Final Destination - Desastre em O'Reoy escrita por FrancaLuke


Capítulo 12
Trapaças




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Jessica deslizou os dedos pelos cabelos louros, jogando-os para trás, e desceu a escada da própria casa, vestida com moletons cinzentos. Tentava fazer o mínimo possível de ruídos, para não acordar a mãe... No entanto, enquanto descia os últimos degraus, percebeu que a mulher estava acordada na sala, assistindo com um ar sonolento a um programa de TV sobre celebridades.

  Tentou passar despercebida, na ponta dos pés, mas foi flagrada pela mãe, que, de repente, assumiu um ar alerta.

  - Jessica?

  - Estou saindo com o Phil, mãe – anunciou Jessica, o que não era mentira.

  - Mas... – a mulher olhou para o relógio no pulso. – A essa hora? Está um pouco tarde, querida...

  Jessica suspirou.

  - É muito importante, mãe.

  Evelyn Holden fitou-a com um ar desconfiado, inclinando a cabeça.

  - Estou muito preocupada com você, querida – confessou ela. – Desde a morte de Claire, você tem agido de forma estranha... Quero dizer, ela era sua melhor amiga, e eu entendo sua tristeza. Mas, eu quero que saiba que pode confiar em mim. Sempre pôde – Jessica engoliu em seco, sentindo que um choro de remorso ameaçava vir à tona. – Está acontecendo alguma coisa que eu deva saber?

  Jessica crispou os lábios, tendo de piscar para que os olhos não marejassem. Sim. Estamos sendo caçados pela Morte, e mais um de meus amigos acaba de morrer...

  - Não – disse a moça, por fim.

  - Tem certeza?

  - Sim, mãe – Jessica suspirou mais uma vez, desviando os olhos. – Eu estou bem... Só um pouco abalada, mas isso vai passar. Acho que o Phil tá me esperando lá fora, então, eu posso ir?

  Evelyn fitou-a em silêncio por um momento, as feições enrugadas evidentemente incrédulas.

  - Claro – disse ela, assentindo. – Se cuide, tá bom? E leve sua chave... Estou indo pra cama.

  Jessica apressou-se em sair, antes que a mãe a fizesse chorar, com aquelas palavras e atitudes cuidadosas de mãe. Como já sabia, Phil a estava aguardando de frente a casa. O rapaz parecia muito apreensivo, quando ela sentou-se ao seu lado, no banco do carona, e trocaram um beijo rápido e seco.

  - Sua mãe acordou? – perguntou o rapaz.

  - Ela já estava acordada...

  - Disse a ela?

  - Não – Jessica meneou a cabeça, angustiada. – E não vou contar... Ela ficaria histérica. E, além do mais, não saberia o que dizer... Você já contou aos seus pais?

  Phil também balançou a cabeça negativamente, enquanto dava partida no carro.

  O rapaz permaneceu em silêncio, enquanto dirigia pelas ruas desertas de McKinley, em direção à casa de Liu. Ainda não acreditava que Patrick Jackson havia morrido. Na verdade, ainda não acreditava no que estava acontecendo. Todas aquelas mortes, os sinais, e o que William Bludworth disse – apesar de todas as provas e fatos, era difícil aceitar.

  - Conseguiu falar com Brenda? – perguntou Phil.

  - Ela não atende... – Jessica pegou o celular, e discou mais uma vez. – Mas eu liguei para a casa dela, e a irmã mais velha disse que Brenda está em um encontro. Espero que esteja bem...

Brenda Grigori cambaleava pela escura estrada de terra em direção em que acreditava ficar a rodovia. Seus pés estavam descalços, já que decidira que, sem os saltos, avançaria mais rapidamente. E, mesmo assim, não conseguia correr... As pedras e torrões de terra machucavam seus pés e, além disso, ainda estava em estado de choque devido à terrível experiência pela qual passara.

  Matara um homem. Matara Christian Jenoix.

  A imagem do corpo de Christian no chão da garagem lampejava diante de seus olhos marejados a todo momento, lembrando-a de que era uma assassina. Era uma assassina fugitiva.

  Brenda não teve coragem de pegar o celular de Christian e ligar para a polícia. O que diria? Pediria ajuda? Diria que matou um homem? E, além do mais, sequer sabia onde estava. Não saberia dizer o endereço nem a localização... E, mesmo que a polícia rastreasse a ligação, teve medo de ser presa. Presa em flagrante. Se ligasse para a polícia, poderiam trancá-la em uma cela imunda com outras mulheres terríveis... Não. Brenda preferiu não correr o risco. Tentaria encontrar a rodovia, pediria ajuda para voltar pra casa, e seus pais contratariam um bom advogado, que pudesse instruí-la sobre o que fazer.

  Todavia, a estrada de terra parecia interminável. E cada segundo naquela escuridão, sem saber o que fazer ou para onde ir, a deixava ainda mais nervosa. De quando em quando, olhava para trás, temendo qualquer coisa que pudesse surpreendê-la naquele breu. Só queria chegar o mais rápido possível na rodovia e encontrar alguém que pudesse levá-la para casa...

x-x-x-x-x

Liu Wong tamborilava os dedos na escrivaninha, os olhos correndo pela tela do computador, quando recebeu o torpedo de Jessica. “Estamos aqui”.

  O rapaz suspirou de alívio e pausou o vídeo que assistia. Brenda Grigori congelou na tela com uma expressão tipicamente esnobe. Liu fitou-a por um momento, antes de descer para abrir a porta. Não que tivesse notado alguma pista ou algo alarmante... Apenas foi arroubado por um sentimento estranho.

  Desde quando você gosta de mim?, perguntara à Claire, na noite em que foi morta.

  Tem muito tempo... Mas você só tem olhos para a Grigori, e por isso não percebeu.

  Já não achava mais Brenda Grigori tão fantástica agora.

  - Onde está Brenda? – perguntou Liu, com um gelo no coração, ao abrir a porta e deparar-se apenas com Jessica e Phil.

  - Não conseguimos falar com ela – lamentou Jessica, trocando um olhar furtivo com o namorado. – Parece que está em um encontro.

  - Onde?

  - Não sabemos, Liu – Jessica baixou os olhos.

  Liu Wong assentiu lentamente, o gelo no peito se intensificando ainda mais. Sabia o que aquilo podia significar... Brenda também estava morta. Ele seria o próximo.

  - Então, somos só nós – sussurrou ele, afastando-se um pouco para que os amigos entrassem. – Precisam ver uma coisa.

  O rapaz conduziu Jessica e Phil até o seu quarto, tendo cuidado para não acordar os pais.

  - Estava vendo os vídeos que gravei da turma, para montar o vídeo de formatura, e percebi... sinais — Liu sentou-se diante da escrivaninha. – Quero dizer, parecem sinais, de como Claire e os outros morreram.

  - Nos vídeos?

  - É – Liu assentiu. – Lembra do vídeo que passei na homenagem às vítimas do desastre em O’Reoy? Lembra que eu falei que seria reproduzido no dia da formatura? Pois é. É uma compilação de vídeos gravados durante a última semana de aula. Todos os alunos da turma aparecem nele... E hoje eu estava assistindo a alguns, e percebi coincidências... – Liu clicou no vídeo em que Claire aparecia. – Veja só... Ao fundo, há três bandeiras...

  Jessica observou, por um momento, sem entender. Então, lembrou-se da imagem da amiga empalada pelas hastes das três bandeiras no saguão da própria casa.

  - Claire morreu empalada por três bandeiras – murmurou Jessica num fio de voz.

  Liu assentiu.

  - E tem um do professor Shawn, dizendo que o deixaríamos “em cacos” e que teria uma recaída, quando formos para a faculdade – Liu clicou no vídeo do professor. – Eu pesquisei, e descobri que ele morreu após pisar em cacos de vidro e incendiar acidentalmente o próprio corpo, que estava impregnado de uísque. Não pode ser apenas coincidência...

  - Isso parece meio forçado, cara – comentou Phil, sem deixar-se convencer.

  - Eu sei, eu sei – Liu estava frenético, e parecia tremer um pouco. – Mas, tem mais... Olha esse aqui – o rapaz clicou no vídeo de Tyler e Patrick. Jessica e Phil assistiram atentamente. – Ali... Queda Livre, na TV. Aquela garota suicida mataria Tyler, se Patrick não estivesse por perto. E... olha só onde eles estão!

  - Craig’s Burgers – sussurrou Phil, chocado.

  - Exatamente.

  - Foi onde o Patrick morreu – Jessica engoliu em seco, compreendendo o que Liu vinha tentando dizer. Aquilo não podia ser apenas coincidência. Eram mesmos sinais.

  - Eu apareço em, pelo menos, três vídeos – contou Liu, apreensivo. – O último vídeo que gravei foi o de vocês, antes do acidente do caminhão na cafeteria...

  - Ah, meu Deus – começou Phil. – Isso é loucura...

  - Você viu os vídeos – retrucou o rapaz asiático. – Viu os sinais...

  - Eu sei, mas... ainda assim – Phil suspirou, desviando os olhos para Jessica, que o observava com uma expressão estranha. – É difícil acreditar em tudo o que está acontecendo... Nem mesmo caiu a ficha de que Patrick foi esmagado pelo letreiro da Craig’s Burgers, e agora isso!

  Jessica continuou observando o namorado, percebendo o quanto ele parecia mal. Aquilo não era comum, porque Phil não gostava de demonstrar fraqueza... Mas, ali, naquele momento, ele parecia apenas mais um adolescente assustado. E, na verdade, era o que ele era.

  Dessa vez, foi Jessica quem afagou sua mão.

  - Patrick salvou Tyler, e a Morte pulou para o professor Shawn – disse ela, tentando manter a voz reconfortante. – E, agora que temos os vídeos com os sinais, será mais fácil prever como ela virá. A gente pode se salvar...

  Phil pareceu ligeiramente sem graça. Engoliu em seco.

  - O agente funerário disse que a Morte viria, mesmo se nos salvarmos agora.

  - É claro que ela virá – Jessica ainda tentava manter o tom reconfortante. – Ele disse que ela viria para ele também. Ninguém é imortal... Pelo menos, achando um meio de nos salvar, teremos mais tempo de vida. Podemos até ter um bom futuro, Phil. Veja o Bludworth... está vivo há quanto tempo, desde que teve a visão? Pela lógica, por mais de dez anos, já que Jude Clayton e Sam Lawton vieram depois, em 1997 e 2000.

  - É por isso que chamei vocês – disse Liu, ainda parecendo muito nervoso. – Achei que quisessem dar uma olhada no vídeo em que aparecem...

Não muito longe de onde Brenda estava, alguns carros disparavam pela rodovia em alta velocidade. Ela podia ouvir o som dos motores e ver as luzes de seus faróis.

  A moça ofegava, sentindo algo como alívio dentro de si. Ignorando a dor nos pés e o corpo dolorido, Brenda Grigori avançou mais depressa em direção à rodovia. À sua salvação.

x-x-x-x-x

  - Digam oi!

  - Liu!

  - Ora, vamos, Jess!— exclamava Liu, no vídeo. – Só faltam vocês! É para o vídeo da turma. Recordação!

  - Outra hora, então— rebatera Jessica, que escondia o rosto. – Aí eu me arrumo direitinho e até me maquio. Mas agora não...

  No vídeo, estavam dentro do ônibus, indo para o aeroporto. Alguns alunos baderneiros faziam um coro do grito de guerra da escola, ao fundo, e era possível entrever Claire e um garoto, no banco de trás do que estavam sentados. Nada alarmante...

  - Amor... Só olhe para a câmera e sorria!

  Liu virou a câmera para o rapaz.

  - É isso aí, Phil!

  No vídeo, Phil sorriu, acenando com uma das mãos pateticamente. Jessica riu daquilo, afastando a mão do rosto. Liu voltou-se para ela mais uma vez. No banco de trás, o garoto levantou-se, ajeitando os óculos.

  - Não vai te doer nada— dizia Liu. – Vai ser bem rapidinho.

  Estranho.

  - Tudo bem.

  - Então, Jessica... Como é namorar o astro do time de futebol da escola? Depois de mim, é claro...

  - Me desculpem, menininhas, mas ele já é meu— dissera a moça, olhando para a câmera. – E não o divido com ninguém... E, respondendo a sua pergunta, Liu, ele é ainda melhor no amor do que no campo... Em um bom sentido!

  Assistindo a si mesma dizendo aquelas coisas, tão feliz, Jessica sentia-se uma estranha. Há muito tempo não fazia brincadeiras com ninguém... Há muito tempo não ria de verdade. Sequer sorria...

  - Hmm, sei... Jessica Holden se revelando!

  - Para, Liu! Eu não quis dizer isso!

  - Entendo perfeitamente o que quis dizer, Srta. Holden!

  Neste momento, Phil beijava o rosto da namorada, divertido. O garoto de óculos voltou a sentar-se no banco de trás. Era o garoto Wilson, que Jessica não lembrava o nome. Mais no fundo, Paul Jackson agitava os braços loucamente, com o resto do pessoal do time. Não parecia ser um sinal, mas e se fosse, o que seria? Afogamento?

  - Minha Jess!

  - Que lindo— dizia Liu, numa vozinha esganiçada. – E você, Phil? Pronto para tirar o fôlego da torcida, no jogo contra Springfield?

  - Sempre! Você sabe... Eu sou o...

  Então, ouvia-se o ruído dos pneus do ônibus freando bruscamente, e a imagem ficava confusa num borrão de cores, porque Liu caíra no corredor do ônibus, com o solavanco da freada. Podiam-se ouvir também algumas exclamações de surpresa. Mas era só.

  - É isso – disse Liu, quando o vídeo terminou. – Perceberam alguma coisa?

  Jessica meneou a cabeça, indecisa.

  - Eu não sei... – ela deu de ombros. – No momento em que você diz “vai ser bem rapidinho, não vai doer nada”, talvez... Foi estranho.

  Liu deu um sorriso amargo.

  - Se esse for o sinal, então vocês deram sorte – disse.

  - “Tirar o fôlego” – sugeriu Phil, com uma expressão pensativa. – Talvez eu morra sufocado ou asfixiado. Você se dirigiu mim, quando disse isso. Acho que é um sinal...

  Jessica olhou para o namorado, surpresa.

  - Qualquer coisa pode ser um sinal – interveio Liu. – O grito de guerra da escola, os óculos de Chris Wilson, o ônibus, em si... ou até mesmo o comentário de Jessica sobre maquiagens.

  Jessica bufou, revirando os olhos.

  - Talvez eu morra devido a uma séria alergia à base – disse ela, com um pouco de sarcasmo.

  - Estou falando sério – retorquiu Liu. – Eu já vi todos os vídeos em que apareço, e não consegui encontrar nenhuma semelhança entre eles, então... Pode ser qualquer coisa. Eu estou com muito medo... Ainda mais agora, que Brenda não dá sinal de vida.

  Jessica mordeu o lábio inferior, trocando um olhar apreensivo com o namorado.

  - Você tem um vídeo dela também? – perguntou.

  Liu assentiu.

  - Eu estava assistindo, quando vocês chegaram. Já que, segundo você, ela é a próxima.

  - Não há nada que possa ser ligado a um encontro, há?

x-x-x-x-x

Quando Brenda Grigori finalmente alcançou a rodovia, estava aos prantos novamente. Não sabia se era de alívio ou outra coisa. Simplesmente não conseguiu conter as lágrimas e o choro histérico. Seu coração parecia um tropel de cavalos, saltando em seu peito... Precisava de uma carona.

  - Alguém...! – berrou ela, acenando loucamente no acostamento para os carros que rumavam para a cidade de McKinley. – Por favor, alguém me ajuda!

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O que você quer, Liu?

  - É só um vídeo da turma para a formatura.

  Na tela do computador, Brenda suspirou, jogando os cabelos negros para trás. Estava sentada em sua carteira, com seu bando de amigas bobas e risonhas. Todas elas morreram em O’Reoy. 

  - Tá, e o que eu preciso fazer?

  - Bem, eu posso fazer umas perguntas... e você responde. Se quiser, é claro.

  As amigas de Brenda riram. A garota olhou para elas, numa expressão de puro veneno, e, por fim, assentiu.

  - Tudo bem...

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Os carros passavam a toda velocidade pela rodovia, ignorando os gritos e os acenos de Brenda. E isso só a deixava ainda mais desesperada, embora não os culpasse.

  Seus cabelos estavam desgrenhados, sua maquiagem escorria pelo rosto, com as lágrimas, e tinha os pés descalços. E, ainda por cima, gritava por ajuda, como em um daqueles filmes de terror ridículos em que tem o fantasma de uma moça na estrada...

  Lembrava-se de que, quando viajava com a família, ficava apavorada com as pessoas que surgiam na estrada, pedindo carona, e fazia o pai prometer de que nunca daria carona a ninguém.

  E, agora, lá estava ela... precisando de uma carona.

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O que pretende fazer, quando formarmos?— perguntava a voz de Liu, no vídeo.

  - Vou ser modelo. Provavelmente em Paris... Conheci uma pessoa muito influente, que pode me ajudar.

  - Bom, você faz o mesmo o tipo top model— comentou Liu.

  - Ahn — as amigas de Brenda riram de novo. – Obrigada.

  Liu pigarreou.

  - E... quais são as melhores lembranças que vai guardar do colegial?

  - Quando eu estiver em Paris, querido, desfilando para a Lumière, eu não vou querer nem me lembrar dessa escola. Minha vida vai ser puro glamour. Não terei tempo para ficar remoendo as desgraças do colegial... A única coisa boa foi ter visto o pacote de Tyler Cassey. Nada mais.

  - Quer que eu coloque essa parte na edição final, ou...?— começou Liu, sem graça.

  - Não, com certeza não — Brenda riu, trocando olhares com as amigas. – Vou parecer muito vulgar... E Brenda Grigori não é vulgar. Tem classe.

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— Por favor, me ajudem...! – Brenda já estava perdendo a voz, e as esperanças. Dezenas de carros passaram por ela, e sequer diminuíram a velocidade para ver do que se tratava.

  Trêmula, Brenda parou de acenar, e começou a avançar, cabisbaixa, pelo acostamento. Voltaria para a cidade, nem que fosse a pé.

  Nesse momento, um carro branco, com vidros escuros e impenetráveis, aproximou no acostamento lentamente, parando ao lado da garota. A porta de trás abriu, com um estalo.

  - Quer uma carona, moça? – perguntou uma voz.

  Brenda hesitou um pouco, aproximando-se para enxergar melhor as pessoas dentro daquele carro. Não conseguiu ver o motorista. Apenas um casal no banco de trás.

  - Entra aí – disse o homem.

  Brenda assentiu, fungando um pouco, e entrou no automóvel, sentindo um forte cheiro de bebida e cigarro. O motorista arrancou.

x-x-x-x-x

Você é vulgar, amiga— dizia Britany Gilbert, com uma voz manhosa. – Só não quer que as outras pessoas saibam...

  - Cale a boca, Britty. Eu não sou vulgar... Eu só... perco a cabeça quando penso em Tyler Cassey. Só isso... E, por que você ainda está filmando?! Já não está bom? Eu tenho mais o que fazer...

  - Ok, ok...

  E o vídeo acabava.

  Jessica engoliu em seco.

  - Acho que é óbvio – disse ela, sentindo a conhecida sensação de angústia e impotência. – Assim que ela disse, eu... eu percebi.

  - Perder a cabeça? – sugeriu Phil, sério, olhando de Jessica a Liu. – É isso?

  Jessica baixou os olhos, em silêncio. Era isso. Parecia loucura e forçado, mas sentia que isso era mesmo um sinal... Mas, o que poderia fazer? Brenda não atendia. Estava em um encontro. E os pais não sabiam onde... Talvez, àquela altura, já estivesse morta. Tudo estava acontecendo tão rápido...

  - A gente precisa encontrá-la – disse Liu, com um nó na garganta.

  Jessica e Phil se entreolharam, sem dizer nada. Jessica sabia, pelo ar sério e apreensivo do namorado, que partilhavam da mesma ideia. Era tarde demais... Mais uma vez.

x-x-x-x-x

Brenda encolheu-se no banco de trás do carro, chorando em silêncio, enquanto seus olhos úmidos esquadrinhavam os estranhos que a observavam curiosamente.

  - Você está bem? – perguntou a mulher do banco de trás, inclinando-se um pouco. Sua voz soou arrastada, e seu hálito tinha um cheiro forte de bebida e cigarro.

  - Eu fui atacada... – choramingou Brenda. – Tentaram me violentar...

  - Ah, meu Deus! – exclamou a mulher, num tom afetado. – E como foi isso?

  - Foi bom? – quis saber o homem branco, de cabelos espetados, ao lado da mulher.

  - Não— Brenda estranhou a pergunta, engolindo em seco. Enxugou mais algumas lágrimas e fitou os olhos do motorista, pelo retrovisor. Era um homem careca e muito magro, usando anéis estranhos. – Foi... horrível.

  - Imagino – retorquiu a mulher, acendendo um cigarro. – Ele bateu em você também?

  Brenda assentiu.

  - Eu gosto que batam em mim – disse a estranha.

  - Você é uma puta – disse o homem que estava no banco do carona.

  - E você também, otário.

  - Eu, pelo menos, não deixo me baterem...

  - Não sabe o que tá perdendo – a mulher sorriu, desviando os olhos para Brenda, que, no momento, se perguntava se devia mesmo ter entrado ali. Aquelas pessoas eram tão estranhas... – Você fuma?

  - Não.

  - Parece ser muito rica – comentou o de cabelos espetados. – Roubaram seu dinheiro?

  Brenda hesitou um pouco, antes de assentir. Segurou com força a bolsinha que carregava, engolindo em seco. Aquilo só podia ser um pesadelo...

  - Vocês estão indo para a cidade? – perguntou ela, tentando manter a voz firme.

  - Não – o motorista disse.

  Brenda sentiu as entranhas congelarem.

  - Ah... é que eu preciso chegar em casa, então... Podem parar, quando chegarmos perto da cidade, por favor?

  - Não – cortou o motorista.

  A mulher do banco de trás abafou uma risadinha.

  Brenda engoliu em seco, o pavor começando a pulsar mais uma vez por suas veias. Os quatro estranhos a observavam, com os olhos sarcásticos e vidrados.

  Calma, não vai acontecer de novo. De novo não...

  - Podem parar o carro, por favor? – pediu Brenda, a voz falhando porque começara a chorar mais uma vez.

  - Não até chegarmos.

  - Onde?

  - Onde vamos terminar o que o cara que te atacou não terminou – disse o motorista, virando-se para olhá-la, com um sorriso afetado.

  Brenda correu os olhos pelos quatro estranhos, apavorada. Não podia estar acontecendo aquilo... Achatou-se contra o banco do carro, tentando se afastar daquelas pessoas, e começou a abrir a janela do carro.

  - Socorro...!

  - Cale a boca, vadia! – exclamou o homem de cabelo espetado, apressando-se em tapar sua boca.

  - Não, não!— Brenda tentou desvencilhar-se das mãos do homem, com uma mordida. Ele gemeu, enquanto o motorista dava ordens para mantê-la calada e quieta.

  - Socorro...!— gritava Brenda, pela brecha aberta da janela do carro. Lá fora, na rodovia, carros passavam por eles zumbindo.

  O homem de cabelo espetado e a mulher tentavam agarrá-la, mas a moça se debatia e chutava loucamente, desferindo golpes desesperados. Puxaram seu cabelo, e ela gritou de dor. Sem pensar duas vezes, golpeou o homem no rosto, com o salto pontiagudo de seu sapato. Continuou a golpeá-lo nas mãos e no peito, até ele soltá-la.

  - Maldita...!

  Brenda atirou um dos sapatos na mulher e, no momento de pavor, encolheu-se contra a porta, procurando pela maçaneta. Aquele carro era menos moderno que o de Christian Jenoix. A porta logo se escancarou, fazendo com que ela caísse, com o automóvel ainda em movimento.

  Gritando, Brenda chocou-se com força contra o asfalto áspero da rodovia. Rolou algumas vezes, sentindo a pele queimar.

  Desnorteada pela dor, Brenda ouviu uma profusão sons, e sua visão foi ofuscada por uma forte luz. No momento seguinte, uma picape marrom e antiga freava bem em cima de seu pescoço, numa tentativa desesperada de parar.

  Não parou. E o efeito da freada foi cruel.

  A carne do pescoço de Brenda Grigori foi reduzida a uma espessa massa vermelha e úmida, pregada no asfalto da rodovia, o sangue respingando pra todo lado. E sua cabeça, desprendida do corpo, rolou pela rodovia, o sangue escuro brilhando à luz dos faróis dos carros que começavam a parar, um a um, para ver o que havia acontecido.

x-x-x-x-x

Não muito longe dali, um homem alto e forte, vestindo roupas sociais, fitava o cadáver de Christian Jenoix. Estava nervoso. E, também, um pouco satisfeito. Pelo visto, alguém chegara primeiro... E fizera o que ele fora até ali para fazer. Matar aquele maldito pilantra.

  O homem de social chamava-se Ben Miles. Era pai de Melanie Miles, uma das muitas garotas que Christian Jenoix enganou e aliciou, antes de sumir com elas na França. Há três anos Ben não via a filha... Apenas recebeu uma carta dela, dizendo as coisas horríveis que passara e estava passando, nas mãos daquele homem.

  Melanie pedira ao pai que o matasse.

  E, assim que soube que Christian Jenoix estava na cidade, Ben pegou sua pistola, vestiu-se da melhor maneira possível, e foi ao lugar em que a filha dissera que podia encontrá-lo. E lá estava ele...

  Ben estava satisfeito por não ter de sujar o nome matando alguém, embora quisesse mesmo fazer aquilo. Se sentiria melhor, já que, provavelmente, nunca mais veria a filha.

  De qualquer forma, já estava feito.  

  Escarrando antes, o homem cuspiu no cadáver de Christian Jenoix e deu-lhe as costas, sentindo o peso da pistola no bolso do paletó.


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