Faces de Pedra escrita por Agatha Wright


Capítulo 10
10 - Ventos de Tempestade


Notas iniciais do capítulo

Queimei a última semana? Queimei! Vida dificil, trabalhos chegando, C'est la vie XD

Mas cá estou eu com o próximo cap. Confesso que me preocupei com o sumiço de algumas leitoras, espero que a história não esteja desagradando (muito) vocês.

Bem, pra quem chegou até aqui. Yey! Décimo capítulo!

Boa leitura.



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Com muito esforço, toda a tripulação estava reunida no refeitório. A nave estava em total escuridão, exceto pelas lanternas e algumas poucas luzes de emergência funcionais. Eles estavam à deriva, todos os motores e sistemas mortos exceto pelo suporte de vida, que mesmo assim estava no mínimo. O desconforto nos vulcanos era evidente por causa do frio. Por ser uma tripulação praticamente homogênea, certas configurações ambientais podiam ser alteradas e uma delas era a temperatura que sempre estava ao redor dos 35 graus Celsius. Isso foi uma das primeiras coisas que Robin Wolf teve que se adaptar a bordo da T’Partha.

Temperaturas elevadas, comida estranha, comportamento frio e a lógica pura.

Robin estava se vendo com saudades dos tempos em que essas eram suas dificuldades a bordo dessa nave.

Agora ela estava lado a lado com todos os outros oficiais médicos e com vários dispositivos recuperados da enfermaria a sua frente ouvindo as ordens e explicações do capitão.

O último ataque havia cortado as pernas e arrancado os olhos da T’Partha. Eles estavam como um sehlat ferido vagando cegamente no meio do deserto enquanto um grande le-matya os rodeia pronto para atacar. Sem energia não havia como usar os sensores internos e encontrar a fonte do Trellium-D, eles iriam depender apenas de tricorders portáteis para escanear uma nave inteira. Dado isso, não havia como saber qual seria o estado da tripulação quando a ameaça fosse localizada e se os relatos sobre as missões do século passado eram precisos, eles estavam correndo um grande risco que ficaria maior a cada segundo.  Após discutir o caso com os oficiais médicos, eles chegaram na única forma de evitar uma catástrofe.

Todos os tripulantes não-essenciais seriam postos em coma, com a atividade cerebral reduzida ao mínimo, eles poderiam retardar a degradação causada pelo Trellium-D e evitar danos neurológicos mais extensos. Apenas o capitão e um pequeno grupo de voluntários se manteria exposto para poder escanear a nave e tentar realizar alguns reparos.

A médica já estava habituada com a obediência vulcana, então não foi surpreendente o fato de que todos cooperaram para que os procedimentos seguissem sem nenhum maior atraso.

“Lembre-se, a equipe médica é a primeira que você deve despertar em qualquer situação. Monitore todos a cada meia hora nas primeiras 24 horas e depois aumente o intervalo para cada três horas. Mantenha os monitores neurológicos calibrados e verifique se todos os dados estão sendo documentados.”

Robin sorriu e concordou com as várias recomendações do Dr. Sakht, fora decidido que seria mais sábio mantê-lo em coma dada a sua elevada idade e sua expertise que poderia ser útil para lidar com os danos causados por essa ameaça assim que ela fosse neutralizada. Apenas ela e a tenente Saya ficariam para monitorar os tripulantes. Elas seriam auxiliadas pelos oficiais de Ciência caso fosse necessário.

Era isso, eles ficaram reduzidos a apenas um grupo de 25 pessoas. Uma extensão da enfermaria foi organizada no refeitório onde todos aqueles em coma iriam ficar juntos para facilitar o trabalho de Robin e Saya. O refeitório agora não tinha muita função com os replicadores inutilizáveis pela falta de energia, eles teriam que se sustentar com as rações de emergência da Frota Estelar, uma combinação única de ingredientes feitos para sustentar humanoides por até três dias sem necessidade de nutrição adicional. Mas parecia que a eficiência era inversamente proporcional ao gosto bom.

“Deve haver algum regulamento da Frota que impede que as rações tenham um gosto decente.” Lamentou Robin franzindo o nariz ao sentir o cheiro do pacote recém aberto.

“As rações não são feitas para serem palatavelmente agradáveis e sim suprir as necessidades nutricionais básicas de uma ampla gama de espécies." Respondeu o Capitão Sevel, mesmo que ele também parecia hesitante em dar a primeira mordida na barra fétida e de um tom marrom acinzentado nada apetitoso.

“O senhor também não parece muito feliz em comer isso.” Respondeu ela com um sorriso

“Eu nunca pareço feliz Dra. Wolf, mas apreciaria que você evitasse implicar suas emoções humanas a mim.”

“Como quiser, senhor.” Disse ela em um tom irônico ao notar que ele ainda não tinha arranjado coragem para morder aquela coisa.

“Aqui, tome isso.” Disse ela entregando a ele uma garrafa d’água. “Vai ajudar.”

Sevel aceitou a oferta, não havia lógica em negar uma forma de tornar aquela tarefa mais fácil. Vulcanos podiam durar muitos dias sem água e comida, mas ele era incapaz de recordar qual foi sua última refeição desde o início dessa crise. Ele deu uma grande mordida na barra seguida quase que imediatamente por um gole de água, a aparência e cheiro não eram melhores que o gosto daquela coisa e ele imediatamente sentiu seu estômago protestar. Se virou para olhar para a médica que estava ao seu lado bem em tempo de vê-la pôr as mãos na boca para impedir o que parecia uma grande crise de náuseas. Com as luzes fracas de emergência, ele não poderia dizer com certeza, mas ela parecia ter assumido um tom de verde incompatível com o fato de que seu sangue não era a base de cobre. Ela piscou com seus olhos lacrimejando e ele sentiu uma súbita vontade rir, algo que foi felizmente posto sob controle antes que alguém notasse.

Todos os tripulantes despertos estavam na sala de reuniões e não pareciam ter notado a rápida troca de interações entre a oficial médica e o capitão. Assim que todos terminaram (ou desistiram de) suas rações de emergência, o plano para colocar a nave em funcionamento foi exposto para todos e as funções foram divididas.

Robin deveria se dividir entre monitorar os tripulantes e auxiliar o time de cientistas na tarefa de escanear a nave.

Ela podia notar com o passar do tempo que eles estavam começando a perde a paciência cada vez com mais facilidade. No final do terceiro dia, ela teve que se intrometer em uma discussão entre T’Aria e T’Lyra que estava junto com a Oficial de Ciências em uma tentativa de aumentar o poder dos tricorders. Elas tinham descordado entre si em um procedimento que imediatamente se tornou uma troca de palavras cada vez mais intensa.

“Todos nós sabemos que isso é uma situação preocupante, mas ninguém vai ganhar nada se vocês começarem a se engalfinhar por qualquer coisa!” Disse ela severamente. “Testem as duas formas, essa é a opção mais lógica.”

Com certeza ninguém esperava ouvir uma humana apontando lógica para vulcanos. T’Aria soltou um longo suspiro, mas aceitou a repreensão de Robin. T’Lyra por sua vez soltou um olhar venenoso para a médica antes de se afastar sem dizer mais nenhuma palavra.

A atmosfera de estresse era evidente e Robin estava se vendo cada vez mais como a única pessoa com bom senso dentro daquela nave. Frequentemente ela começou a se refugiar no refeitório sob as desculpas de que deveria monitorar os tripulantes ou checar algo particular em alguém. O silêncio daquela sala era somente interrompido por algum som ocasional dos aparelhos.

No final da primeira semana nessa situação, ela estava monitorando os dois oficiais que ela se viu obrigada a pôr em coma há dois dias após ver que a degradação de suas vias sinápticas estava atingindo um nível crítico. Quando ela se preparou para sair, ela ouviu o som de sussurros em vulcano, ela não podia entender as palavras, mas elas pareciam ter um tom bastante desesperado. Seguindo o som, ela se deparou com o capitão encolhido em um canto escuro com sua testa apoiada em seus dedos cruzados.

Os tricorders não estavam fazendo um bom trabalho em localizar a fonte do Trellium-D ou em diagnosticar o problema que fez a nave perder toda a sua força. Enquanto os outros tripulantes começaram a ter surtos de raiva cada vez mais frequentes, o capitão parecia capaz de se manter tranquilo e lógico mesmo com todo esse caos ao seu redor.

Bem, pelo visto ele apenas aparentava calma.

“Capitão, o senhor está bem?” Perguntou Robin se aproximando com cautela. Ela já teve que desviar dos punhos de alguns tripulantes o suficiente para saber os perigos de interagir com vulcanos emocionais.

Sevel baixou as mãos e se virou para a médica. Ele parecia exausto e algumas décadas mais velho.

“Eu não necessito de nenhuma atenção médica, doutora.”

Robin se abaixou na altura dele, ela notou como ele se encolheu um pouco com a proximidade.

“Eu tenho algo que pode ajudá-lo a se adaptar melhor a temperatura.” Disse ela em uma tentativa de fazê-lo falar.

Ela o ouviu expirar com mais força que o necessário.

“Novamente, eu não necessito de nenhuma assistência médica.” Repetiu ele.

Com um suspiro de resignação, ela desistiu desse exercício inútil e se sentou contra a parede ao lado dele.

“Talvez teria sido mais sábio deixar o Dr. Sakht lidar com isso.”

Essa declaração atraiu a atenção do capitão.

“Sendo a única tripulante imune aos efeitos da toxina e tendo a expertise necessária para auxiliar na investigação das causas dessa ameaça, sua escolha para a posição de Oficial Médico Chefe foi a mais lógica.” Respondeu ele.

Robin soltou uma leve risada.

“Eu imagino que deveria agradecer por isso.”

“Não se agradece a lógica.” Respondeu ele simplesmente.

“Eu acho que nunca vou entender vocês vulcanos, mesmo estando em uma nave cheia.” Disse ela dando de ombros.

“Sua adaptação a bordo da minha nave foi melhor do que qualquer expectativa minha.”

Isso arrancou mais um sorriso da médica.

“Agora eu devo agradecer por isso?”

“Estou apenas apontando um fato.

“Imagino que suas expectativas deviam ser bastante baixas então.”

“Elas eram.”

Isso a fez engasgar. Direto ao ponto!

“Eu previ que suas chances de ser transferida dessa nave eram de 93% antes dos primeiros seis meses de missão.”

“Bem, estou aqui há um pouco mais de dois meses, ainda há mais quatro de sobra para suas previsões se concretizarem. Não desista tão cedo!”

“Eu acho que nunca vou entender esse senso de humor humano, mesmo tendo vivido por anos na Terra cercado por muitos de vocês.”

“Eu não estava fazendo uma piada.” Respondeu Robin assumindo um ar sombrio

“Entendo...”

Um silêncio bastante desconfortável caiu entre os dois por um bom tempo antes de Sevel voltar a falar.

“Mas devo apontar que dada a presente situação, caso nossa missão seja um sucesso, suas chances de permanecer nessa tripulação são bastante elevadas graças a sua performance durante essa crise.”

“Bem, muito obrigada, senhor.”

Quando Sevel tomou uma respiração para responder, Robin o interrompeu.

“Humanos agradecem por essas coisas, sendo lógico ou não.”

O capitão acenou a cabeça em concordância.

“Eu vejo.”

Ao se mover um pouco, a mão da médica roçou levemente com a dele.

“Eu realmente acho que você iria se sentir melhor se eu lhe desse algo para regular sua temperatura corporal. Não há nenhuma lógica em termos um capitão morrendo de hipotermia em nossas mãos.”

Após um momento de hesitante teimosia, Sevel concordou. Robin se levantou e foi até sua maleta de suprimentos e recuperou um pequeno frasco que ela anexou a um hipospray.

“Aqui. O senhor vai se sentir bem melhor.” Disse ela ao aplicar o hipospray no pescoço de Sevel.

“Não haverá relevância para tais medicamentos se o suporte de vida não for normalizado em breve. Devemos retornar aos nossos deveres, doutora.” Disse o capitão se levantando e retornando imediatamente para sua atitude altiva e inatingível.

“Com certeza, senhor.” Respondeu ela o acompanhando até a saída.

Algumas horas mais tarde naquele dia, Robin estava se esgueirando pelos tubos Jefferies para chegar o mais rápido possível até a ponte após um chamado do capitão. O deslocamento pela nave sem os turboelevadores era algo bastante triste, mesmo em uma nave menor como a T’Partha.

Ao chegar finalmente na ponte, ela estava com o rosto vermelho, suado e com os cabelos bem desgrenhados.

“Aqui estou eu.” Disse ela anunciando sua chegada. “Acho que andei negligenciando meus treinamentos físicos, desculpe pela demora. Aqui estão os equipamentos solicitados.”

Ela estendeu alguns tricorders e cartões de memória que ela recuperou da enfermaria.

“Posso saber o que estamos tentando fazer agora?”

“Conseguimos recuperar parte da estação de ciências.” Respondeu T’Aria” “E nossos sensores detectaram algo no casco, próximo à nacele esquerda.”

“A fonte do Trellium-D, talvez?”

“Não, e é exatamente por isso que requisitei sua presença. Parece uma forma de vida de alguma espécie, mas não se encaixa em nenhum dos parâmetros que conseguimos acessar do nosso banco de dados limitado. Talvez possamos acrescentar algo recuperado do banco médico.”

“Entendo. Bem, espero que a corrida tenha seu valor.” Disse ela tentando soar mais animada.

A Oficial de Ciências trabalhou por algum tempo em seu console antes de entregar os primeiros resultados.

“Eu precisaria de mais analises, mas me parece que se trata de uma forma bastante intermitente de vida, durante maior parte do tempo ela parece ser formada por matéria, mas após isso, apenas por energia em um nível que escapa dos meus sensores.”

“Não é uma resposta completa, mas nos dá um certo campo para trabalhar.” Disse o capitão se juntando as duas oficiais.

No momento que o capitão se juntou ao grupo, T’Aria deve que se deslocar um pouco para o lado o que fez seu rosto ser iluminado pela luz do console e revelou um terrível hematoma na lateral de seu rosto.

“Comandante, o que aconteceu?” Perguntou Robin puxando seu tricorder na hora para sondar o ferimento.

“Houve um contratempo com a tenente T’Lyra, mas já está resolvido. Meu ferimento não exige cuidados adicionais.”

T’Aria estava certa, era só uma escoriação menor e não havia sinais de contusão, mas a declaração dela ainda era bastante preocupante. T’Lyra estava se mostrando bastante volátil nos últimos dias e Robin realmente não queria se ver obrigada a fazê-la se juntar ao resto da tripulação em coma.

“Os dados realmente não são precisos, mas podemos levantar a hipótese de que essa transição dessa forma de vida entre energia e matéria, está consumindo a energia da nossa nave. O mais lógico seria buscar formas de afastá-la de nosso casco, uma vez que não podemos determinar quais são suas intenções.” Declarou o capitão.

“Mas como faríamos isso se não temos nenhum sistema de defesa?” Questionou a oficial de Ciências.

“Podemos pedir para a engenharia desviar parte da energia do suporte de vida e modelar nossos escudos para gerar um pulso de repulsão que possa afastar essa criatura da nossa nave.”

“Isso soa como um grande trabalho para uma nave semimorta.” Murmurou Robin.

“Nossas chances de sucesso são de 75% o que em nossa presente situação torna a tentativa válida.” Respondeu o capitão.

“Eu não sei se gosto da ideia de nos encurralar ainda mais.” Disse a médica em tom preocupado. “Vamos ter que tirar o suporte de vida de um deque inteiro para uma tentativa dessas.”

“Ainda assim, as chances estão ao nosso favor, vamos fazer isso.”

“Sim, Capitão. Irei estabelecer um canal com a engenharia agora mesmo.” Disse T’Sai, a Oficial de Comunicações.

Assim que ela tocou em seu console, todas as luzes voltaram e a nave recuperou sua energia para segundos depois se apagar novamente. Isso surpreendeu a todos.

“Capitão, veja isso!” Exclamou T’Sai.

A estação da oficial estava plenamente funcional e inúmeros dados passavam pela tela do computador. Todos pareciam completamente perdidos exceto ela que olhava para aquelas informações aleatória com o olhar de um navegador perdido que finalmente avistou terra firme. Antes que Sevel ou qualquer outro pudesse questionar, ela se virou com ar triunfante.

“Senhor, acho que estamos sendo saudados.”

 


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Notas finais do capítulo

Eita! Alguém entrou em contato! Será que veremos um desfecho desse mistério? Deixem seus gritos nos comentários, eles podem fazer meus dedos digitarem mais rápido.



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