Com muito custo ele se arrastava com o cheiro terrível de peixe invadindo suas narinas, em desespero já no meio daquele comércio incansável de peixes de todos os tipos, o cheiro salgado do mar continuava ali mesmo a uma boa distância da praia.

Ele notou que as roupas que as pessoas trajavam eram estranhas, o modo de se cumprimentar, até mesmo o modo de vender entre eles, algumas bem poucas mulheres andavam com roupas pesadas, cheias de enfeites, laços e babados. Ele parecia ter voltado no tempo, para alguma época em que tudo era dominado por reis e rainhas.

Roupas vitorianas, ele recordou, mas havia algo diferente, aquelas roupas tinham cor, e como diabos uma garota era guarda do rei se nesses tempos eles só aceitavam os guardas do sexo masculino. Era um detalhe forte, porque as mulheres estavam em tudo ali, ele admirou aquilo.

Continuou a viajar em seus próprios pensamentos se arrastando pelas ruas. Haviam crianças pobres em esquinas, essas trajavam tecidos sujos e rasgados, os rostos inexpressivos de crianças que não teriam sua infância normal, e quem sabe onde estavam seus pais? Eram apenas eles, sozinhos e sem rumo, mas ao menos, tendo a chance de viver.

Ele avistou o final daquela enorme feira que exalava o fedor já preso em suas narinas. Enquanto alguns homem jogavam sacos de peixes uns para os outros ele escolheu dar a volta, nunca fora tão difícil sentir cheiro de peixe, e finalmente ele adentrou em ruas cheirosas, com casinhas bem trabalhadas, cheias de cores, algumas mais simples com palha na decoração de entrada, outras com... Aquilo seria metal? O lugar já estava ficando extremamente estranho pra ele.

Algumas casinhas tinham placas, e as placas; Alvo agradeceu aos céus; tinham desenhos. Um copo de cerveja, uma espada, um pote... Uma cama, ali estava. Ele chegou ate a portinha com uma janela, empurrou a porta e sentiu o ar quente que vinha de lá dentro, e aquilo fora extremamente confortante desde o vento forte do mar.

Ele caminhou ate o balcão, havia uma recepção ali, era uma sala rústica, cheia de coisas antigas, e ele não poderia imaginar diferente, mármore para todos os lados, até haviam lamparinas ali, os sofás de couro elevados nas paredes, uma lareira no fundo, e logo em cima da lareira um relógio, que demonstrava que estava vivo com seus tiques a cada segundo, as paredes eram de um marrom aveludado, assim como o chão, em alguns pontos era possível ver pedras, aquele lugar era construído sobre pedras. Percorrendo os olhos pela sala detalhadamente, ele se assustou ao ouvir um pigarro, olhou alertado pra frente quando viu uma jovem de cabelos escuros e olhos mais escuros ainda ali.

— Posso ajudar? — Ela perguntou erguendo uma sobrancelha

— Eu procuro por Emily...

— Sou eu, pois não? — Ela tinha olhos intimidadores, ele não conseguia diferenciar a iris da pupila

— Aurora me mandou aqui e...

Antes que ele pudesse continuar a menina arregalou os olhos e voou a mão na boca do garoto, tampando a mesma, ele franziu o cenho confuso, a menina por trás do balcão abriu uma porta de lado, ainda tampando a boca do mesmo, e passou para o outro lado, ficando frente a frente com ele, agora sim ele podia perceber que ela tinha mais ou menos a sua idade, mas ainda estava confuso.

— Não fale em voz alta — Ela revirou os olhos — Você finalmente chegou

Ela tirou a mão da boca do moreno e agarrou seu braço, o puxando para logo atrás do balcão, havia uma cortina ali e ela adentrou, um corredor, um corredor meio escuro ao seu ver, ela o arrastou até a ultima porta ali, uma porta de madeira grossa, ela tirou uma chave do bolso, levou a tranca, ela abriu a porta e teve algum esforço pra empurrar a mesma. De acordo com o que porta se abria ele pode contemplar um quarto, um quarto enorme, como o que ele se lembrava de filmes medievais.

— Você pode, por favor, me explicar? — Ele indagou adentrando o quarto

Uma cama de casal enorme ao canto direito, cobertores pesados e travesseiros cheios de babados, lamparinas pelo quarto todo, uma poltrona ao lado da cama, duas cadeiras e uma mesa a direita, uma porta a frente que ele deduziu ser um banheiro, um grande tapete felpudo vermelho vinho cobria boa parte do chão, as paredes eram em um verde musgo. Ela caminhou ate uma das cadeiras e sentou, ele entendendo o recado fechou a porta atrás de si, era realmente pesada, e caminhou ate a cadeira a frente dela.

— Você está em Hirena, e se você é humano e conseguiu chegar aqui, ou você fez merda ou ganhou o jogo... Na verdade, se você está bem aqui na minha frente, não ganhou o jogo...

— Então você sabe do jogo? Espere. Hirena é uma... Cidade?

— Cidade? — Ela riu achando graça do garoto — Um reino, querido, Hirena é um reino, uma nação pra ser exata

— Mas as pessoas jogam...

— No seu mundo, é apenas um jogo, bem, um jogo mortal

— Eu sei, meus dois irmãos estão jogando, e eu procurei saber o que era, e acabei vindo parar aqui — Ele agora recordava-se dos seus irmãos, ele fez uma careta com a lembrança repentina, talvez Aurora tivesse tirado aqueles xaropes...

— Dois irmãos? E como você não joga também? Isso é muito estranho...

— Por quê?

— É uma questão de sangue, todos que participam do jogo tem o sangue de Hirena, a muito tempo atrás aqueles que tinham, digamos... — Ela se aproximou do garoto para sussurrar — "magia", foram mandados para o seu mundo

— Magia? Tipo magia mesmo?

— Sim

— Então quer dizer que eu tenho sangue de Hirena...

— Não entendo o porquê de você não ter entrado no jogo...

— Eu fui pego por Cal e Aurora, e então...

— Claro! Aurora trabalha para o Rei, lógico que ela podia simplesmente tirar você

— então, o jogo é feito pelo Rei?

— Sim — Ela revirou os olhos — Ele é um velho mimado, está ensinando tudo para o filho primogênito, vai ser mais um mimado.

— Ele se diverte vendo pessoas morrerem por um jogo idiota?

— Não é bem assim, é para eliminar todos aqueles que tem magia, no final o jogador vencedor vem para o nosso mundo, volta para as raízes e é obrigado a trabalhar no castelo

— Isso não é lá uma vitória...

— Por que você acha que o Rei tirou todos os que tinham magia daqui? Para que ele pudesse reinar em paz, os que ficaram são praticamente humanos, bem, até onde sabemos...

— Mas o sangue de Hirena em si não contém magia?

— Sim... Mas não sabemos de praticamente nada.

Alvo puxou a túnica dos braços e tirou o capuz, mostrando para a moça as raízes que mais pareciam tatuagens internas em seu pulso, em meio as veias, a menina olhou para o seus braços e sorriu, puxou o cabelo para o lado e ali no pescoço ele pode ver as mesmas raízes, que eram mais escuras que as dele, as dele pareciam esverdeadas já as da jovem eram negras. Ela ergueu os olhos para o rosto dele, e por alguns segundos ficou encarando seus olhos.

— Eles fizeram seu ritual... Como foi?

— Ritual? Eu não sei, eu estava meio que em coma, ou meio morto.

— Aqui nós nascemos com isso, porém aqueles que vem do seu mundo fazem um ritual, assim como Aurora...

— Então Aurora foi uma jogadora?

— Sim, conheci ela no projeto...

— Projeto?

— Acho que você já ouviu coisa demais por hoje, que tal dormir um pouco?

— Seria bom

— Pode dormir, estarei lá fora — Ela deixou a chave na mesinha ali e se levantou — A propósito, qual seu nome?

— Alvo, Alvo Potter

— Ótimo, descanse, Alvo

Ele observou enquanto ela ia embora, era realmente muito para ingerir, um ritual... Ele não era mais humano?

***

Ela soltou a respiração e relaxou os músculos, enquanto do outro lado do carro, uma risada irrompia, vindo de uma ruivinha com óculos escuros no rosto.

— Você ia matar sua própria prima, irmãozinho?! — A voz de Lily fez os outros três despertarem e olharem para ela, ela deixou o lado do carro, e a passos rápidos foi ate a outra ruiva.

Rose ainda estava parada, anestesiada e perplexa, ela olhou pra Lily ainda desnorteada, enquanto a prima a agarrava em um abraço.

— Quanto tempo, Rose, meu Deus do céu, garota, como você some assim? — Lily murmurou apertando a prima

— Como você cresceu — Rose pronunciou aquelas palavras baixas e surpresas

— Ainda bem que meu irmãozinho dirige muito bem, ou você já estaria estatelada ai no chão

— Credo, Lilian — Dominique falou se aproximando das duas

— Eu não morri... Não ainda — Rose ergueu os olhos e encarou o primo

Ele deu meia volta no carro até estar de frente para a garota, a puxou para um abraço quase desesperado

— Como que você para no meio da rua, sua doida?

— Eu estava correndo por conta do... — Rose parou um minuto, se afastou um pouco do primo e olhou para Dominique

— Eles jogam —Ela murmurou

— Os caras praticamente bombardearam a casa da Domi, destruíram tudo, pelo simples fato de estarmos conversando sobre o jogo

— Então foi isso que te trouxe até aqui — Lily mudou da água para o vinho ficando tensa de repente

— Sim...

— Eles mataram Lucy... — James falou com pesar, Rose ergueu a cabeça para encara-lo

— O que? — Os olhos da menina começaram a encher de lágrimas, ele a puxou para perto enquanto ela deixava as lágrimas rolarem perplexa

Domi arregalou os olhos indignada, agora era bem mais provável que tivessem matado Alvo.

O silencio pesou entre eles por minutos, era possível só ouvir os soluços de Rose. Antes que qualquer um pudesse fazer alguma coisa, os três celulares apitaram, Rose suspirou contra o peito do primo com medo de olhar, então puxou o celular do bolso de trás, quebrou o abraço para olhar a nova mensagem.

"Rose,

Já conseguiu sentir o gostinho das consequências?

O tempo está correndo, 24 horas, Senhorita Weasley

Queremos o mais brilhante, e quem sabe o mais poderoso

Você não sempre foi boa em mentir?

O desafio está lançado,

Hirena"

Rose se apoiou no primo e sussurrou para só ele ouvir

— Preciso ir a uma loja de roupas, logo.