Start escrita por Queen Of The Clouds


Capítulo 34
Quando você está por perto




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/707796/chapter/34

Armin

Eu abri a porta do quarto só para me certificar de que Annya ainda estava dormindo. Depois do que aconteceu pela madrugada, ela apagou em alguns minutos, mas eu não. Tive medo de que ela pudesse ter outra crise, então mal consegui pregar os olhos.

Assim que ela dormiu, eu a deitei na cama e coloquei uma almofada entre nós dois, para evitar o tipo de cena que faria Lily infartar. Agora pela manhã, eu já havia ido ao mercado, voltado para casa, arrumado as compras e limpado o apartamento, mas ainda não havia encontrado motivação suficiente para retornar suas chamadas.

Eu preparei a mesa do café da manhã e me deitei no sofá super confortável de Annya. Eu não pretendia dormir, só queria descansar os olhos... mas foi mais forte do que eu. Eu estava cansado pela noite em claro e só acordei por causa de um barulho. Me sentei num pulo, pensando que Annya poderia ter se machucado, mas quando vi ela estava na cozinha, se esticando para pegar algo no armário.

Eu me levantei e fui até ela.

—O que está fazendo?

—Preciso pegar meu remédio.

Eu esfreguei os olhos e analisei as caixas sobre a prateleira.

—Qual deles?

—A caixa azul e verde.

Eu peguei e a entreguei. Voltei a me deitar.

—Desculpe por ter te acordado.—Murmurou, tirando o comprimido da cartela. Eu bocejei e me virei de lado, abraçando a almofada. Já conseguia sentir o sono voltando.

—Sem problemas.

—Obrigada por fazer o café e por... organizar a casa e...—Pelo seu tom, ela não parecia muito à vontade.—Eu vou tomar banho.

Escutei seus passos atravessarem a sala rapidamente.

—Hum... se precisar de ajuda é só chamar.—Falei, sem pensar.

Ela parou. Eu abri os olhos assim que terminei de falar a besteira e a fitei, constrangido.

—N-não foi o que eu quis dizer... eu quis dizer que se precisar de ajuda em... outra coisa qualquer... eu posso ajudar.

Ela assentiu, sem me olhar nos olhos.

—Eu sei.

—Legal. Okay. Tenha um... bom banho.

Escondi o rosto no sofá e franzi o cenho. Tenha um bom banho? Qual é o meu problema?

—Armin, sobre o que aconteceu de madrugada... 

Voltei a olhar dentro dos seus olhos, esquecendo toda a vergonha que havia acabado de passar. Meu coração deu um salto, tolamente esperançoso. Eu estava torcendo para ouvi-la dizer que sentia minha falta, que queria que tudo voltasse ao normal e...

—...eu quero que esqueça tudo aquilo.

Ela finalmente sustentou meu olhar, mas não foi como eu queria. Seu semblante estava fechado, rígido.

—Esquecer? Como assim?

—Esqueça tudo que eu falei e fiz. Eu estava no meio de uma crise e... estava com sono, não sabia o que estava falando.

—Mas...

—Só esqueça, Armin.

Ela entrou no quarto e bateu a porta.

Eu continuei na mesma posição, olhando o vazio que ela ocupava alguns minutos antes. Eu não conseguia entender. Repassei todas as minhas ações e falas desde que acordei procurando algum erro que pudesse ter cometido, qualquer deslize, mas não encontrei nada.

Eu disse alguma idiotice? Fiz algo que a desagradou? Será que encostei nela enquanto dormia? Falei algo errado enquanto tentava acalmá-la durante a crise?

Eu fiquei tão paranóico que até perdi o sono. Quando Annya saiu do quarto, eu estava mais do que acordado. Ela segurava um elástico entre os lábios e prendia o cabelo num rabo de cavalo. Estava vestindo um top preto e calça legging da mesma cor.

—Onde você vai?

—Vou caminhar.

—Por onde?

—Por aí.

—Tudo bem, vou com você.

Ela fechou os olhos e respirou fundo.

Sozinha, Armin. Eu quero caminhar sozinha.—Falou, decidida.

—Claro, agora você quer ficar sozinha.—Reclamei, me levantando.—Mas ontem à noite...

—Ontem à noite não aconteceu nada.

Nada? Annya, eu fiz alguma coisa errada? Falei algo que te deixou mal ou...

—Armin, eu só estou tentando consertar as coisas.

—Eu também!—Ela revirou os olhos.—Eu estou tentando cuidar de você, por que não me deixa eu fazer isso? Rachel não deixou de existir enquanto ficamos sem nos falar, sabia?

—Eu sei, mas...!—Ela abaixou o tom e suspirou antes de abrir a porta.—Não vamos discutir outra vez, okay?

—Como quiser, mas não posso deixar que saia sozinha.—Reafirmei, dando um passo à frente. Ela repousou sua mão sobre o meu peito, me impedindo.

—Armin, eu preciso de um tempo para pensar e não consigo fazer isso com você p...

Seus olhos castanhos trilharam um caminho até sua mão e, por fim, se fixaram nos meus. Eu a encarava, confuso, esperando-a terminar a frase.

—Não me siga. Por favor.—Pediu, deixando o apartamento.

 

Anastasia

Eu terminei de dar a volta em três quarteirões e fiz uma parada no parque para descansar. Eu não deveria me esforçar tanto, havia desmaiado há menos de vinte e quatro horas e ainda estava doente, mas precisava sair de casa. Eu queria pensar e não conseguia fazer isso com Armin por perto. Eu não entendia exatamente o porquê, mas estar perto dele era como empurrar a razão para o buraco mais escuro do meu cérebro.

Mesmo depois de tanto tempo, eu ainda precisava me afastar para enxergar a situação com clareza. Eu pensei que já tivesse passado por cima de tudo que sentia por ele, mas não passei. Eu estava magoada, mas ainda o queria por perto e precisava dar um fim nisso. Nós não funcionávamos como um casal, não funcionávamos como melhores amigos, não funcionávamos nem mesmo como conhecidos. Eu não podia continuar insistindo naquilo.

Mas eu ainda estava relutante em deixá-lo. Eu só queria um sinal de que deveria desistir. Qualquer um.

Eu desabei num banco de madeira, com a cabeça pendendo para trás. Um cara passou de skate, assobiou e falou uma babaquice qualquer que eu nem me dei ao trabalho de escutar. Em resposta, eu fiz um sinal não muito agradável com o dedo para ele. De repente, pensei em Alexy. Se ele me visse agora, vestindo roupas apertadas e sentada com as pernas abertas no meio de uma praça, brincaria dizendo para eu sentar igual a uma mocinha.

Eu sentia saudades de todos eles. Alexy, Rosalya, Arnaud, Vitória... até mesmo do Castiel, que eu não via há meses. Mas Rosalya e Alexy eram um caso especial. Eu os tratei mal, ignorei mensagens, bloqueei chamadas... eu com certeza havia os perdido e não os culpava por isso. Só queria ter a chance de me desculpar uma última vez antes de ir embora para sempre.

Eu estava começando a pensar em voltar para os Estados Unidos. Seria a única forma de trazer paz à Armin, à sua família e, talvez, à mim. Quando eu estava tomando café da manhã, observando Armin deitado no sofá, esgotado de cansaço... eu me senti mal. Aquilo era minha culpa. As preocupações de Alexy e Rosalya, as brigas com a Lily, o desentendimento com o Castiel... era tudo culpa minha.

—Oi! Quanto tempo!—Alguém interrompeu meus pensamentos. Eu abri os olhos para ver quem era e encontrei uma mulher, provavelmente da minha idade, que me olhava com um largo sorriso. Seu cabelo cor de mel estava preso, assim como o meu, e ela também usava roupas de ginástica, apesar de não estar deploravelmente suada como eu.

—Desculpe, eu te conheç...?

Ela se sentou ao meu lado e seguiu falando num tom animado:

—Tem alguém me seguindo. Não sei o que fazer.

Eu segurei o impulso de olhar em volta e continuei falando normalmente.

—Você conhece a pessoa? Viu como ela era?

Ela negou com a cabeça.

—Tudo bem. Quer que eu chame a polícia ou...?

Ela negou outra vez, exasperada.

—Eu quero ir pra casa.

—Mas ele pode te seguir e...

—Por favor.

Seu sorriso vacilou e as lágrimas não demoraram a aparecer nos cantos dos seus olhos. Já era fim de tarde, a praça ficava no centro da cidade e estava começando a encher com o fluxo de pessoas voltando do trabalho, da escola ou da faculdade. Eu não conseguiria identificar quem a seguia, podia ser qualquer um. Eu nem mesmo saí com o meu celular, poderia ligar para o Armin e pedir ajuda.

Não. Eu vou resolver isso sozinha. Logo não vou ter mais o Armin comigo, preciso reaprender a viver por conta própria.

—Tudo bem. Vamos só esperar um pouco e depois eu posso te acompanhar.

Ela concordou e abaixou a cabeça, se concentrando numa pulseira de guizos em seu braço. Suas mãos tremiam.

—Qual é o seu nome?—Tentei distraí-la.

—Sophie. E você?

—Anastasia.

Ela esboçou um sorriso e fungou.

—Como a grã-duquesa russa?

—A que foi executada? Espero que não.

Ela riu e soltou a pulseira.

—Eu podia ter feito uma comparação menos mórbida, não é? Desculpe se te assustei.

—Não assustou. Relaxa.

Nós voltamos a ficar em silêncio. Um grupo barulhento de adolescentes passou na nossa frente, rodeando um casal de amigos e fazendo piadas. A menina, envergonhada, segurava um buquê de tulipas rosas e o menino estava com o braço por cima de seus ombros, falando algo ao seu ouvido. Ela dava risadas e empurrava o seu rosto.

—As coisas são tão mais fáceis nessa idade, não é?—Sophie comentou quando eles se afastaram.

Não. Pelo menos não pra mim.

—São bem mais fáceis.—Menti.

—Parece que quanto mais velhos ficamos, mais difíceis as pessoas se tornam.

Pensei automaticamente na minha mãe. Me lembrei de todas as vezes em que tentei entender o lado dela, me coloquei em seu lugar. Ela nunca fez o mesmo por mim.

—Acho que as pessoas são sempre difíceis. O problema é que, quando somos mais novos, a inocência faz com que a gente acredite mais nos outros. Depois de algumas decepções, enxergamos as coisas como elas realmente são.

Sophie me olhava atentamente.

—É uma forma meio triste de ver a vida.

Eu dei de ombros.

—É a realidade.

Ela voltou a tocar a pulseira. Pelo menos os tremores parecem ter passado.

—Eu sabia que não deveria ter saído de casa hoje.—Murmurou.—Parece que acordei com o pé esquerdo pela terceira vez essa semana.

Esperei que ela continuasse. Não queria parecer intrometida.

—Meu namorado terminou comigo. Ontem à noite.

—Sinto muito.

—Não, eu era a vadia da história. Ele fez certo em terminar. Eu sou uma idiota egoísta.—Ela escondeu o rosto nas mãos e seu corpo inteiro chacoalhava quando ela começou a chorar copiosamente. As pessoas que passavam por nós duas estavam começando a olhar, curiosas. Eu coloquei a mão nas costas dela, assustada, e tentei acalmá-la.

—Se quiser conversar, eu...

—Pra ser sincera, ele nunca gostou de mim desse jeito. Fui eu quem insisti, eu achava que estava apaixonada por ele.—Ela falava rápido, notavelmente abalada.—Nós éramos amigos e ele gostava de outra garota, mas antes que ele se declarasse pra ela, eu cuspi tudo que eu achava que sentia na cara dele, eu o obriguei a corresponder os meus sentimentos. Ele... ele ficou comigo por pena!—Ela começou a chorar outra vez.

—Não diga isso. Ele devia sentir algo por você també...

—Não, ele...—Ela fungou.—Ele disse que não se sentia da mesma forma. Deixou isso bem claro. Mas eu sabia que iria perdê-lo pra ela e eu não podia aceitar a ideia de perder o meu melhor amigo.—Suas mãos gesticulavam, nervosas, enquanto ela falava.—Droga! Não era justo, ela não tinha nada a ver com ele, nós dois éramos praticamente alma gêmeas!

Céus, onde eu fui me enfiar? Ela estava começando a fazer um escândalo.

—Mas... por que você achava que iria perdê-lo assim? Ele podia continuar sendo seu melhor amigo e namorar quem quisesse.

—Ah, por favor, seria o trio mais patético do mundo! O casal e a amiga que não sabe viver sozinha.—Sophie secou as lágrimas com a palma das mãos, como uma criança.—Nós fazíamos tudo juntos, eu não conseguiria dividir a atenção dele com ela e muito menos continuar agindo da mesma forma sabendo que poderia estar atrapalhando-os.

Algo começou a incomodar dentro de mim. Eu não deveria estar me identificando com essa história... ou deveria?

—Era tudo perfeito... nós pensávamos igual, tínhamos os mesmos interesses, passamos por experiências parecidas, mas...

Ela me fitou, com uma expressão ainda mais chorosa, se é que era possível.

—Mas...?—Incentivei-a a continuar.

—Eu não sei! As coisas não davam certo! Nós brigávamos o tempo inteiro, de uma hora para outra começamos a discordar de tudo. Talvez eu só não conseguisse aceitar o fato de que alguém tão parecido comigo quisesse ficar com outra pessoa. Eles podiam ser diferentes em vários aspectos, mas pelo menos o sentimento era verdadeiro. Eu o forcei a escolher entre mim e ela e eu nem mesmo amava ele, não desse jeito...—Sua voz falhava.—Eu fui tão egoísta.

Ela voltou a chorar. Algo estalou dentro de mim. Eu dava tapinhas automáticos em suas costas, quando um milhão de pensamentos me vieram à cabeça.

—Eu não sou uma pessoa ruim, não é? Eu só não queria perdê-lo.

—Todo mundo se confunde às vezes.—Falei, sem nem mesmo olhá-la.

Minha cabeça estava a mil por hora. 

Eu pedi um sinal, não foi? A culpa era minha.

—Eu... eu quero ir pra casa.—Sophie disse enxugando as lágrimas mais uma vez. Ela riu entre o choro.—Eu aluguei os seus ouvidos com esse monte de bobagens... me desculpe, você perdeu o seu tempo aqui e...

Imagine, não precisa pedir desculpas. Você só precisava desabafar.—Eu fiquei de pé.—A sua casa é muito distante daqui?—Perguntei, alongando os braços.

—Não. Fica na rua das camélias.

Eu não fazia ideia de onde era isso.

—Tudo bem. Vamos lá.

Se antes eu já não estava falando demais, agora era como se eu praticamente tivesse feito um voto de silêncio. Em compensação, meu cérebro não parava nem por um segundo.

Eu também estava sendo egoísta. Armin se apaixonou por outra pessoa e eu não soube lidar com isso. O que eu estava pensando? Ele não iria esperar por mim para sempre. A culpa não é dele se eu sou uma pessoa que tem sempre os dois pés atrás com tudo. Se, depois de tudo que passou, ele conseguiu seguir em frente e encontrar alguém para confiar e amar, eu deveria estar feliz por ele. É o que os amigos fazem.

Talvez eu nem mesmo gostasse dele, afinal. Meu ego simplesmente deve ter ficado satisfeito demais por encontrar alguém tão machucado quanto eu. Eu estava sempre tão concentrada em pensar no pior das outras pessoas que nunca notei que eu não estava imune à isso. Eu também sou capaz de agir com egoísmo, ciúme, orgulho. Eu nem mesmo podia julgar Lily por ter raiva de mim. A minha proximidade com Armin era uma ameaça à ela, eu poderia ter tentado ser minimamente compreensiva com as inseguranças dela.

—É na próxima rua.—Sophie mais uma vez me tirou dos meus pensamentos.

—Ah. Certo.

Depois de andar distraída por um monte de esquinas, olhei teatralmente ao nosso redor. Eu havia esquecido completamente o motivo de estar escoltando Sophie de volta para sua casa. Pelo menos parecia não haver ninguém nos seguindo.

—Está tudo bem?—Ela perguntou ao atravessarmos uma rua.

—Sim, e com você? Está se sentindo melhor?

Ela não me respondeu.

—Você parece preocupada.

Eu também não respondi.

—Depois de ouvir todo esse drama, pode desabafar comigo também, se algo estiver te incomodando.

—Eu estou bem.

—Não é o que parece.

Uma pontada de antipatia deve ter estampado meu rosto quando olhei pra ela, porque logo ela se colocou na defensiva.

—Okay, desculpe! Não quis ser intrometida.

—Não, eu...—Suspirei.—Não é culpa sua. É que eu nunca falei sobre isso pra ninguém e... é complicado.

—Eu sou uma boa ouvinte.—Ela deu um meio sorriso, sem graça, e desacelerou o passo, me incentivando a falar.

 Eu a fitei antes de prosseguir. Eu nunca havia falado sobre a minha situação com o Armin com ninguém. Minha única conselheira era eu mesma e, depois de me trancar num apartamento por três meses, adoecer e beirar à uma depressão, eu tinha certeza de que não estava cumprindo meu papel como deveria.

—Eu conheci uma pessoa há alguns meses. Quase um ano, na verdade. Ele foi a primeira coisa boa que me aconteceu em muitos anos, então acho que tem sido tudo muito...

—Intenso?

—É! Acho que sim. Ele é engraçado, inteligente, cuidadoso...

—Bonito?

—Tão bonito que às vezes parece irreal.

Sophie riu.

—Estou começando a ficar com inveja.

Eu forcei um sorriso. Realmente, Lily era alguém de sorte.

—Nós somos parecidos em tudo e eu amo a companhia dele. Parece que qualquer momento com ele se torna mais leve.

—Você fala como se ele fosse seu namorado.

—Na verdade, ele nem sabe que eu gosto dele... e nem pode saber. Ele tem namorada agora.

Sophie parou de andar.

—O quê? Como assim?

—Eu acho que demorei demais. Fiquei tão ocupada pensando no passado e em todas as decepções que já passei que não consegui dar um passo a frente e dizer o que sinto por ele.

—Mas você tem certeza do que sente por ele?

—Sinceramente? Eu não sei. Eu nunca senti isso antes. Talvez possa ser só egoísmo, não é? Assim como aconteceu com você.

Ela desviou o olhar para frente e deu uma risada nervosa.

—Eu não sei se sou a pessoa mais indicada a te dar um conselho sobre relacionamentos.

—Eu também estou sendo egoísta, não é?—Insisti.

Ela balançava a cabeça, indecisa, como se estivesse escolhendo bem as palavras antes de dizê-las.

—Eu não quero ser a pessoa a te dizer isso, mas se você já o conhece há tanto tempo e nada aconteceu...

Eu não diria que nada aconteceu.

—...talvez ele não sinta o mesmo por você.

Mas nesse quesito ela pode estar certa. 

Sophie parou de andar em frente a uma casa pequena de dois andares. A fachada era toda branca e o terreno era cercado por cercas vivas, apesar de não estarem muito bem cuidadas. Parecia ser a casa mais escura da rua, nem mesmo os postes em frente à ela funcionavam bem. Eu não conseguia evitar de olhar para a lâmpada a cada vez que ela zumbia e se apagava.

—Chegamos.—Ela abriu os braços dramaticamente. Quando viu que eu olhava para a casa, se apressou em dizer:—O lado de dentro é mais aconchegante, eu juro.

—Acredito em você.—Falei, tentando ser simpática.

Era como se um peso tivesse saído das minhas costas, mas por que eu ainda me sentia tão mal? Eu pedi um sinal e recebi um. Eu não podia ficar irritada só porque não era a resposta que eu queria.

—Quer entrar? Podemos continuar conversando e...

—Não, eu tenho que ir, desculpe. Já está tarde.—Eu dei um passo para trás quando o poste zumbiu outra vez.—Obrigada por me ouvir, ajudou bastante.

—Não foi nada! Foi você quem me ouviu e ainda salvou a minha vida. Muito obrigada, Anastasia.—Ela estendeu a mão e eu a apertei.—Podíamos nos encontrar outra vez. Eu cheguei há alguns meses aqui na cidade, não conheço praticamente ninguém. Você pode me passar o seu telefone?

—Mas eu não...

Sophie já estava com o celular na mão, esperando quase ansiosa para que eu ditasse o meu número para ela. Logo eu nem estarei mais morando aqui.

Dei de ombros e peguei o celular, salvando o meu número como um contato de emergência. Sophie riu e me agradeceu outra vez, antes de se despedir.

—Até logo, Anastasia.

—Até, Sophie.

Eu caminhei desanimada de volta para o meu apartamento, mas pelo menos havia me decidido. Com sorte, em algumas semanas eu estaria dentro de um avião, indo para o mais longe possível de todos os problemas que causei.

E das melhores pessoas que já conheci em toda a minha vida.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!