Por sua causa escrita por Elie


Capítulo 31
Marcela




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— O que houve? — Dário estranhou o tempo que sua esposa passou no banheiro.

— Tem algo estranho. Sinto algumas cólicas — a voz de Amélia estava trêmula.

— Melhor irmos ao hospital.

Após correr para pegar as chaves do carro, Dário auxiliou Amélia no caminho até a garagem. Ele está aflito e isso pode ser visto pelas vezes em que enxuga as gotas de suor em sua testa. Amélia, conhecendo seu marido tão bem, percebeu isso e ficou ainda mais preocupada. Três dias antes ela foi visitar a lápide de Marcelo, seu aluno que tinha se suicidado, e isso abalou seu emocional. Amélia não conseguia entender como uma pessoa tão jovem desistiria assim da própria vida.

— Deve ser só um susto, querido. Sinto que Marcela está bem, acho que estou sentindo seus movimentos agora mesmo — ela dá um sorriso que não o convence.

— Melhor pecar pelo excesso — ele responde.

Dário esperava aquele filho há muito tempo. Chegou até a achar que Amélia nunca quereria ser mãe, mas ele a amava demais e continuaria ao lado dela do mesmo jeito. Entretanto, quando chegava agosto ele sentia uma profunda inveja de seus amigos que comemoravam o dia dos pais com seus filhos.

Quando chegaram ao hospital, uma enfermeira simpática os atendeu atenciosamente. Ela perguntou quando Amélia começou a sentir as dores, se ela notou algum corrimento ou perda de líquidos, se tinha alguma alergia e outras perguntas de rotina. A médica chegou uns vinte minutos depois disso e explicou que precisaria fazer um toque para checar se estava tudo bem. Amélia já tinha ouvido falar que o toque obstétrico era desconfortável e ficou visivelmente angustiada com a notícia.

Os batimentos de Amélia ficaram cada vez mais acelerados enquanto ela via a médica calçar as luvas. Os boatos eram verdadeiros e cada segundo daquele exame era incômodo. Não demorou muito para a preocupação ficar estampada no rosto da médica. Depois disso, a mulher buscou um aparelho para auscultar os batimentos do bebê, mas após longos cinco minutos, não foi possível encontrar o foco dos batimentos cardíacos fetais. Dário e Amélia já estavam assombrados.

— Seu colo está aberto e não achei o coração do bebê. Precisaremos de um ultrassom — a médica explica sem dar muitos detalhes.

— Está tudo bem, doutora? — Dário se apavora ao notar um rastro de sangue na luva que a médica jogou no lixo.

— Veremos.

O casal não trocou mais nenhuma palavra depois daquele momento. Estavam ocupados demais pensando em todas as terríveis possibilidades que poderiam ter acontecido. Amélia fazia algumas preces de olhos fechados, rezando para que Marcela estivesse bem. Quando o gel para ultrassom foi colocado sobre seu abdome, o frio aumentou. Cada movimento que o aparelho captava era um sinal de esperança, mas a médica não trazia uma expressão feliz, pelo contrário, olhava exaustivamente para a tela onde procurava sinais do bebê.

— Sinto muito. A senhora teve um abortamento incompleto. Ainda há restos do feto, mas não há sinal de vida — foi o veredito da profissional.

— O quê? — Amélia tentou gritar, mas já não tinha voz. Começou a chorar desesperadamente e não conseguia prestar atenção em mais nada.

— O que faremos agora? — Dário pergunta.

— Agora tentaremos amolecer o colo para expelir o resto. Caso não consigamos, faremos uma curetagem.

— Doutora, tive uma tristeza muito grande nesses últimos dias. Será que foi por causa disso? — Amélia não parava de chorar. Ela estava se culpando por tudo.

— Pode ter contribuído, mas existem muitos outros fatores… — a mulher olhava para o celular ao mesmo tempo em que falava.

A médica tentou proferir algumas palavras de apoio, mas ela parecia bastante ocupada e teve que correr para uma emergência em outra sala. Ambos ficaram ali, abraçados e desolados. Amélia sentiu como se tudo na sua vida estivesse desmoronando. “Será que eu mereço passar por isso?”, ela se perguntou várias vezes. Chorou tanto que ficou sem voz e com o rosto todo inchado por muitas horas. Era como se tivessem arrancado uma parte dela.

Depois daquele dia, Amélia concluiu que se dedicaria integralmente aos seus alunos. Passaria o resto de sua vida tentando ajudar os sobreviventes. Não sabia se seria capaz de passar por uma gestação novamente.

 

 

Dezembro, 5

Marcela, tenho a pior das notícias para te dar. Infelizmente não nos encontraremos nesta vida. Foi um prazer te conhecer por essa fração tão pequena de tempo, mas meu amor por você é infinitamente grande. Sei que você já sabe disso, mas repetirei até o dia em que eu for embora. Sou incapaz de entender mistérios e injustiças desta vida, mas confio que tudo tem um propósito. Não importa o que me digam, serei sempre sua mãe. Com todo amor existente no mundo, Amélia.

 

 


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