Manipuladores do Futuro escrita por Amanda Maia


Capítulo 1
Prólogo




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Sophie teve um pesadelo. Não lembrou assim que acordou, mas seu coração batia forte. A sensação de ter visto algo ruim estava impregnada em sua pele e o suor frio também. Olhou pela fresta da janela e suspirou por ainda estar escuro, tinha prova na primeira aula e queria dormir um pouco mais.

Quando o celular despertou pela segunda vez, abriu os olhos assustada. Crente que estava atrasada, desligou o despertador, desatenta e começou a se arrumar. Vestiu sua calça jeans preferida, sua camisa baby look preta e os tênis. Foi ao banheiro, lavou o rosto, escovou os dentes, prendeu os cabelos num rabo-de-cavalo e parou um segundo para se olhar no espelho, só para ficar com raiva de suas olheiras, resultado de sua noite mal dormida.

Lembrava-se de ter acordado várias vezes durante a madrugada, mas principalmente, de ter acordado pela última vez por causa de um sonho do qual não conseguia recordar e que a deixou com uma sensação estranha. Não conseguiu ter um sono tranquilo depois disso. Passou uma base para disfarçar as olheiras, pegou sua bolsa, o celular e foi para a cozinha procurar algo para comer.

  Sua casa não era grande, mas às vezes parecia enorme, principalmente quando estava com pressa. À direita de seu quarto, no corredor, ficava o quarto de seus pais. Cada um dos quartos, com um banheiro, além do banheiro do corredor que não era utilizado.  Hoje, para Sophie, o corredor parecia relativamente longo.

Descendo as escadas em silêncio, percebeu que sua mãe já estava na cozinha colocando sua caneca de café dentro da pia. O primeiro andar da casa era espaçoso, com uma cozinha bem equipada e uma sala de jantar pequena. No corredor próximo à sala de jantar tinha outro quarto usado como escritório e outro banheiro pouco usado. A porta no fim do corredor dava para o quintal no fundo da casa. A sala comum era o lugar mais confortável da casa depois de seu quarto, isso era o que Sophie sempre dizia.

Todos os móveis da casa eram modernos e escuros. Sua mãe tinha fixação por móveis na cor tabaco e branco. Os eletrodomésticos e eletrônicos, de última geração. Seu pai, um engenheiro mecatrônico, fez questão de substituir tudo que ele disse que iria consertar, mas acabou montando outras engenhocas com as peças que, agora, ocupam uma parte da garagem, grande o suficiente para caber um carro grande e uma moto. 

Ao ver Sophie, Bárbara abriu um largo sorriso.

— Bom dia filha! Ainda tem um pedaço daquele bolo que você gostou na geladeira, seu pai não comeu.

— Espero mesmo que seja um bom dia, porque a noite foi horrível. – Colocou a bolsa no chão e sentou no banco próximo a bancada.

— Qual é o outro motivo do seu mau humor?

Bárbara já sabia, mas achava graça quando a filha reclamava. Abrindo a geladeira para pegar o bolo, ela olhou de relance para Sophie.

— Estou com fome e atrasada, mãe!

— Quando você não está com fome? Come e eu te dou uma carona. — Colocou o bolo em cima da bancada e observou a cara de desespero da filha. — Mas aonde você vai as 06h00 da manhã? – Bárbara não conseguiu se conter.

— Antes fosse 06h00. Deve ser umas 06h30 agora.  Preciso estar na faculdade até 07h15, tenho prova na primeira aula.

— Ah filha! Você está muito estressada... Ainda são 06h00. Come seu bolo com calma. Não devia trabalhar tanto, é muito nova para ficar ansiosa desse jeito. – Sophie não conseguia identificar se sua mãe estava de gozação ou preocupada.

— Droga! – Exclamou, indignada. — Coloquei o celular para despertar às 05h30 para não me atrasar e estou agindo como se estivesse atrasada.

A risada de sua mãe não diminuiu sua ansiedade.

— Preciso mesmo organizar e colocar um limite no meu trabalho. Tem uma pessoa querendo que eu venda coisas para as quais provavelmente não acharei compradores. – Sua mãe mal conseguia acompanhar, ela intercalava entre reclamar e mastigar. — E olha que tem pessoas querendo comprar e vender de tudo na internet. Os produtos dela são inúteis, mas vai explicar isso. – Sophie revirou os olhos igual ao pai.

— Você faz isso há quase seis anos. Queria ter seu dinheiro e fica sempre feliz quando olha sua conta, não é sempre que reclama assim. Se quiser parar de trabalhar...

— Acabei de entrar na faculdade, estou tirando minha habilitação, não quero ser sustentada e não posso parar agora, mãe. – Bufou, odiava pensar em se tornar um estorvo para seus pais, já achava que morar com eles, apesar de conveniente, era errado. Continuava ali porque gostava de estar perto deles. — Já recebi essa proposta antes. Gosto do que faço, sou boa nisso, mas quero reclamar de vez em quando. Lembrando que, vocês não me deixam pagar por nada. – Outra coisa que a irritava, uma vez chegou ao cúmulo de pegar as contas da casa escondida e pagar, só para levar bronca depois. — É bom ter o meu dinheiro e minha liberdade. Foram vocês que me ensinaram o real valor do dinheiro e o que significa ser responsável, agora não podem reclamar!

— Isso é verdade, mas não sei se te ensinamos na época certa. Afinal você trabalha desde os treze anos, estuda muito e sai pouco. Tudo bem. Quando você sai não tem hora para voltar, sabe o que tem que fazer e tudo mais… – Bárbara soltou um suspiro longo ao pensar na confiança que sempre depositou em Sophie. — A verdade, minha filha, é que você age como uma velha e tem apenas 18 anos.

— Obrigada, Dona Bárbara! Velha... – Bufou, fazendo careta. — Era só o que estava faltando, depois de precoce, CDF e isolada. Isso é perfeito! Definiu bem sua filha.

 — Ah, para com o drama! Eu só quero reclamar de vez em quando. – repetiu a frase da filha, em tom de sarcasmo. — Posso?

— Só se sua filha precoce, CDF, isolada, velha e dramática… – Apontou para si e riu. — Viu? Estou evoluindo... Puder reclamar também!

— Pode. – Bárbara apontou para o bolo. — Agora come para ocupar a boca.

Sophie voltou a comer abrindo exageradamente a boca. As duas começaram a rir. Bárbara e Rogério não precisavam se preocupar com a filha, mas agiam como pais agiriam. Aos 38 anos, Bárbara tinha uma filha quase tão responsável quanto ela, quase...

— Delícia de bolo, ainda bem que o pai não comeu. Falando nisso, cadê ele?

— Não teve a mesma sorte que você e saiu uma hora mais cedo achando que estava atrasado.

— Coitado! Mãe!

— O que eu podia fazer? – Retrucou em resposta ao tom acusatório de Sophie. — Acordei com ele resmungado que estava fodido e correndo pelo quarto pegando as coisas do trabalho dele, me deu um beijo e saiu. Só olhei no celular depois que ele já tinha saído com a moto. Não dava mais para avisar e é só por isso que você está comendo o bolo.

— Agradeço pelo bolo, mas parece que vai chover. Não é um bom dia para usar a moto. – Sophie concluiu, olhando para o tempo cinzento através da janela.

— Então ele foi pensando estar atrasado… Vai voltar molhado e puto da vida.

Uma nova rodada de risadas aconteceu. Rogério adorava comer doces, era quase tão estressado e ansioso quanto à filha e sempre motivo de chacota por isso.

— Aquela carona ainda está de pé? Agora são seis e meia. – Ela levantou para colocar seu prato na pia.

— Então vamos, deu sorte que seu pai saiu com a moto. Hoje era meu dia de ficar com ela.

— Que bom! Tive que prender meu cabelo, só o rabo-de-cavalo deu um jeito, não deu tempo de fazer uma hidratação e fiquei com ele armado.

— Você sempre adia essas coisas e seu cabelo é tão ondulado quanto o meu. Prefiro alisar, me poupa tempo e trabalho.

— Talvez eu alise também. – Deu de ombros ao passar pela porta.

Depois de trancarem a casa, Bárbara tirou o carro da garagem e elas seguiram para a faculdade.

O dia estava nublado e já começava a chover. Era uma sexta-feira, do dia 07 de outubro, o tipo de dia que as pessoas anseiam por ficarem em casa assistindo a filmes, deitadas no sofá comendo qualquer coisa gordurosa, quente demais ou doce demais.

Mãe e filha pararam em uma papelaria para comprar folhas sulfite e enquanto Bárbara pagava, Sophie esperava na porta, rindo da maneira como a mãe estacionou o carro.

— Ainda bem que aprendi a dirigir moto com você e carro com meu pai.

— Só está um pouco torto, nada demais. Seu pai dirige a moto como eu dirijo o carro e você não ri de dele. – Respondeu, fingindo estar magoada.

— Então deve ter alguém rindo dele nesse momento. Vocês são péssimos para estacionar.

— Ah, cala a boca ou vai para a Faculdade na chuva!

— Eu calo, mas é engraçado.

— Estou rindo horrores. – A mãe usou de sarcasmo, uma das características que a filha tinha dela, além das físicas. — Vamos!

Todos tiraram os carros da garagem lotando as ruas naquele dia. Estavam congestionadas e lentas, mas o trânsito na avenida próxima à saída da cidade estava fluindo bem. A Faculdade ficava na cidade vizinha, era perto, mas precisava pegar um trecho da estrada.

Bárbara olhava pelo retrovisor, quando viu uma pick-up preta andando em zigue e zague alguns carros atrás do seu.

— Aquele dirige mal, aposto que estaciona ainda pior. – Comentou, para provar que não era tão ruim assim no volante, existiam piores.

— Quem? – Sophie afastou um pouco o cinto para tentar ver pelo retrovisor.

— Olha para trás. – Bárbara levantou o polegar e indicou a direção.

Sophie seguiu o dedo de sua mãe e logo começou a suar frio, seu coração bateu mais forte, parecia que ia sair pela boca. Bárbara percebeu que algo está errado ao ver que a filha estava ofegante e ficando pálida.

— Sophie, o que foi?

— Mãe ele está chegando perto, todo mundo está saindo da frente, sai também.

— Estou saindo. – Bárbara começou a esterçar o volante para a esquerda e deu seta. Todos estavam buzinando e xingando. Um caos.

À medida que os carros saíam da frente, a pick-up acelerava e só o carro de Bárbara estava no caminho, além, é claro, dos carros à frente dela. Sophie olhou novamente para trás e sentiu que estava para perder os sentidos, mas tentou controlar a ansiedade.

No momento em que elas começaram sair da pista central, Sophie girou bruscamente o volante para a direita e gritou:

— Acelera mãe, agora!

 O carro foi para a direita e morreu; a pick-up atingiu dois carros: o da esquerda e o da pista central. O impacto da batida foi tão forte que provocou um engavetamento.

O coração de Sophie parecia que estava batendo em sua cabeça enquanto observa os três carros começando a pegar fogo. Ela sentiu vontade de gritar. A sensação de familiaridade com a cena a deixou em choque. O carro da esquerda estava com as portas travadas pelos dois lados, um pela mureta da avenida e o outro pela pick-up que pressionava as portas do lado do passageiro e a porta do motorista do carro da pista central.

O passageiro do carro da pista central consegue sair e em seguida a pick-up explodiu. Como nos filmes de ação que seu pai gostava de assistir de vez em quando.

Sophie gritou. Gritou por estar vendo aquela cena pela segunda vez, por saber que por pouco o carro delas estaria no mesmo lugar. Ela não entendeu como sabia para qual direção ir e, quando começou a se perguntar, uma sensação horrível tomou conta dela. Ter a impressão de já ter visto uma cena antes era normal, mas saber exatamente o que fazer era perturbador. Sua mãe observava, horrorizada o acidente, abraçou Sophie e só teve tempo de dizer “Meu Deus!” antes dos outros dois carros explodirem também.

Sob o barulho da explosão, Sophie se lembrou de seu pesadelo da madrugada e compreendeu como sabia para qual direção ir e que a sensação de familiaridade estava ali porque ela de fato existia.

Não era à toa que tinha dormido tão mal depois desse sonho. Mesmo sem conseguir recordar de seu pesadelo de imediato, a cena caótica, o fogo, gritos e o cheiro de carne humana carbonizada era de desnortear qualquer um.

 

 


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Notas finais do capítulo

Leitor querido, se chegou até aqui, foi por que houve interesse kkkkkkk Tá, sei que é óbvio! Mas quero lhe pedir, por favor, deixe-me saber sua opinião sobre a história e use os recursos disponíveis aqui para me ajudar a alcançar outros leitores. Esse é meu pedido. Agradeço sua atenção e espero que continue com a leitura.
Obrigada!



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