Balbuciou Gaz, ainda de olhos fechados.

 

— O que aconteceu com ela? — Alec perguntou, o sacudindo pelas vestes.

 

— Ela está com medo... e dor... ela... está indo embora... está se perdendo na escuridão.

 

— O que isso quer dizer?

 

Mas não houve resposta; Gaz continuou balbuciando as mesmas palavras, como se estivesse em uma espécie de transe parcialmente consciente

 

— O que isso quer dizer, Julions? Me responda! O que quer dizer? — Alec berrou e rosnou.

 

Kian se meteu no meio dos dois e fez o Volturi largar Gaz, que caiu no chão em um baque surdo.

 

Mantieni la calma, Alecssandro.

 

— Você ouviu o que ele disse! — Exasperou-se Alec. — Precisamos descobrir onde a Renesmee e a Brooke estão, e rápido. Se o Julions não as encontrar por bem, as encontrará por mal. Saia da minha frente.

 

— Pense racionalmente, meu amigo. Sei que violência funciona bem nessas situações, mas esta é uma exceção. Se você pressionar de maneira errada e excessiva o Julions, romperá a conexão — falou Kian, sem se mexer. — Deixe-me cuidar disso.

 

O Archetti se virou para o loiro encolhido no chão e se ajoelhou ao lado dele, o tocando suavemente no ombro.

 

— O que você está vendo, Gaz?

 

Gaz grunhiu, os olhos girando em uma dança frenética.

 

— Detalhes...

 

— Que tipo de detalhes?

 

Não houve resposta, apenas mais grunhidos.

 

— Gaz? Você pode me dizer que tipo de detalhes são, por favor? — Insistiu Kian, fechando os dedos com certa pressão no ombro do vampiro desorientado, o chamando a atenção.

 

Funcionou. Os olhos vermelhos vívidos se estreitaram e pararam de girar, passando a fitar um ponto vazio do nada à frente.

 

— Há uma estrada... ruínas de um incêndio... e uma m-música estranha...

 

— Que tipo de música?

 

— Uma melodia de caixinha de música... badalar de sinos... — Engasgou-se Gaz. Ele gemeu e fechou as mãos no pescoço de Kian, o encarando desumanamente fora de órbita. — É um posto d-de gasolina.

 

Então apagou. O Archetti respirou fundo e massageou o pescoço, se levantando e se afastando do loiro desmaiado. Quando se virou para o Volturi, se deparou com o inconfundível olhar de quem matava uma charada.

 

— O que você sabe?

 

— Ruínas de um incêndio. Uma estrada. Gasolina. Isso tudo parece com o lugar onde eu caí em uma armadilha e quase fui explodido junto — disse Alec, trincando os dentes.

 

— Está dizendo que o ex-namorado da Evern a sequestrou e a está mantendo no lugar onde tentaram matar você? — Alec assentiu. — Uau. Eu já tinha ouvido falar de ex ciumentos, mas esse com certeza é um...

— Filho da puta.

— Isso mesmo.

— Vamos pegá-lo.


— Isso é um convite? — Kian ergueu as sobrancelhas.

 

Alec o fitou e assentiu lentamente, ponderando naqueles segundos se aquela era realmente uma boa ideia.

 

— Jane e os outros não estão aqui e não perderei mais tempo — falou, indiferente. — Ainda sabe socar os idiotas?

 

O feiticeiro abriu um sorriso largo.

 

— Sei. Também tenho alguns golpes novos, se quer saber.

 

— Não quero. Basta usá-los se necessário.

 

Kian bufou.

Resmungos soaram.

 

— O que aconteceu?

 

Os dois olharam para o chão, onde Gaz havia recuperado os sentidos e agora estava sentado, olhando ao redor, confuso. Ele segurava o ombro direito, que parecia continuar doendo.

 

— Deu certo? Eu descobri onde a Brooke está? — perguntou, a esperança notável na voz.

 

Alec caminhou até ele e o estendeu a mão:

 

— Levante-se, Julions. Temos um resgate à donzelas para fazer. Partiremos agora, pela porta dos fundos e sem chamar a atenção dos Cullen. Vamos.

 

 

 

Brooke Evern

 

 

Andar era praticamente impossível com aquelas botas, ainda mais quando tinha um objeto perfurante dentro delas brigando por espaço com seus pés e tinha uma arma atrás da sua cabeça. Contudo, ela continuou seguindo em frente, inabalável, vasculhando a área deserta e destruída na beira da estrada.

Ainda era madrugada, a tempestade havia parado e o céu era uma densa e imensa camada escura sem estrelas, o que não possibilitou Brooke reconhecer o lugar para qual estava indo, apenas conseguia distinguir as árvores ao redor e a placa que delimitava o território da cidade.

E isso era bom, pois significava que ainda estavam em Forks, mais próxima de voltar à mansão caso conseguisse escapar.
Depois de retornar à cozinha, devidamente agasalhada e calçada, Luke/não Luke havia a arrastado para um carro escondido e estacionado próximo à mansão, onde a jogou no banco de trás e assumiu o lugar do motorista, mantendo uma Renesmee desacordada no banco do carona. Ele também havia levado a híbrida.

Durante o trajeto, Brooke pensou em tentar fugir quebrando o vidro do carro e se jogar pela janela, ou então ataca-lo enquanto ele dirigia, mas desistiu de tentar todas as vezes que via a arma apontada diretamente para a cabeça de Renesmee, que às vezes acordava, mas que logo voltava a ficar inconsciente pelas pancadas que o demônio a dava com a arma.

Demônio.

Era difícil aceitar que a pessoa que estava diante de si não fosse a que conhecia há anos, e sim alguém com a mesma faceta, mas sem alma ou humanidade. Contudo, se vampiros, lobos e feiticeiros existiam, duvidar da existência de demônios beirava o ridículo no momento.

Brooke mordeu o lábio, sentindo a histeria começar a dar as caras. Ela esteve mentindo para si mesma durante todo aquele tempo: estava apavorada, e não calma como aparentava. O medo parecia abrir um buraco sem fim em seu estômago, cada vez mais fundo e mais intenso, fazendo pensamentos sangrentos surgirem em sua cabeça e tornando respirar algo cada vez mais difícil.

Não tenha um ataque de pânico, ordenou internamente a si própria enquanto cruzava o acostamento da estrada e caminhava para as árvores, as botas afundando na lama assim que entraram em contato com a terra batida

 

— Pare.

 

Brooke parou bruscamente, ouvindo as batidas frenéticas de seu coração explodindo em seus ouvidos. Estava com medo de se virar, mas não foi preciso. Poucos segundos depois Luke/não-Luke estava parado ao seu lado, carregando uma Renesmee inconsciente no ombro, a arma pressionada contra a nuca dela.
 A morena se forçou a desviar o olhar para ele, e em meio a escuridão da madrugada, perguntou:

 

— Que lugar é este? — Ela queria que sua voz tivesse passado de um sussurro.

 

O demônio estalou os dedos da mão que estava livre e, como se fosse mágica, a terra tremeu e um clarão cegou Brooke, a fazendo fechar os olhos. Quando os abriu, apenas conseguiu identificar na escuridão a forma de algumas vigas de ferro e metade de um telhado, e se perguntou como não havia percebido aquilo quando chegara.

 

— Continue andando em frente, minha senhora — A voz do demônio a fez despertar da breve distração.

 

Brooke moveu-se. Ela avançou lentamente na direção das vigas, tentando não tropeçar pelo caminho sombrio e acabar fatiando os pés. O vento frio golpeava seu rosto e seus lábios estavam rachados e ressecados, e o sereno da noite deixara seu cabelo úmido.

Em sua cabeça, mil pensamentos se afunilavam: pensava em um jeito de escapar; em um jeito de escapar com Renesmee; se os Cullen já sabiam do que havia acontecido com elas e se os Volturi também; se Gaz — seu leal e heroico melhor amigo — estava bem; e principalmente, como um demônio que sequer ela sabia da existência, era tão idêntico ao seu ex-namorado, além de querer saber o que havia acontecido com o Luke verdadeiro.

A Evern estava a ponto de ser sufocada com tantos pensamentos e dúvidas. Ainda assim, fez o seu melhor para não surtar.

Quando chegou até as vigas, no lado onde tinha telhado, o cheiro de fuligem era predominante. O demônio apareceu em seguida e a deu uma breve olhada com seus olhos amarelos incandescentes assustadores antes de dar-lhe as costas e colocar Renesmee no chão, onde tirou algemas de aço do bolso e começou a algemar as mãos da híbrida nas vigas de ferro.

Brooke prendeu a respiração, pensando se aquele não era o momento certo para agir. Porém, se era, ela o deixou passar, pois em poucos segundos o demônio já tinha acabado com a ruiva e se virava para ela. Ele se aproximou como se não tivesse pressa, e apontou para a viga mais próxima, onde uma corda jazia.

 

— Sente-se e fique quieta — Ele ordenou.

 

A morena se resignou a obedecer, reprimindo todo o medo e fúria que sentia. Se colocou diante da viga ao lado de Renesmee e se sentou no chão sujo, colocando as mãos entrelaçadas para trás um pouco arqueadas, pois, se estivesse certa, conseguiria se soltar depois.

O demônio demonstrou não perceber seu plano, e enquanto ele dava o último nó, o familiar cheiro de cigarro e bebidas que sempre desprendida do verdadeiro Luke, adentrou as narinas de Brooke, a fazendo temer pelo ex-namorado por um momento.

 

— Como isso pode ser possível? — Ela sussurrou, dando som aos seus pensamentos. — Como você pode se parecer, falar e cheirar como Luke e ainda assim não ser ele?

 

O demônio terminou de amarra-la e se afastou. Ele ficou de pé, em sua frente, com as mãos nos bolsos da jaqueta do mesmo jeito que Luke Hayes fazia.

 

— Sou um demônio possuidor, minha senhora. Possuo o corpo da minha presa e assumo o controle — Desvendou ele, frio. — No momento, estou assumindo o corpo de seu ex-namorado.

 

Brooke rangeu os dentes. Ela quis xinga-lo, mas ao ver como as sombras do lugar pareciam ser atraídas para ele, transformando o rosto conhecido em uma máscara inumana com olhos incandescentes, ela se conteve. Ao invés, resolveu expressar uma de suas reais preocupações, embora aquela não fosse a mais imediata:

 

— O meu... Luke vai ficar bem quando você deixar o corpo dele?

 

— Recebi ordens para não machuca-la. Mas será que dor emocional conta? — Ponderou o demônio. Em seguida deu de ombros. — Você terá sua resposta quando tudo isto acabar, minha senhora. Até lá, fique quieta e não tente escapar.

 

O demônio virou as costas. Brooke engoliu em seco, pensando nas palavras dele. Porém, antes que ouvisse o som dos passos se afastando, viu a silhueta masculina parar e a cabeça dele virar para trás.

 

— Você também deveria saber que era seu ex-namorado naquela noite em que ele foi procura-la. O possuí depois que ele saiu da mansão e vi tudo o que aconteceu entre vocês. As palavras que ele lhe disse eram verdadeiras e ainda era ele... Vamos ver se a dor emocional é mais satisfatória de se ver.

 

Então, voltou a se virar e caminhou para longe, os passos ecoando no silêncio até desaparecerem junto com o dono deles.

Brooke sentiu os olhos se encherem d'água antes que ela pudesse soltar o fôlego que nem tinha percebido estar prendendo. Ela cravou os dentes no lábio inferior para não deixar o grito escapar.

A única coisa que quebrou o silêncio da madrugada e do lugar onde estava, foi seu choro mal contido. Um choro de pesar e de antecedência. Porque Brooke soube antes mesmo de acontecer que Luke Hayes não voltaria mais. Porque ele havia se tornado mais um na sua lista de perdas.

 

 

 

Muito tempo depois, quando o dia havia substituído a noite, Brooke estava exausta. Seus pulsos doíam de tanto contorce-los para se libertar, suas unhas quebraram-se com as tentativas e algumas até sangravam, e seus olhos eram machucados pela claridade da manhã nublada.

Agora que podia enxergar, seu palpite em estar em um posto de gasolina em ruínas estava certo, e além disso, percebeu em qual posto: o único em Forks, que havia sido explodido em uma armadilha para Alec Volturi. Não podia ser coincidência, ela sabia; e por isso temeu ainda mais.

Brooke grunhiu, desistindo das cordas. Inclinou a cabeça para trás e a encostou contra a viga de ferro, fechando os olhos pesados de cansaço e sono. Tinha plena consciência de Renesmee logo ao lado, ainda inconsciente. A ruiva já deveria ter acordado, mas talvez as pancadas na cabeça tenham deixado seu lado humano mais suscetível à situação.

De qualquer maneira, ela só precisava acordar no momento certo, ou seja, no momento da fuga.  A Evern reabriu os olhos, encarando a mata ao longe, já que era tudo o que podia ver. Não tinha certeza, mas suspeitava que o demônio havia feito alguma coisa, pois não conseguia mais ver a estrada.

Algum tipo de camuflagem ou algo do tipo. Ele havia estalado os dedos e o chão havia tremido, coisas assim não aconteciam sem algum motivo ou explicação. Mais um sinal de que precisava correr para longe, e logo.

 

— Nós vamos sair dessa — murmurou Brooke, para si mesma. Ela desviou os olhos para a híbrida desacordada, sentindo o cansaço a deixando lânguida. — Nós vamos conseguir. Não morri e ressuscitei para acabar assim. E você acabou de se acertar com o cara que ama, ainda precisa viver muita coisa, ruiva.

 

Nós vamos sair dessa, repetiu em pensamento, sentindo o corpo começando a ficar dormente enquanto suas pálpebras voltaram a se fechar. Ainda lutou, mas o cansaço a venceu e logo, a morena caiu no sono.

Acordou sobressaltada com gritos desesperados de dor, tão pertos que achou que ficaria surda se continuasse a escuta-los. Brooke abriu os olhos e precisou de alguns segundos para se lembrar de onde estava e notar o que estava acontecendo.

Renesmee.

Antes de virar a cabeça para o lado e olhar a cena, a Evern já estava tentando se soltar e gritando a plenos pulmões:

 

— Larga ela! Sai de perto dela! Solta ela!

 

Seus gritos surtiram efeito. Continuando a se debater e a tentar se soltar, ela observou com terror, o demônio com o rosto de Luke sorrir cruelmente para ela conforme arrastava a faca cravada na perna de Renesmee e a fazia gritar e chorar e o sangue espirrava no ar.

Além da perna com a carne parcialmente fatiada, o braço esquerdo da híbrida estava posicionado em um ângulo estranho, e Brooke percebeu que estava quebrado. Também havia marca de dedos nas bochechas, assinaladas com sangue. A náusea tomou a morena junto com a agonia pela cena e a aflição pela amiga.

 

— Estávamos esperando seu despertar, minha senhora — O demônio possuidor praticamente cantarolou, arrancando a faca da perna da ruiva e a rodando entre os dedos.

 

Renesmee gritou uma última vez e então seus olhos rolaram, se fecharam e a cabeça dela pendeu para o lado. Ela desmaiou de dor.

 

— Saia de perto dela! — Brooke berrou, o olhando colérica. — Se voltar a encostar nela, eu o mandarei de volta para casa: a porra do inferno!

 

O demônio arqueou as sobrancelhas, mas se afastou do corpo imóvel da Cullen. Ele caminhou até a morena e se agachou ao seu lado, a fitando tão próximo que a respiração gelada a tocou.

 

— Minha senhora deveria medir as palavras antes de dize-las. Também deveria me agradecer.

 

— Agradecer? Por me prender aqui ou por torturar minha amiga? — A Evern cuspiu, sem uma gota de medo no momento. — Ou por ser ela sofrendo no meu lugar?

 

— Nenhuma das opções. Não posso machucar você fisicamente, minha senhora, mas isso não quer dizer que seu emocional esteja incluso no pacote — disse o demônio, no ouvido dela. — Encare isso como uma preparação e uma lição.

 

O corpo de Brooke tremia de raiva e ela queria muito chuta-lo, mas se controlou. Embora estivesse furiosa, tinha que pensar racionalmente e calcular seus próximos atos. Foi aí que se deu conta que aquele era o momento certo para tentar algo, ou então morrer tentando.

Brooke engoliu em seco e parou de se debater, sustentando o olhar do falso Luke, sem deixar transparecer suas intenções. Imperceptível e silenciosamente, ela voltou a retorcer as mãos para desamarra-las. Sentia que depois de tantas investidas, o nó da corda começava a ceder e deslizar por seus pulsos esfolados.

 

— Preparação e lição para quê? — perguntou, para ganhar tempo.

 

O demônio deu de ombros. Moveu a mão e deslizou a faca pelo rosto dela, espalhando o sangue de Renesmee na lâmina pela pele pálida.

 

— Uma guerra está chegando, minha senhora. E apenas os fortes sobreviverão no final. E estes são aqueles que juram fidelidade ao meu Senhor das Sombras.

 

— Então é disso que se trata? Me fazer forte? Por quê? Por que o seu senhor me escolheria?

 

— Porque você é mais forte do que pensa. Só precisa aprender a lição mais importante em uma guerra.

 

O nó estava quase desfeito.

 

— Qual?

 

— Não tenha pontos fracos. Mas se tiver, elimine-os.

 

Brooke o observou se levantar e dar-lhe as costas, para então começar a assobiar uma melodia suave, como sinos badalando. Como as notas de uma caixinha de música. E somente quando o demônio deu um passo na direção de Renesmee e sacou a arma da cintura, foi que ela entendeu.

O sonho onde a híbrida era assassinada. O demônio no corpo de Luke era o assassino.

 

— Não! — gritou a Evern, ao passo que ele direcionou a arma para a cabeça da ruiva.

 

Tomada pelo desespero e fúria, a morena grunhiu e puxou as pontas da corda com uma força que não sabia de onde vinha. O nó finalmente cedeu e ela tomou impulso e se colocou de pé em um pulo habilidoso, a exaustão dando lugar à raiva pulsando em suas veias.
Brooke encarou os olhos frios e inumanos do demônio, que desviou o olhar para ela.

 

— Não interfira, minha senhora. Você não pode lutar comigo, não possui arma para isso — falou o demônio, sem deixar de mirar Renesmee com o revólver.

 

Brooke sorriu cinicamente.

 

— Quem disse que não?

 

Em um movimento rápido, ela se curvou para frente e enfiou a mão dentro da bota direita, puxando a espada mediana para fora. A lâmina reluziu e se encaixou perfeitamente em sua mão, que mesmo tremendo, não a deixou cair.

Quando subira até o quarto para pegar um casaco na mansão, dera de cara com a espada cravada na poltrona, as joias no cabo brilhando, esquecida. Havia segurado a espada apenas uma vez, quando Kian a presenteara com ela. Desde então, se recusava a pensar sobre a arma ou a toca-la.

Mas alguma coisa tinha lhe dito que precisaria dela, como um presságio sobre o presente momento.
Então lá estava Brooke: segurando uma espada aparentemente poderosa, sem saber usá-la, prestes a enfrentar um demônio usurpador de corpos — usurpando atualmente o do seu ex-namorado.

Os olhos do falso Luke se estreitaram, a máscara inumana se fragmentado um pouco com a incerteza surgindo em seu semblante.

 

— Você não pode me vencer, minha senhora.

— Quer apostar, idiota?

— Tenho ordens de não feri-la, mas se ousar me atacar, não terei escolha — Alertou o demônio, sombrio. O dedo dele escorregou para o gatilho do revólver. — Alguém morrerá hoje, e não há como mudar isso.

 

Ao ouvir tais palavras, todo o corpo de Brooke enrijeceu. Seu coração batia tão enlouquecido que dava a impressão de que sairia voando pelo peito a qualquer instante. Porém, ela não se importou com nada disso. Ela apenas se importou com Renesmee caída, na mira de uma arma, e com o demônio em sua frente.

Os dois eram fatos, matéria real e sólida como ela mesma. Um era bom e o outro mau. Um sairia dali vivo e o outro morto. Eram convicções que Brooke tinha, assim como o fogo que começava a queimar lentamente em seu interior, deixando a ponto de explodir alguma coisa dentro dela, que começava a ganhar espaço.

 

— Sim, você — disse a Evern, mal reconhecendo a própria voz grave.

 

E então atacou, sem se importar com o fato de não saber lutar com uma espada ou com o fato de que aquele era o corpo de Luke Hayes. Sua mente se desligou e seu corpo assumiu o controle, a fazendo brandir a espada e investir contra o demônio. Antes que a lâmina o tocasse, o tiro ecoou.

Renesmee, pensou Brooke no segundo que se seguiu, antes de ouvir o tintilar da espada, caindo no chão de joelhos. Foi só quando sentiu a dor excruciante se espalhando por seu ombro e seu corpo tombou para a frente, que percebeu que ela fora quem recebeu o tiro.

Brooke segurou o ombro baleado com a outra mão e gemeu. Mal havia recuperado o fôlego quando sentiu o chute em suas costas, a fazendo cair completamente, o rosto pressionado contra o cimento com marcas de fuligem.

 

— Eu avisei que você não era páreo para mim, minha senhora — A voz do demônio soou acima dela, em tom de zombaria. — Desculpe pela violência, mas você não me deixou escolha.

 

Ela quis gritar, de dor e de raiva, mas não encontrou a voz. Também quis levantar e devolver a violência, mas seu corpo estava sendo consumido pela ardência da bala alojada em seu ombro. Nunca pensara que um tiro doeria tanto.
Desse modo, apenas continuou no chão, enquanto ele voltava a falar:

 

— Que isso também sirva de lição: se não pode lutar contra seu oponente, não o ataque. Você terá tempo para aprender isso com calma, quando se juntar ao lado vencedor da guerra.

 

— E quem disse... que me juntarei a você e ao seu senhor? — Indagou Brooke, por fim encontrando a voz com a força de seu ódio

Atrás dela, os passos do demônio ecoaram.

 

— Você não terá escolha quando perder tudo, minha senhora. Porque você vai perder; tudo e todos que a fazem fraca.

 

— Do que... está falando?

 

— Estou falando do plano do meu mestre para fazê-la se juntar ao reinado que ele está prestes a construir. Para isso, ele arrancará tudo aquilo que você, como humana, mais ama.

 

Brooke ofegou. Ela tentou se levantar, mas seus braços fraquejaram..

 

— Sua irmã e seu ex-namorado já estão fora da lista, mas ainda há algumas pessoas nela — comentou o demônio possuidor, a rodeando como um abutre. — Sua amiga aqui.

 

— Cala a boca — A Evern grunhiu, arranhando o chão com as unhas quebradas.

 

Contudo, ele continuou:

 

— Os Cullen e os Volturi.

 

— Cala a boca.

 

— Seu padrinho.

 

— Fica quieto.

 

— Seus amigos lobos.

 

Brooke rosnou.

 

— Seu amigo recém-criado.

 

— Cala a boca!

 

— Sua mãe.

 

— CALA A BOCA! — Gritou ela.

 

E finalmente alguma coisa explodiu.

 

Começou com um arrepio percorrendo todo o seu corpo, depois se transformou em um grande furacão dentro de si, a puxando mais e mais para as sombras. Brooke achou que estava tendo a alma sugada quando começou a se contorcer e gritos irromperam de sua garganta.

Ela procurou entender o que estava acontecendo, mas a cada segundo ficava mais difícil manter a consciência. Sua visão se transformou em um borrão vermelho, e os piores sentimentos a invadiram: raiva, ódio, sede de sangue. Ela sufocou e tentou se agarrar a realidade; a voz do demônio fazendo perguntas se tornando distante.
 E então, após mais alguns minutos de agonia, algo estranho aconteceu.

Eu assumo daqui, o sussurro ecoou em sua mente. Antes que a Evern descobrisse o significado daquilo, ela foi engolida pelas sombras e tudo ficou quieto.

 

— Minha senhora? — Chamou o demônio, se aproximando do corpo imóvel da garota no chão.

 

Houve uma pausa, e então Brooke se mexeu. Com uma graciosidade que ela não costumava ter, apoiou as duas mãos no chão e se içou para cima, sem se importar com o ferimento aberto no ombro. Sua cabeça estava baixa quando se colocou de pé e se virou para o demônio no corpo do ex-namorado.

Muito lentamente, ela ergueu a cabeça, revelando uma expressão tão demoníaca quanto a dele: os lábios retorcidos em um sorriso maldoso, sangue espalhado pelo rosto e os olhos, que costumavam ser castanhos, brilhando da cor do fogo mais vívido.
O céu escureceu alguns tons.

 

— Ela não está mais aqui, ser inferior — A voz de Brooke era a mesma, menos o tom de voz, que agora continha todo o desprezo e frieza que a garota não costumava ter. — Somos só você e eu.

 

Aquela não era mais Brooke Evern. Era uma outra versão sua, como o outro lado da mesma moeda sendo exposto. Uma exposição perigosa e inesperada.

 

— O quê...? Não pode ser... — O demônio possuidor arregalou os olhos. — O espírito da Descendente...

 

— Eu sou a Descendente — Rosnou Brooke, estalando o pescoço. — E você voltará para a podridão de onde saiu.

 

Com um aceno de mão, a espada jazida no chão voou diretamente para ela, que a segurou com evidente satisfação. Brooke girou a lâmina com maestria e jogou o longo cabelo para trás antes de mirar o demônio e desfilar até ele, pé ante pé, o queixo levantado e o fogo dentro dos olhos queimando intensamente.

O falso Luke pareceu desorientado por algum tempo, mas quando a viu se aproximando, saiu do torpor e a apontou o revólver, ignorando as ordens que tinha. Ele disparou uma saraivada de tiros; e a Evern se esquivou de uma de cada vez, se deslocando tão rápido e silenciosamente quanto uma sombra.

Por fim, Brooke o alcançou, o fazendo sibilar em uma linguagem demoníaca para ela. O demônio desistiu da arma e a jogou longe, e partiu para o corpo-a-corpo. Entretanto, quando investiu e desferiu o primeiro golpe contra a garota, ela foi mais rápida e em um piscar de olhos já estava atrás dele.

 

— Diga ao seu mestre que sim, este mundo será um reinado — Sibilou Brooke, os lábios tocando no ouvido do demônio. — E eu serei a única rainha o liderando.

 

E em seguida cravou a espada no tórax dele.

O demônio soltou um grito horripilante e a Evern afundou a espada na carne, a puxando logo em seguida, o sangue fresco escorrendo pela lâmina e por suas mãos e então pingando no chão. Ela chutou as panturrilhas do demônio e o fez se ajoelhar diante dela a tempo de assistir a fumaça negra sair da boca de Luke e se acumular no ar, transformando-se em uma sombra disforme e dissipando-se posteriormente.

Aos poucos, os olhos do rapaz se abriram, e a tonalidade verde estava de volta, assim como o verdadeiro Luke Hayes. Ele piscou algumas vezes e levou as mãos ao tórax, como se tivesse se dado conta de que estava ferido, e seu olhar encontrou com o da Evern.

 

— B-Brooke? — perguntou em um fraco sussurro, confuso ao vê-la parada em sua frente, parecendo diabólica.

 

— Não, mas repasso seus cumprimentos à ela — respondeu a Descendente, erguendo a espada acima da cabeça de Luke. — Não que vá fazer muita diferença, já que você estará morto, humano infeliz.

 

Antes que Luke pudesse dizer alguma coisa, ela desceu a lâmina, certeira e fatal, sentindo a antecipação da satisfação pelo sangue derramado. Contudo, o ruído da decapitação nunca soou, o que a fez levantar os olhos e descobrir o motivo.

Parado entre ela e Luke que havia desmaiado pelo ferimento no tórax, Alec Volturi segurava a lâmina da espada com as mãos, o rosto retorcido em frieza e desprezo, o manto negro dos Volturi esvoaçando com o vento.

 

— Eu gostaria muito de deixá-la terminar o trabalho, mas creio que se matar esse idiota, a verdadeira dona do corpo terá que lidar com as consequências.

 

Atrás dele, os rostos de Kian Archetti e Gaz Julions surgiram; o primeiro sério, analisando a situação, e o segundo estarrecido, de olhos arregalados, como se não pudesse acreditar no que estava vendo.

 

— Então você é o famoso Alec Volturi — A voz de Brooke soou no ápice da frigidez, alta e etérea, uma combinação que não combinava com a expressão cruel em seu rosto. Ela olhou o vampiro com despeito, os cantos dos lábios se elevando em uma diversão sádica enquanto mantinha a espada pressionada contra as mãos dele: — Já deve ter percebido que eu não sou aquela por quem veio. Não nos conhecemos, mas tenho acesso às lembranças dela e posso ver todos os momentos de vocês dois... Ah, sim. Um belo relacionamento complicado o de vocês, devo dizer.

 

— Se sabe tudo isso, também deve saber que não irei embora sem a Evern — disse Alec. — Então que tal sair desse corpo por livre e espontânea vontade antes que eu a obrigue a fazer isso?

 

A Descendente grunhiu.

 

— Isso não vai acontecer, vampiro. Drácula me criou e me aprisionou por mais tempo que a sua existência durou, e tudo isto por causa de uma profecia que deve estar prestes a se concretizar. Se o corpo escolhido para minha habitação é o de Brooke Evern, então é nele que ficarei, e o tomarei para ser somente meu. Assim seremos uma só.

 

— Acontece que a Evern já é ruim de suportar sendo uma só. Duas dela, com um espírito maligno como você, é demais para minha sanidade. Por isso você vai dar o fora!

 

Com um movimento, Alec empurrou a lâmina da espada para baixo e deu uma rasteira em Brooke, a derrubando enquanto a espada voava alguns metros longe.
Ele se surpreendeu ao vê-la de pé segundos depois, o encarando com o fogo nos olhos crispando, os traços contorcidos em fúria.

 

— Você irá pagar por isso! E quando eu terminar com você, vou destruir sua querida Evern! — A Descendente gritou, fazendo o chão tremer.

 

Ela ergueu uma das mãos e a espada voou em sua direção como um imã indo de encontro ao metal. Assim que fechou a mão no cabo cravejado de joias, a espada resplandeceu e o fogo vívido consumiu a lâmina, tão forte quanto o de sua íris.

O Volturi arregalou os olhos, mas recuperou o foco e colocou-se em posição de ataque. Aguardou até que ela avançasse, e quando isso aconteceu, analisou seus movimentos, percebendo que seria difícil lutar contra a Descendente no corpo da Evern, pois era rápida e seus movimentos eram fluídos; uma verdadeira guerreira.

Porém, isso não o assustou. Assim que ela correu em sua direção e empunhou a espada alvejando sua cabeça, Alec conseguiu desviar e ignorou o fato daquele ser o corpo de Brooke, e a chutou na barriga. Ela cambaleou alguns centímetros, mas se recuperou rapidamente e voltou a ataca-lo; desta vez mirando outros pontos de alcance mais fácil.

O Volturi rechaçou o segundo ataque, mas não rápido o suficiente para não ser atingido de raspão no braço pela lâmina em chamas. Assim que sentiu o fogo queimando o tecido da camisa e abrindo um corte doloroso em sua pele, imaginou as chamas se espalhando pelo resto do seu corpo em alguns instantes, porque, diferente do que as lendas sobre vampiros dizem, o fogo era o inimigo das criaturas da noite, e não o alho.

Porém, as chamas não se espalharam e o fogo não o consumiu. Alec ficou aliviado ao ver faíscas vermelhas envolverem o braço atingido e aliviarem a dor no local. Quando levantou a cabeça, encontrou com os olhos prateados de Kian ao seu lado, que tinha as palmas das mãos voltadas para cima, uma grande concentração de faíscas vermelhas saindo delas.
O feiticeiro parecia irritado.

 

— Eu cuidei da profecia por séculos, para que ela fosse cumprida como tinha que ser, como um feiticeiro deveria fazer. E aí você aparece e tenta transformar o meu melhor amigo em churrasco de vampiro? — gritou o Archetti. — Você mexeu com a pessoa errada, senhorita.

 

— Você foi o feiticeiro encarregado da profecia? — Questionou Brooke, o tom de ironia. Ela girou a espada, reproduzindo anéis de fogo ao seu redor. — Eu deveria agradecer, mas ao invés disso me contento em arrancar o seu coração por ousar interferir em uma batalha que não é sua.

 

Kian sorriu largamente.

 

— Manda ver.

 

Ele e Alec se entreolharam e assentiram um para o outro. E então atacaram primeiro, um de cada lado, ao mesmo tempo. Alcançaram a Evern, que girou com a espada tentando acerta-los diretamente, mas os dois se esquivaram.

O feiticeiro fez surgir esferas vermelhas eletrizantes nas mãos e as lançou contra Brooke, que com reflexos impressionantes desviou de todas e também fez seu truque: revidou com bolas de fogo, as atirando uma após a outra contra Kian. Ele as refreou com sua magia, mas perdeu o chapéu que foi incinerado.

 

— Meu chapéu! — Berrou, enraivecido.

 

Alec, que havia atacado pela retaguarda e sido bloqueado pela garota, berrou de volta, tentando se aproximar o suficiente novamente:

 

— Esqueça a porcaria do chapéu, Kian! Concentre -se na luta!

 

O Archetti resmungou algo mais antes de assentir e continuar atacando.
A luta se desenrolou por mais tempo que o Volturi tinha cogitado. Toda investida que eles davam contra a Evern, ela bloqueava e revidava com mais força ainda, como se a raiva e a adrenalina da batalha a fortalecesse.

Era como lutar com o exército de vampiros do castelo em dia de treinamento, mas todos reduzidos a uma pessoa só.
O espírito da Descendente que habitava no corpo de Brooke era forte e potente, disso Alec não tinha dúvida.

Era por isso que ele se sentia exausto mentalmente quando ela arremessou Kian e ele do outro lado do posto de gasolina, os fazendo pousar como bolas de canhão. Nem sua névoa paralisante havia tido efeito sobre ela, que com um movimento da espada, a fizera desaparecer.

O Volturi estava um farrapo: a camisa e o manto estavam esburacados e as roupas de Kian não estavam muito atrás. Também havia sangue escorrendo da testa do feiticeiro.

 

— Fazia tempo... que eu enfrentava alguém tão poderoso — murmurou Kian, arquejando em busca de ar, ainda no chão.

 

Alec se virou para ele.

 

— Nem me diga — Rosnou. — Alguma ideia de como a derrotamos, sem usar a força?

— Nenhuma... Espere — Interrompeu-se Kian, olhando por cima do ombro do vampiro. A expressão dele se tornou pensativa. — O corpo é da Brooke, o que significa que a alma e a consciência dela ainda devem estar lá dentro...

 

Os grunhidos da Descendentes se aproximaram.

 

— O que isso quer dizer? Rápido, diga logo!

— Brooke ainda está lá dentro. Pelo que conheço de espíritos, eles devem ser mandados embora, mas como não estamos falando de um espírito comum, não iremos ter êxito total. Brooke está perdida em algum lugar dentro dela mesma, na escuridão. Ela precisa ser trazida de volta.

— E como fazemos isso? — perguntou Alec, se colocando de pé com os olhos injetados de raiva.

 

Kian o imitou, ainda que com um pouco mais de dificuldade.

 

— Lembrando à ela a pessoa que é.

 

O Volturi acenou com a cabeça e se virou para a figura de Brooke, parada à dez metros, perfeitamente bem. O sorriso cruel e os olhos em chamas o lembrava que não era a Evern que conhecia, que discutia e que diversas vezes tinha tido medo de perder. Não era a sua Evern, era apenas uma impostora em seu corpo. E aquilo não estava certo.

 

— Pensei que seria divertido acabar com vocês dois — disse ela, os encarando com uma calma assassina. — mas acho que me enganei. Agora chega de jogos.

 

Brooke deu um passo em frente e o fogo da lâmina aumentou o dobro. O vampiro e o feiticeiro tencionaram os músculos, preparados para o combate. No entanto, antes que um dos três realizasse o primeiro movimento, a voz ecoou:

 

— Pare, Brooke! — Bradou Gaz.

 

Ele estava parado, os olhos semicerrados e os punhos fechados, o corpo tremendo. Atrás dele, Renesmee estava deitada no chão, ainda inconsciente e agora desalgemada. Uma grande tensão pairava ao redor do Julions.

 

— Você deve ser o melhor amigo — A Evern cuspiu com desprezo. — Acabarei com você também, mas antes precisa entender que ela não está mais aqui.

 

— O que você está esperando para ataca-la, Julions? — Alec grunhiu, olhando exasperado para o loiro.

 

— Não posso machucar a minha amiga.

 

— Ela não é a sua amiga, seu estúpido! Mexa-se.

 

— Sem chance — Gaz balançou a cabeça, sem sair do lugar. — Não lutarei contra alguém que amo. A pessoa que está falando e andando pode não ser minha melhor amiga, mas esse ainda é o corpo dela, e eu não o machucarei. Não posso fazer isso, não com você Brooke, que esteve ao meu lado quando me transformei em vampiro e que me ouviu reclamar da minha família quando ainda era um simples humano. Não posso machucar a Brooke que conheço e amo, nem quero.

 

Todos encaravam a Evern, esperando que ela os atacasse a qualquer momento. Porém, ela não o fez. Apenas ficou imóvel, fitando Gaz confusa, a chama nos olhos enfraquecendo, a boca entreaberta, balbuciando frases pela metade:

 

— O quê... Eu... Gaz... Eu não... Não! — Ela chacoalhou a cabeça com força e o fogo nos olhos voltou a brilhar intensamente. — Acha mesmo que pode me enganar e trazer sua preciosa amiga com todo esse sentimentalismo, vampiro imundo? Pois saiba que não pode e eu o provarei.

 

Mas aquilo foi o suficiente para Alec compreender.
O Volturi buscou o olhar de Kian, que assentiu brevemente, estalando os dedos e arrumando o suéter esburacado com um ar de entendimento.

 

— A atrasarei, mas não demore muito, amigo — Suspirou, e em seguida partiu para cima de Brooke, iniciando um duelo de faíscas eletrizantes contra fogo vivo.

 

Sem ficar para ver o resultado da luta, Alec correu na direção contrária: para Gaz.

 

— Faça de novo — disse ele assim que o alcançou. — Diga as palavras que disse antes. Você viu como elas mexeram com a Evern, como quase a trouxeram de volta. Kian a está distraindo, mas não vai aguentar por muito tempo. Faça de novo.

 

— Sim, mas... — Interrompendo-se, Gaz trincou o maxilar. Ele fitou o Volturi e refletiu por alguns instantes. Quando por fim pareceu chegar a uma conclusão, deixou sair em um rosnado: — Não.

 

Alec arqueou as sobrancelhas.

 

— Como assim, não, Julions?

 

— Não vou fazer isso. Como você mesmo disse, eu quase a trouxe de volta, então isso não serve de nada — falou Gaz, fazendo as palavras soarem dolorosas e decepcionantes. E quando disse as próximas, deu para entender o porquê: — Mas você fará isso. Você a trará de volta.

 

— Como você pode ter certeza disso?

 

— Porque é de você que Brooke gosta, Volturi.

 

O silêncio entre os dois só foi quebrado pelo som da luta mais adiante. Alec sentiu a força que aquelas palavras tiveram sobre ele e o modo surpreso e quase... feliz que o deixaram. Entrementes, ele também viu a forma triste como elas deixavam o Julions.

Era nítido os sentimentos que ele tinha para com a Evern, e ainda assim ele era capaz de abrir mão daqueles mesmos sentimentos e confidenciar os dela por outra pessoa para salva-la. Aquilo era o que os humanos chamavam de amor, Alec se deu conta, e ficou impressionado ao também perceber que o compreendia bem até demais.

 

— A segurarei enquanto você fala com ela — Anunciou Gaz, muito firme do que dizia.

 

— Como sabe que vai conseguir usar seu dom dessa vez? — Indagou o Volturi, deixando os pensamentos sobre as emoções para depois. Ele olhou cético para o loiro. — E, digamos que funcione, como podemos ter certeza que funcionará nela? Nem minha sombra teve tal efeito.

 

— Você faz perguntas demais, Volturi — O Julions abriu um sorriso insolente. — Andei praticando sozinho. Claro que não dá para ter certeza de que irei conseguir segura-la no tempo, mas quem arrisca não petisca. E esqueceu que como recém-criado da nova espécie eu tenho uma conexão com a Brooke? Isso deve servir para alguma coisa.

 

Alec não ficou totalmente convencido, mas analisou as opções e notou que aquela era a única que tinham. E como se fosse para enfatizar aquilo, o grito de Kian ecoou pelo posto enquanto ele caía com a perna ferida.

O Volturi passou a mão pelo cabelo e bufou. Em seguida olhou indiferente para Gaz, que devolveu o gesto.

 

— É melhor fazer funcionar.

 

— E é melhor você dizer a coisa certa e trazê-la de volta.

 

Houve um entendimento e uma promessa silenciosa entre os dois antes de trocarem um último olhar e se virarem para a morena de pé, ao lado do corpo do feiticeiro, a espada na mão prestes a dar o golpe final.

 

— Ei, espírito de múmia! — gritou Gaz, abrindo os braços e os esticando para frente.

 

Brooke virou a cabeça, o encarando furiosamente.

 

— Do que você me chamou, seu verme? — Vociferou ela.

 

Alec balançou a cabeça, imaginando se o Julions e seus insultos não estaria os levando ao fim.

 

— Múmia velha! Também é surda? — Continuou Gaz, elevando cada vez mais o tom de voz. Ele abriu as palmas das mãos, mirando a figura da Evern, que rugiu. — Está com raiva? Venha me pegar se for capaz.

 

— Eu matarei você!

 

— Não. Você apenas dará adeus, espírito idiota.

 

Gaz gargalhou, e aquela foi a deixa. Brooke rosnou e correu para atacar, se movendo tão rápido quanto um vampiro completo.

 

— Agora, Volruri! — O Julions berrou ao mesmo tempo que fechava as pálpebras e se concentrava.

 

Alec avançou no mesmo instante, correndo na direção de Brooke, na mesma velocidade. Ele viu tudo se transformando em borrões conforme ambos se aproximavam: o posto, a mata, Kian encolhido no chão, Renesmee desmaiada, Luke Hayes sangrando inerte; e se focou nos diabólicos olhos em chamas que o fitavam com sede de sangue.

A Descendente no corpo da Evern ergueu a espada quando faltavam menos de cinco centímetros para os dois colidirem, e Alec pensou que o plano falharia. Porém, quando um raio ofuscante de luz branca acertou a morena diretamente no peito e a fez parar bruscamente, ele se deu conta que estava errado.

O Volturi chutou a espada da mão dela, a fazendo sair voando pelo ar e agarrou Brooke pelos pulsos, a jogando no chão e caindo por cima dela, a prendendo debaixo de si. Ela permaneceu parada, o rosto congelado numa expressão assassina, a boca entreaberta em espanto, exceto os olhos, que continuavam em movimento, as chamas dançando conforme o fitavam cheios de ódio.

 

— Você não parece tão poderosa agora — Alec debochou, inclinando o rosto para perto do dela, que apenas emitiu um grunhido e continuou o encarando imóvel.— Vamos lá, sabemos que você foi derrotada, Descendente. Agora vá embora e devolva a Evern.

 

Nada aconteceu. Nenhuma mudança, transformação ou algo do tipo. Os olhos demoníacos ainda o encarava, e Alec constatou que se não dissesse as palavras certas, aquelas que alcançariam a Evern aonde quer que ela estivesse, não conseguiria traze-la de volta. Mas quais eram as palavras certas?

 

— Ande logo! Não vou conseguir segura-la por muito mais tempo! — A voz de Gaz soou esganiçada, como se ele estivesse se esforçando ao máximo para falar.

 

O Volturi apertou o maxilar, intensificando o aperto nos pulsos da morena.

 

— Eu sei que você ainda está aí, Evern. Então é melhor sair e expulsar esse espírito maligno do seu corpo. Isto é uma ordem! — Ordenou Alec, cerrando os cantos dos olhos. Ele esperou algum sinal, mas não houve nenhum, o que o fez bufar e continuar, embora não soubesse o que dizer: — Você deve cumprir esta, pelo menos dessa vez, já que você tem esse terrível hábito de ignorar minhas regras e ordens, sua garota patética... — O vampiro pausou, e passou a fitar o rosto dela. Estranhamente, ele já sabia de cor cada traço daquele rosto, a forma dos olhos, nariz e a curva da boca. Ele sabia da cicatriz na bochecha e o jeito como a garota usava o cabelo dividido no meio. Aqueles detalhes ainda estavam lá, porque ainda era ela fisicamente, embora a alma e tudo o mais que a fazia ser quem era, não estivesse. Foi só aí que Alec apercebeu-se que tinha muitas coisas de Brooke Evern que ele mantinha em mente, e a partir daí as palavras surgiram: — Não. Você não é mais aquela garota patética que conheci. Você não é mais a garota assustada e deprimida que eu fazia questão de aterrorizar, e já provou isso diversas vezes. Você está sempre contrariando aqueles com quem não concorda; você está sempre comprando a briga daqueles com quem se importa; você morreu e ressuscitou apenas para continuar lutando. Você é uma sobrevivente, e a Evern que eu conheço não desiste tão fácil. Por isso não desista, não se renda desse jeito e volte!

 

Brooke bateu os cílios, mas o fogo em seus olhos continuou brilhando. Ainda não era ela. Alec soltou um rosnado, sentindo a mesma sensação de perda que sentira no dia que ela morrera e voltara a vida, ameaçando assola-lo.

Alguns metros atrás de si, o Volturi escutou o Julions gritar e em seguida cair, exausto. Então sentiu a Descendente começar a recuperar os movimentos lentamente.

 

— Não se atreva a ficar perdida aí dentro, Evern! — Alec exclamou, apoiando o próprio peso no corpo dela para dificultar seus movimentos. Ele se inclinou ainda mais para frente, o colar com o brasão dos Volturi tocando no pescoço de Brooke, a fitando no fundo dos olhos faiscantes. — Há muita gente aqui fora contando com você. Os cullen, os cachorros da tribo Quileute, sua mãe... — Inspirando, ele diminuiu o tom de voz para um sussurro: — Todos eles precisam de você, Evern. Ho bisogno di te*.

 

O Volturi calou-se, ansiando que funcionasse. E funcionou. Brooke moveu-se embaixo dele no exato momento em que o fogo em seus olhos se extinguiu e a íris ficou branca, antes das pálpebras se fecharem. Ela ficou imóvel por alguns minutos, o silêncio mórbido se instalando na atmosfera.

Alec não fez nenhum movimento, muito menos abaixou a guarda. Continuou a segurando com força, na mesma posição, esperando alguma reação. Quando aconteceu, ele manteve a cautela. O vampiro observou a morena abrir os olhos lentamente e a primeira coisa que ela viu foi ele.

 

— Alec? — perguntou Brooke, o tom de voz que costumava usar. E o mais importante: com os olhos castanhos que apenas a verdadeira Brooke Evern tinha.

 

O Volturi suspirou de alívio.

 

— Já era hora. Espero que tenha gostado do lugar onde esteve — disse ele seriamente, apesar de estar sorrindo. — Bem-vinda de volta, Evern.

 

O semblante dela demonstrava toda a confusão que tinha no momento, mas ele ignorou. Saiu de cima da morena cuidadosamente e a ajudou a sentar, ficando de frente para ela que não parava de encara-lo atordoada.

 

— O que aconteceu? Renesmee e eu... O demônio no corpo de Luke... Algo se apoderou de mim e eu lembro de algumas coisas... — Assombro atravessou a face de Brooke, que desceu o olhar para as mãos e fitou o sangue as manchando. Lágrimas brotaram em seus olhos imediatamente. — Luke... Eu o matei... Eu matei o Luke! EU O MATEI!

 

Ela girou a cabeça para todos os lados, procurando o corpo do ex-namorado, e o encontrou caído a muitos metros adiante. Brooke levou as mãos até a boca e soltou um grito, sentindo o ombro latejar. Ainda assim, ela tentou levantar e correr até Luke, mas Alec a segurou no lugar.

 

— Não foi você — disse ele, e então notou o sangue fluindo e ensopando o casaco da garota. O Volturi praguejou e levou a mão até o local, a fazendo gritar de dor. — Você foi baleada.

 

A Evern o ignorou e continuou se debatendo e tentando levantar.

 

— Eu o matei... — Soluçou.

 

Logo depois, desfaleceu no peito de Alec.

O vampiro louro-acastanhado balançou a cabeça e a puxou para o colo, se pondo de pé em seguida. O cheiro de sangue e fuligem se misturava com a umidade do ar e durante alguns segundos, Alec ficou parado, contemplando o cenário onde estava e contando as quatro pessoas no chão.

 

— Acho melhor chamar uma ambulância — A voz grave de Kian ecoou em seus ouvidos, o fazendo se virar para ele.

 

O Archetti havia se arrastado até as vigas de ferro do posto e tinha as costas pressionadas contra uma delas. O tecido da calça esquerda estava rasgado e ele tinha cortes profundos na pele, que estava meio esverdeada.

 

— A lâmina da espada era envenenada — Alec deu um passo hesitante na direção do feiticeiro, mas se refreou quando o viu levantar a mão. — Você vai ficar bem?

 

— Vou. Certamente vai demorar para que minha magia drene todo o veneno, mas pelo menos eu não posso morrer — respondeu Kian, exibindo um sorriso de lado. — Cuide de Brooke primeiro.

 

Alec concordou com a cabeça. Ele lançou um último olhar para Kian e para os outros três inconscientes: o Julions de bruços, provavelmente apagado de exaustão; Luke Hayes jazido em uma pequena poça de seu próprio sangue, possivelmente morto ou quase; e a híbrida, protegida de todo o massacre, embora estivesse tão mal quanto os outros dois — ela também o preocupou mais que os outros dois, o que o fez prometer que ligaria para os Cullens o mais rápido possível.

Por alguma razão, Alec se importava com Renesmee. O suficiente para querer vê-la bem e segura.

 

— Aguente mais um pouco, ruiva — falou, antes de virar as costas e correr para longe com a Evern nos braços.

 

Quando tudo ficou silencioso, o feiticeiro estalou os dedos e fez uma adaga aparecer. Cerrando a mandíbula, ele a cravou na perna ferida e a deixou lá, proferindo algumas palavras em uma língua estranha. O fluxo de seu próprio sangue diminuiu e um líquido preto começou a sair dos cortes.

Kian encostou a cabeça na viga e respirou fundo enquanto o veneno era expurgado de seu corpo.

 

— Brooke Evern é mais fascinante do que eu pensei — murmurou consigo mesmo, fechando os olhos e relaxando.

 

 

 

 

Em algum lugar longe dali, no subsolo, em um trono forjado a ferro e ossos humanos, o Senhor das Sombras sorria satisfeito. Seu plano estava indo como planejado e não demoraria muito para conquistar o que queria.

 

 

 

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

* Ho bisogno di te* = Eu preciso de você.
* Mantieni la calma, Alecssandro = Mantenha a calma, Alecssandro

—___________________________


OLÁ, AMORES!

Dessa vez, eu estou mais atrasada que o normal, eu sei. E peço desculpas como sempre, principalmente por setembro ter sido um mês difícil e além de tudo, o mês em que a fanfiction completou dois anos de existência! Nem acredito que já faz tanto tempo assim que o plot e os personagens apareceram na minha cabeça (e mais ainda que eu não tenha terminado de escrever o resto da história rsrsrs). Acho que serei eternamente grata por ter tomado coragem e postado a fanfiction dos meus sonhos, porque foi com ela que consegui todo esse apoio e carinho incrível que recebo de vocês. Muito obrigada!!

Enfim. Agora vamos ao capítulo de hoje: Eu esperei TANTO tempo para escrever ele e estou ansiosa para ver a reação de vocês. Me digam o que acharam da Descendente no corpo da Brooke e o que acham que vai acontecer daqui pra frente. Tenho alguns pontos para ressaltar: primeiramente, sobre o Gaz. Eu fiquei de coração partido por ele, mas juro que isso foi preciso para dar um rumo ao personagem. Segundamente: Kian Archetti está aos poucos conquistando o meu coração. Daqui para frente vocês irão ver o passado dele com os gêmeos Volturi e a forte relação de amizade construída entre eles, assim como a triste história do personagem. Terceiramente: #Broolec está acontecendo, por isso vocês já podem comemorar haha!

É isto.

Quero saber a opinião de vocês, por isso deixem um comentário e me façam feliz. Não tenho data para o próximo capítulo, mas tentarei não atrasar tanto quanto este.

Amo vocês...

Bjs!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Eyes On Fire" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.