Alguns alunos já apresentaram suas obras. Rafaela mostrou para todos o belo portfólio que fez junto com seus amigos. Maia e Tiago cantaram juntos uma música pop sobre amizade que estava fazendo sucesso na novela das oito. Flávio mostrou uma foto de Rafaela para uma campanha de roupas e falou algumas palavras decoradas sobre empoderamento feminino que não convenceram ninguém. Certamente não é suficiente para salvar sua nota e há uma grande possibilidade de que ele repita o ano.

— Tainá, sua vez – a professora fala.

Segurando um pequeno quadro do tamanho de uma folha de papel sulfite comum numa bonita moldura de cobre detalhada, Tainá se levanta, deixando claro com seu sorriso que que está animada com a apresentação.

— Oi, gente. Como sabem, meu trabalho é sobre a Cecília. Sim, essa garota que todos conhecem como "aquela das tatuagens" ou "aquela que se veste de rockeira".

Inevitavelmente, todos olham para Cecília, que se encolhe um pouco devido a atenção inesperada. Ela está nervosa desde quando soube que Tainá se apresentaria, mas saber que em pouco tempo não verá mais aquelas pessoas diariamente a confortou um pouco.

— Mas para falar sobre a Cecília terei que falar um pouco sobre mim. Alguns de vocês já sabem, mas tem uma parte triste da minha história. Eu tinh... Tenho uma irmã mais nova chamada Tereza que morreu há um tempo atrás. Ela teve leucemia. Enfim, não vem ao caso, mas esse é o tipo de coisa que não dá para superar.

A professora Amélia não esperava que a aluna falasse sobre isso, o que a faz ficar um pouco nervosa. O vídeo de Felipe mexeu muito com ela e suas emoções estão quase transbordando.

— Minha irmã era cheia de vida. Não é fácil perder alguém desse jeito. Num dia você está feliz e no outro parece que sua vida foi destruída. Os dias tristes até ficam menos tristes quando você compara com o dia em que perdeu alguém que ama.

A animação de Tainá foi diminuindo um pouco nesse momento, mas ela se esforça o máximo que pode para sorrir. Ela quer que seja uma ocasião feliz, mas precisa contar sua história.

— Hoje posso dizer que estou bem por causa da minha família, meus amigos e, principalmente, pela força que Deus me deu. Só que, honestamente, não estou bem todos os dias. Tem dias que eu simplesmente passo na rua e lembro de alguma piada que minha irmã faria naquele exato momento e, gente, isso é brutal. 

Todos na sala  de aula param para prestar atenção e as conversas paralelas somem. Elisa pensou que já estivesse imune a qualquer sentimentalismo depois de assistir à apresentação de Felipe, mas está ainda mais emocionada enquanto ouve sua amiga falar.

— Pronto, é isso que tenho que falar sobre mim. Agora falarei sobre Ceci Monteiro. Para quem não sabe, é assim que ela está assinando as artes dela.  

— Uhul! – Flávio agita.

— Ceci é isso tudo que vocês vêem. Ela é transparente. Nunca vai mentir para te agradar. E se quiser a opinião dela sobre uma roupa, prepare-se para a resposta mais honesta possível. Ceci é extremamente cética também. Ela precisa checar as coisas com os próprios olhos para acreditar. Ceci ama suas tatuagens e seus desenhos. É uma artista plástica incrível. Adora se vestir de preto porque mostra sua personalidade forte. E, acreditem – Tainá dá uma risada tímida –, ela não poupa esforços para lutar pelo que defende.

Meio envergonhada por sua atitude na festa de aniversário de Vera, Bruna sabe que é uma indireta para ela. Teve que usar muita maquiagem por causa do olho roxo.

— Agora eu quero que vocês vejam esse quadro que eu trouxe. É um canguru triste porque está com o marsúpio vazio. Para quem não sabe, o marsúpio é a bolsa em que alguns mamíferos, como cangurus e coalas, mantém seus filhotinhos para que se desenvolvam. Ceci me desenhou nesse canguru. Ela sabe que faço de tudo para proteger os que amo porque tenho medo de perder mais alguém.

— Own – algumas pessoas dizem em coro.

Antes de ouvir aquilo, Cecília achou que seria um vexame, mas ela está sentindo uma sensação muito boa. Não está ligando para pessoas que a achem piegas, nem quer saber o que alguém acha de suas habilidades artísticas. Ela não está se importando com seus amigos fazendo piadas estúpidas sobre sua amizade com a garota mais certinha da sala. Ceci está feliz e ponto final.

— Isso mostra o quanto Cecília presta atenção nas pessoas e que, por mais que ela diga que não está nem aí, ela seria capaz de fazer qualquer coisa por seus amigos. Prestar atenção é uma habilidade que está ficando rara – Tainá continua.

Se havia uma pessoa na sala que sabia disso, essa pessoa era Maia. A amizade com Cecília era o que a fizera não mudar de colégio, se não fosse isso seria mais solitária do que já era. 

Felipe também assinaria embaixo de tudo que Tainá está falando. O outro quadro que Cecília pintou já deve está pendurado numa parede no Canadá. Ele lembrou de como Ceci nem pensou duas vezes para ajudá-lo.

— Só que tem um porém. Ceci é isso tudo que deixa transparecer, mas há uma parte dela que tenta esconder. Ela não gosta muito de quando as pessoas a conhecem melhor, pois se sente exposta. Acho que é uma besteira porque todo mundo que a conhece bem gosta do que descobre. Ceci é sensibilidade em pessoa. Para alguém que gosta tanto de preto, ela é luz. Para alguém que adora parecer séria, ela é bem engraçadinha. Para alguém que se diz tão cética, ela acredita muito nas pessoas.

Ao dizer isso, Tainá tira um pequeno canguru de origami do bolso.

— Meu coração está quentinho – Vera comenta baixinho para Janaína.

— Quem diria... – Renan diz.

— É, gente. Por isso que tive que falar um pouco sobre mim, para vocês terem noção da sorte que tive em conhecer a história de alguém como ela – Tainá conclui.

Todos aplaudem. A professora está muito emocionada. Aquele discurso a fez lembrar do dia mais triste de sua vida. Amélia assoa o nariz e finge um espirro para poder dizer que está com o rosto vermelho de alergia. 

Após terminar seu discurso, Tainá vai até Cecília para abraçá-la, sendo recebida com estranheza no início, mas bastam poucos segundos para que Cecília se sinta grata.