Herdeira da Lua escrita por Julipter, Julipter


Capítulo 26
Capítulo Vinte e Seis - Il sole e la speranza




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Matteo       

Sexta feira. Cinco de setembro. Ela ainda está aqui.

E eu estou cantando.

Estou cantando pra ela porque quero que me perdoe por toda a merda que eu não sei que fiz.

Eu sou um clichê.

O Café está cheio, como sempre. Itália serve mesas e sai e entra da cozinha e cochicha com Henri e a outra garçonete. Podem pensar que ela não está ouvindo a banda. Mas na verdade essa é a principal coisa que ela está fazendo.

E Matteo sabe que ela sabe que ele a persegue com o olhar o tempo todo.

Então ele canta.

Here comes the sun (aí vem o sol)

Here comes the sun (aí vem o sol)

And I say (e eu digo)

It’s all right (que está tudo bem)

Estava logo ali, o sol. Ele não quis ver antes. Não quis ver que tudo ficaria bem. Com ou sem Itália, tudo ficaria bem.

Little darling (queridinha)

It’s been a long cold lonely winter (tem sido um inverno longo e solitário)

Little darling (queridinha

It feels like years since it’s been here (parece fazer anos desde que ele está aqui)

Here comes the sun (aí vem o sol)

Here comes the sun (aí vem o sol)

And I say (e eu digo)

It’s all right (que está tudo bem)

Quando ela chegou, nada fazia sentido. Matteo pensara que ela trouxera sentido ao seu mundo, mas ele já estava ali. Itália só juntou as peças. Ela não fez com que Téo voltasse a ser seu amigo; Téo já estava ali. Ela não fez a banda, a banda já estava ali. Ela não trouxe a sua sanidade, ele sempre foi são.

Little darling (queridinha)

The smiles returning to the faces (os sorrisos estão voltando aos rostos)

Little darling (queridinha)

It seems like years since it’s been here (parece fazer anos desde que eles estão aqui)

Here comes the sun (aí vem o sol)

Here comes the sun (aí vem o sol)

And I say (e eu digo)

It’s all right (que está tudo bem)

É claro que Matteo não dependia dela. É claro que ela não era as nuances de alegria.

E, talvez não acontecesse tão cedo, mas é claro que ele voltaria a sorrir quando ela fosse embora. Ela não era o sol.

Sun, sun, sun, here it comes… (sol, sol, sol, aí vem ele…)

 

Little darling (queridinha)

I feel that ice is slowly melting (parece que o gelo está derrentendo lentamente)

Little darling (queridinha)

It seems like years since it’s been clear (parece fazer anos desde que está claro)

Here comes the sun (aí vem o sol)

Here comes the sun (aí vem o sol)

 

And I say it’s all right (e eu digo que está tudo bem)

Here comes the sun (aí vem o sol)

Here comes the sun (aí vem o sol)

And I say it’s all right (e eu digo que está tudo bem)

It’s all right (está tudo bem)

Matteo pensou que ela era o sol. Itália não era o sol. Ela era só... A brisa que afastava as nuvens de chuva. E o sol está chegando. Porque ela afastou a chuva.

(...)

O mundo fazia sentido.

Era... Aparente.

Sem escuridão cinza. Sem clarões cegantes.

Apenas aparente e real.

—Então eu não sou o sol.

Matteo ria porque era incrível. Era ele quem falava através de metáforas agora, não Itália. Mas essa era a língua dela, ela o entendia, e parecia perfeito.

O café estava vazio. Itália fecharia. Só os dois estavam lá, sentados de pernas cruzadas no palco, um de frente pro outro.

—Faz sentido que eu não seja o sol, - ela continua. – porque o sol está vindo. E eu estou indo embora.

Era um teste.

Matteo tocou o rosto dela, acariciou a bochecha, não parava de sorrir porque, meu deus, ele entendia.

—É. É por isso que você não é o sol. Mas você limpou o tempo, e eu agradeço.

—Então ta tudo bem? – Ela levou sua mão à dele, e os dois tiveram uma sensação reconfortante: aquela sensação apaixonada que parecia ter sumido por um tempo.

—Little darling,  it’s all right.

(…)

No dia seguinte, Matteo acordou tarde.

Choro. Ele ouvia choro. Algo se quebrou.

Quando saiu do quarto, o cabelo bagunçado e a cara amassada, Pedro passou correndo pelo corredor, berrando e chorando e com um papel nas mãos. Matteo tentou segurá-lo, mas ele bateu a porta do quarto e trancou a porta. Foi até a sala.

Geovana estava no chão da sala, com o rosto escondido entre as mãos e as pernas cruzadas. Um saco de lixo aberto ao lado dela.

Matteo se aproximou devagar, e aos poucos foi entendendo o que estava acontecendo.

Os quadros nas paredes. Os porta retratos. Tudo vazio.

—Mãe? – Chamou, tocando o ombro dela. Sentiu que a mulher tremia.

Geovana virou o rosto, mas não disse nada.

—Tudo bem. Tudo bem, vem cá. – Ele se sentou ao lado dela e a abraçou. – Tudo bem. – Repetiu.

Era o fim. Era exatamente isso, o fim. Um final feliz!

Chega de Gabriel. Chega de olhinhos de Gabriel o perseguindo pela casa. Chega de ligações e mais um desses shows e eu te tiro de casa, como se ele realmente pudesse fazer uma coisa dessas.

—Ele ficou furioso. – Geovana finalmente disse.

—O papai?

—Seu irmão.

Pedro.

Pedro tivera uma relação muito melhor com Gabriel do que Matteo. Pedro nasceu quando ele começou o tratamento. Gabriel gostava dele, realmente. É um garotinho inteligente e cheio de vida, que o ama.

Porque no fundo, a verdade era essa: Matteo nunca amou verdadeiramente o pai. Não amamos as pessoas para as quais temos que nos provar. Nos provamos, por vontade própria, para aqueles que amamos.

E o Pedro era assim. Ele chegava da escola com um elogio da professora sobre sua letra bonita, e mostrava ao Gabriel. Ele tirava uma boa foto, e era Gabriel o primeiro a vê-la. Quando se machucava, pedia para Gabriel cuidar dele.

Pedro era assim.

Ele amava o pai.

E o pai o amava.

E a guarda não era compartilhada.

—Eu tirei isso dele, Matteo, eu não tinha o direito de tirar isso dele. – Geovana o abraçou mais forte, se deixando chorar e soluçar.

—Vai ser melhor pra ele, mãe. Eu tenho certeza que ele vai entender isso. Vai ficar tudo bem. – Ele afagou os cabelos dela.

—Você cresceu sem o seu pai, Matteo. Ele estava aqui mas não estava. E agora eu o afastei do Pedro também.

Matteo segurou o rosto dela, secando as lágrimas com os polegares.

—Não tem nada que você tenha feito que não tenha sido pro nosso bem. Você me protegeu e está protegendo ele. Não tem nada de errado, mãe. O Pedro vai ficar bem. –Deposita um beijo na testa da mãe. – Vamos todos ficar bem.

Eu vou falar com ele, decidiu, silenciosamente. Assim que se acalmar. Vou conversar com ele.

(...)

—Você acabou de ganhar uma coxinha por conta da casa graças a sua cara de derrotado.

Matteo forçou um sorriso para Henri porque, mesmo aquele garoto radiante não ia conseguir melhorar seu humor naquele dia.

—Posso te dar uma cerveja, também.

—Desde quando vendem isso?

—Não vendemos. – Matteo revirou os olhos.

—Eu passo. Cadê a Itália?

Henri sumiu pela porta que levava à cozinha e voltou com um café particularmente bonito, levando o mesmo até uma mesa.

—Na escola. Ela começa uma hora depois de mim.

Matteo sentiu vontade de bater a cabeça na parede por fazer uma pergunta estúpida assim. Ele sabia que ela estava na escola. Sabia os horários dela em geral. Ela era sua namorada.

—Eu fico meio perdido quando não vou pra aula. – Henri dá risada, e por um momento a vontade de se machucar passou.

Filho da mãe.

—Tem algo que esteja querendo falar sobre? – O garoto perguntou, com sinceridade.

Matteo pondera.

—Tem umas merdas na minha família. – Despejou de uma vez.

—Tem umas merdas em toda família. – Meu Deus, o garoto perfeito fala “merda”.

—Acontece que eu e o meu irmãozinho não podemos mais ver o nosso pai. Eu realmente não estou nem aí, mas sei que pra ele é importante. Foi a justiça que determinou, porque o meu pai tem uma doença que quando não é acompanhada, pode deixá-lo meio agressivo. Minha mãe usou isso pra ficar com a guarda.

Ele planejava jogar isso em cima de Itália. Porque ela o ouve, compreende, abraça e dá bons conselhos. Mas ela não estava ali. E tudo bem.

—Ela está se sentindo culpada agora. – Finalizou.

—Com razão. – Henri disse, assentindo com a cabeça como se entendesse.

Como se esse cara entendesse alguma coisa.

—O quê?

—Matteo, eu não sei a história da sua vida nem da dos seus pais. Mas com a pequena informação que você me deu agora, o seu pai deve ter sido um bom pai pro seu irmão. E se ele foi um bom pai por tanto tempo mesmo com essa doença, por que ela o atrapalharia agora? – Henri começou a contar as moedas da caixa registradora como se estivesse falando do tempo lá fora. – A sua mãe usou de uma falha do seu pai pra ficar com a guarda. Mas ela também tem falhas. Talvez não falhas diagnosticadas, mas continuam sendo falhas. Se você não confia no seu pai, você tem suas razões pra isso. Assim como o seu irmão tem razões pra confiar.

Papai, eu tirei foto de uma borboleta amarela hoje. Mas apaguei sem querer. Quis chorar!

Eu tenho certeza que ela continua linda, com foto ou sem.

Ele realmente era um pai. Gabriel era um pai.

—Se a doença dele o atrapalhou como seu pai – Henri continuou. –, e vocês usaram dela pra fazer com que ele não seja um pai pro seu irmão, vocês não só não têm esperanças de que ele possa melhorar, como estão arrancando essa esperança do seu irmão também.

Pedro merece esperança.

Ele merece toda a esperança do mundo.


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Notas finais do capítulo

OI PESSOAS LINDAS DO MEU CORAÇÃO!
Alguém me segura, só faltam quatro capítulos :')
Música cantada pelo Matteo: Here Comes The Sun - The Beatles



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