Dolores escrita por Marília Bordonaba


Capítulo 14
Março - Virgínia




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Março

A Jéssica tinha razão quando disse que ser representante de turma seria trabalhoso. Eu estava subestimando as minhas funções. Mas nem tenho do que reclamar, era tudo o que eu queria, não era?

Pra começar, a campanha foi um sucesso! Primeiro, aluguei o ouvido da Luíza por todo o tempo em que ela ainda não havia conversando com a gente sobre a escolha de representantes. Propus que se fizesse uma campanha na escola inteira e que fosse permitida a formação de chapas, até mesmo entre alunos de outras turmas, que compartilhassem ideias e coisas do tipo. A Luíza não aprovou muito essa proposta, disse que daria trabalho e que eu, como aluna prestes a me formar, não deveria me envolver em projetos que tomassem tanto o meu tempo. Eu estava preparada pra esse tipo de reação e fiz todo um discurso que denunciava a falta de vivência cidadã na escola, em como que não socializamos a política e que acabaríamos saindo do colégio apenas com a teoria como bagagem. Ela ficou impressionada com o meu entusiasmo e disse que se eu conseguisse pilhar o resto dos alunos pra uma verdadeira eleição, que ela me daria apoio.

Dito e feito: falei com os meus conhecidos das outras turmas e, pra minha sorte, sempre existe quem esteja disposto a se envolver e consegui agregar duplas de meninas pra compor a chapa Woolf, a única chapa que englobava representantes e vices de diversas turmas. A única mancada foi a Jéssica não querer entrar nessa comigo, sendo quase uma contradição a grande idealizadora da eleição com chapas ser a única a ter um vice homem. Mas não foi de todo ruim, pois algo me diz que o Gui foi essencial pra puxar votos pra mim, mas isso não importa, o importante é que eu venci e que eu terei a chance de mudar algumas coisas nessa escola.

Eu sei que representantes só servem pra ficar buscando e levando recado da diretoria pros professores e vice-versa, mas eu já me obriguei a não ser esse tipo de representante. Eu quero ter voz ativa, quero colocar minhas ideias em prática e quero, antes de mais nada, tornar meu último ano na escola memorável.

Claro que as cobranças aumentaram. A Luíza já veio com um papo de:

— Quero só ver essas notas subirem, hein mocinha?

Não prometi nenhuma melhora drástica (até porque Química Orgânica, como eu havia previsto, não tá nada fácil), mas me comprometi a me esforçar.

No dia do resultado das eleições, quando a diretora reuniu os alunos no pátio e mencionou que a chapa Woolf venceu em duas das turmas do 8º e 9º ano, três turmas da 1ª série e uma da 3ª série (que no caso era a minha turma), imediatamente, a maioria dos alunos começou a vibrar. Senti um choque gostoso subir pela minha espinha e eu soube que estava colocando o pé na estrada que me levará ao sucesso, porque finalmente eu consegui mobilizar uma grande quantidade de pessoas em prol das minhas ideias.

Imediatamente repassei todas as coisas que prometi mentalmente pra esse ano e determinei que cumpriria com todas. Tá bom que eu já larguei a academia, mas eu posso voltar, não é mesmo? E eu já to tramitando aqui como aumentar as minhas notas e, aumentando as minhas notas, vou ter carta branca pra ter um ano memorável. Essa escola que me aguarde!

Mas voltando ao dia do resultado da eleição, eu tava com um tremendo nó na garganta, emocionada por ter vencido a eleição. Parada no meio do pátio, meio atônita ainda , senti uma mão no meu ombro e todo o sangue do meu corpo correu pro rosto, fazendo-o queimar. Somente uma pessoa punha a mão no meu ombro com tanta firmeza, como que se não temesse falar comigo. Foi pra minha surpresa, pois fazia muito tempo que essa voz não me dirigia a palavra – ou eu que não dirigia a palavra a ele?

— Parabéns! – o Lucca falou com um sorriso enorme no rosto – Eu sabia que você ia ganhar com ou sem o meu voto e, mesmo assim, ainda votei em você.

— Obrigada. - respondi alegre.

Quando o Lucca saiu, virei para o lado, procurando pela Jéssica e descobrir se ela viu o que acabou de acontecer, mas tudo o que vi foi a Dolores reprimindo a raiva de braços cruzados, olhando pra mim e cochichando com aquela Daniela, com o desdém escrachadíssimo. Nem posso afirmar que foi uma raiva despropositada, até porque, depois desse dia, o Lucca e eu retomamos a nossa amizade (se é que posso chamar assim). Claro que isso só foi possível porque eu abaixei um pouco a minha crista e resolvi dar mais uma chance para o nosso convívio.

Toma na sua cara, otária! Toda a sua campanha de oposição foi inútil! Nem mesmo o argumento de que o Gui é um arruaceiro, na tentativa de desmerecer a chapa, funcionou. Pelo contrário! O fato de o Gui ser arruaceiro é que atraiu tanta simpatia. Uma menina carismática e disposta a ser útil para o alunado associada a um menino boa praça e divertido. Claro que eu preferiria que fosse a Jéssica ao meu lado, mas no fim das contas num deu certo do mesmo jeito? Pra mim isso basta.

— Parabéns pra nós, companheira. - o Gui disse satisfeito, esticando a mão em minha direção.

— Parabéns pra nós. - apertei sua mão com firmeza e a balancei somente uma vez.


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