Dolores escrita por Marília Bordonaba


Capítulo 57
Outubro - Dolores




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Foi com a minha insistência que consegui recuperar meu notebook, porque se dependesse dos meus pais, eu ficaria sem um até eu conseguir um emprego. Tive que jogar um migué de que eu tinha mil trabalhos e que nem sempre tinham computadores disponíveis na biblioteca da escola pra que eu pudesse utilizar, e blá, blá, blá, até que eles se deixaram convencer. “Num tem como comprarmos um novo, mas podemos consertar esse”. Mal sabendo eles que ficava muito mais em conta comprar um novo, mas quem era eu pra reclamar? O importante era ter o meu computador de volta!

Claro que eu tava sendo prejudicada na escola sem o meu computador, só que nem de longe essa era a minha maior preocupação. Boa parte das minhas reclamações pra Dani acusava a internet como a principal causadora do meu sofrimento por estar sem o pc. Eu alegava estar irritadíssima porque não tinha como me atualizar das novidades do mundo pelas redes sociais, mas a verdade é que eu não via a hora de voltar a assistir os vídeos da Virgínia – acabei desistindo de tentar chamá-la de Tábata, esse nome não se encaixava de jeito nenhum.

Demorou, mas aconteceu: eu tava com o meu notebook de volta. E eu tava inquieta, louca pra me trancar no quarto e assistir mais vídeos, mas os meus pais não me davam privacidade, até porque esse é o único computador da casa e eles queriam dar uma olhadinha em seus e-mails e coisas do tipo. Minha perna tremia de ansiedade enquanto eles não largavam o meu notebook e não saíam do meu quarto, mas uma hora finalmente aconteceu. Pluguei o meu pen-drive e cliquei no mesmo vídeo que assisti na última vez, reouvindo a grande revelação.

— Aí eu tenho que ir à mesa do professor, explicar toda a minha história em 5 minutos e dizer pra ele falar “Virgínia” no lugar de “Tábata”. É um saco isso! Eu seria uma pessoa mais feliz se parassem de entrar professores novos naquela escola. De toda forma, hoje foi um bom dia e nem vou ficar me demorando por aqui, arrumando desculpa pra estragar o que já tá ótimo. Então até a próxima, tchau. - e desligou a câmera.

Eu estava com sede daqueles vídeos e cliquei no dia 2 de Fevereiro.

— Querido diário, meu aniversário tá chegando e eu ainda não sei o que quero de presente. Tenho que pensar bem, porque como esses são os meus 15 anos, minha mãe vai caprichar.

Tá, um vídeo rápido. Tudo bem, próximo. 8 de Fevereiro.

— Querido diário, hoje eu tive um problema com um professor por culpa da Dolores. Sempre a Dolores, né? Impressionante!

Me ajeitei na cama, atenta ao que ela tinha pra contar.

— Eu tinha pedido pra ir ao banheiro, só que o professor disse que já tinha gente lá fora e disse pra eu esperar. Daí beleza, eu esperei… E esperei e esperei e esperei. E nada dessa pessoa voltar. Quando volta, adivinha quem era?... Exato! Dolores. Quem mais poderia ser? E eu já tava muito apertada, muito mesmo e…

Fechei o vídeo e optei por não ouvir o resto. Eu me lembro do final dessa história. Foi um dos piores dias da minha vida (junto a tantos outros).

Eu tava com muita dor de barriga e a minha mãe achou que eu tava de frescura, arrumando desculpa esfarrapada pra faltar aula, só porque eu não tava indo ao banheiro de cinco em cinco minutos em casa e aí ela me mandou pra escola, mesmo comigo falando que a qualquer hora eu ia fazer cocô nas calças. Eu tava certa e foi na escola que eu comecei a ir ao banheiro toda hora. Na aula de Matemática eu pedi licença pra ir ao banheiro pela milionésima vez e, cara, eu queria ter sido mais rápida, lógico, só que não deu. Quando voltei pra sala, ainda com dor de barriga, mas já bem mais de boa do que antes, a Virgínia, ridícula como sempre, resolveu me humilhar em voz alta e aí todo mundo começou a rir de mim… Quer saber? Quero sim ouvir a versão dela dessa história. Recoloquei o vídeo e adiantei até o momento em que eu tinha parado. 

— E eu já tava muito apertada, muito mesmo e sem nem pensar direito, só falei enquanto saía da sala “que porra de caganeira é essa, Dolores?”. Eu nem falei tão alto assim…

Nossa, não! Imagina... Praticamente gritou na frente de todo mundo!

— Só que aí, quando eu voltei pra sala, o professor me chamou a atenção, porque eu tinha adivinhado que a Dolores tava com diarreia e depois a galera ficou zoando ela, dizendo que ela tava com merda no uniforme e num sei o que, constrangendo ela, sabe? Aff! E o professor quis me culpar por uma parada que eu não tinha nada a ver. E eu lá tinha culpa do pessoal pegar no pé da peidorreira? Aí ele pediu pra eu ir pra direção. A sorte é que a Luíza geralmente acredita em mim e não me deu nenhuma advertência por isso. Ainda bem.

Sim, Virgínia, a diretora Luíza sempre foi a sua puxa-saco. Como eu odiava isso!


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