Herdeira da Lua escrita por Julipter, Julipter


Capítulo 25
Capítulo Vinte e Cinco – Bonheur, Felicitá




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Matteo

Bem. Saudável. Completamente são.

Essas eram algumas das palavras escritas no novo diagnóstico de Matteo.

Era basicamente igual ao anterior, exceto pelas nuances de alegria em maior quantidade, o que Matteo pensou ser algo bom.

—Vou enviar pra sua mãe. – Jorge disse quando Matteo levantou os olhos do papel.

—E eu vou precisar da sua confirmação de que não tem como ela me fazer voltar pro acompanhamento.

—Ela pode, Matteo. Até você fazer dezoito, ela pode.

Matteo soltou um suspiro pesado, pegou a mochila e se arrastou pra fora da sala. Até agora, não era um de seus melhores dias.

Ele sofrera para tirar Pedro da cama. O garoto não queria ir pra escola. E foi horrível, ele começou a chorar e Matteo nunca sabe o que fazer quando ele chora, então ele teve que ligar pra Clara e foi constrangedor.

Sim, Pedro estava grande para chorar por ter que ir pra escola. Mas acontece que ele quebrara o braço a alguns dias, e quando apareceu na escola com o gesso e as outras crianças foram assinar e desenhar nele, uma delas escreveu... Um apelido não muito agradável aos olhos dele.

Ele não queria voltar pra escola com aquilo no braço, mas não podia simplesmente tirar, e Matteo não pensara na estúpida e simples solução em que Clara pensara: fita crepe.

Depois, era quase setembro. E não podia ser setembro. Porque ela iria embora em outubro.

—Como foi? – Sorriu ao vê-la ali.

Itália mordia o lábio, encostada de braços cruzados ao lado da porta. Geralmente, após as sessões de Matteo, ela sempre estava lá com uma expressão otimista. Agora, parecia preocupada. Era incomum, mas percebeu que a garota tinha em mãos um papel muito parecido com o que ele carregava.

Passou um dos braços ao redor dos ombros dela.

—Estou dentro da minha mais plena sanidade mental. – Ele sorriu e a olhou estrategicamente para acalmá-la. Não funcionou. – Ele disse que eu tive mais nuances de alegria do que no ano passado, e eu acho que a culpada é você. – Ela ri fraco. – O que foi?

—Não é nada importante.

—Você estava em acompanhamento?

—Não, eu não estava. – Matteo retirou o papel da mão dela. Itália bufou. — Qu'est-ce que l'enfer, Matteo! Dá pra me devolver?

Ansiedade.

Estava bem ali, com todas as letras.

—Você não pode ir embora. – Ele murmurou.

Itália arrancou o papel das mãos dele.

—Você não pode ir, Itália, tem que ficar aqui, porque a Amanda... Vai cuidar de você, foi ela que te acompanhou enquanto você desenvolveu isso, você não pode ir.

Ela lançou-lhe um olhar fulminante e tirou o braço de Matteo de seus ombros.

—Eu não preciso ser cuidada. Eu não preciso ficar aqui. E eu não preciso que você me diga do que eu preciso!

Idiota. Tão idiota.

Não, mas eu preciso. Preciso saber que você está bem, preciso que fique e preciso que me ouça.

Porque eu preciso de você.

—Você... Itália, você é as minhas nuances de alegria! Está no papel, eu sou mais feliz, você não pode ir!

—Não acredito que está dizendo isso.

—Preciso de você.

—Você não precisa de mim, Matteo, porque a guitarra não precisa da árvore!

—Talvez a guitarra seja feita de madeira. – Ele colocou as mãos nos bolsos e a encarou nos olhos. Estava prestes a chorar. Não queria chorar, porque era ela quem estava com problemas.

—Amanda enviou meu diagnóstico pro Adrien. Ele vai encontrar alguém lá que possa fazer o acompanhamento e cuidar da minha cabeça. Isso não é grave, Matteo, é só uma doença como outra qualquer que vai ser tratada. Pensei que entenderia. Dentre tantas pessoas, pensei que você entenderia.

Itália cruzou os braços e abaixou a cabeça.

—Eu entendo. Itália, qual é, eu... Eu não quero ficar longe de você.

—Isso é ridículo. É ridículo, sabia? Que você use de frases assim pra me manipular. Eu não posso ficar, e você sabe, e isso... Isso é completamente abusivo.

—Abusivo?

—Não só comigo, Matteo, com você também. Não se faça acreditar que você depende de mim, porque vai te fazer mal. Você não depende de mim. E não me faça acreditar nisso porque só vai servir pra eu me sentir culpada quando eu for embora. Você não entende que eu não posso ficar bem lá, pensando que você precisa de mim aqui? Pensando que posso magoar todos vocês?

Mas... Ele só queria tê-la por perto. Amá-la de perto. Beijá-la, abraçá-la, consolá-la. Ele só queria que uma coisa ficasse para sempre.

—Me deixa ir, Matteo. Só... Me deixa ir.

—Eu não tenho que deixar. Você não me pertence.

Itália levantou o olhar. Ele estava com raiva.

—Matteo...

—Me diz se eu te faço mal. – Ele pronunciou, baixo.

—O quê?

—Eu sou ruim pra você? Eu faço você se sentir mal? Porque, Itália, eu nunca me esforcei tanto pra não decepcionar alguém quanto eu faço contigo. E você está me afastando. Só pode ser porque eu te faço mal.

— Não. – Ela deu um passo a frente. – Não, Matteo. Você não me faz mal algum. – Mais um passo. – Você é incrível. Eu só não quero te magoar quando for embora. Não quero encher você com as minhas incertezas, entende? Eu preciso saber que você vai ficar legal. E talvez... Se me esquecer antes que eu vá, não sinta minha falta.

Ele pegou as mãos dela e as levou para o próprio rosto.

—Não me afasta. Você vai embora, Itália. A última coisa que eu quero... É te perder antes disso. E eu vou sentir saudades, e vai ser bom, porque é assim que eu vou lembrar que você esteve aqui.

Como pôde chegar a esse ponto?

Como pôde ir de apaixonado a dependente?

Ele não era assim.

Esse não era o Matteo por quem Itália se apaixonara e nem o Matteo que ele queria ser.

Ele queria ser o cara que se achava o novo Jimmy Hendrix. Que não precisava de ninguém. Que se importava com o irmão mais do que com qualquer outra coisa no mundo. Que se apaixonou pela gatinha do banheiro.

Itália não era o amor da vida dele, isso não existia porque a vida não se baseava num amor romântico assim. Ele a amava e a vida dele não dependia disso.

Não podia depender.

Onde estava aquele Matteo?

Quero ele de volta, ele pensava enquanto Itália se afastava a passos largos sem olhar para trás.

Eu não sou as suas nuances de alegria.

A sua felicidade não depende de mim, Matteo, depende de você.

Você precisa entender isso.

As palavras finais de Itália ainda martelariam muito na cabeça dele.

(...)

Itália

“Nunca deposite a sua felicidade em outra pessoa.

Eu entendo. Eu sei que tem gente que te faz mais feliz. Eu tenho muitas pessoas que me fazem mais feliz.

Mas veja bem: Marjorie e Oliver me faziam mais feliz. Eles se foram. Imagine se eu depositasse toda a minha felicidade neles?

Eu entendo que eu faça Matteo um pouquinho mais feliz. Ele também me faz feliz, um pouquinho a mais todos os dias. Só que o que acontece se eu for a única fonte de alegria dele?

Jorge diagnosticou errado. Essas “nuances de alegria” que ele chama de Itália não são nada saudáveis.

Eu quero que ele seja feliz, estando comigo ou não. Eu quero que assim que eu pise no avião, ele vai ficar com um monte de garotas e com todas as fãs que eu sei que ele acha lindas. Eu acho elas lindas, e convenhamos, tenho uma ótima auto estima. Caramba, isso é horrível. Por que escrevo essas coisas aqui? Enfim... Eu quero que ele beije outras pessoas. Eu quero que ele me esqueça e entenda que eu não vou poder voltar e que foi maravilhoso enquanto estive aqui.

E não, não digo isso por frieza. Digo porque me importo.

Eu sou ansiosa afinal, não é?Está lá no papel, com todas as letras. Tenho que ter certeza de que tudo vai ficar nos eixos.”

Depois daquela discussão desnecessária, Itália foi pra casa. Porque a dose de drama do dia havia chegado ao máximo.

Além disso, Matteo havia a irritado.

E isso acontecia faz tempo. Ela não agüentava mais aquela frase. Preciso de você, preciso de você, preciso de você... Ela não era a droga do anel de Sauron e ele não era a droga do Gollum.

Ansiedade.

Mas, não é todo mundo ansioso?

—Você devia terminar com ele. – Adrien interrompeu seus pensamentos falando do outro lado do computador. – Falando nisso... Eu terminei com o Gustavo.

—Eu não quero terminar, Ad... Quê? Espera. Você ta bem?

Ele riu. Aquela risada perfeita que só Adrien sabe dar.

—Lembra daquele curta que a gente via quando era criança? As vezes em cima e as vezes embaixo, assim é o mundo, escute o que eu acho: seu corpo é saudável dos pés à cabeça, agradeça sua sorte e a tristeza esqueça!

Itália riu e a lembrança de um carneiro sem pele e uma espécie de canguru com chifres (leprílope!) surgiu em sua mente.

E sobre a sua dança eu vou te mostrar... — Ela continuou. – Que pode subir e quase voar! Levante uma perna e arremesse no ar, é gostoso demais brincar de pular! Pular, pular, pular e pular!

Eles riram um para o outro e Itália tocou a tela do computador.

—Vamos ter que reassistir isso. – Adrien fez o mesmo. – Quando você chegar.

—Vamos ter que fazer muita coisa.

—E vai ficar tudo legal.

Itália sorri.

—Melhor que nunca.

Eles se despediram. E Adrien sumiu.

Ela sabia que ele diria isso. Sabia que Adrien não gostaria mais de Matteo assim que contasse esse pequeno acontecimento. Mas não escondia coisas do irmão.

E foi completamente infantil a forma como Matteo reagiu àquilo. E egoísta! Então ela tinha que ficar porque isso o deixava melhor? E quanto a ela? Ele estava bem. Itália não.

Não, ela não iria afastá-lo. Mas ele tinha que mudar isso, ele tinha que ser o Matteo... O Matteo verdadeiro, que estava com ela porque gostava dela, e não porque precisava dela.

Então, Itália teve um lampejo.

Arrastou a cadeira até a área de desenho e pegou uma folha e uma canetinha azul marinho. Ele adorava azul marinho.

Então, escreveu.

“E aí?

Olha, eu acabei de ter essa ideia e suspeito que a minha letra não esteja das melhores e também que seja uma ideia ruim, mas não vou conseguir pensar em outra tão cedo.

Sim, eu sei que você não gosta do Cheshire e nem ele de você.

Mas o Cheshire não te odeia. Ele jamais te odiaria, já que eu te amo e ele é obrigado a amar tudo que eu amo.

Você foi o primeiro brasileiro que eu amei.

Você me pediu a caneta emprestada, Leo. Você se condenou a este momento.

A você, eu deixo Cheshire, meu fiel companheiro. E não, pelo amor de Deus, isso não é um testamento.

Eu só acho que você o merece como ninguém merece. Que ele vai dar um toque especial ao caos engraçado da sua casa. Que ele vai amar seus irmãos e vai amar você e vai enlouquecer a sua mãe.

Leo, eu jamais poderia deixar o Cheshire com o Matteo. O Pedro é alérgico a gatos. Além disso, não faria bem pra ele ter algo meu tão perto. E eu quero que ele fique bem. Eu o amo, também.

Eu jamais poderia deixar o Cheshire com a Ju. Ele se estressaria tanto com a família dela. Com os pais rigorosos que a fazem chorar. Com a irmã que fica o dia todo em casa. Ele cuidaria bem da Vitória, mas não sei se a Vitória cuidaria bem dele. Não posso arriscar.

Pois é, Leo. “Eu escolhi você porque não ta tão fácil assim de escolher. Tem muita gente ruim.”

Sim, eu me lembro de quando você me mostrou essa música. Mas eu não te escolhi por isso, não. No fundo, ele sempre foi seu.

Você e o Cheshire tem essa mania de querer me proteger.

Eu não preciso de proteção, não.

Vocês deviam proteger um ao outro.

Ele é seu agora e para sempre.

—Da sua eterna Arco-Íris.” 


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Notas finais do capítulo

OI GENTE!
EU TÔ AQUI.

O capítulo tem umas referências. Pegaram?

Quem acha que o Matteo tá precisando mudar uns conceitos?

O curta da infância de Itália e Adrien foi parte da minha infância. Eu sei, é um amor. Aliás, se chama "Pular" e é da Pixar.

Adorei essa cartinha pro Leo.

Eita, chega.

Até o próximo capítulo!



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