Oposto Complementar escrita por Tai Barreto


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Olar, amores. E como eu disse no capítulo anterior, dia 30 estaria aqui e aqui estou.
Eu fico feliz por saber que estou agradando.
Dia 5 estarei voltando.

Sem mais, boa leitura.



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— Para a sua primeira semana, até que você se saiu muito bem — diz Harry, entrando na sala do meu galpão.

— Foi um pouco cansativo, devo admitir. — Sento, indico o espaço ao meu lado para que ele sente e coloco a almofada no colo. — Todas as noites, eu dormi que nem senti.

— Foi desse mesmo jeito para mim. — Harry se acomoda, usando apenas jeans escura e camisa de mangas compridas preta, que estão arregaçadas acima dos cotovelos.

Os cabelos compridos e escuros estão úmidos e eu os observo, com uma vontade repentina e imensa de enfiar as mãos por eles e sentir a textura por entre os dedos. Cruzo as pernas sob mim, como de costume e jogo a cabeça para trás. Eu estou bem satisfeita com minha evolução na Carter Construction Company, apesar da presença constante e desagradável do James. Eu acordei tem cerca de vinte minutos, mas a preguiça costumeira do sábado me assolou e só tive tempo de descer a escada e me jogar no sofá, a fim de dormir mais um pouco.

— Segunda-feira vai fazer três semanas que cheguei... — Reflito e o olho.

— Sente saudades da sua família? — Harry me fita com aqueles olhos escuros.

— Sinceramente? — Franzo os lábios. — Pode pensar que eu sou uma péssima filha e irmã, porém, não sinto. Eles me acostumaram a isso, sabe? Sempre foram ausentes, todo mundo muito ocupado com suas vidas... — Suspiro.

— Não quer falar com ninguém? Já deu sinal de vida?

— Na terça-feira da mesma semana. Isso foi o suficiente.

— Laila... Eu não acho que seja uma boa ideia que se mantenha longe de todos dessa forma. Seus pais podem estar preocupados.

— Eu vou tomar uma ducha. Comeu algo?

— Ainda não.

Levanto do sofá e me espreguiço. Estou usando apenas uma calça moletom que roubei do Felipe, meu irmão mais velho, surrada e cinza mescla e uma regata branca de lycra.

— Podemos preparar algo juntos, se quiser. — Olho por sobre o ombro.

— Claro. Só não demora.

— Pode deixar. — Corro escada acima e entro no meu quarto, retirando a camiseta de imediato, seguindo para o banheiro. Retiro a calça e largo no cesto.

Tomo um banho morno e rápido, sem mexer nos cabelos. Quando termino, seco-me e enrolo a toalha no meu corpo. Saio e paro no closet, pegando um short jeans, justo e de cintura alta, um crop top de alcinhas. Pego uma calcinha e visto-me rapidamente. Calço meus chinelos de estampa animada, largo a toalha no cesto e desço com ele, seguindo de imediato para a área de serviço. Coloco tudo na lavadora, despejo a quantidade ideal de sabão em pó e coloco para lavar.

— Foi rápida, hein? — Harry se coloca de pé e me segue em direção à cozinha.

— Foi apenas uma ducha. Mãos à massa, garotão?

— Claro.

***

— Assim não vale! — exclamo, correndo para longe do Harry, que me persegue com uma bola de neve imensa em mãos. — Eu não tenho a mesma prática que você. — Resmungo.

Estamos num parque um pouco distante do nosso prédio e devidamente agasalhados, enquanto a neve cai com média intensidade. A quantidade de pessoas que está por aqui é mínima; somente Harry e eu, que estamos sendo vistos como dois malucos e duas famílias com dois filhos cada uma. As árvores do local estão repletas de neve e mal se vê os galhos. Sem sombra de dúvidas isso é algo lindo demais. E graças à minha paixão por paisagens, eu me perco observando a maravilha que é e sou atingida por uma bola de neve na cabeça. Harry ri alto e comemora.

— Oito a dois!

Eu me agacho e tento fazer uma bola de neve o mais rápido possível. Só tenho tempo de levantar e desviar de uma possível bolada na cara.

— Ei. — Revido e corro, pegando neve do galho mais baixo e fazendo outra bola. — Você é trapaceiro.

A risada dele me faz sorri e logo em seguida, acompanhá-lo por mais que esteja chateada com essa diferença no placar. Inesperadamente, eu sinto um empurrão que me faz cair de cara na neve e eu me arrepio por inteira.

— Peguei você. — Harry sai de cima de mim, me vira e volta a sentar sobre minhas pernas.

— Trapaceiro. — Mostro a língua e ele ri outra vez. Aproveito sua distração, encho a mão direita de neve e bato contra sua testa.

— Olha quem fala. Você trapaceou agora.

— Rá. Rá. — Rio em seguida e ele estreita os olhos escuros para mim.

— Rá. Rá. — Harry repete, enfia as mãos por dentro do meu casaco e me faz cócegas.

Eu rio alto, enquanto tento fazê-lo parar.

— Harry! — exclamo e ele para. — Ufa! — Suspiro e tento regular os batimentos do meu coração. — Sai de cima. Minhas pernas estão ficando dormentes, seu obeso.

Observo seus olhos se estreitarem outra vez e ele deita na neve ao meu lado. Tiro o que estava pelo meu rosto e o afasto, a fim de fazer um anjo.

— Eu não posso acreditar que você está fazendo isso.

— Tira uma foto. — Ofereço meu aparelho e ele se coloca de pé e faz.

— Gostei da sua capa. — Ele deita ao meu lado outra vez e tira uma selfie.

— Folgado. O que te faz pensar que eu quero uma foto com você? — Pego meu smartphone. — Quero duas. — Tiro uma e ele ri.

— O que você faria agora se estivesse no Brasil? — questiona, enquanto olho as fotos.

— Estaria no mar, provavelmente. É verão. Temperatura em torno dos 35 graus, com sensação térmica de 40 ou mais... Rio de Janeiro é quente, baby. Bem como eu. — Dou-lhe uma piscadela e ele ri.

— E não deixou nenhum namorado para trás?

— Não. Eu mal tinha vida, Harry. — Fito minha foto ao lado da minha única amiga de escola. — Essa é a Marcela. Cara, nós duas juntas fazíamos cada idiotice. — Abro um vídeo onde estamos dançando funk no seu último aniversário, ao som de um cantor dos anos 2000.

— Que música é essa?

Cerol na mão, de Bonde do Tigrão. — Eu rio.

— Você gosta?

— Eu ainda sei a coreografia e tenho no meu smartphone. — Minimizo a galeria e abro o reprodutor de músicas. Coloco a música e faço a coreografia ainda deitada.

— Você dança há muito tempo?

— Acho que desde os quatro anos. — Mudo a música antes de acabar para um MPB. — Acredite, eu sou muito eclética para música. Você vai encontrar todos os ritmos brasileiros aqui. Tem frevo, funk, MPB e até música clássica.

— E que música é essa?

Entre Olhares, Ana Carolina. Essa mulher é uma deusa. Que voz. E as letras! Eu me derreto toda ao ouvir.

— Explica essa.

E eu faço e quando acaba, começa Evaporar, de Fresno. Eu, a cantar. Eu sei que é antiga, mas é o tipo de música que sempre que eu ouço, é impossível ficar calada. Do mesmo jeito que, quando ouço Work da Rihanna. Eu não consigo ficar parada. Acho que se tocassem num velório, eu estaria me requebrando, nem que fosse de maneira discreta. E eu me controlo para não cantar a plenos pulmões, porque essa música sempre me tira de mim.

— Que tal tomarmos um chocolate quente? — Sugiro e Harry se senta.

— Vamos nessa. — Ele levanta e me estende a mão.

Com sua ajuda, como sempre, eu levanto e caminhamos de braços dados.

— Obrigada pela distração.

— Ainda vai continuar sem dar sinal de vida à sua família?

— Não. — Suspiro. — Vou falar com eles hoje à noite, talvez.

— Certo. Eu vou beber um chá, se não se importa.

— Não quero que mude o seu jeito de viver por minha causa. Nunca.

— Eu digo o mesmo.

— E é bom que me aceite do jeito que eu sou, querido. Porque sou exclusiva.

***

— Está mais do que na hora de você parar de pagar absolutamente tudo para mim. — Resmungo assim que saímos da cafeteria.

— Não seja implicante. — Ele me abraça de lado e por incrível que pareça, eu não me sinto desconfortável por isso, diferente das vezes em que Lucas tentou fazer isso.

Não que ele fosse meu namorado; era apenas um amigo, que as pessoas torciam para nos ver juntos, porém, eu nunca senti nada além de um amor fraterno por ele. E daí que ele é lindo? E que esperavam que eu fizesse a vontade alheia? Eu apenas não poderia me envolver com alguém que não gostava. Podem me chamar de tola, só que, depois de ter que aprender a cuidar de mim mesma, eu aprendi a me valorizar e não dar ouvido aos outros.

— Não seria eu se não fosse. — Beberico do meu chocolate e me delicio. — Isso é divino. É feito de quê? Pedaços do céu? — Enfio a outra mão no bolso do seu sobretudo.

— Experimenta os marshmallows.

Eu me afasto um pouco, abro a tampa e cato um dos cinco com a língua. A quantidade de chocolate quente que enche minha boca faz meus olhos marejarem e eu resmungo.

— Ai. — Despejo dentro do copo outra vez e isso faz o Harry rir.

— O que houve?

Eu paro de caminhar e faço beicinho.

— Queimou minha boca.

— Deixa eu ver. — Ele me oferece o seu copo e eu pego e abro a boca. Harry aproxima o corpo do meu e olha a minha boca. — Feriu. — Pega o copo dele outra vez e bebe todo o chá.

— Ei.

— Relaxa. — Ele se afasta, entrando num beco.

— O que vai fazer?

— Tem água aqui. — Ouço o barulho da água bater contra o copo com força. — Fica gelada pelo fato de estar na rua, mas é limpa. — Ele volta e me oferece o copo. Eu cheiro a água, a fim de me certificar e então encho a boca, mantendo-a ali e aliviando a dor. E eu relaxo visivelmente. — Desculpa por ter feito isso com você. — Ele coloca uma mecha do meu cabelo atrás da orelha e eu ergo o indicador.

Cuspo a água no copo e suspiro.

— Relaxa. Eu estou bem melhor. Aliviou demais, mas preciso de mais um pouco. — Encho a boca outra vez e permaneço com ela até esquentar. Cuspo no copo. — Eu quem sou gulosa e você bebeu todo chá. Como vai se aquecer? Eu te ofereceria meu chocolate, mas eu cuspi o que estava na boca dentro do copo.

— E ainda assim vai tomar? — Ele pega o copo do chá e tampa.

— É a minha boca. Claro que sim. — Tampo o meu.

Harry ri e volta a me abraçar.

— Vamos seguindo. Vai cair uma nevasca mais tarde. — Retomamos o caminho

— E eu tenho que cuidar de umas coisas no galpão.

— Tipo o quê?

— Lavar os banheiros. Fazia isso na minha casa todos os sábados.

— Hm.

— Tirar a poeira dos móveis. Essas coisas...

— Tudo bem.

Eu beberico do meu chocolate outra vez, sem me importar de ter cuspido aqui e volto a tagarelar sobre músicas.

Entramos no prédio, seguimos ao elevador e no nosso andar, eu vou sozinha para o meu galpão; Harry diz aparecer lá depois de trocar de roupa. Eu jogo o copo descartável no lixo e me apresso a trocar de roupa, usando o mesmo short, porém uma camiseta no lugar do crop. Prendo os cabelos num rabo de cavalo, pego meu fone de ouvido, calço meus chinelos e desço a escada colocando minhas músicas para reproduzir no modo aleatório.

E para iniciar a variedade, eu vou de Bruno Mars, It Will Rain. Pego os produtos de limpeza e entro no banheiro do térreo. Felizmente ele é duas vezes maior que o meu antigo, no Rio de Janeiro, e eu me sinto menos claustrofóbica fazendo a limpeza. Cuido dos ladrilhos; maldita hora em que o Bruno escolheu justo branco. Dando continuidade às antigas, Gimme More da Britney Spears inicia.

Eu me divido entre duas tarefas: lavar e dançar. Não sou o tipo de pessoa que tem preguiça para tarefas domésticas; era a única da casa que fazia sem problemas. Até porque, eu só estudava, já que Letícia, minha irmã mais velha, trabalha desde que terminou o ensino médio, há cinco anos e ainda faz graduação. Esse ano ela vai iniciar o mestrado, o que deixa meus pais orgulhosos demais para se importarem comigo.

Europa, de Fresno, se inicia e eu me controlo para não cantar a plenos pulmões, como costumo fazer. Não quero que Harry ouça; eu desafino falando. Cantando então... E por falar nisso, onde ele está? Pelo tempo que estou aqui, já deveria ter chegado. Eu começo a secar o chão com um pano e rodo e quando termino e viro-me para sair, deparo-me com Harry. Dou um gritinho e puxo meus fones, enquanto ele mantém os lábios presos num meio sorriso.

— Há quanto tempo está aí? — questiono.

— Eu acho que desde que entrou no banheiro.

Arregalo os olhos, o que o faz rir.

— Você só pode estar de brincadeira.

Harry simplesmente balança a cabeça em negativa e eu fecho a cara e começo a recolher os produtos de limpeza, enfiando no balde com mais força do que a necessária.

— Está chateada comigo?

Eu empino o nariz, pego o balde, junto com os panos não utilizados e saio dali, subindo a escada.

— Não. — Resmungo, fazendo-o rir novamente e entro no quarto do Bruno.

— O que vai fazer hoje de noite? — Ele me segue.

— Acho que vou ler um livro, já que não posso ver filme, pois não possuo televisão... — Entro no banheiro.

— Por que não vê no seu notebook?

— Pode ser que eu veja. — Coloco o balde no chão e começo a lavar.

— Por que você faz as tarefas domésticas parecerem algo tão simples? — questiona, cruzando os braços e se recostando contra o batente da porta.

— Talvez seja porque são... — Dou de ombros e desconecto os fones do aparelho, fazendo TKO, do Justin Timberlake parar. Aperto play e enfio-o no bolso traseiro do short, de modo que o fone dele fique para fora. — Ou porque eu estou acostumada...

— Gosto de fazer, mas sozinho.

Eu fico em silêncio e começo a me requebrar no ritmo da música. Depois que termino a limpeza do chão, passo para o vaso sanitário, pia, paredes. É cansativo, devo admitir, porém, é mais que necessário.

— Analisando a letra dessa música, eu gostaria de ser mais malvada. — Comento.

— Fez jus ao receber o apelido de “meu doce”.

Eu o olho e Harry me dá uma piscadela.

— Eu me acho muito ingênua algumas vezes. Porque sempre que algumas pessoas me machucavam, eu acabava perdoando.

— Isso é uma virtude, não um defeito.

Eu mordo o lábio inferior e finalizo a lavagem.

— Isso é tolice. — Admito.

— Não, Laila.

Prendo a respiração, tentando me controlar. Decido enxaguar a espuma. Harry acaba me ajudando, secando tudo e nós saímos dali.

— E você, o que vai fazer? — Mudo de assunto, seguindo para o meu quarto.

— Vou sair. Marquei com uns amigos... Quer ir?

— Prefiro ficar em casa, se não se importa. — Entro no banheiro e inicio a lavagem.

— Está chateada com algo?

— Não. — Suspiro. — Eu apenas estou cansada.

— Por que não deixa para fazer isso amanhã?

— Não. Vou finalizar pelo menos aqui.

— O que quer jantar?

Franzo os lábios.

— Frango xadrez.

— Vou fazer o pedido. — Harry se afasta e eu me dedico totalmente à tarefa doméstica.

Ao fim desta, eu saio dali e levo todos os produtos para a área de serviço.

— Eu vou apenas tomar uma ducha e então jantamos. — Aviso.

— Vou arrumar a ilha.

— Certo. — Apresso-me escada acima novamente, entro no meu quarto e sigo para o banheiro, iniciando meu banho rapidamente.


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Notas finais do capítulo

Vejo vocês nos reviews.
Bom fim de mês e semana.



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