Start escrita por Queen Of The Clouds


Capítulo 8
Flores azuis




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Anastasia

Eu não costumo ter sonhos. Ou, pelo menos, nunca me lembro deles. Mas essa noite tive um.

Eu estava caminhando por uma floresta, rodeada por flores azuis. Os pássaros cantavam e o sol brilhava entre as copas das árvores. Estava tudo perfeito... até que ouvi uma voz me chamando, quase num sussurro.

Eu procurei por muito tempo, entre os arbustos, atrás das árvores, sobre os galhos, até finalmente encontrar o dono da voz parado a metros de mim. Ele era como uma sombra e eu não conseguia enxergar nada além dos seus olhos azuis, mas, mesmo assim, eu sentia que o conhecia. Eu não entendia o porquê, mas meu coração se aqueceu imediatamente quando o encontrei ali.

Eu tentava alcançá-lo apenas andando, mas sentia como se algo me puxasse para trás. Me esforcei para correr em sua direção, mas, quanto mais me aproximava, mais rápido as flores no meu caminho começavam a murchar, indo do azul vívido para o amarelo. As pétalas secaram. O sol desapareceu, me deixando na quase completa escuridão. Os galhos ganharam vida de repente e começaram a se fechar ao meu redor, enrolando-se no meu tornozelo e me puxando para a terra. Espinhos afiados cresceram num piscar de olhos e arranhavam minha pele.

Eu gritei, aterrorizada, pelo homem entre as árvores mas ele não parecia ouvir o meu pedido de socorro. As flores ao seu redor também estavam amareladas e repletas de espinhos, mas não o machucavam. Nem sequer o arranhavam!

Eu continuei implorando por ajuda, sentindo os galhos envolverem meu pescoço. O ar já me faltava quando finalmente... acordei.

Minha respiração estava tão pesada quanto na floresta. Tive medo de ainda estar naquele pesadelo infernal, mas, assim que abri os olhos, me encontrei num quarto. Meu travesseiro subia e descia, como se também pudesse respirar. E ele tinha um coração que batia tranquilamente sob meu ouvido direito.

Mas travesseiros não faziam nada disso.

Eu tentei me levantar, num sobressalto, mas havia um braço pesado envolvendo meus ombros. Armin se moveu, ainda dormindo, e pareceu encostar a bochecha na minha cabeça. Comecei a entrar em pânico.

O que Armin está fazendo aqui? Ele ia dormir na sala! Como isso aconteceu?! Eu precisava sair dali. Imediatamente! Como eu posso dizer que não vou me envolver com ninguém e logo depois durmo abraçada à uma pessoa que conheci praticamente agora?!

Me movi lentamente, tentando não acordá-lo, mas isso apenas serviu para que Armin me puxasse para ainda mais perto.

Suspirei.

Senti seus braços se afrouxarem, subitamente.

—...Annya?—Sussurrou.

—Hum... oi.

—Deus... desculpe.—Ele me soltou e se afastou de mim.—Eu não queria... me desculpe, de verdade.—Disse, outra vez.—Eu devo ter caído no sono.

Mas ele nem mesmo ia dormir no quarto, como acabou caindo no sono aqui?

—Tudo bem. Eu não quis te acordar.—Eu me afastei ainda mais e curvei a boca num sorriso sem graça.—Bom dia.

—Não... nada de "bom dia", finja que eu ainda não acordei.—Ele se espreguiçou e puxou seu travesseiro para baixo, abraçando-o no meu lugar e voltando a fechar os olhos. Eu sorri.—Desculpe outra vez. Está se sentindo melhor?

Estranhei sua pergunta. Ele abriu os olhos.

—Quero dizer, depois daquela... bom, depois daquele episódio.

Eu franzi as sobrancelhas, ainda sem entender.

—Que episódio?

Ele parecia confuso.

—Como assim "que episódio", Annya?

Senti meu coração errar uma batida. Do que ele estava falando?

—Você não se lembra de nada?

Eu neguei com a cabeça. Ele continuava me olhando, parecendo tão assustado quanto eu. Eu estava começando a me preocupar.

—Ok. Calma. Não foi nada demais, só pensei que você lembrasse. Acho que você... passou mal no meio da noite. Estava trêmula, nervosa, talvez um pouco desorientada. Quando eu estava indo para a sala, você me pediu para ficar aqui, disse que não queria ficar sozinha. Você só se acalmou quando deitei do seu lado, eu ia embora quando você dormisse, mas acho que acabei pegando no sono também.

Acho que eu arregalei os olhos involuntariamente porque seu rosto se encheu de culpa.

—Desculpe, eu não quis...

—Por que eu não me lembro disso?!—Me sentei na cama, em pânico, e ele me copiou.

—V-você estava com muito sono, deve ter sido o remédio. Quando eu tomo também costumo apagar.

Eu nunca mais dou as caras por aqui. Nunca mais, nunca mais, nunca mais.

—Desculpe se fiz alguma coisa que não deveria. Você parecia com medo e e-eu não sabia o que fazer. Eu só queria te acalmar.

Eu olhei para ele.

—Desculpe. De verdade.—Disse, mais uma vez, preocupado.—Não sei o que está pensando, m-mas não aconteceu nada, e-eu juro. Eu nem mesmo estava deitado perto de você no início, só estava segurando sua mão, devemos ter nos aproximado durante a noite. D-desculpe.

Seus olhos pareciam vasculhar o meu rosto, inquietos, como se tentassem entender qualquer expressão minha. Como se já não bastasse tê-lo assustado e feito-o perder o sono, eu ainda estava fazendo com que ele sentisse culpado.

Suspirei.

—Não precisa se desculpar, Armin. Você só estava me ajudando e fui... foi a idiota aqui quem pediu para você ficar.—Eu passei as mãos pelo rosto.—Que vergonha... eu que deveria pedir desculpas.

—Não precisa, não foi nada demais.—Senti sua voz se acalmar.—Você está bem?

—Ótima.

Eu continuei cobrindo o rosto com as mãos. Não conseguia nem mesmo raciocinar. Eu queria um buraco para me esconder e, de preferência, que ainda me jogassem terra por cima e me enterrassem de uma vez!

—Às vezes você também murmurava algumas coisas sem nexo como "Armin é o cara mais legal do mundo" e tal, mas, de novo: nada demais!

Eu o encarei, apavorada.

—Brincadeira.—Ele segurava o riso, apesar de ainda parecer nervoso.—Só estou tentando te animar. Não esquenta a cabeça com isso.

—Só me diga que eu não falei mais nenhuma besteira, por favor.—Implorei.

Ele pensou por um segundo.

—Você não falou mais nenhuma besteira.

—Você está falando isso só porque eu pedi?

—Sim.

Eu peguei o travesseiro e enterrei a cara nele.

—O que eu falei, Armin?—Minha voz saía abafada.

—Pra te deixar mais nervosa? Não vou dizer.—Ele tirou o travesseiro da minha mão e começou a arrumar a cama.

—Como eu não ficaria nervosa?—Disparei, sem pensar.—Em um único dia eu interrompi seu jogo, te atrapalhei a estudar, surtei de madrugada, falei besteira e não te deixei dormir!

—Você...!—Ele começou a falar, mas parou no meio do caminho. Parecia pensativo, irritado, talvez. Mas, então, ele apenas voltou ao que estava fazendo, com as sobrancelhas erguidas numa expressão engraçada de quem estava alheio à mim.—Cai fora, preciso arrumar a cama.—Falou, dando a volta na cama e parando na minha frente.

—Não vai mesmo me dizer o que eu falei?

—Não. Sai de cima da cama.

Eu cruzei os braços e as pernas e fechei os olhos, ignorando-o. Escutei Armin respirar fundo e, de repente, ele me ergueu no ar pela segunda vez. Eu me debati quando ele simplesmente me jogou nos ombros e começou a andar pelo quarto.

—Ei! Me coloca no chão!—Ele continuou andando de um lado para o outro.—Armin!

Depois de muito reclamar, ele me colocou cuidadosamente sobre o puff escuro no canto do seu quarto, se ajoelhou na minha frente e me segurou pelos ombros.

—Se você ousar dizer que me atrapalhou ou me incomodou outra vez eu juro que vou te colocar no ombro e te rodar tanto que você vai vomitar esse quarto inteiro.

Eu fiz uma careta pela cena repulsiva e comecei a rir.

—Eu estou falando sério, Annya.—Ele olhava no fundo dos meus olhos, tentando permanecer sério, mas, claramente, segurando o riso.—Vou pintar o quarto inteiro de verde.

Eu empurrei seu ombro, ainda rindo, e ele me soltou.

—Para com isso! Que nojo!

—Estamos entendidos?—Perguntou, com a mão estendida.

—Só se me disser o que eu falei de madrugada.

Ele respirou fundo.

—Você pediu para que eu não saísse do seu lado e nunca te deixasse. E é o que eu estou tentando fazer, se puder não dificultar o meu trabalho seria bom, eu estou tentando ser seu amigo.—Ele estendeu a mão para mim.—Entendidos?

Apertei sua mão, sem dizer nada. Eu tentava absorver o que ele disse. Meu rosto queimava. Não sabia que essa expressão era tão verdadeira até sentir agora, pela primeira vez. Eu estava dividida entre a felicidade e a vergonha e Armin era responsável pelos dois. Eu não queria dar esse tipo de poder a ele.

Não é uma questão de poder, Anastasia. Nem sempre as pessoas são boas porque querem algo em troca.

E quando não foi assim comigo?

Eu podia tentar. Só mais uma vez. Não era possível que as coisas seriam assim para mim todas as vezes, eu não poderia viver esbarrando em pessoas ruins o tempo inteiro, poderia? Eu não seria tão azarada assim. Em algum momento, as coisas tinham que dar certo. Podia ser agora.

Mas quanto maior a altura, maior a queda. Também era a primeira vez que eu me sentia tão à vontade com alguém, se desse errado agora, tenho o pressentimento de que eu não saberia lidar com mais uma mágoa para a coleção.

—Não está começando a surtar, ou está?—Armin perguntou e só então percebi que ele ainda estava na minha frente.—Se estiver, tente pensar pelo lado bom...

—E qual é o lado bom?

—...eu não faço a mínima ideia, só estou tentando te animar. De novo.

Eu comecei a rir, em parte pelo seu bom humor e em parte por estar extremamente nervosa.

—Acho que me lembrei de algo...—Falei, tentando me recordar. Ele se sentou na cama, apoiou o cotovelo no joelho e a cabeça sobre a mão, me olhando, interessado.—Acho que você estava... me lembro de acordar em algum momento e ver você me observando, não foi?—Questionei de forma acusadora, mas ele não me pareceu nem um pouco surpreso.

—Sim.

—Por quê?

—Porque você é mais legal dormindo.—Ele deu de ombros.—Parece meiga e inofensiva.

—Só quando estou dormindo?

—Sim.

Eu puxei o travesseiro e ameacei jogar nele.

—Ei, o que vai fazer?—Eu me levantei, fazendo-o correr para se trancar no banheiro.—Eu acabei de arrumar isso, sua agressiva!

Eu me voltei para a cama e terminei de dobrar os cobertores, com um sorriso insistente no rosto. Decidi procurar por Alexy. Ele não estava mais em seu quarto, então já devia ter acordado. Quando desci até a cozinha o encontrei sentado, digitando algo no celular.

—Bom dia, Alexy.

—Boa tarde pra você também, mademoiselle.—Disse, carregado de ironia.

Eu olhei para o relógio vermelho na parede. Não eram nem dez da manhã, mas eu estava começando a me acostumar aos dramas de Alexy e resolvi não questioná-lo.

—Pensei que encontraria meu irmão apagado no sofá a essa hora. Aconteceu alguma coisa que eu deveria saber?—Ele me examinava com um olhar desconfiado. Eu puxei uma cadeira e me sentei.

—Quer parar com isso? Não aconteceu nada.

—Só achei estranho, vocês não...—Alexy parou de falar quando Armin surgiu na cozinha.—Bom dia, irmãozinho! Como estava o sofá?

Eu chutei a perna do gêmeo ao meu lado. Ele disfarçou a dor e me olhou feio. Armin não percebeu nada.

—Ah, não dormi no sofá. Precisei ninar Anastasia até ela dormir, acredita?

—Muito engraçadinho.—Resmunguei. Ele me dirigiu um sorriso.

Um sorriso perfeito, como só ele poderia ter.

Foco, Anastasia.

—Sério mesmo? Ele fez você dormir?—Alexy se levantou, segurando sua caneca decorada com ursinhos marrons.—Deveria ter feito você ficar acordada.—Ele se curvou e sussurrou a última parte só para que eu ouvisse, já se afastando.

Eu franzi o cenho, mas logo depois entendi o que ele quis dizer. Minhas bochechas voltaram a queimar. Por sorte, Armin não escutou nada. Estava ocupado demais preparando seu café da manhã.

Depois de encher o café com dezenas de colheres de açucar, ele tomou um gole. Seu rosto se contorceu numa careta. Eu não queria ter sorrido, mas não consegui evitar, mais uma vez. Era assustador o quão rápido eu estava me afeiçoando àquelas pessoas. Eu poderia me acostumar facilmente àquela rotina. Dormir e acordar ao lado de Armin, tomar café com Alexy, encontrar Rosalya no shopping... me parecia um dia perfeito.

No entanto, apesar de uma voz lá no fundo me dizer para mergulhar de cabeça, eu ainda não tinha coragem de abandonar a minha promessa. Não queria me machucar outra vez. Preferia passar a vida protegendo o meu coração a sentí-lo se quebrar dentro de mim outra vez.

Por mais que ele ainda esteja rachado.

Quando me dei conta, Armin colocou um prato de torradas e uma caneca de café diante de mim.

—Seu café da manhã, senhorita.—Ele piscou para mim.

Céus, como ele consegue ser tão bonito?

—Hum... obrigada... Armin.—Murmurei.

—Está tudo bem? Você parece preocupada.

Esbocei um sorriso.

—Está tudo bem, sim. Não é nada demais.

—Tem certeza?—Perguntou, se sentando ao meu lado. Só de olhar em seus olhos, tive vontade de contar tudo. Explicar todas as minhas paranoias, contar cada um dos meus medos, listar os sentimentos ruins que rondavam a minha mente... mas, por sorte, um ruído na porta me fez voltar à realidade.

Vitória surgiu na cozinha, carregando sacolas de compras.

—Oi, crianças! Olá, Annya!

—Oi, Vitória!

—Annya? Pensei que só tivéssemos dois filhos.—Um homem loiro surgiu atrás de Vitória, com um sorriso no rosto.

—Verdade! Você ainda não conheceu meu marido. Annya, esse é Arnaud.—Vitória o apresentou para mim. Ele deixou as compras sobre a mesa e apertou minha mão.

—É um prazer conhecê-la. Ouvi dizer que é a namorada do Armin, já fez o pedido, Annya?

—O-o quê?—Armin gaguejou, assustado.

—Ouviu dizer certo.—Alexy logo reapareceu na cozinha. A mãe dele fez um sinal com a cabeça em direção ao filho e piscou para mim.

—A-ah, eu estava esperando o momento certo, agora vocês estragaram a surpresa!!—Falei, arrastando a cadeira para perto de Armin e esbarrando em seu ombro. Ele continuava assustado.

—É só uma brincadeira, filho. Mas eu entendo se você for como o Alexy e...

—Ei! Calma aí, por que tem que ser oito ou oitenta? Eu sou hétero, mãe, te garanto.—Ele disse, com um suspiro. Eu e Alexy nos olhamos e ele sorriu. Assim como eu, deve ter se lembrado da conversa que tivemos na noite anterior.

—Que olheiras são essas?—Vitória perguntou erguendo o queixo do Armin.—Vocês não foram dormir tarde não é?

—Não.—Alexy disse, tranquilo.

—Eu fui.—Armin disse, também tranquilo.

Senti o olhar de Vitória sobre mim e só então me voltei para ela.

—Isso inclui a mim também?

Ela colocou a mão na cintura e me olhou como se fosse óbvio.

—Claro, querida, você é minha nova filha!

—Sendo assim, eu dormi tarde também.

—Meu Deus, mas o que é que os dois ficaram fazendo até tard...—Vitória parou de falar, alternando olhares entre eu e Armin. Ela sorriu.

—Jogando videogame, hein, filhão.—Arnaud falou, com a voz arrastada. Eu me engasguei com o café.

—Meu Deus, Annya, ignora os dois adolescentes que eu chamo de pais.—Armin passou a mão pelo rosto.

Os três davam risada e continuaram com as piadas entre si. Vitória tentava encerrar o assunto e me pedia desculpas pelas brincadeiras, mas não conseguia parar de rir a cada vez que o Alexy ou seu marido abriam a boca. Aposto que Alexy andou espalhando informações —fofocando— por aí. Eu estava morrendo de vergonha e Armin não estava muito diferente de mim, mas logo pareceu se reacostumar às piadas da família e retrucar cada uma delas.

Eu preferi ficar quieta, apesar de também achar graça. Apesar dessa história ter um fundinho de verdade, eu não podia deixar isso transparecer de jeito nenhum. Ninguém precisava saber da minha "quedinha" besta pelo Armin. Logo isso iria passar, não era nada demais.

Eu me levantei para lavar o que sujei, mas Armin logo se prontificou para lavar a louça no meu lugar. Eu encostei no armário ao seu lado.

—Preciso ir para casa...—Falei baixo.

—Já? Você podia ficar para o almoço.

—Acho que já estou aqui há muito tempo, Armin. Não quero incomodar.

—Você não está incomodando. Foi alguma coisa que meus pais disseram? Desculpe, às vezes eles passam dos limites...

Eu neguei com a cabeça, observando de longe enquanto os três conversavam e brincavam entre si. Senti um aperto no peito.

—Eu gosto da sua família.—Falei, sem pensar. Armin olhou para trás, sacudindo as mãos cheias de espuma dentro da pia, e sorriu.

—É. Também gosto. Ainda bem que eles decidiram escolher dois gêmeos com cara de doidos pra adotar.—Brincou, terminando de lavar a louça, e secou as mãos.—Quer que eu te leve em casa? Podemos ir andand...

—Annya já vai pra casa?—Alexy surgiu do além e se enfiou na nossa conversa.—Por que não fica para o almoço, garota?

—Foi o que eu disse...—Armin cruzou os braços e se recostou na pia.

—Você mora sozinha?—Arnaud perguntou e eu confirmei.—Nossa, então vocês dois são tão chatos que ela prefere ficar sozinha a ficar com vocês?

—Não é nada disso...—Eu ri.

—Talvez o problema esteja em nós dois, querido, não podemos nos esquecer que uma de nossas crias já está querendo nos abandonar também...

—Senti um certo tom de mágoa na sua voz, dona Vitória.—Armin resmungou, indo na direção da mãe e a abraçando.

—Você vai se mudar?—Perguntei.

—Eu vou para um apartamento aqui na cidade mesmo. Não se preocupe, vou continuar perto de você.—Falou, convencido.

—Na verdade, minha esperança era de que você fosse para mais longe de mim.

Ele me fez uma careta.

—É mais perto da faculdade e, como ele passa boa parte do tempo lá ou trancado no próprio quarto, acho que vai ser melhor para ele.—Vitória explicou.—Ou, pelo menos, é assim que eu estou tentando me consolar.

Um celular tocou no bolso de Arnaud e ele se afastou para atender. Quando voltou, uma expressão cansada estava estampada em seu rosto.

—Outra vez?—Alexy perguntou, como se já soubesse do que se tratava o assunto.—Pai, desse jeito, essa reforma não vai acabar nunca...

—Ah, você sabe como a sua avó é, parece que nunca está satisfeita com a casa. Agora ela inventou que precisa separar a sala de jantar da área da cozinha outra vez, antes que a gente viaje no meio do ano. Quando ela começa uma reforma naquela casa, temos que estar por perto para impedi-la de demolir tudo e refazer do zero.

—Papai era ótimo desempenhando esse papel.—Vitória murmurou para si mesma, parecendo recordar de algo.

—Seu pai tinha uma paciência de ouro. Se não tiver ido para o céu, eu dou a minha vaga pra ele.—Arnaud se esquivou quando Vitória tentou lhe dar um tapa. "É óbvio que o meu pai foi pro céu, engraçadinho!"

Os rapazes começaram a rir com a "briga" dos dois, como se já fosse uma piada recorrente entre eles e me peguei sorrindo pela situação também. Todos eles pareciam se dar tão bem... era reconfortante estar ali, por mais que eu não fizesse parte disso.

Depois de se recomporem da discussão, Vitória pediu a Alexy e Armin que preparassem o almoço e mantivessem a casa em ordem. Ela beijou a testa dos dois e me deu um abraço apertado, saindo logo em seguida.

—Hum... isso aí, o que a mãe de vocês diz é lei. Adorei conhecer você, Annya.—Arnaud me abraçou e disse só para eu ouvir.—Espero você como minha nora.

Deixei escapar uma risada nervosa.

—A-ah, c-com certeza.—Concordei, de modo sarcástico. Ele sorriu e deu tapinhas nas minhas costas.

—Confio em você para tomar conta desses dois.—Avisou, já se afastando.—Tchau, crianças!

A porta se fechou e ficamos sozinhos outra vez.


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