Dolores escrita por Marília Bordonaba


Capítulo 31
Dolores




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/704941/chapter/31

Não sei porque eu to fazendo tanto tumulto nessa reunião. Até parece que eu to ajudando a preparar a festa por obrigação... Bom, a princípio pode ter sido obrigação, mas eu to curtindo ser útil. Posso negar, mas fiquei bem contente quando o Lucca sugeriu que eu ajudasse com a decoração, ele até disse que me cairia como uma luva, porque meus desenhos são muito bons e que tenho bom gosto – nessas palavras. Acabei recebendo autonomia e passe livre pra pensar na decoração como eu quisesse, então montei uma equipe massa, pedi até pra Dani chamar o Murilo pra ajudar a gente e ele aceitou numa boa. Já temos boa parte da decoração pronta, tá tudo guardado com cuidado lá em casa. Então acho que o tumulto tem sido mais para que velhos hábitos nunca se percam, até porque fazia bastante tempo que nem mesmo nos implicávamos. Mas fiquei calada pelo resto da reunião, assim como quase todo mundo queria.

Sei que a única pessoa que gosta de mim nesse momento é o Lucca, embora ainda hoje tenhamos tido um momento desconfortável enquanto vínhamos caminhando pra casa da Virgínia.

Volta e meia fico bolada com o rumo que as nossas conversas tomam. É como que se às vezes parecesse incoerente estarmos juntos, porque somos bem diferentes em alguns pontos. Como hoje, quando do nada ele me perguntou:

— O que você gostaria de mudar no mundo?

Na verdade eu achava bem fofinho quando o Lucca soltava perguntas aleatórias, sempre numa tentativa de descobrir mais coisas sobre mim. Só que era legal quando ele soltava coisas como “se o mundo fosse pra ser só de uma cor, qual cor você gostaria que fosse?” ou “se a vida fosse um mangá, qual você gostaria que fosse?”, mas esse tipo de pergunta filosófica sempre me deixava sem saber o que dizer.

— Sei lá. Eu nunca pensei nisso.

Apesar de sorrir enquanto dizia isso, não deixei de notar que o Lucca ficou levemente desapontado com a minha resposta.

— E você? O que mudaria?

Ele olhou pro nada e respirou fundo.

— Eu abriria a mente das pessoas pra que elas pudessem ouvir mais e, consequentemente, mudassem mais.

Dessa vez quem ficou desapontada fui eu, porque eu não concordava com isso.

— E mudar pra que? Pra ser uma pessoa sem convicção?

— E quem disse que mudar é sinônimo de não ter convicção?

— Ué, desde sempre. É coisa de gente sem personalidade e sem opinião.

— Eu discordo. - e ele contradisse o que acabara de dizer, não me dando a chance de explicar o meu ponto, finalizando a conversa ao ficar calado até chegarmos à casa da Virgínia. Foi uma surpresa vê-lo tão carinhoso comigo agora, porque pensei que ele tinha ficado bravo. Ou será que tá bravo mesmo e por isso tá pedindo pra eu ficar calada? Bom, não sei.

Já que ninguém dessa reunião queria ouvir o que eu tinha a falar, mesmo que fosse uma coisa útil, me dei ao luxo de passar a maior parte do tempo daquela reunião olhando para os lados e reparando na casa da Virgínia. É engraçado que em dez anos que nos conhecemos, essa é a primeira vez que vim pra sua casa… E também não é pra menos, nunca nos gostamos, o que eu faria aqui? Mas é uma casa bem bonita. Classe média alta eu diria. Bem melhor que a minha, diga-se de passagem. Quase me veio uma vontade de perguntar do que os pais dela trabalham, mas segurei comigo essa curiosidade, só pra não dar esse gostinho pra Virgínia e ela achar que tá por cima.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Dolores" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.