Deixe-me te amar escrita por Nathália Francine


Capítulo 14
Quatorze




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Caminhei pela ilha o máximo de tempo possível.

Eu já havia ouvido histórias de Imateriais que ficavam tão vidrados em um Material que acabavam por destruir a vida deles, mesmo que sem querer. Nunca achei que o regente do amor pudesse fazer isso. Mas também nunca havia esperado que o Espelho fosse mostrar dois presságios tão assustadores quanto aqueles.

Eu deveria salvar minha filha e a doce Amy.

Não importava o que ela dissesse. Eu iria sair da vida dela.

Então só restaria Arly e nisso, Morte poderia me ajudar.

A lua estava desaparecendo o céu sendo engolida por nuvens escuras. A chuva começou leve e assim que passei pela Porta que dava no corredor do apartamento, ouvi os trovões. Entrei e a vi dormindo perdida em cobertas. Eu andei pelo apartamento pequeno, registrando cada detalhe. O gato surgiu entre as cobertas e miou. Eu me abaixei e beijei o alto de sua cabeça. Ele me encarou e por um minuto tive a certeza de que ele sabia de tudo e de que sentiria minha falta tanto quando eu sentiria a dele. Ele foi para o pote de leite que eu havia acabado de encher e me dirigi para a cama dela.  Acariciei seus cachos e sua pele. Observei a marca da queimadura: um coração borrado.

“- Vai passar...tudo vai passar.”

Me aproximei de seu ouvido e suspirei.

— Durma. – Ela suspirou e o sono aprofundou – Você nunca mais vai sofrer. Toda a sua dor, vai ser esquecida. Você não precisa mais ter medo. Não verá mais almas ou qualquer outra coisa. Você vai ser feliz. Vai encontrar o amor da sua vida e ser eternamente feliz...- eu engoli em seco e minha garganta se apertou.

Assim que me afastei um pouco, uma lagrima rolou pelo rosto dela e só então eu percebi que quem chorava, era eu.

Fui para o telhado e retirei meu arco. A flecha se materializou e a chuva se intensificou. Minhas lagrimas se misturaram com a tempestade me encharcando por dentro e por fora. Soltei a flecha e a vi brilhar tanto quanto o raio que a cercava. Aquela flecha garantiria que o sofrimento de Amy seria esquecido aos poucos. Tudo seria amenizado. Assim que a flecha de desfez, eu cai de joelhos e o granizo começou a cair fortemente congelando meus ossos.

Fiquei por alguns minutos, tremendo e chorando.

Um sobretudo preto me cobriu e saltos vermelhos apareceram na minha frente.

Ergui a cabeça e vi Honestidade com o rosto desfigurado pela tristeza e ao meu lado Morte estava com os braços no meu ombro e encarava o chão.

Ele me apoiou para dentro da Porta e deixou que eu caísse chorando no meio do asfalto rachado. O ar estava seco ali e a ferrugem tomava conta da cidade. Estávamos em uma ponte. Honestidade estava sentada na beirada e balançava os saltos tentando tirar a água. Morte a observava sem interesse. Eu me levantei e olhei em volta, estávamos em Pripyat. Ao meu redor eu via os esqueletos dos automóveis e da vida que a muitos anos havia abandonado a cidade após o desastre nuclear de Chernobyl. Eu observei cada detalhe da morte e do abandono. Devo ter ficado assim por muito tempo, encarando o nada no horizonte, pois Morte pigarreou e me arrancou do devaneio obscuro. Eu o encarei:

— Cupido...eu não sei o que lhe dizer. Mas no momento, isso parece ter sido a melhor coisa a se fazer.

Honestidade ergueu o olhar para mim e sorriu. O sorriso mais genuíno que eu já havia visto e que era impossível não retribuir. Eu me aproximei e ela me abraçou, Morte colocou a mão no meu ombro, eu nunca mais veria Amy, sabia disso.

Aquele fato era a destruição para mim, mas a visão no Espelho ainda não havia terminado e agora eu devia me concentrar em salvar minha filha. Amy seria feliz.

Extremamente feliz, sem mim.

 

                                 Um ano depois...

 

De toda a minha existência, esse foi o ano que mais me doeu.

Eu nunca me permiti chegar perto de Amy e quando não estava em meu quarto, estava com Arly. O pressagio que o Espelho mostrará não havia dado em nada a não ser que Caleb estava encrencado.

Certa noite, eu e Morte fomos atrás deles e o vimos dentro de um bote em um lago rindo abraçados. Isso não poderia ser nada tão perigoso, então esquecemos o assunto com a garantia de que Caleb voltaria a trabalhar e nas horas vagas, veria Arly.

Eu observei Henrique e Carla em baixo de um visco no telhado do apartamento dos amigos. O beijo estava para acontecer á muito tempo, mas a falta de coragem dos dois atrapalhava tudo. Sendo assim, resolvi atender a Canção do casal e despejar uma flecha certeira. Quando o relógio bateu à meia noite banhando Londres de alegria, o beijo aconteceu.

Eu fiquei olhando o casal de longe e minha imaginação me traiu.

Ela me mostrou Amy em meus braços me beijando docemente.

Meu sorriso me doeu o rosto e então o ar ao meu redor congelou.

— Feliz Natal, meu amado irmão.

Eu me virei e a vi. Com um vestido curto de couro vermelho e uma bota de cano curto preto. Os cabelos estavam esvoaçando desenhando seu corpo.

— Feliz Natal, irmã.

Ódio sorriu e se aproximou de mim encarando o casal ao longe que sorria de mãos dadas.

— Mais um trabalho bem feito, não é?

Concordei.

Ela veio até mim e me abraçou. Eu retribui e senti que ela chorava.

— Sinto sua falta.

— Ódio...

Ela me soltou e foi em direção a Porta que se materializava, antes dela passar segurei sua mão e a puxei para mim. Seus lábios colaram nos meus e entre os beijos ela sorria, e eu chorava.


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