Os póneis bonzinhos vão para o Inferno escrita por Maurus adam


Capítulo 16
Livro 2 Capítulo 5 - Tempo e clima




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E motivação foi o que manteve a perseverança de Arenito durante tanto tempo que mais pareceu uma eternidade. Os anos transformaram-se em décadas e estas por sua vez tornaram-se em séculos. A pesquisa de Arenito ia avançando a passos lentos, mas pelo menos ia avançando.
Eventualmente chegou ao ponto de permitir a Arenito viajar no tempo. Desenvolvendo uma poção que lhe permitia saltar para a frente ou para trás no tempo, conseguiu o prodígio de se encontrar consigo próprio. Uma situação bastante surreal, para dizer o mínimo. Arenito nunca foi muito proficiente com as habilidades sociais e tentar comunicar consigo próprio muitos séculos depois de se ter desaprendido a falar teve um resultado bastante caricático. Ademais, para o bem ou para o mal, uma das suas versões sabia sempre o que se iria passar. O stresse que um ser forçado ao autismo durante a maior parte da vida sofre ao tentar lidar com outro pónei, mesmo se esse pónei é ele próprio, pode originar alguns estragos na mente de qualquer pónei. As primeiras vezes que Arenito se encontrou a si mesmo resultaram em ataques de pânico, de fúria, de confusão e de frustração. Ao longo dos séculos ele tinha aprendido a ser paciente, mas aqueles insólitos encontros estavam acima dos seus nervos. Numa das vezes quase chegou a agredir o seu outro ele. Consequentemente passou a ignorar-se a si mesmo quando experimentava viagens temporais.
Apesar de tudo ainda era incapaz de alterar o passado de qualquer forma. Não que ele não tivesse tentado. A sua primeira experiência nesse sentido consistiu em atirar uma bola de trapos para um sitio onde não se avistou a si próprio e de seguida voltou atrás no tempo para tentar interceptar aquele lançamento. Será inútil dizer o quanto a experiência falhou. As suas diversas tentativas revelaram-se bastante caricatas, para dizer o mínimo. Na sua primeira vez enganou-se no sitio e foi esperar pelo lançamento no outro lado da cidade. Na segunda tentativa esbarrou contra si próprio numa tentativa posterior. À terceira vez falhou redondamente o feitiço e recuou no tempo uma semana a mais do pretendido. À quarta vez esbarrou contra si próprio numa tentativa anterior. Finalmente, na quinta tentativa, estava a ficar tão frustrado com o desenrolar daquela experiência que nem reparou num buraco que tinha sido aberto quando o tecto de uma cave ruiu que caiu redondo para dentro dele. Nessa altura desistiu, pelo menos temporariamente. Eventualmente fez novas experiências, mas os resultados foram sempre os mesmos. Cada vez que tentava alterar o passado, não interessava o quão pequeno e localizado fosse essa alteração, ou falhava ou acabava por fazer acontecer algo que se lembrava de ter acontecido no passado. A única coisa que lhe servia de consolo era que a sua pesquisa em magia ia avançando.
Porém, havia outra coisa que também parecia avançar, e ao contrário da investigação de Arenito, fazia-o com alguma ligeireza. Um terrível nevão, de proporções épicas, começava a espalhar-se por todas as terras. A temperatura baixava de dia para dia.
A enorme tempestade de gelo tinha sido provocada por um enxame de windigos, espíritos do Inverno que se alimentavam de rancor, inveja e ódio. Também adoravam o clima frio das regiões árticas. À medida que se alimentavam de emoções negativas criavam nuvens de neve e granizo para converter o mundo num habitat que lhes fosse mais confortável. E esse habitat ameaçava cada vez mais cobrir todo o mundo.
E com o frio os problemas de todos os póneis multiplicavam-se. Incapazes de compreender a natureza da ameaça que pairava sobre eles, os póneis começaram a competir entre si pelos poucos alimentos que ainda possuíam e a trocar acusações que noutra altura pareceriam insignificantes. Isso levou a que aumentasse o rancor e as disputas entre os póneis, o que só fez com que os windigos se fortalecessem e o tempo piorasse ainda mais.
À medida que o frio aumentava a vida vegetal estava cada vez mais ameaçada. As árvores, os arbustos, as flores, todas as plantas que Arenito usava como componente para poções ou para se alimentar começaram a morrer. Um dia chegou ao ponto da vila do Inferno estar quase completamente coberta de gelo.
Arenito tinha feito várias tentativas para se livrar daquele nevão ameaçador. Sendo espíritos, os windigos eram inatingíveis por qualquer ataque directo. Arenito tinha descoberto isso por conta própria. Não conseguia usar a telecinesia neles. O combate corpo-a-corpo e vários tipos de raios mágicos revelaram-se inúteis, visto os windigos serem intangíveis. O fogo, ou mais propriamente o calor, conseguia por-los desconfortáveis e assustá-los um pouco, mas nada de muito eficiente. Os poderes de pégaso de Arenito também se revelaram inúteis. As nuvens controladas pelos windigos estavam impregnadas do poder deles e eram completamente incontroláveis pelos métodos habituais. A alquimia e a magia de unicórnio não surtiram qualquer efeito sobre aquele clima.
Sendo criaturas cuja força provinha inteiramente das emoções negativas, os windigos somente poderiam ser atingidos por um tipo de magia governado pelas emoções opostas. Um feitiço alimentado por amor ou carinho poderia feri-los imenso, mas é claro que Arenito não estava em posição de lançar convenientemente esse tipo de magia. Simplesmente não poderia energizar algo baseado em emoções das quais não possuía verdadeiro conhecimento empírico.
No entanto o oposto também se aplicava. Se os windigos eram capazes de drenar ódio e rancor de outros póneis, então também poderiam ser enfraquecidos pelo mesmo processo. A capacidade natural deles de se alimentar das emoções era bastante forte, mas mesmo assim era só uma capacidade natural. Por outro lado Arenito sentia verdadeira raiva e desespero. Tinha lidado com isso durante grande parte da sua vida, sem mencionar que passara toda a sua infância convivendo com póneis para quem o ódio e o desprezo eram como uma segunda natureza. Ainda para mais ele não precisava de absorver a energia deles nem de a controlar, somente privá-los dela. Mais uma vantagem que possuía sobre aquelas criaturas.
Não demorou muito tempo a Arenito improvisar um feitiço que pudesse ferir os windigos. Funcionou maravilhosamente bem. Com um simples raio a vitalidade deles tornava-se incontrolável e evaporava como uma brilhante chama azul, que ainda por cima era bastante quente. E assim Arenito começou uma batida para se livrar permanentemente daquela praga. Arenito não conseguia ferir permanentemente os windigos mas o seu feitiço enfraquecia-os bastante, sem contar que lhes provocava dores horríveis. (Os seus gritos esganiçados eram a prova disso.) A purga de Inferno demorou a quase dois dias completos, mas finalmente, cansados e aterrorizados com a implacável perseguição que Arenito lhes dera, os windigos afastaram-se daquela área.
Sem estar sobre a influencia dos windigos, aquela massiva tempestade revelou-se bastante fácil de desfazer. O bom tempo voltou a reinar em Inferno e a maior parte das plantas conseguiu recuperar o vigor antes que o todo o ecossistema ficasse irremediavelmente ferido. Durante algumas décadas alguns windigos, decerto atraídos pelo o desespero de Arenito, tentavam de vez em quando aproximar-se daquela área. Porém, agora já não constituam nenhuma ameaça e eram facilmente afugentados mal se faziam notar. Consequentemente, livre de distracções, a pesquisa temporal de Arenito poderia continuar ininterruptamente durante séculos.


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