Lady Luck escrita por Fadaravena


Capítulo 3
Capítulo 3




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Do lado de fora da casa de eventos formava-se uma fila de duas quadras, pessoas, em sua maioria jovens do sexo masculino, aguardavam desde cedo a abertura das portas marcada para às duas da tarde. Na calçada vários folhetos coloridos se espalhavam ou eram levados pelo vento. Era a aguardada estreia da jovem ídolo de dezesseis anos, Minami Mia.

 Naquele momento a garota se achava sentada na beirada esquerda do palco enquanto técnicos testavam os aparelhos de som e luzes. Seu agente andava de um lado ao outro a dez passos dela conversando em voz baixa ao telefone. Mia fingia não prestar atenção, concentrada em mexer num fio vermelho da peruca em suas mãos. Ela sabia do que se tratava, sabia que seu agente conversava com algum editor de revista, ou com seus pais a respeito de seus horários de trabalho. Mas, quando sentiu aflição em seu tom de voz e o nome da secretária ser pronunciado, percebeu que não era nenhum dos dois. A garota parou de mexer na peruca e foi até ele.

— O que houve com a senhora Homura? Choro, está me assustando. - puxou levemente a manga de seu terno.

 O agente despediu-se e desligou o telefone.

— Hoje é seu grande dia Mia-chan. Takahashi me contou que conseguiu agendar uma entrevista para tarde desta sexta. Já falei com seus pais e com o diretor do colégio, eles vão te liberar mais cedo. - Choromatsu deu um sorriso acolhedor.

 Mia não se atreveu a questionar mais, em vez disso disse que ia para o camarote dos fundos trocar de roupa.

 Era comum a Choromatsu fazer isso, esconder qualquer preocupação. A secretária era muito próxima dela, para Mia era quase uma conselheira, uma amiga confidente. Se espelhava em toda a ternura que era Matsuno Homura, em suas habilidades culinárias e seu jeito simples de lidar com as tarefas do cotidiano. Mia tinha muito medo de errar em sua estreia e foi uma semana antes da data ser confirmada que buscou conforto nas palavras de Homura.

 Ela deixava a gravadora ainda receosa, mexendo constantemente na barra da saia quando foi chamada pela secretária, Homura carregava algumas pastas que deixou em cima do balcão e pediu que Mia a aguardasse um pouco.

 A garota aguardou numa sala de esperas pequena, numa das poltronas. Estava enrolando uma mecha de cabelos quando a secretária se aproximou, carregava duas xícaras de chá, ofereceu uma à Mia e a outra colocou em cima da mesinha. A secretária juntou ambas as pernas e colocou uma mão em cada joelho, assim como faziam as professoras do primário quando precisavam ouvir seus alunos, seu rosto era sereno.

— Fiquei feliz em ouvi-la hoje. Acredito que conquistará sua geração, suas notas são claras e muito me agradaram, quando o pequeno nascer levarei ele para assistir um dos seus shows, ele vai ficar muito contente. - ela sorria, um sorriso ameno como o pôr do sol.

 Mia parou de mexer nos cabelos e agradeceu a Homura por suas palavras. A secretária assentiu e a convidou para ir em sua casa. Mia nunca estivera lá, e nem conhecia o marido de sua amiga, só ouvira falar dele pelo seu agente e pela própria Homura.

— Você vai gostar dele, tem um jeito mais agitado, e pode assustar no começo, mas no fundo é um bom homem.

— Homura-san, eu não tenho certeza como vou me sair, todos aqueles homens me olhando, me dá um pouco de medo. - Mia mirou o conteúdo líquido se mexendo na xícara em suas mãos, sentiu um respingo molhar seu dedo.

— Quando estiver lá em cima, feche os olhos, lembre de mim e de meu marido, lembre de Choromatsu, lembre de seus pais, todos lá embaixo gritando o seu nome, te dando apoio.

 Mia continuou olhando o chá, arriscou bebericar um pouco, ele a aquecia por dentro.

 Até aquele momento, em que se via no grande espelho pendurado na porta, lembrava dessa frase, mas agora ela lhe dava uma inquietação. Se perguntava o que poderia ter acontecido e voltava a mexer na barra do vestido colorido de babados.

 Quando deixava o camarote perguntou por Choro, precisava de uma explicação, mas ficou sabendo que o agente deixara a casa de eventos apressado. Isso só a deixou ainda mais apreensiva e a imaginar mil e um cenários. Não tinha como se concentrar na apresentação desse jeito. Virou a cabeça de um lado a outro a procura de algo, correu de volta para o camarote e viu em cima do toucador um copo ainda cheio de água, tomou-a de um só gole junto com um remédio para náuseas. Voltou para trás da cortina de pano, colocou-se a postos, microfone em mãos. Da onde estava podia ouvir o burburinho de conversas, eram várias vozes, respirou fundo.

 Parecia para ela que a cortina se deslizava em câmera lenta, centímetro por centímetro era exposta para uma multidão, como carne no açougue, imaginou. Quando sentiu as luzes se voltando para si abriu um sorriso de canto a canto e iniciou a auto apresentação formal. Fechou bem os olhos e começou a cantar a primeira música.

 No começo achou que fosse errar a letra, que ia se descuidar, chegou a pensar mesmo que estava gaguejando. O microfone estava deslizando de suas mãos, suava frio.

Quando chegou no endereço indicado no papel ficou a decidir-se se seguia em frente ou não, ela ergueu bem a cabeça admirando o complexo residencial, simples como qualquer outro, mas que no fundo escondia uma família que estava prestes a conhecer, um homem do qual nada sabia. Mia mexia sem parar na barra da saia, subiu os degraus com cautela e se pôs em frente ao número da residência dos Matsuno. Apertou a campainha e aguardou.

— Que bom vê-la Mia-chan, estávamos aguardando ansiosos.

Foi a senhora Matsuno quem atendeu, todo o ar que estava entalado em sua garganta se esvaiu em um só suspiro.

— Venha, assei uns biscoitos para nós.

— Com licença.

Mia subiu o pequeno degrau e foi logo tirando as sandálias com fivela que usava, deu uma boa olhada ao seu redor. Nada parecia fora do comum, à direita começava uma cozinha simples com um fogão, geladeira, pia e um balcão aberto que dava para uma sala também simples, apenas um sofá e uma televisão, à esquerda dois quartos, um aberto e vazio com as paredes cor creme, o outro fechado, provavelmente era o quarto do casal.

Mia foi caminhando a passos lentos, admirando tudo como se fosse novo, mesmo o simples causa espanto. Ela se acomodou com muita cerimônia no sofá, o sorriso ameno de Homura dizendo que fosse em frente, juntou as pernas e colocou sobre o colo a pequena bolsinha de alça que levava.

— E então, como foi seu dia?

A senhora Matsuno tirava do fogão uma bandeja, um cheiro gostoso e quente perfumava o espaço.

— Nada novo, não passei na prova de matemática e o professor mandou eu ir até a lousa resolver um problema.

— Isso não é bom, mas eu sei que é capaz Mia-chan, nos esforçaremos dá próxima vez, combinado?

Mia assentiu com a cabeça.

De repente escutou a porta de entrada abrindo e um canto cheio de vigor ser entoado. Ela olhou naquela direção e sentiu como se uma maré a impulsionasse para frente, em um terno igualmente simples lá estava o senhor Matsuno, os cantos dos lábios arqueados de tal forma que parecia que sua boca ia engolir algo, um sorriso ainda mais brilhante que o de sua esposa.

— Que cheiro bom, o que está preparando, querida? Posso comer um?

Mia presenciou uma cena nada cotidiana. Era o que acontecia, a senhora Matsuno jogava o biscoito recém assado na direção do marido que pegava no ar como se fosse um cachorro atrás de um frisbee. Mia ficou boquiaberta.

— Está uma delícia, querida, valeu. – E levantou o polegar em aprovação.

— Querido, quero apresentar a você uma pessoa, está aqui é Minami Mia da gravadora.

A garota levantou de um salto e curvou-se em cumprimento.

— Muito prazer, senhor Matsuno.

— Muito prazer, Mia-chan. – O sorriso não o abandonava.

Mia desviou o rosto para o lado e voltou a sentar-se no sofá. Mas o senhor Matsuno não parou no cumprimento e começou a contar como a esposa falava muito dela, que sempre teve curiosidade de ir ao trabalho da esposa ver a Mia cantar, se ela fazia shows em estádios de beisebol, que ela deveria fazer shows lá para dar boa sorte para o time. Sempre com o mesmo sorriso irradiante.

Ela sentia um sol entrar dentro de si, era abrasador e acolhedor, a fazia se sentir viva e ao mesmo tempo contente. Em pouco tempo pegava os biscoitos de maneira descontraída, contava algum caso engraçado que lhe aconteceu, partilhava da mesma opinião do senhor Matsuno sobre os hanshin tigers, liga profissional de beisebol, dava gargalhadas com eles, sentia-se num verdadeiro lar.

Sua mão parou de tremer, o microfone estava seguro em suas mãos, não lhe escorregava mais. Ela fechou bem os olhos e em seus lábios se desenhava um riso leve, chamou seu público com o mesmo vigor que naquele dia o senhor Matsuno a chamava de Mia-chan.


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