Tratado dos Párias escrita por Isabela Allmeida


Capítulo 17
Príncipe humano




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A carruagem sacolejava. Nem via a paisagem pela janela, olhava tudo e nada, fechado dentro dos seus próprios pensamentos e sem conseguir tirar o sorriso bobo da cara. Revivendo a cena pela décima vez com total perfeição sem se cansar de voltar a ela novamente e não sem rir no fim no final da lembrança todas as dez vezes que a reviveu.

Uma bela moça com seu vestido creme esvoaçando pela pressa de sair e fechar a porta rapidamente e com força. Olhando em seguida para sua mãe com o sorriso mais sapeca que já tinha visto em uma mulher. E que linda ela estava tão descontraída rindo assim, o desejo que esse sorriso fosse para ele novamente o tomou, mas o que mais havia chamado sua atenção foi sua gostosa gargalhada enquanto saia pelo portão.

Como ela conseguia ser assim? Geralmente as risadas das mulheres eram forçadas, ou aquele maldito sorrisinho falso aonde a careta bizarra era uma tentativa de sedução, já ela...

Apertou os olhos e pensou pela milésima vez, desde o primeiro baile de máscara ela era uma lembrança constante. Quem era ela afinal? Porque a família Salazar havia escondido um tesouro daqueles? Balançou a cabeça. Devia ser por seu jeito espontâneo, eles talvez tivessem vergonha, balançou a cabeça de novo, não pareciam ter vergonha mas sim pareciam a incentivar a ser assim, eram muito modernos os Salazar. Ou era para causar impacto nos homens do reino quando a apresentassem a sociedade? Porque se fosse isso ao menos com ele tinha funcionado muito bem e mais uma vez a lembrança de seu rosto o pegou.

Seus cabelos castanhos escuros e longos, faziam uma moldura perfeita em seu rosto bonito, mas o que o fazia ficar sem ação eram seus olhos. Nunca tinha visto aquele tipo de verde, tão claro e tão profundos e brilhantes.

Fechou os olhos, se perderia naqueles olhos, e em seus lábios também, se perderia em seu corpo.

Fechou a cara novamente se lembrando do baile, claro que se perderia se não tivesse sido idiota aquele dia tentando chamar sua atenção.

Ela o odiava por aquilo ele sabia que sim. Eu a constrangi. Pensou ele mais uma vez, mas também o que ela queria? O olhava como se estivesse dançando com um servo e não um príncipe, ela odiou cada minuto ao seu lado naquele baile, sequer pareceu se interessar pelo pomposo titulo de príncipe, se fosse outra teria pulado em seu pescoço forçando o falatório geral.

Qualquer uma delas teria grudado nele tentando lhe seduzir, mas ela sequer mostrou interesse, apenas irritação com sua companhia, poderia ficar ofendido, mas isso atiçou sua curiosidade.

Balançou a cabeça contrariado, tinha que tirar a experiência de conhecer aquela mulher longe de sua cabeça, essa ansiedade toda não o ajudaria em nada e já tinha até chegado no castelo sem nem ver o tempo passar, o portão se fechou com um estalo.

— Diana... — Sussurrou e gostou de como o som de seu nome dançava em sua língua, de como sua língua encostou no céu da boca duas vezes ao pronunciá-lo. Se lembrou da porta a sua frente e subiu a escada.

Ela riria daquela forma tão natural para ele? Seria a mesma em meio a tantos mimos? Ficaria tentada em conhecer uma vida de luxo ao seu lado? Torceu a boca se sentindo um idiota, isso não a interessaria, ela já tinha tudo isso com os pais, era um fato. Então o que ele tinha a oferecer a ela? Ela já era feliz tinha comprovado isso hoje, tinha luxo, era segura de si.

Estalou a língua, o que oferecer a uma mulher que parece não almejar nada do que você possa oferecer visto que ela já tinha tudo isso? Sorriu de lado talvez... somente talvez se ele a beijasse, se conseguisse encontrar uma oportunidade para isso, ela poderia se encantar, sorriu confiante.

Uma de suas melhores qualidades era o bom beijo, mas não aguentou segurar a risada fazendo até o guarda o olhar de torto. Não queria saber o que significava aquele olhar dele para ele, revirou os olhos olhando em silêncio para o guarda abobado. Sim amigo eu sei, estou agindo feito um bobo, mas você faria o mesmo que eu se a tivesse conhecido também.

Entrou rápido fugindo do olhar inquisidor do guarda, sem conseguir segurar a risada, aquela peste seria bem capaz de lhe dar um belo tapa na cara pela sua ousadia.

Receber um tapa de uma mulher pedindo respeito seria morte certa, balançou a cabeça novamente, se fosse o seu pai interessado nela ela já estaria no harém o servindo. Levou a mão a bochecha pensativo, talvez ate gostasse, uma mulher diferente de todas que tinha visto no reino, se tornaria perfeita se ainda fosse corajosa e arisca, uma conquista que valeria lutar por ela, se quisesse coisa fácil iria ao harém e não teria preparado tudo para conhecer as mulheres, para cortejá-las.

— O que está, fazendo ai feito paspalho, rindo feito idiota?

Seu pai estava parado no salão olhando para ele, uma coisa rara de se ver.

— Pai? O que faz aqui embaixo? Não devia estar com seus brinquedos lá em cima?

Seu pai lhe sorriu de torto e ele agradeceu mais uma vez por puxar as feições da sua mãe.

— Quero falar com você sobre alguns detalhes e não irei admitir que você se oponha.

Revirou os olhos já imaginando o tema do assunto. — Temos um acordo, nada de seus negócios nesse mês pai e não vou aceitar mudanças.

Seu pai fechou a cara. — Quero essas cadelas fora da minha floresta em um mês está me ouvindo? Nem um dia a mais, senão venderei elas por lotes para que sumam logo de meu local de negócios.

—Tá, tá pai! Agora se me der licença. — Saiu apressado do salão e subiu as escadas de dois em dois degraus, sentindo uma raiva imensa de seu pai. Ele era um cretino, primeiro aceitou tudo o que foi combinado e agora ficava se lamentando por seus negócios perdidos, chutou a porta e bateu ela em seguida com toda força para fechá-la.

O quarto lhe parecia agora pequeno, se sentiu claustrofóbico e não era uma sensação desconhecida para ele, devia gritar ao mundo os podres de seu pai, fazer com que ele fosse destronado. Se soubessem o que ele sabia, o rei estaria morto. Por culpa das leis que ele mesmo criou não teria perdão para aquilo.

Sentou na cama e sorriu com amargura e também não era a primeira vez, queria fazer isso, mas não podia, ele tinha mais a perder do que seu pai, a proteção de sua casta nobre era importante para ele.

Faltava tão pouco para completar, duas ele já tinha comprado e lhe custaram quase suas bolas na negociação com seu pai, mas faltava uma e o maldito não ia cobrar barato. Ele não tinha mais nada a oferecer ao rei. Apenas seu silencio e ouro. O último, o rei tinha de sobra, mas quem sabe se encontrasse algo que ele quisesse muito... 

O primeiro pagamento foi abrir mão do direito ao trono e seu silêncio, ele nunca seria rei isso ele sabia, foi o pagamento pedido por elas, mas o que mais ele poderia oferecer a seu pai que ele já não tivesse como parte do pagamento?

Suspirou e falou num sussurro. — Celeste ainda comprarei você, de um jeito ou de outro eu a comprarei e ai ficará completo e então quem sabe...

Deitou de costas olhando o teto pensando consigo mesmo.

Talvez então ele deixasse de ser um covarde e gritasse para todo o reino quem é o verdadeiro Júlio, mas para isso precisava negociar com ele uma ultima vez.

Só faltava Celeste então completaria finalmente o que faltava... Ficou imaginando o que o rei poderia querer por ela, mas nada lhe veio a mente e acabou dormindo.


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