Green Eyes - Jily escrita por Vitória Serafim


Capítulo 13
O Funeral


Notas iniciais do capítulo

GENTE. OLÁ! Mano... Esse capítulo eu chorei... Chorei MUITO.
Eu não vou falar mais nada, só leiam.
(O título foi para fins de choque mesmo)
Boa leitura :)



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            É triste como a vida tenta brincar com a gente a cada brecha que ela acha, chega até ser engraçado. Já tinha sofrido demais nos últimos meses... Perdi meu emprego, me meti em confusão por causa de um caso com um garoto com câncer, quase perdi James Potter e agora isso...

            Eu achava que costumava saber o que significa dor, mas agora percebo que nada que eu considerasse dor chegaria ao que estava sentindo agora. Já tinha chorado tanto em menos de vinte e quatro horas que nem havia mais forças para fazê-lo, mesmo que no fundo do meu coração eu não conseguisse mais aguentar em pé.

Músculos da testa doloridos ao serem contraídos, ponta do nariz avermelhada e ardente e boca salivante; esses eram para ser sintomas de uma adolescente sensível ao ler pela primeira vez o livro A Culpa é das Estrelas, e por muito tempo foram os meus, mas nunca tão repetidamente. Era como se eu estivesse metida em um pesadelo, na qual eu nunca seria hábil o suficiente a escapar.

Encarava o meu reflexo desgostoso no pequeno lago de peixes dourados, quando senti a mão de James Potter pousar delicadamente sobre o meu braço.

— Lily? Vamos... Já está na hora ele murmurou, como se falar alto fosse uma ameaça aos meus tímpanos, o que realmente era, pelo menos depois da noite passada.

Respirei fundo fechando meus olhos por um momento e senti um sentimento avassalador me atingir pela centésima vez no dia. Engoli um bocado de saliva e controlei minha respiração antes de limpar os olhos e me virar para o rapaz afirmando com a cabeça. Empurrei a cadeira de rodas de meu namorado pelo gramado verde, bem aparado e ainda úmido – decorrente do temporal da madrugada – do cemitério e posicionei-o ao lado dos marotos, que estavam ali, visivelmente atordoados com a capacidade que tiveram de confiar seus segredos a um dos garotos que há tempos costumava ser um dos seus e agora já não era mais. Sirius estava com as expressões explícitas de culpa, afinal, essa história toda tem tudo a ver com ele.

O padre iniciara o funeral com algumas palavras monótonas que eram, provavelmente ditas em qualquer outro. O caixão coberto pela bandeira do Reino Unido, soldados por todo o recinto. O ambiente era intensivamente angustiante. Avulso às palavras do padre, tudo o que se ouvia naquele pedacinho eram os soluços e fungados proveniente das seis fileiras de pessoas trajadas em negro que assistiam à cerimônia fúnebre.

Alguns conhecidos prestaram homenagens ao falecido, mas não pude ouvir nada, as lágrimas silenciosas que escorriam pelo rosto de minha mãe eram dolorosas demais para que eu pudesse me concentrar em qualquer outra coisa ali.

— E agora, Lily Evans gostaria de falar algumas palavrinhas – o padre comentou e minha mãe acariciou meu braço carinhosamente depois de assoar o nariz pela quinta vez no mesmo minuto.

[30 HORAS ATRÁS]

Tinha acordado fazia um tempo e ainda não tinha caído a minha ficha que tinha dormido com James Potter. A minha mente latejava toda vez que eu revivia a cena da noite passada, não por estar arrependida, mas por simplesmente não conseguir acreditar que a minha hora tinha finalmente chegado. James tinha sido extremamente cuidadoso comigo, me ajudava sempre que tinha a oportunidade e nunca tinha pensado que ele era tão compreensível quanto ele tinha sido no nosso momento. Por muito tempo eu nunca pensei que estaria viva para sentir nada disso, mas felizmente, não só eu, mas James Potter estava vivo para me proporcionar aquilo, e por isso eu era muito grata.

Após vinte minutos presa aos meus devaneios ainda tendo minha cabeça sobre a pele quente de Potter e o corpo debaixo das cobertas, levantei lentamente da cama, caçando peças perdidas de minhas roupas pelos cantos do quarto e deixei o quarto e um James ainda adormecido para trás.

Entrei no banheiro e tomei um banho quente, relaxando todos os músculos do meu corpo e lembrando-me de como foram tocados pela mão direita de meu namorado no meio dos movimentos mais incríveis que pensei ter realizado. Era tudo muito surreal. Nunca que eu teria imaginado que hoje estaria aqui no banheiro de James em plena segunda-feira de manhã logo depois acordar de uma das melhores noites da minha vida, mas tinha acontecido e eu tinha gostado.

Enxuguei-me na única toalha que se encontrava pendurada no banheiro e acabei por vestir a mesma roupa de seda do jantar da noite passada por falta de opção. Caminhei até a sala e vi a minha maleta com violoncelo ali encostada no braço do sofá. Sorri e me encaminhei até ali, e retirei o instrumento da maleta, posicionando-o entre as pernas exatamente como tinha feito há aproximadamente vinte e quatro horas atrás e deslizei a crina da vara que usava para tocar sobre as cordas. Sem nem mesmo perceber tinha começado a tocar.

(Representação: https://www.youtube.com/watch?v=WZjFMj7OHTw)

Só fui sair de meus devaneios quando escutei um ruído em minha frente. James Potter estava parado no corredor sentado em cima da cadeira de rodas, o rosto inchado – mostrando que tinha acabado de acordar – os cabelos totalmente despenteados caindo-lhe sobre a testa, o olhar sonolento e a boca moldada num sorriso abobalhado. O encarei um pouco desconfortável, afinal, havia inúmeros motivos pela qual eu poderia estar me sentindo constrangida no momento, cabia ele escolher um.

— Ah... Desculpe-me se te acordei... É que eu o vi aqui e quando percebi já estava... – ele se aproximou de mim com mais rapidez do que de costume e puxou meu rosto para perto do seu, me dando um beijo. –... tocando — terminei desnorteada e continuei de olhos fechados, como se olhá-lo me fizesse mal.

Não sabia se tinha agradado a James na noite passada. Tinha apressado as coisas e talvez não fosse a hora... Meu Deus... E se eu estraguei tudo?

James pareceu me observar por um tempo e senti seus lábios encostarem no meu nariz, mesmo não vendo nada, podia imaginar o sorriso se formando nos lábios dele mais uma vez.

— Olhe pra mim, bobinha... – ele sussurrou, obviamente notando o meu desconforto e sabendo exatamente a que se referia. Abri os olhos e senti minha circulação concentrar no rosto. – Não se sinta constrangida por ontem... Eu me sinto honrado por ser o homem com quem você teve a sua primeira vez e não quero que pense que foi de repente porque nós dois sabemos bem a conexão que temos. E como alguma coisa pode ser ruim quando essa coisa envolve você? – ruborizei mais ainda. – Foi a noite mais incrível de toda a minha vida.

— Não seja exagerado... – comentei abaixando meu olhar. – Não precisa dizer que gostou sem ter gost-

— Pare de besteira, Lily. Você é a pessoa mais maravilhosa que eu já conheci e dormir com você com certeza era um dos tópicos que estavam na minha lista de desejos em longo prazo – ele comentou e eu ri abraçando-o.

— Agora fiquei curiosa... Uma lista de desejos sua? Fico imaginando o que mais existe nela... – comentei com um sorriso. Ele soltou uma risada nasalada que me fez estremecer.

— Você não vai querer saber... – comentou ajeitando os óculos para me encarar.

Observei-o tentando decifrar que é que aqueles olhos castanho-esverdeados estavam tramando.

— O que foi? – perguntei estreitando os olhos em sua direção. Ele continuou calado. – É melhor você falar ou vou ter que arrumar meus próprios métodos... – disse cruzando os braços com as sobrancelhas erguidas.

— É... Deve parecer meio idiota para você, que começou carreira de medicina e tudo mais... Mas eu sinto que... – concentrava toda a minha atenção nele, mesmo que pareça loucura, o meu intuito nos últimos dias era saber tudo sobre James Potter. – Sinto que devo investir na minha carreira na música – ele terminou e eu prendi a respiração.

Música sempre fora o que eu sempre sonhei para a minha vida. Violoncelo desde criança me trouxe uma alegria surreal pra mim e eu, a princípio também queria seguir carreira musical, mas sabia que não teria muito futuro, visto que eu precisava logo arrumar um emprego para ajudar minha família nas despesas da casa.

Agora tinha tudo se esvairado... Os meus anos de faculdade agora não valiam mais de nada, meu nome já teria se espalhado pelo círculo de internatos e mesmo que eu tentasse ninguém me aceitaria, porque, obviamente, uma médica nunca comete erros de tamanha gravidade, especialmente quando se trata de crianças inocentes.

Seria agora uma nova oportunidade batendo na minha porta? Meu namorado era tão talentoso quanto eu na música e...

— Está sugerindo que façamos uma dupla? – perguntei abrindo um sorriso largo.

Ele arregalou os olhos e retribuiu o sorriso.

— Na verdade eu ainda não tinha pensado nisso, mas acho seja uma ideia que devemos averiguar – disse animado, mas no segundo seguinte murchou.

Fiz um sinal com os olhos como se perguntasse o que estava havendo.

— Mas agora... Tenho quase certeza de que a minha mão nunca mais será a mesma e temo que nunca consiga voltar a tocar tão bem quanto antes... Ainda mais que a mão esquerda é a que eu uso para trocar as notas... – ele comentou e eu suspirei entrelaçando minha mão esquerda em sua mão direita.

— James... Pare de se preocupar com esse acidente... Você vai fazer a fisioterapia, vai voltar a tocar e também a andar. É só uma questão de tempo, ok? – animei-o.

— Certo, certo. Não tenho nada a reclamar quando tenho o amor da minha vida só pra mim – ele comentou com um biquinho e fez menção de me beijar mais uma vez. Imitei-o, mas minha vontade de rir foi maior. – Não tem graça, ruiva... – ele falou rindo da minha risada.

— Você é tão meloso, Potter... – revirei os olhos e ele riu corando.

Ficaríamos ali o dia inteiro um rindo da cara do outro se os ruídos vindos do hall não tivessem nos despertado de nossas brincadeirinhas. Levantei rapidamente e abri a porta, vendo uma morena batendo insistentemente na porta do meu apartamento, como se o mundo fosse acabar. Franzi o cenho e a encarei.

— Holly? O que é que...

— Ah meu Deus, Lily! Amém! Precisamos conversar e rápido! Eu estou totalmente surtada. Céus! — virei-me para James com um olhar de “me-desculpe-mas-acho-que-tenho-que-ir” e fechei a porta atrás de mim, destrancando, consequentemente, minha casa para permitir a entrada de minha amiga.

— Entra... Pode ficar à von-

— Ele está me enlouquecendo totalmente! Meu Deus, eu odeio Sirius Black – ela se aproximou de mim e agarrou meus braços finos com tanta força que eu tinha certeza que ficaria a marca. – ODEIO! – Holly olhou nos meus olhos e depois de notar que eu ficaria em silêncio até que me explicasse que diabos estava acontecendo, ela bufou e levou as mãos à cabeça.

“Ontem a tarde você sabe que discutimos mais uma vez na frente da casa do Remus e tal... Eu te falei que ele disse que queria voltar comigo, mas eu, obviamente, não quis, porque não mereço ser usada. Na casa dos seus pais ontem a noite toda vez ele me encarava na hora da minha vez de fazer a mímica, era uma mistura de flerte e inocência – ergui as sobrancelhas. – Eu sei... Eu sei... Não faz o tipo dele – ela suspirou e desmontou-se em cima do tapete de veludo da sala de estar.

Tirei meus sapatos, os deixando ao pé da porta e me deitei do lado da morena. Aquilo me fazia lembrar do dia em que me mudei para cá. Estávamos todos exaustos e no fim acabamos nos esparramando pela sala. Já fazia três meses...

— Você ainda gosta dele que eu sei.

— Ele foi um idiota...

— Mas temos que saber perdoar as idiotices de quem amamos... – comentei no quanto estava arrependida por não ter conseguido perdoar Potter antes.

— Você diz isso porque está as mil maravilhas com o James – ela bufou encarando o teto emburrada.

— E me arrependo de não tê-lo feito antes... E... – engasguei. Iria contar para minha amiga sobre a noite passada. – Ontem à noite... Bem...

Ela me encarou, notando obviamente a minha insegurança ao querer me expressar. Sabia que isso acontecia quando tinha alguma coisa que eu tinha de contar, mas estava tímida demais para fazê-lo.

— Nós... – fiz um gesto.

Ela franziu o cenho não entendendo. Revirei os olhos a encarando como se a frase “Eu transei com James Potter” estivesse estampada na minha cara. Só depois de alguns segundos ela arregalou os olhos, finalmente entendendo.

— OH. MEU. DEUS! EU NÃO ACREDITO! – ela abriu a boca em um perfeito “o” e caiu por cima de mim, me abraçando. – LILY! COMO FOI?! QUERO DETALHES!

Holly me levou para o quarto e nós sentamos na cama para que ela ficasse plenamente focada no que eu diria sobre a minha noite.

— Vai logo, desembucha! – ela exclamou impaciente, tirando-me de meus pensamentos.

— Ah, eu... – corei só de relembrar a cena.

— Sabia que ia acontecer muito em breve! – ela começou a falar mais consigo mesma do que comigo. – Vocês são perfeitos um pro outro e seus pais os apoiam em tudo...

— Fui eu quem quis – disse de uma vez por todas.

— Claro que quis. Quem não quereria passar uma noite nos braços de James Potter? – disse eu a repreendi com o olhar. – Que é? Só achei que tava na hora.

— Ah, claro... – suspirei deixei que meu corpo tombasse na superfície plana do meu colchão de molas. – Eu não estou acreditando que fui eu quem comecei isso tudo...

— Está dizendo que se arrepende? – ela contraiu a musculatura da testa.

— Nah, não me arrependo. É só que... Cada momento que eu passo perto dele me amedronta. É como se eu fosse a pessoa mais sensível da vida. Eu não era assim... O que eu me tornei? – coloquei as mãos na frente do rosto.

— Parece que temos uma Lily apaixonada por aqui... – ela sorriu de maneira maliciosa e suspirou tirando o celular do bolso, deslizando o dedo sobre a tela como se passasse pelo feed de alguma rede social.

Fiquei ali encarando o teto do meu quarto por um tempo e suspirei. Eu estava pirando... Estava namorando James Potter e já tínhamos tido a nossa primeira vez. Foi tudo tão rápido que eu nem vi o tempo passar.

— E Alice? Tem tido notícias dela? Eu andei meio desconectada nos últimos dias, se é que me entende... – disse deixando o lance da demissão implícito.

— Ah... A Ali está toda diva. Já tirou altas fotos nos sam... Sambó sei lá. O lugar que tem aqueles desfiles malucos que ela sempre adorou ver. Você não sabe o quão feliz ela está... Melhor lua de mel de todos os tempos! – ela sorriu clicando em uma foto onde Frank a abraçava por trás e ambos sorriam, provavelmente no primeiro dia em que eles chegaram ao Brasil. A legenda era “BR” e um emoji da bandeira do país.

— Que lindos! James foi muito gentil em dar um presente desses... – comentei e Holly sorriu logo em seguida. – Ah! Esqueci-me de te contar... Consegui um emprego no Ministério, sabe? Eles tinham várias vagas para recepcionistas e secretárias e aí eu vou trabalhar na parte de preencher cadastros e tal... Sei que não é grande coisa, mas assim eu já posso me sustentar sem ficar dependendo da minha mãe o tempo inteiro... Ela volta da Romênia essa semana. Ficou por mais uns meses lá por causa de negócios, é complicado... – ela comentou e eu assenti com a cabeça.

— Entendi... Mas poxa, Holly... Fico muito feliz por você! – sorri e voltei a me sentar, pousando minha mão sobre seu ombro direito.

— AAAAAA! – recuei imediatamente ao ouvir o berro da minha amiga.

— Mas o que...?

— Sirius Black é maluco! – ela jogou o celular em cima da cama e começou a andar de um lado a outro do quarto. – Não consigo ver isso. Olha você – ela disse apontando brevemente para o celular em cima da colcha da cama.

Olhei para a postura histérica de minha amiga e hesitei em pegar o celular por alguns instantes. Juro que apareceria o vídeo da Samara ou coisa parecida, ela sairia de seja qual escuridão ela estivesse só para nos matar, mas tudo que eu me deparei foi a página do blog O Profeta Diário aberto na ala Mais vistos.

Entre as postagens mais frequentes que constavam no blog, havia um vídeo de Sirius interpretando uma música de James Bay, chamada Let It Go. O mais lindo daquilo não era só a voz dele acompanhada da melodia linda do violão que ele tocava, nem os cabelos arrumados propositalmente iguais aos do cantor original, mas a legenda que ficava em cima do vídeo “#HH”.

— Eu não acredito... – comecei sorrindo largo.

— Ele é um idiota, não é? – ela cruzou os braços e direcionou o olhar para além do horizonte mostrado pelo vidro da porta da sacada do meu quarto.

— Holly... Na legenda do vídeo tem uma hashtag com as suas iniciais. Sirius dedicou uma música para vocês... Que lindo! Vocês precisam voltar! – falei quase chorando ao reproduzir o vídeo.

— Não force a barra... Ele fez mais do que obrigação de fazer alguma coisa para se desculpar comigo... – ela comentou e eu revirei os olhos.

— Não seja tonta, Hall. Sirius é o maior cachorro que já conheci, então para ele dedicar uma música é coisa séria... Se eu fosse você eu pensaria duas vezes antes de desistir dele.

I used to recognize myself
It's funny how reflections change
When we're becoming something else
I think it's time to walk away

            – Cara... Isso é lindo... – sibilei para mim mesma. – Tem tudo haver com a relação de vocês. É como se ele estivesse pedindo para vocês voltarem...

            – Mas... Não vamos— ela hesitou.

            – Ótimo... Fique aí com o seu orgulho, assim como eu fiquei com o meu. Eu te asseguro que é um saco ficar reprimindo sentimentos que podem te fazer bem, Holly. Por muito tempo escondi meus sentimentos por James e agora que estamos juntos eu me sinto... livre— comentei e ela ficou calada.

***

            Logo após Holly ter ido embora – depois de uma longa hora de conversa sobre o relacionamento com o maroto de cabelos negros – troquei minha roupa que ainda estava do dia anterior e segui para a cozinha. Preparei um pão italiano com queijo e uma xícara de chá. Não tinha nada marcado para fazer no dia e então decidi que já estava na hora de superar aquele hospital e aquele cargo, na qual eu tinha sido afastada, e ir visitar aquele lugar mais uma vez. Afinal, eu ainda tinha um paciente na qual eu me importava.

            Mesmo causando muitos problemas para a minha carreira, eu não culpava Harry Lancaster de absolutamente nada, muito pelo contrário, ele era a grande vítima daquilo tudo. Quem é culpado por adquirir câncer? Ainda que proibida de vê-lo, quando ainda trabalhava no London Plainsboro Hospital eu costumava passar no quarto de Harry fora do horário de visita, onde ele estaria em suas sessões de quimioterapia e eu poderia observá-lo dormir por alguns breves instantes.

            O inverno já estava chegando ao seu fim e logo logo os arvoredos de Londres estariam floridos mais uma vez. Olhei meu reflexo no espelho e percebi o contraste que uma roupa mais light causava quando comparada aos meus conjuntos de tecidos grossos que comprara só para usar no natal. Senti meu celular vibrar no bolso traseiro da minha calça jeans e vi uma mensagem de James no WhatsApp e mais umas 7 conversas. Tinha que ir me acostumando com isso.

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            [28/02/17 – 11:13] James Potter: Já estou com saudades, dá pra acreditar?

            [28/02/17 – 11:13]: Não seja bobo... Eu saí daí faz pouco tempo kk

            [28/02/17 – 11:14] James Potter: Eu sei, mas ainda assim...

            [28/02/17 – 11:14] James Potter: A gente podia fazer alguma coisa agora à tarde, você não acha? Não aguento mais ficar dentro desse cubículo de apartamento o dia inteiro...

            [28/02/17 – 11:15]: Você está me chamando para sair, James Potter?

            [28/02/17 – 11:15]: É isso mesmo?

            [28/02/17 – 11:15] James Potter: Provavelmente. Somos um casal agora, então acho que não seria uma surpresa se eu te chamasse para sair, seria?

            [28/02/17 – 11:16]: Nah...

            [28/02/17 – 11:16]: Afinal, nunca foi uma surpresa, não é?

            [28/02/17 – 11:16] James Potter: Considerando que eu passei os três anos do ensino médio te atormentando por causa disso... Então realmente não se trata de uma surpresa pra ninguém... kkkk

            [28/02/17 – 11:17]: Realmente.

            [28/02/17 – 11:17]: Seria ótimo, mas eu já estou saindo agora para ir visitar o Harry e não sei que horas vou voltar...

            [28/02/17 – 11:17] James Potter: Harry? O garotinho que está no hospital?

            [28/02/17 – 11:17]: Esse mesmo... Sempre estou visitando ele, sabe? Não que eu me sinta culpada nem nada mas...

            [28/02/17 – 11:17] James Potter: Se afeiçoou ao menino...

            [28/02/17 – 11:18]: Sim.

            [28/02/17 – 11:18] James Potter: Isso é ótimo, Lily. Se aproximar de crianças sempre foi o seu forte, isso explica muito a sua paixão por pediatria.

            [28/02/17 – 11:18]: É... Bem, acho melhor eu ir...

            [28/02/17 – 11:18] James Potter: Ah, espere... Será que eu não poderia ir junto? Eu também gosto muito daquele moleque.

            [28/02/17 – 11:19]: Não acho que seja uma boa ideia...

            [28/02/17 – 11:19] James Potter: Se for por causa da minha cadeira de rodas chamar atenção... Você mesma disse para eu parar de me preocupar com ela.

            [28/02/17 – 11:19] James Potter: Por favor não me faça mudar de ideia sobre esse assunto.

            [28/02/17 – 11:22] James Potter: Lily?

            [28/02/17 – 11:22]: Está bem!

            [28/02/17 – 11:22]: Mas vamos apenas passar rapidamente. Acredito que se eu for vista naquele hospital outra vez que não seja para pegar as minhas coisas do armário do vestiário, vão suspeitar que tem algo a mais acontecendo.

            [28/02/17 – 11:23] James Potter: Ótimo. Vamos...

            [28/02/17 – 11:23] James Potter: Espero que goste de empurrar o gostosão aqui, porque não querendo te lembrar nem nada... Mas eu não posso dirigir meu carrinho lindo por problemas técnicos que você já sabe.

            [28/02/17 – 11:24]: Ah, que ótimo.

            [28/02/17 – 11:24] James Potter: O que você não faz por mim, não é, ruiva?

            [28/02/17 – 11:25]: Cala a boca.

            [28/02/17 – 11:25]: Não estou falando, estou digitando.

            [28/02/17 – 11:25]: Engraçadinho.

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            Quando vi que aquela conversa idiota com James não iria para frente, dei uma visualizada rápida nas outras mensagens, que eram de dois, três dias atrás. Alice tinha mandado bastantes fotos da viagem, Tonks tinha surtado muito por finalmente ter começado a sair com Remus e Holly por não ter superado Sirius (mesmo ela não admitindo isso). A única que nunca falava no grupo era eu. Talvez eu não fosse tão dependente do meu celular quanto minhas amigas costumam ser, e por isso, eu não tomo parte em muitas conversas pelo WhatsApp. Muitas vezes acabo deixando pessoas no vácuo, mas eu juro que não é a minha intenção (algumas pessoas como Snape, sim).

            Peguei uma bolsa transversal e a encaixei no meu ombro esquerdo, apoiando-a sobre o lado direito da minha cintura. Então me lembrei de que tinha esquecido minha maleta com o violoncelo na casa de James. Quando voltássemos da visita ao hospital, eu teria de passar lá para pegar, o que não seria trabalho nenhum, já que eu resido em frente à sua casa.

            Deixei meu apartamento e presenciei James devanear a um canto do hall do sétimo andar. Não contendo o meu espírito divertido, comecei a rir, o que despertou a curiosidade do rapaz em relação aos ruídos.

            – Ah, olha você aí... – ele sorriu ao ver que eu ria. – Anda tão feliz... Gosto disso.

            – Como diz a sua camiseta... Carpe Diem— disse e ele hesitou um momento antes de entender a referência que eu tinha feito ao dia anterior, onde tínhamos nos declarado um ao outro. Ele usava uma camiseta com os mesmos dizeres.

            – E ela está certíssima. Aproveitar o dia é o meu intuito todos os dias – ele sorriu e eu fiz o mesmo de volta, cumprimentando-o com um demorado e carinhoso beijo na bochecha.

            Apressamo-nos em direção ao hospital. Fomos conversando durante todo o percurso. Não era difícil empurrar a cadeira de rodas, James falava o tempo inteiro e isso me distraía tanto que eu nem percebia o tanto que tinha andado. Ele me contou mais sobre o que ele pretendia fazer para começar a sua carreira na música com tudo e a cada palavra que ele pronunciava, eu ficava mais fascinada.

            – Seríamos uma boa dupla... James e Lily. Soa lindo – ele comentou e eu ri.

            – Potter e Evans... Soa mais profissional.

            – Você e seus fetiches por sobrenomes... – ele comentou. Pelo tom de voz, provavelmente tinha revirado os olhos durante a fala.

            – Você e seus fetiches por mim – disse convencida e ri.

            – Depois eu que sou o convencido, não é? – ambos rimos.

            Chegamos no hospital em vinte e cinco minutos. Passei pela fachada e fui até a porta dos fundos, onde haviam uniformes de enfermeiras e peguei um, vestindo-o por cima de minhas roupas. Potter olhou para a cena um pouco desnorteado.

            – O que estamos fazendo? Pensei que íamos entrar pela porta da frente.

            – James, James... Você não conhece esse mundinho aqui... Precisamos passar despercebidos pelos corredores e você vai colaborar, não vai? – ele concordou. – Excelente. Faça a cara mais doente que você já viu na vida, porque você vai ser o meu paciente.

            – Brilhante – ele sorriu e tentou fazer uma cara de acabado.

            – Assim está ótimo. Vamos – coloquei uma máscara cirúrgica que tampava metade do meu rosto e atravessei a porta que dava na recepção. Com o canto do olho, vi McGonnagall totalmente concentrada no seu computador, digitava de maneira frenética, como sempre. Enfermeiras de plantão passavam constantemente pelos corredores, sempre com estetoscópios pendurados ao redor do pescoço e fichas de pacientes em mãos.

            – Concentre-se, Lily... – James murmurou e eu saí de meus devaneios. Era difícil considerar a ideia de entrar naquele hospital sendo que eu não fazia mais parte da sua equipe de médicos. Contudo, tinha vindo com um propósito e não sairia de lá até que ele fosse cumprido.

            – Certo, certo... – respirei fundo e passei direto pela recepção indo em direção ao elevador, que por sorte já estava aberto.

            Adentramos no elevador e eu apertei o botão para ir ao terceiro andar, que um dia tinha um dos quartos ocupados pelo rapaz sentado na cadeira a minha frente. Logo ao ver a porta se abrir, notei Filch, o velho rabugento, conversando com uma mulher com um rosto muito familiar. Parando para analisar, Argus parecia estar fazendo um intervalo e a senhora que cuidava da biblioteca correspondia aos flertes que ele lhe laçava (se é que o que aquele velho faz é realmente considerado um flerte).

            Relembrando as palavras de James, tentei focar na missão. Deixei o elevador empurrando a cadeira de rodas em minha frente e fui direto ao quarto 687. Ao adentrarmos, fechei a porta e posicionei James ao lado direito do leito onde Harry estava deitado, e eu fui para o outro extremo sentar na poltrona acolchoada que havia em todos os quartos de internação.

            Harry tinha perdido todos os cabelos lisos e finos que antes preenchiam sua cabeça. Seu rosto agora estava pálido e parecia emagrecer um quilo todas as vezes que vinha visitá-lo, estava enfraquecendo muito rápido. Como o previsto, ele não teria menos que alguns meses, mesmo que ligado a aparelhos e às quimo e radioterapias. Ainda sim ele tinha um tempo de vida. Tempo que se dependesse de mim, seria estendido, mas infelizmente eu não tinha poderes mágicos para fazer alguma coisa a respeito.

            James e eu permanecemos em silêncio o tempo inteiro. Tudo o que se ouvia no quarto era a respiração pesada do garoto adormecido. Um pequeno vaso estava ali em cima de uma mesinha de madeira de abeto, margaridas amarelas enchiam o vaso com vida, coisa que não era muito presente no ambiente.

            Segurei a mão do garoto por alguns instantes e meditei algumas palavras em sua homenagem. Gostava muito de me comunicar de maneira não verbal com crianças, era um jeito único que eu tinha encontrado de me expressar onde eu só utilizava quando estava com minhas crianças por perto. Infelizmente, não poderia continuar com as visitas, em breve descobririam sobre mim e me baniriam de uma vez por todas daquele lugar e aí sim, eu estaria ferrada.

            James entendeu a minha conexão silenciosa e optou por fazer o mesmo. Beijei a mão do garoto de forma delicada e depois de mais cinco minutos imersos em total silêncio, deixamos o quarto.

            Já tínhamos passado por todo o percurso de volta à salinha de trajes de enfermeiro que dava à porta dos fundos. Retirei minhas roupas hospitalares e as joguei na lata de lixo hospitalar. James e eu só voltamos a nos falar quando estávamos na metade do caminho para casa.

            – Ele é um bom garoto...

            – É sim... Tem gente que nasce para sofrer. Esse menino merecia coisa muito melhor do que passar o resto da vida deitado numa cama de hospital sem nem ao menos poder urinar sozinho – comentei e nos calamos mais uma vez.

            Ao passarmos na frente da casa de chás da madame Puddifoot, resolvemos parar para comer alguma coisa para enganar a fome, visto que já passava da hora do almoço. Acomodamos-nos à uma mesa e pedimos quatro croissants e dois cafés. Para quem acha que tudo foi pedido a fim de respeitar as proporções, se engana; três salgados seriam para mim, levando em consideração a vontade que eu estava de comer alguma coisa gordurosa em dias.

            – Estranho... Sirius não me ligou nem mandou nenhuma mensagem de ontem pra hoje – James comentou e eu franzi o cenho tentando imaginar o motivo para ele tê-lo feito.

            – Ele deve estar ajudando Peter com a avó... – disse apoiando meus cotovelos em cima da mesa e, em seguida a cabeça nas mãos.

            – Mas a grande coisa é que ele me avisaria caso tivesse de passar mais algum tempo com Peter. Sou o melhor amigo dele... – ele acrescentou e eu suspirei entendendo o seu lado.

            – Então por que não liga pra ele e descobre o que está havendo? – perguntei.

            – Vou fazer isso – ele tirou o celular do bolso e discou o número do amigo.

            Passei alguns segundos admirando James enquanto ele aguardava na linha. Nunca que poderia imaginar que algum dia estaria ali, apoiando-o em todas as circunstâncias. O que parecia ser a coisa mais improvável do mundo há meses antes, era um orgulho para mim agora. Me sentia feliz quando estava perto dele e podia enxergar nos seus olhos que ele sentia o mesmo. É ótima a sensação de amor recíproco.

            Assustei-me quando a expressão de James mudou de pensativo para abismado em questão de milésimos de segundos. Alguém tinha atendido o celular e parecia que boa coisa não era.

            – O que você fez com ele? – Potter perguntou com um tom de fúria. Tinha certeza de que se sua mão esquerda estivesse saudável, ele estaria cerrando os punhos.

            Fitei James perguntando com um olhar o que estava acontecendo. Ele estava chocado demais para dizer qualquer coisa.

            – Escute aqui... Se você encostar um dedo nele... – ele parou de súbito e suspirou irritado. Provavelmente alguém caçoava dele do outro lado da ligação.

            Ele suspirou e desligou o celular, o colocando em cima da mesa. Cobriu o rosto com a mão e por um minuto eu achei que ele iria chorar. Fiz menção de tocar o seu braço quando ele negou com a cabeça.

            – Não acredito... – sua mandíbula se encontrava travada. Engoli em seco.

            – James? – chamei-o, mas ele não respondeu. – James... O que aconteceu?

            – Eu fui traído. Foi isso o que aconteceu – seus olhos marejaram. – Meu Deus Lily... Peter...

            – O que houve com Peter, James? – perguntei amedrontada.

            – Ele planejou tudo... Agora eles estão com Sirius... Sirius, Lily! – sua voz falhou e lágrimas saltaram para fora de seus olhos. – E eu não posso fazer nada para impedir... Nada.

            – James... Se acalme... – senti a aflição estampada em suas expressões serem sugadas para mim.

            – Não dá, Lily... Não dá— ele se desesperou. Creio que se fosse capaz ele teria corrido para fora da padaria na mesma hora, mas como não tinha escolha, ele não saiu do lugar.

            – Por favor, me explique o que está havendo... – ofeguei em meio aos olhares desesperados de James Potter.

            Ele fechou os olhos por um momento e tirou os óculos para secar as lágrimas que molhavam seus cílios, recolocando-o logo em seguida.

            – S...Se lembra daquela noite do acidente? Que eu te contei sobre o grupo na qual Snape estava trabalhando? – afirmei com a cabeça. – Peter tinha desaparecido, não tinha? Pois é... Ele estava encontrando o mesmo grupo... E ontem à noite... Ele...

            James engoliu em seco.

            – Ele levou Sirius para uma emboscada. Agora ele está sabe Deus aonde... Sendo tomado de refém. Eles são... os Comensais da Morte, Lily – arregalei os olhos.

            Sabia muito bem o que essa quadrilha fazia, o próprio nome dizia tudo. Se não conseguissem o que queriam no tempo estimado matariam Sirius à sangue frio. Rodeei a mesa e abracei meu namorado, pela primeiramente eu tinha de ser forte por ele.

            Depois de sabermos da notícia até desistimos de comer qualquer coisa que seja. Pedimos desculpas para a atendente por ter feito os pedidos, paguei do mesmo jeito e voltamos para minha casa. Liguei para todos, que se reuniram na casa de James. Estávamos todos ali na sala: Remus, Holly e Tonks. Ou bem... Parte dos que sobraram. Cada um tinha feições mais incrédulas do que o outro, todos fixos no celular de James – que descansava em cima da mesa de centro da sala ao lado do meu, que estava sem utilidade por ter acabado a carga da bateria – esperando por algum milagre que o número de Sirius retornasse a ligação. Não conseguia caber na cabeça de ninguém de que Peter estava por trás desse sequestro. Não podia ser... Talvez o líder daquele grupo maquiavélico quisesse nos fazer questionar sobre os amigos que temos ou até nos fazer de trouxa.

Holly estava em total estado de choque.

— E se ele nunca mais voltar? Eu sou uma idiota... Devia tê-lo perdoado quando tinha chance... – ela perguntou para mim como se não se importasse de falar coisas como aquela em frente aos marotos. Nada mais importava naquele momento a não ser a segurança de Sirius.

— Não diga isso, Holly... Vai ficar tudo bem – abracei-a pelos ombros e suspirei.

— Nunca vou me perdoar se alguma coisa acontecer a ele... – ela completou e todos continuaram em silêncio.

O ambiente ficou mergulhado em total silêncio e tensão por mais uns vinte minutos antes do celular de James soar em cima da mesinha. Ele o agarrou com tanta rapidez que acabou desequilibrando-se da cadeira. Ao atender ele franziu o cenho.

— Jessica? – ele atendeu franzindo o cenho e me encarou. Arregalei os olhos em sua direção. – Sirius está bem? Graças a Deus! – todos ao ouvir isso, suspiraram aliviados e se abraçaram eufóricos. – Eu ah... Certo, vou passar sim, um segundo – James disse e tirou o celular do ouvido. – É sua mãe, Lily. Ela quer falar com você – com um sorriso enorme, segurei o celular de James e atendi.

— Mãe! Ah que bom que Sirius está bem! Mas como você sabia que ele tinha sido... – parei de súbito ao perceber que ela chorava no outro lado da linha.

Todos meus amigos comemoravam na sala, aliviados. Levantei-me dali e fui para o quarto de James a fim de escutar melhor a ligação.

Lily... — ela soluçava.

— Mãe... O que aconteceu? Pensei que Sirius estava bem – senti uma pontada de dor, mal sabendo que o que viria a seguir seria uma dor mil vezes mais aguda.

Lily... É o seu pai... — meus olhos se arregalaram e encheram-se de lágrimas no mesmo instante. Podia escutar os batimentos fortes no meu peito. Minha mãe não teve coragem de terminar o que estava prestes a dizer, mas eu já sabia exatamente o que estava acontecendo, mesmo que o meu coração se recusasse a admitir.

— Não... – sacudi a cabeça, me negando a acreditar. – Onde você está agora? Vou aí agora – ela comentou que estava em frente ao palácio de Buckingham e eu desliguei rapidamente o celular, saindo do quarto em disparada.

Ao chegar na sala, os olhares de meus amigos pairaram sobre mim e seus sorrisos murcharam.

— Preciso que você me leve ao Palácio de Buckingham agora, Remus – disse com a voz impassível, claramente ordenando que ele realizasse a tarefa imediatamente.

— Mas o que...?

— Só me leve até lá, agora— disse sentindo meus olhos arderem.

— Volto já, gente – Remus avisou aos amigos e se levantou com a jaqueta em mãos.

— Não, nós vamos com vocês! – James disse.

— Vamos logo, Remus! – rosnei e saímos em disparada, deixando um James e duas amigas totalmente perdidos.

Entrei no carro de Lupin e respirei fundo, era como se estivesse sofrendo um início de asma.

— Lily, o que aconteceu? – Remus perguntou preocupado enquanto encaixava a chave na ignição do carro.

Só dirige, ok?— exclamei ao notar minha visão se desfocar por conta das lágrimas que estavam implorando para saírem de meus olhos. Ele obedeceu e chegamos ao meu destino em quinze minutos.

De longe era possível ver uma multidão aglomerada em volta de alguma coisa. Meu coração foi até a boca. A polícia estava no recinto, assim como o serviço de segurança nacional e uma ambulância.

— Pessoal, afastem-se, por favor. Isso é uma cena de crime... – uma voz masculina soou do montinho de pessoas que se espremiam uma nas outras para ver o que estava se passando ali.

As coisas nunca foram fáceis na vida de ninguém. Problemas são coisas que surgem com o tempo e resolvem atiçar as pessoas, uma por uma, sem nenhum pingo de misericórdia. E as coisas, definitivamente, não estavam facilitando para o meu lado. Eram acontecimentos atrás de acontecimentos, não havia nem uma mísera pausa para respirar. Mal sabia eu que essa era a pior coisa que aconteceria no meu tempo de vida.

Nunca se sabe qual será a última vez de uma pessoa aqui na Terra, pessoas morrem todos os dias. O último dia da pessoa que você mais ama pode estar mais longe ou mais perto do que você espera estar. Eu, Lily Evans, gostaria que um dia desgraçado como esse estivesse mais longe, mas infelizmente não estava.

Atravessei a multidão. Snape, Peter, e mais quatro indivíduos estavam distribuídos dentro de dois carros de segurança máxima. Sirius estava sentado, na porta escancarada de uma ambulância, massageando um dos braços que parecia estar machucado. Mais ao fundo, Petúnia e mamãe estavam caídas no chão ao leito de um homem, reconheci-o como o corpo de meu pai.

Depois disso, as coisas pareciam estar embaçadas demais. Não sabia o que tinha feito depois de dar de cara com aquela cena, mas um grito tinha soado na minha mente, um grito de desespero. Talvez uma parte de mim também estivesse morrendo junto com meu pai.

Tudo de que me lembro fora ver minha mãe vir até mim e segurar meu rosto encharcado pelas lágrimas, fazendo-me encará-lá. A dor era tanta que eu não tinha forças nem para continuar chorando. Era como se um ser estranho estivesse rasgando o meu peito de dentro pra fora.

— Respire, Lily... Respire, querida... – ela estava bem mais calma do que parecia no celular. Mesmo que minha mãe pedisse, eu simplesmente não conseguia. Já tinha conseguido superar muitas coisas na minha vida, mas aquilo era demais. Aquilo não era um tipo de dor que se suportava, você simplesmente era atingida e era como ficar paraplégica no mesmo instante.

NÃO! — foi tudo o que saiu da minha boca. – E...EU... QUERO VER... O... O MEU PAI! – me desvencilhei dos braços de minha mãe e vi o corpo de John Evans estirado no chão, tinha sido baleado na cabeça, era claro que tinha morrido na hora.

Era insuportável saber que ele tinha morrido com tanta facilidade assim. A família inteira sabia dos riscos que ele estava tomando quando decidiu tomar parte da equipe de segurança do Reino Unido, mas nunca pensaríamos que sua morte viria tão cedo. Nunca se está preparado para superar uma morte, mesmo que ela esteja clara que está próxima. De qualquer maneira, sabendo ou não, eu nunca superaria a morte de meu pai.

Sua face estava ainda morna, devido o falecimento recente, o tiro atravessado em sua testa não me trazia demasiado medo, já que já estava acostumada a ver sangue e lesões no hospital. O que me amedrontava era o fato de que era o meu pai que era a vítima. Seja lá quem fosse o culpado pelo assassinato teria de pagar caro, muito caro.

Fiquei abraçada a meu pai não sei por quantos minutos, mas tive de ser removida da área quando a equipe de segurança solicitou que todos se afastassem para que a área fosse limpa, já que ali era a frente do castelo da Rainha da Inglaterra. Não me lembro de mais nada que acontecera depois disso, estava atordoada demais para lembrar de muita coisa. Precisava de explicações em breve, mas agora não era uma boa hora.

O velório se passou ao anoitecer e no dia seguinte o enterro aconteceria no cemitério Highgate, ao norte de Londres, num bairro de mesmo nome.

[DIAS ATUAIS]

Ergui-me e fui até o caixão do meu pai, descansando em cima dele a miniatura do carro branco que ele mais gostava, um lírio branco e um demorado beijo vindo de meus lábios inchados. Acariciei o tecido macio da bandeira que ocultava metade do caixão e deixei que uma lágrima escorresse, levando, logo depois, a mão rapidamente ao rosto, me recompondo e direcionei-me ao pequeno altar que no gramado se firmava.

Estavam todos ali. Os marotos, as garotas, mamãe, Petúnia acompanhada de Vernon... Até a senhora Figg do térreo estava lá com seus trapos negros que só a envelheciam mais.

Fitei os presentes por uns bons momentos antes de tomar o fôlego necessário para começar a minha homenagem. Tinha preparado uns três parágrafos de discurso, mas mais uma vez a vida não permite que eu diga planos.

— Bem... Meu pai... – suspirei sentindo um baque me atingir no peito só por pronunciar aquela palavra sabendo que ela nunca seria mais dita da mesma maneira depois deste dia. – Meu pai era a pessoa mais doce, compreensível e paciente que já conheci na vida. Ele era o meu porto seguro. Foi ele quem me ensinou a andar de bicicleta, quem me ajudou com os deveres de casa quando mamãe não podia. Era do tipo de pai que chegava tarde do trabalho exausto, mas mesmo assim fazia um esforço para jogar uma partida de Monopoly em família – umedeci meus lábios, sentia meus olhos arderem, mas não podia deixar que lágrimas fossem derramadas, pelo menos não enquanto eu não terminasse o meu monólogo.

Um soluço audível soou da primeira fila de cadeiras e eu pude, infelizmente, presenciar mamãe cobrindo a boca com um lenço branco, a fim de diminuir os ruídos que seu choro traziam ao ambiente. Custei para não me deixar abalar.

“Achei que ele gostaria que eu dissesse algumas palavras no dia de hoje, mas me dei conta de que tudo que estou aqui a dizer ele já sabia. Ele sabia que era um pai exemplar porque se esforçava para isso. Sabia que era o meu herói porque eu o fazia saber a cada vez que me tomava nos braços acariciando os meus cabelos e sussurrava para mim que estava tudo bem e que ele estava ali comigo para o que der e vier.

“E é por isso que eu afirmo hoje, que John Evans não só foi, mas também continua sendo um homem imensamente amado por muita gente, por mim, especialmente. Ele nunca deixará de ser o homem mais corajoso que já conheci, nem o pai com o melhor abraço, com a melhor coleção de miniaturas, com o emprego mais valente e também nunca deixará de ser o meu... papai”.

Senti que não aguentaria mais nenhum segundo ali, mas tinha de continuar. Não tinha terminado... Não sabia mais o que falar, mas alguma coisa dentro de mim tinha certeza de que ainda havia alguma coisa dentro de mim que devia sair.

E então lembrei... Havia uma música que Elton John tinha escrito em memória à John Lennon, que era a preferida de meu pai e por mais melancólico que fosse, é possível admitir que a letra coincide exatamente com a letra.

Pobre papai... Nunca pensou que sua música preferida seria o presságio da sua morte, assim como foi do seu ídolo. Estufei o peito e juntei todas as forças que pude iniciando um trecho.

Who lived there?

He must have been a gardener that cared a lot,

Who weeded out the tears and grew a good crop.

Now we pray for rain, and with every drop that falls.....

We hear, we hear your name.....

 

            Pensei estar controlando o meu corpo, quando notei que não estava. Lágrimas escorriam pelo meu rosto involuntariamente, afetando um pouco a minha voz, mas continuei.

And I've been knocking, but no one answers.

And I've been knocking, most all the day.

Oh and I've been calling, oh hey, hey, Johnny!

Can't you come out to play,

In your empty garden?

Johnny?

Can't you come out to play, in your empty garden?

            Ao fim da canção todos pareciam emotivos demais para sequer respirar corretamente, deixei o microfone ali em cima e virei-me para o caixão mais uma vez.

            – Adeus, papai... – sussurrei com a voz falha e beijei delicadamente a superfície lisa, retornando ao meu lugar.

            Mamãe, Petúnia e mais algumas pessoas da família discursaram também, cada um com a sua essência. Ao fim da homenagens, o caixão seria enterrado e a lápide colocada sobre o pedaço de terra que era agora o túmulo do meu falecido pai. O que eu não esperava era que James Potter também prestaria suas homenagens.

            – Ahn... – ele hesitou. – Não conheci o senhor... John... Não conheci John como gostaria. Tivemos tão pouco tempo de convivência que eu posso me arrepender profundamente de não ter visto nem um oitavo do tanto que sua filha, Lily, viu durante toda a sua vida – ele não tinha preparado nenhum discurso, mas mesmo assim estava lá em frente a uma imensidão de pessoas desconhecidas para ele dizendo coisas bonitas sobre o meu pai. Eu realmente não tinha errado em escolher James Potter para entrar na minha vida. – Mas posso dizer que o conheci o suficiente para saber que ele era um homem bom, simpático, sempre andava feliz e transmitia essa felicidade para qualquer um que estivesse ao seu redor. Tinha uma bela coleção de carrinhos em miniatura que deixaria qualquer um com inveja e acima de tudo... Ele gostava de mim. E eu não posso estar mais agradecido em saber que ele estava feliz pelo meu relacionamento com a sua filha. É uma honra tão enorme que... Eu simplesmente não tenho palavras para descrever. E eu, James Potter, diante deste dia, juro solenemente que farei de tudo para trazer alegria a essa família, não igual a ele, porque obviamente não conseguirei, mas me esforçarei para trazer o meu máximo para os Evans – ele concluiu e suspirou sabendo que não conseguiria dizer mais nada.

            O sepultamento levou cerca de mais quarenta minutos e logo a lápide de pedra polida foi cravada no gramado que tinham acabado de colocar, onde se lia:

—_______________________________________________________________

JOHN EVANS

AMADO PAI, OFICIAL E ESPOSO

  * 28/03/1967

†28/02/2017

—_______________________________________________________________

Os oficiais da polícia bateram continência e se retiraram, deixando apenas a família ali. James, os marotos e as meninas acharam que deviam dar alguns minutos para nós. Não se ouviu mais nada, nem de minha mãe, nem Petúnia. Agora eram só nós três e eu sabia que seria totalmente diferente. Entrar na casa onde cresci e lembrar que meu pai não estaria mais ali seria causador de um sentimento excruciante por muito tempo.

Pela primeira vez na vida eu desejei que meu pai tivesse tido câncer no lugar de Harry, talvez eu pudesse ter passado seus últimos meses de vida fazendo-o o homem mais feliz do mundo.

Atrás da lápide de meu pai, estava escrito uma frase que eu pedira para colocar: Ele não se foi, só está ausente por algum tempo.

Eu poderia ter sido conscientemente sua garotinha por mais um tempo... Era tão injusto como as coisas aconteciam comigo. Seria mais fácil se eu simplesmente não existisse mais. Eu não queria mais viver. Não queria.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Notas finais do capítulo

O que foi esse capítulo? Eu também não sei...
Só desgraça... Eu, a partir de hoje, me considero a pessoa mais dramática da Terra. Me desculpem por isso.
Bem, espero que vocês tenham gostado!
Um beijo enorme e até o próximo capítulo ♥



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