Teoria do caos escrita por Angelina Dourado


Capítulo 5
Antes da Queda - Capítulo Quatro


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal! Aqui está o capítulo da semana, agradeço a todos os comentários, acompanhamentos e favoritos!
Boa leitura!



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Aquele não seria um trabalho qualquer. Muito mais que traduzir símbolos, mais do que passar mensagens, mais do que revisar contas, isso era muito mais do que os irmãos já haviam feito.

Isso é o detrito de uma alma humana. — Gaster os explicara. – Está quebrada há muitos anos, soterrada na terra e com seus pedaços espalhados um mais longe que o outro. Mas em seu interior ainda há o resquício do que um dia foi uma força, uma memória, até mesmo magia.

— Dá pra quebrar a barreira com várias dessas coisas?! – Sans perguntou esperançoso, mas o olhar que o doutor lhe lançara não parecia ser de uma resposta positiva.

Não, são necessárias sete almas humanas completamente intactas. Uma junção de centenas á milhares de pedaços seria como um quebra cabeça onde nenhuma peça se encaixa.

— Então o que você pensa em fazer com isso? – Papyrus perguntou, estava com os cotovelos na mesa e as mãos apoiando a cabeça, estava esperando pela parte interessante e querendo logo que o falatório acabasse.

Mesmo que eu explique a teoria para vocês é provável que não compreendam, são jovens demais. — Gaster disse enquanto limpava os óculos com um lenço que retirara do bolso do jaleco. Sans ao ouvir aquilo bufou descontente, afinal já se achava velho o suficiente para entender qualquer coisa. – Por enquanto quero que saibam que este é um projeto com o objetivo de mudar nossa história, não sendo mais necessário que nenhuma alma humana apareça por pura sorte.

— Não era mais fácil usar uma alma inteira? Só pegar as do rei. – Sans retrucou como se só tivesse escutado metade do que ele havia dito. Gaster respirou profundamente, sua paciência para tantas perguntas já estava se esgotando.

 - Jamais eu colocaria em risco as almas que o rei coletara, afinal em testes imprevistos podem ocorrer. Além do mais, a natureza das almas é instável e imprecisa demais para um experimento científico delicado como este. Agora sem mais perguntas. — Gaster olhou para os dois que retribuíam o olhar á espera da continuação de sua fala. – A única missão de vocês por enquanto é manter o detrito de alma o mais ‘’vivo’’ o possível, tentarei fortalecê-la ao máximo e vocês deveram manter ela estável. Há muitas outras coisas para serem feitas neste projeto, já que é algo que possui diversas etapas. Será uma preocupação a menos caso vocês façam esta manutenção.

Os irmãos ao perceberem que Gaster não estava mais tolerante a perguntas - ele detestava ser interrompido – ficaram em silêncio sentados em suas cadeiras, apenas prestando atenção em suas explicações. O doutor sempre falava de um modo técnico demais, fazendo com que fosse mais difícil de prestar a atenção, entretanto desta vez era diferente.

Cuidar de uma alma – ou algo que já foi uma – era totalmente novo, a curiosidade e surpresa faziam com que até o palavreado do doutor não parecesse grande coisa.

Para manter o resto de alma nas condições que Gaster queria, foi preciso que ele adaptasse o recipiente normalmente usado para almas inteiras. Em sua base uma pequena tela mostrava oscilações de duas linhas paralelas que deveriam estar sempre longe uma da outra e jamais se entrelaçando, isso indicava o estado da sua força ou poder. Ao lado havia um pequeno teclado de seis dígitos para ativar informações mais precisas, porém essas o doutor disse para os garotos não mexerem, pois de qualquer maneira eles não entenderiam nada.

Mas o mais importante era uma pequena peça redonda, que podia ser retirada como uma chave girando-a no sentido anti-horário. Nela havia um pequeno buraco onde uma seringa deveria ser posta. Injetando um soro criado pelo doutor que fortaleceria a alma, quando dada a quantidade certa periodicamente.

Basicamente era isso que os irmãos estavam encarregados de fazer: zelar e nutrir o detrito da alma humana.

— Pode deixar pa...Gaster! Eu e Sans vamos cuidar muito bem dela. – Papyrus disse animado, pegando o contêiner e começando a arrastá-lo em sua direção, fora impedido de segurá-lo quando o doutor colocara sua mão em cima do recipiente, forçando para que o menor não arrastasse mais.

. Em seguida lançou um olhar fulminante no menor que se encolheu amedrontado.

Jamais faça isso novamente, o detrito não é um bichinho de estimação. — Gaster o repreendeu com um olhar firme, suas órbitas vazias fizeram o mais novo se encolher amedrontado.

— Me desculpe... – Papyrus arrependido tentava sem sorte reverter à situação. Sans olhava para a situação completamente perdido, querendo defender o irmão, mas ao mesmo tempo tendo consciência da magnitude daquela peça.

Isso não é igual a outros trabalhos que fizeram. — O doutor os olhava firme, com os olhos cravados neles, os obrigando a prestar atenção em seus gestos. Continuando de maneira calma, mas ao mesmo tempo sério e determinado. – Estou em busca muito mais do que conhecimento, busco algo que nos tirará daqui, que reverterá toda nossa terrível situação. Mas isso não será possível caso arruínem tudo.

Os irmãos ficaram calados, olhando para o chão encabulados. Sabiam que deveriam agir de maneira séria e madura quando se tratava dos projetos de Gaster, o doutor os havia ensinado isso desde que nasceram. Mas mesmo assim continuavam a serem crianças curiosas e imaturas, com atitudes quase imprevisíveis.

E Gaster sabia disso. Não era uma pessoa paciente, jamais fora, e frequentemente explodia com os dois. Entretanto tinha a consciência de que jamais iria para frente se não soubesse lidar com Sans e Papyrus. Tinha orgulho da educação que havia os dado e do vasto conhecimento científico que ambos tinham com tão pouca idade, num subsolo onde o ramo científico não era mais tão apreciado os dois eram o único suporte que ele tinha, mesmo que com ajudas tão simples. Deveria entendê-los, mas era difícil com todo o peso em suas costas.

Tudo que eu peço é que entendam o que está acontecendo, o quanto isso é importante. Quero que pensem antes de agir e que saibam como se portar, pois agora são de certa forma meus auxiliares. — Tentara novamente explicar de forma mais tranquila, e ao deixar mais claro foi de imediato à volta no brilho do olhar dos dois.

— Quer dizer como assistentes? Então nós vamos ter jalecos legais de cientistas?! – Sans indagara, ficara tão animado que mal parecia ele mesmo sempre tão calmo e distraído.

— Eu quero um jaleco legal de cientista! – Papyrus quase gritara, com os braços erguidos de empolgação.

— [Não foi isso que eu quis dizer...] - O doutor colocou a mão na cabeça, suspirando cansado de toda aquela circunstância, enquanto os dois irmãos falavam um com o outro sobre a notícia que tanto o animaram.

                                                                    ***

Sans espiara o beliche de cima, para ter certeza que seu irmão estava dormindo. Queria fazer aquilo sozinho, afinal Papyrus nem se interessaria por aquele tipo de coisa e por mais que fosse maldade sua pensar nisso tinha medo que o irmão estragasse seu plano. Por isso planejava sair despercebido do quarto.

Pelo menos conseguira a algumas noites atrás convencer o irmão a dormirem novamente em suas próprias camas. Sans ainda tinha medo de dormir sozinho, mas desde que lançara seu primeiro ataque por acidente tinha medo de ferir o irmão sem querer. Apesar de Gaster ter o ajudado a lidar com a mágica ele ainda se sentia inseguro demais quanto a isso.

E igual à noite em que soltara seu primeiro osso, saiu de fininho andando com cautela pelos corredores escuros. O motivo? A busca por respostas e seu próprio orgulho. Podia ser jovem, mas Sans estava certo de sua capacidade para compreender teorias científicas, afinal nascera de uma! Por isso queria saber o que o doutor estava tramando, para o que ele e o irmão estavam trabalhando, no que estariam se metendo.

Gaster guardava seus artigos em um escritório pequeno, quase que nos fundos do laboratório. Sans sabia disso depois de tanto tempo trabalhando com as traduções, assim quando acendera as luzes da sala logo se familiarizou com o ambiente. Fechou a porta e rumou até a escrivaninha com um computador, vendo e procurando seus arquivos parecendo um profissional, mas a primeira coisa que lhe chamou a atenção foi quando sua mão que segurava o mouse esbarrou em um pequeno amontoado de pastas em cima da escrivaninha.

Teria as ignorado se não fosse o título em wingdings que estampava suas capas: Teoria do nascimento espontâneo – Estudo da natureza de almas por Dr. W.D Gaster.

Havia lido aqueles artigos há muito tempo atrás e sabia do que se tratava. Era sobre ele, sobre ele e seu irmão. Eram de um tempo em que Gaster ainda não escrevia em computadores, pois ainda não havia desenvolvido um teclado em wingdings para isso. Suas capas e folhas estavam amareladas e manchadas pela idade e de tanto tempo que estavam guardadas. Era estranho que aquela pasta estava logo ali e não guardado nos fundos da gaveta de um arquivo, isso chamou mais ainda sua atenção.  

Pegou a pasta e abriu numa página que estava marcada com um clipe, marcando uma das últimas páginas. Sans leu tudo atentamente, a procura de traduzir os símbolos e compreender o que estava escrito:

Registro número 21:

Com os testes e resultados pode-se concluir que a natureza das almas é completamente imprecisa e aleatória, não podendo ser medida ou controlada. Como consequência é impossível criar um elemento completamente artificial ou mesmo controlar uma alma com precisão, já que todas elas possuem características únicas e abstratas.

Ademais, os experimentos passam bem.

 

Provavelmente Gaster consultara aquilo antes de ir em frente com o novo projeto, dando ênfase a sua última parte. Sans ao ler aquilo se sentira estranho, era desconfortável ser visto como algo e não alguém como o último trecho denotava, já que ele tinha certeza que se tratava dele e do irmão. Em uma fuga daqueles sentimentos acabou voltando sua visão ao computador, em busca do atual plano. Pelo que encontrara era um projeto de apenas seis entradas até aquele momento, ainda sem um título:

Registro número 1:

Durante os testes do projeto de magia na desmaterialização e movimentação de corpos, notei um segundo elemento em conjunto que não estava em meus planos. Durante o processo de teleporte diversas linhas e atalhos diferentes parecem se formar durante uma viagem, mas que não podem ser atravessadas. Seriam elas anomalias espaços-temporais ou variações do tempo? Acredito que com análises mais aprofundadas poderei ter certeza de sua real natureza.

 

Registro número 2:

A viagem e manipulação do tempo podem estar mais próximas do que imaginei. Ao que tudo indica, caso tivéssemos uma força superior que permitisse adentrar nesses multiversos, eventos poderiam ser mudados ou uma realidade melhor poderia ser explorada.

Isso revolucionaria toda a história e a ciência.

 

Registro número 3:

Há lendas que contam sobre humanos que um dia manipularam o tempo, que possuíam uma alma tão poderosa que abalavam todo o espaço ao seu redor. Sendo verdade ou não, é sabido por todos sobre o quão forte é uma alma humana. A natureza de tamanho poder nessas almas é desconhecida, e mesmo uma alma humana comum há um poder surpreendente. Caso pudesse isolar uma parcela desse poder e mesclar com a magia que fez possível o teleporte, talvez... Talvez tudo possa ir muito além de simples hipótese.

 

Registro número 4:

Uma alma humana inteira não é o que busco. Caso se rebelasse ou a corrompesse o projeto iria direto ao fracasso. As almas dos monstros não possuem essa misteriosa força que move a dos humanos. Como um antigo estudo meu aborda não é possível criar algo assim artificialmente e muito menos controlar uma alma com exatidão. Preciso de algo diferente, mas não sei onde buscar.

 

Registro número 5:

A mesma tradição humana que me permitiu encontrar os ossos que fizeram Sans e Papyrus ajudou-me a encontrar soterrada no solo o elemento que eu precisava. O que tentarei fazer agora é mesclar uma pequena quantidade de essência humana com a mágica dos monstros, produzindo um elemento que poderá atravessar barreiras pela realidade. Como um componente vindo da própria alma deverá ser usado em um ser vivo que deverá ter o próprio poder de mexer no espaço e no tempo.

Mas é necessário paciência, afinal o resto de alma deverá ser enriquecido com magia antes de tudo. Ainda devo estudar a natureza das linhas do tempo, projetando paralelamente algum maquinário que possa me ajudar a identificar e analisá-las.

Este é um projeto extremamente complexo, sendo fascinante analisar todas as suas facetas.

 

Registro número 6:

Mesmo com o término do sistema de resfriamento do Core o trabalho é muito para apenas uma pessoa. Ninguém mais pensa em outras formas de voltar à superfície e o laboratório anda ficando cada vez mais vazio.

Com o número de almas humanas coletadas aumentando, mais o plano de quebrar a barreira com as mesmas se torna a maior esperança de todos os monstros. É um caminho relativamente fácil para a liberdade, mas e depois? Um genocídio irá acontecer para que possamos viver em paz, isso se pensar com otimismo... Pois aquele trágico evento de anos atrás mostra o que a junção da alma de um humano e um monstro pode causar.

Por mais que este seja o plano de Asgore ele jamais gostou dessa ideia, não é uma nova guerra que ele deseja, e por mais poderoso que ele seja sendo um Monstro Chefe há um enorme risco controlar sete outras almas com suas próprias ambições. 

Meus experimentos são de certa forma a única forma de criar um novo plano, algo que não tenha tantos riscos e que derrame tanto sangue. Por conta disso Asgore ainda possui esperanças sobre mim, mesmo com a ciência se transformando num ramo cada vez mais em decadência pelo subsolo.   

 

Ao terminar a leitura Sans se recostou na cadeira, juntando as mãos. Absorvia tudo o que havia lido e juntava as peças em sua cabecinha, tentando compreender as palavras do doutor. Sentia-se orgulhoso por compreender grande parte do que estava escrito, agora podendo entender melhor todo o trabalho que viria pela frente. Aquilo o fascinava, era tão mágico e irreal que parecia até seu jogo de videogame (só que sem naves espaciais). Não via á hora de explicar para o irmão que com certeza iria preferir um resumo que ele tinha lido.

Ao pensar no irmão, Sans lembrou que deveria voltar para cama antes que Papyrus ou até mesmo Gaster notassem sua falta, se levantando rapidamente e sem querer deixando uma das pastas caírem no chão.

Juntou o papel as pressas, revisando duas ou três vezes se havia posto todas as folhas em ordem, afinal não queria ser descoberto e penalizado com cinquenta questões de química. No meio disso uma fotografia que estava no meio da pasta acabara caindo à parte, fazendo com que Sans a recolhesse e por curiosidade a olhasse.

Nela estavam ele e Papyrus bem menores, de uma época em que Sans era definitivamente mais alto que o mais novo. Estavam de mãos dados e Papyrus parecia ser tão jovem que só se mantinha equilibrado em pé por conta disso, era o único que olhava para frente com um largo sorriso no rosto que deveria ser para quem segurava a câmera. Sans ao contrário do outro estava distraído, com o dedo na boca e olhando para o lado. Ao ver-se daquele jeito Sans riu de sua versão mais jovem e do quão pequeno ele era, em seguida percebeu que havia alguma coisa escrita em wingdings na borda, lendo o seu conteúdo:

Sans e Papyrus com suas primeiras camisetas listradas.

Realmente os dois estavam de camisetas listradas, iguais as que eles sempre usavam: brancas com três listras pretas, a manga e a gola também pretas. De certa forma aquilo alegrara Sans que guardou a foto com cuidado e carinho antes de voltar para seu quarto.

                                                                    ***

Gaster disse para não saírem do quarto naquela tarde. A máquina para resfriar o Core estava sendo transportado em direção á Nevada onde seria instalado. O doutor não queria que os dois causassem problemas e só permitiu a saída do lugar caso houvesse alguma urgência.

Enquanto os dois ouviam o barulho alto e desconcertante da mudança, não havia muita coisa a ser feita. Papyrus ficava criando passatempos semelhantes as das revistas e dava para Sans fazer, esperando com ansiedade as reações do outro.

A bateria do videogame acabara novamente, ela não durava nem meia hora e infelizmente esquecera a bateria em outro cômodo. Assim Sans se obrigava a fazer os desafios feitos pelo irmão, apesar de serem extremamente fáceis – era preciso apenas preencher todas as colunas das palavras-cruzadas com ‘’Cara legal’’ – era muito melhor do que não fazer nada.

— Terminei.

— Você notou minha pegadinha?! Notou?! – Papyrus perguntou empolgado, engatinhando até Sans já que ambos estavam sentados no chão.

— A coluna onde só cabia ‘’legal’’? Achei incrível! – Respondeu empolgado aproximando sua mão do crânio de Papyrus na intenção de lhe dar um cascudo como frequentemente fazia, mas hesitou de repente afastando-se devagar. O mais novo não deixou de notar aquilo desfazendo seu sorriso de imediato.

— Por que está fazendo isso? – Papyrus questionou, parecia indignado. Sans se sobressaltou com a pergunta, procurando algum jeito de se esquivar.

— Fazendo o que?

— Você sabe o que Sans, você não quer mais ficar perto de mim. – O semblante do menor ficava mais entristecido a cada palavra dita, aquilo destruía Sans por dentro que sabia que aquilo não era verdade. – Foi por algo que eu fiz?

— Não, não! Claro que não Paps!

— Então é o que?!

— É... É complicado. – Respondeu não conseguindo olhar para o irmão por vergonha. Sabia que caso falasse para Papyrus o porquê de sua distância o outro não ligaria para o que dissesse, tinha medo de por o irmão em mais riscos ainda.

— Tudo bem. Foi você que pediu por isso. – Papyrus franziu os olhos antes de se atirar em Sans e ficar agarrado nele á força. Assustado com o ato Sans tentou se livrar do irmão empurrando-o, mas Papyrus era surpreendentemente forte e continuava firme.

— Papyrus! Me larga! – Tentava dizer inutilmente enquanto sentia o irmão apertas seus ossos ainda mais. Temia que de alguma forma usasse um ataque contra ele sem querer, por isso tentava desesperadamente se livrar de suas mãos.

— Eu chamo isso de golpe do irmão siamês! NYEHEHEHE! – Papyrus anunciou determinado, por mais que Sans tentasse não conseguia mover nem um osso do irmão. – Não vou te libertar até me dizer tudo!

Dado por vencido Sans parou de tentar afastá-lo, respirando fundo para tomar coragem de falar. O irmão o encarava sério, esperando sua declaração.

— Está bem, eu explico. – Disse revirando os olhos enquanto os do irmão brilhavam de alegria. – Eu fiz um ataque sem querer há umas noites atrás e agora eu tenho medo de te machucar. É isso, me solte.

— Wowie, um ataque?! Eu quero ver, me mostra! – Pediu como já era esperado por Sans. Ao ouvir aquilo Papyrus o soltara de imediato, ficando completamente animado com a ideia.

— Não! Eu não sei controlar, pode dar muito errado!

— Mas, você não tem como fazer que... Seja ‘’não perigoso’’? – Papyrus perguntou decepcionado, mas com ainda uma ponta de esperança.

— Bem... Gaster disse que o único jeito de eu saber controlar é treinando, mas não faço ideia como e não quero machucar ninguém. – Disse inseguro, coçando atrás do crânio de nervosismo. Papyrus colocou a mão no queixo de maneira pensativa, antes de alguma ideia iluminar sua mente.

— E se eu te treinasse?! Seria incrível! O que acha?! – Sugeriu e Sans se segurou para não rir da ideia.

— Isso é loucura Paps, um sabe menos que o outro. – Respondeu tentando segurar o riso.

— E quem disse sobre saber? Você fica no esquema de tentativa e erro, e eu Papyrus serei seu apoio moral! – Respondeu fazendo uma pose heróica apontando para Sans. – E não me vem com este papo de minha segurança, sou um menino crescido e sei me cuidar! Recuse e se prepare para mais um dos meus ataques... Que ainda não são bem ataques.

Sans não tinha outra escolha a não ser aceitar as condições do irmão. Por mais que ás vezes tentasse não havia como se livrar dele, era como se o menor tivesse posto uma algema invisível nos dois que impedisse de esconder os sentimentos um do outro. Apesar das complicações, aquilo deixava Sans feliz, pois não importava a situação Papyrus sempre encontrava um lado bom.

— Começamos o treinamento amanhã! Mas agora... Sans, to com fome.

Bem, ele continuava a ser o irmão mais velho.

                                                                        ***

Era difícil não ser compreendido.

Mesmo quando usava os sinais nem sempre entendiam o que queria dizer, afinal quase todos os monstros usavam a fala para se comunicar e nem sempre entendiam todos os sinais. Era uma vida inteira de gestos sendo feitos dezenas de vezes, blocos de notas sendo escritos no alfabeto tradicional (uma tortura), traduções mal feitas de Sans e a desistência por parte dos ouvintes.

Ao menos o rei, Asgore, entendia todos os sinais que fazia. Podia em sua opinião ser um cara molenga e por vezes irritante, mas este lado extremamente amigável era que o fazia aprender de libras á tricô só para agradar algum dos súditos.

— Então doutor, disse que queria falar sobre uma nova ideia para irmos á superfície? – Asgore indagou enquanto ambos observavam o vaivém dos outros monstros empacotando e transportando as peças do maquinário para resfriar o Core. Não era o cenário mais apropriado, mas não era como se Gaster tivesse todo o tempo do mundo para marcar uma audiência com o rei para falar sobre essas coisas. Tinha que aproveitar essas oportunidades.

Como eu ia dizendo Majestade, segundo teorias que ando pesquisando... — Interrompeu a própria fala ao notar um elemento que não deveria estar ali. Sans acabara de passar entre eles, tranquilamente como se não estivesse nada acontecendo, quando na verdade deveria estar em seu quarto com o irmão!

— Oh! Um esqueletinho, quem é este doutor Gaster? Acho que nunca o tinha visto antes. – Asgore se distraiu completamente ao ver Sans percorrendo o corredor, Gaster caso não fosse um esqueleto estaria suando de nervosismo naquele momento. Afinal, não havia uma boa resposta para aquilo.

Ele vive comigo. — Respondeu incerto, não sabia como explicar mais do que aquilo, era uma história um tanto complicada.

— É seu filho então? E tão grande já! Você é realmente extraordinário doutor, nunca havia me contado sobre esse lado seu. – Asgore parecia empolgado, definitivamente o assunto anterior estava completamente perdido. Antes que Gaster pudesse de alguma forma tentar ressuscitar sua fala, Sans passou por eles novamente segurando dois copos de leite.

Era óbvio que o rei não ficaria calado.

— Olá garotinho! – Cumprimentou Sans que o olhou confuso, olhando para os dois lados como se quisesse ter certeza que a conversa era com ele.

— E ai. – Respondeu para o rei. Gaster estava se remoendo por dentro, tentando manter a compostura.

— [Sans modos...] — Disse e Sans o olhou sem muita expressão, logo voltando o olhar para Asgore e estudando aquela enorme figura que parecia exalar tanto poder.

— E ai, moço. – Sans se corrigiu se é que aquilo podia ser dito como uma correção. Gaster dera um tapa na própria cara, não sendo notado por nenhum dos dois.

— Como se chama? Eu sou Asgore. – O rei permanecia simpático como sempre, mas Gaster sentia seus ossos vibrarem de raiva e vergonha.

— Sans e... Espera, tu é o rei? – O menor perguntou na maior inocência e Asgore riu.

— É muitos dizem que sim.

— Legal. – Disse simplesmente, tomando um gole do leite em seguida.

Sans, volte para o quarto. — Tentou se livrar inutilmente do garoto, mas foi interrompido pelo próprio Asgore.

— Não precisa disso Gaster, se o menino quiser pode ficar aqui sem problemas. – Asgore sorria docilmente, aquilo deixava o doutor nauseado.

— Eu tenho que levar isso pro meu irmãozinho, ele ta com fome. – Sans respondeu, estava curioso para conversar com o rei, em sua opinião ele tinha uma cara bem mais... Inofensiva do que imaginara. Mas sabia que não podia deixar o irmão esperando.

— Então vocês são dois?! Doutor Gaster você anda escondendo várias coisas de mim! – Disse o rei rindo e Sans também só para acompanhar, enquanto o doutor ficava tentando manter a calma. – Pode chamar seu irmão aqui, adoraria conhecê-lo também!

Creio que não seja necessário...

— Ta bom. – E Sans saiu à procura de Papyrus antes que pudesse ser entendido. Ficando apenas o doutor sendo encarado por um Asgore curioso demais para o seu gosto.

Sinto muito pela indelicadeza de Sans, ele é um garoto teimoso. — Tentou se explicar, o rei novamente riu fazendo um gesto para deixar pra lá.

— Crianças são assim mesmo, sei muito bem. – Comentou Asgore parecendo nostálgico de algo, havia algo em seu olhar no qual Gaster não conseguia compreender naquele momento. Seu rosto apesar do tenro sorriso se tornara triste, com os olhos perdidos em algum lugar de suas dolorosas memórias.

Até que de repente uma pilha de ossos apareceu correndo, estabanado e extremamente agitado, ao contrário do irmão que vinha logo atrás em um ritmo bem mais lento.

— Oi senhor rei! Fico feliz em te conhecer! – Papyrus imediatamente ofereceu um aperto de mão que foi retribuído com prazer pelo monstro chefe que voltara com a expressão alegre. – Meu nome é Papyrus!

— Prazer conhecer você Papyrus. – Asgore entrou na brincadeira, animado com a presença de duas crianças.

— Essa sua capa parece bem pesada! Você fica com ela o dia inteiro? – Papyrus perguntou. Seus olhos brilhavam de tamanha alegria ao conhecer alguém tão importante.

— Bem, como rei você acaba se acostumando. – Respondeu achando a pergunta adorável. – Quantos anos você tem Papyrus?

— Hoje eu fiz sete!

— É mesmo? Parabéns então!

— Obrigado! Mas por quê? – O menor pareceu confuso com aquilo fazendo com que Asgore estranhasse sua atitude.

— Por seu aniversário.

— O que é aniversário? – Sans perguntou desta vez e Gaster ficara quase que congelado, não sabendo mais o que fazer, era como se o chão estivesse se desmoronando.

— Oras o pai de vocês nunca falou sobre isso? – Asgore perguntou fitando Gaster que queria quase morrer naquele momento.

— Não. E nós não o chamamos de pai. – Sans respondeu e o rei se sobressaltou, antes que ele perguntasse algo Papyrus prontamente complementou:

— Verdade, ele não gosta!

— Ele diz pra o chamarmos de Doutor Gaster. – Sans disse olhando de modo sacana para Gaster, havia percebido o desespero do mais velho que sentiu vontade de esfregar a cabeça de Sans no chão.

Acho que já está na hora de vocês voltarem para o quarto. — Pronunciou quase arrastando os dois pelo corredor.

— Mas nós já terminamos de anotar as variações do experimento! – Sans disse de propósito, não segurando o sorriso no rosto. O pior de tudo era que ele não estava mentindo e Gaster quase não tinha para onde fugir.

— Eu sei contar as vinte primeiras casas de PI! – Papyrus anunciou sem um motivo, só piorando a situação. Quando conseguira se livrar deles já era tarde, o doutor teve que lidar com o olhar de julgamento do rei pelo resto do dia e talvez por toda a eternidade.

Papyrus não entendeu por que depois tiveram que fazer uma redação de três páginas sobre ‘’Modos e Educação’’. Mas Sans não se arrependera nem um pouco enquanto escrevia cada palavra, afinal aquilo não deixava de serem ossos do ofício.


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Notas finais do capítulo

Se caso todo o negócio do experimento do Gaster ficou confuso podem me avisar que dou um jeito de arrumar pra ficar mais simples! Acho que consegui explicar bem apesar de parecer uma bagunça total... Qualquer coisa só perguntarem! Também no próximo capítulo, acho que isso não é spoiler, Sans vai explicar o projeto com suas próprias palavras de um jeito menos científico e bem a cara dele ;p
Comentários são sempre bem vindos! ^-^



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