O descendente chinês já percebia as pequenas modificações na namorada de anos, afinal era um exímio observador... Mulan tinha um cabelo muito longo e escuro, desde criança, que usava solto; não gostava de maquiagem, e mesmo assim, passava algum brilho ou batom nude nos lábios, e blush para dar vida ao seu rosto pálido e redondo... Nenhuma joia com exceção ao anel dado por ele mesmo.

Primeiro ele viu quanto tempo ela passava se encarando no espelho. Analisando as feições suaves do próprio rosto. “Não é nada, tinha uma espinha no meu rosto”, “são as rugas de expressão”... Mas também observava o rosto do namorado muitas vezes, alisando-a. E então o cabelo foi encurtando e encurtando até um ponto que não dava mais pra disfarçar.

—Ele estava dando nós nas pontas. Era difícil de pentear...

Shang sabia que não era apenas isso. Ela estava mudando por dentro. Ela já não era a mesma mulher por quem ele havia se apaixonado, mas ainda sim, estava cada vez mais apaixonado por ela.

—Shang... – Mulan tirou o cabelo curto e escuro de sobre o rosto, encarando o namorado sob a meia luz do quarto. – Eu quero falar uma coisa. – Ele coçou os olhos pequenos.

—Tem que ser agora? – O despertador mostrava 1:45 da madrugada.

—Sim... – Ele se apoiou num dos cotovelos e virou-se para ela. Mulan torcia as mãos. – Poderia me chamar no masculino a partir de agora?

—Como assim? Como homem? – Ela mordeu os lábios, deixando-os brancos.

—É. Eu... Eu sou transexual... – Chang piscou os olhos sonolentos, encarando a pessoa a sua frente. Mulan parecia tão frágil naquele momento, com os ombros trêmulos e olhos brilhantes e lacrimosos, que lhe partia o coração.

—Ok.

—Você não vai reclamar?

—Você terminar comigo? – Ele arqueou uma das grossas sobrancelhas.

—Não.

—Então porque eu faria isso?

—Eu estou mudando, com hormônios e tudo mais...

—Mulan... Eu amo você. Isso não vai mudar se você tiver barba. Pode dormir agora? Eu gostaria de voltar ao sonho em que meu atual namorado se deita do meu lado e dorme comigo a noite toda. – O mais magro subiu sobre o namorado sorrindo, como há muito o outro não via. Beijou-lhe suavemente o pescoço e se encaixou contra o corpo musculoso que imediatamente adormeceu.

—Eu também amo você, idiota...