Os Jogos de Johanna Mason escrita por Nina


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

Oi gente! Hoje, contrariando todas as expectativas, estou postando um capítulo extra depois de outro postado NO DIA CERTO! Agradecam a pessoa maravilhosa chamada Athena Olympus, com um comentario que me fez chorar ( to tendo uns dias muito merda ;-; ) e me sentir uma pessoa importante ( huahsuahsa nao Nina, voce é uma ameba na sociedade - essa aqui é minha mente falando com voces - - eu concordo com ela - ) Bom, vi que varios de voces queriam um capitulo fofinho e legal com o Blight, e ele acontecera la pra frente, ok? E eu ia falar mais mas dai seria spoiler ( maior do que eu ja dei, descuspa huahsau ) entao até as notas finais ( esse capitulo, pelo o que eu vi, ficou enorme '-' )



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Mal consigo sentir meu corpo ao acordar. Entro e saio do estado de consciencia multíplas vezes, até finalmente acordar e não voltar a dormir. Tento me sentar, mas meu corpo dói, entao simplesmente me deito, encarando o teto. Depois do que me parece uma eternidade, uma enfermeira entra na sala, e sua voz aguda chega a machucar meus ouvidos, enquanto me assusto com sua aparencia. Branca, mas não normalmente. Branca como um lençol. Sua maquiagem dourada assusta, seus labíos cinzas assustam, seus olhos cinza escuro assustam. Provavelmente essa aparencia serve para combinar com sua roupa, mas pouco me importa. Muito ocupada em analizar seu rosto, eu a ignoro por algum tempo até não conseguir ignorar sua voz insuportável.

 — O que foi?

 — Preciso fazer alguns testes em voce, Senhorita Mason. A queda foi bastante forte, e a descarga de adrenalina segundos depois também.

 — Voce não vai fazer teste nenhum. Eu estou bem. Eu estou falando, provavelmente andando, raciocinando. Não chegue perto de mim.

 E então começo uma das cenas mais patéticas de minha vida. Tres enfermeiros que apareceram do nada tentando me examinar e eu lutando fracamente contra eles, enquanto grito o mais alto que posso. Eu quero sair daqui, chegar em casa, desaparecer. Estava gritando com esses seres assustadores quando percebo alguem entrando no quarto. Na minha frente, ninguém mais ninguém menos do que o Presidente Snow.

 Paro de gritar na hora. Congelo, vendo seus olhos de serpente me encarando profundamente. Sinto o mesmo arrepio do dia do desfile, mas dessa vez um milhão de vezes mais forte. Com um simples aceno de cabeca, os enfermeiros saem na hora, me deixando sozinha com ele.

 Calmamente, ele anda em minha direção e se senta em uma cadeira do lado de minha cama. Escondo minhas mãos que tremem embaixo do lençol, enquanto ele me encara como se visse um cachorrinho.

 — Então, Senhorita Mason, temos assuntos a discutir. Mas, antes de ser acusado de indelicadeza, gostaria de saber como anda sua saúde. Minha mais nova vencedora deve estar bem para podermos prosseguir.

 Levo alguns segundos para perceber que ele esta falando comigo antes de responder. A velocidade de meu racíocinio deixa a desejar.

 — Eu estou bem.

 Seu olhar me mostra que esta satisfeito com minhas 3 palavras, embora esperasse algo melhor. Aqueles olhos me deixam sem oxigenio, como quando vi aqueles tributos lutando bem em minha frente.

 — Ótimo. Não irei me prolongar aqui, já que a Senhorita precisa descansar. Temo que tenho um problema em mãos, Senhorita, e cabe a voce conserta-lo.

 Eu respiro fundo e aceno com a cabeça. Ele volta a falar.

 — Bom, voce nunca deveria ter voltado para cá. A menina do 9 deveria ganhar, mas aquele garoto a deixou bem machucada, não é mesmo? E voce ganhou. Não a culpo por isso, tenho certeza que se soubesse disso a teria deixado ganhar. Mas, o ponto é, foi muito fácil para voce. Voce simplesmente se escondeu naquela árvore, e matou alguns carreiristas. Quantos foram, 4? Realmente impressionante. Mas o que eu quero dizer é que voce deveria ter sofrido mais. Mais machucados, mais dificuldades, mais abrigos. Novamente, isso não é sua culpa. Nada disso é. Mas agora, algumas pessoas acham que a Capital enfraqueceu. Que a Capital facilitou para voce. Quero que deixe claro na sua entrevista que não foi fácil demais para voce. Que voce achou mais difícil. Fale isso para eles. Espero que a Senhorita esteja ciente das consequencias de não me ouvir.

 Eu respiro fundo uma vez. E outra. Na quinta respiração, já esta ficando ridículo.

 — Sim.

 — Sim o que, Senhorita? Preciso que seja clara.

 — Sim, vou fazer minha parte.

 — Ótimo. Te desejo melhoras, minha cara. Esteja boa essa noite, na entrevista. Voce só terá uma, já que está desmaiada a dias. Tanto dinheiro perdido.  Ah, e voce realmente deveria deixar os enfermeiros te examinarem. Pode fazer bem pra voce.

Recapitulo cada pedaço da conversa em minha mente. Se ele mandasse, eu deveria simplesmente desistir? É minha culpa? Alguma rebelião está acontecendo?

 Me contenho de sorrir com esse pensamento.

 Eu assisto enquanto ele sai de meu quarto e enquanto os enfermeiros entram de novo. Recomeço a luta contra essas pessoas por mais algum tempo, até que duas pessoas entram no quarto: meu mentor e minha estilista. Inicialmente sem saber o que fazer, eles entram devagar e me encaram por um longo tempo até eu mandar os enfermeiros embora com gritos. Eles olham para Blight que os autoriza a sair com um sussuro. Eu reuno cada força que tenho para me sentar na cama, enquanto Blight chega mais perto e eu o abraço do jeito mais forte que consigo. O primeiro ser humano que toco em bastante tempo. O primeiro que não quer me matar. Ele continua me abraçando enquanto eu deixo algumas lágrimas escaparem.

 — Eu preciso de ajuda.

 Ele ouviu o meu sussuro, pude perceber pela sua postura que mudou. Ele move sua cabeca milimetricamente e se senta perto de meus joelhos. Do outro lado da sala, minha estilista me encara sorrindo um pouco. Tenho vontade de mandar ela parar de sorrir, mas não faço isso. Ela esta feliz que eu estou viva. Mesmo que isso signifique a morte de 23 pessoas tão inocentes quanto eu. Muito mais inocentes que eu. Muitas dessas mortes em minha mão.

 Começo a chorar de novo, e meu mentor coloca a mão em meu joelho. Eles me deixam chorar por varios minutos até a estilista decidir que já perdemos tempo o suficiente. Ela diz que estou pronta para sair do hospital, ainda mais agora que me recuso a ser atendida, e que a entrevista será hoje as 7 horas. Pelo visto acordei na hora do almoço, mas terei o luxo de almoçar em meu andar do centro de treinamento. Depois de convencer alguns enfermeiros que estou bem, minha estilista me ajuda a trocar de roupa no banheiro e a andar até o elevador. Blight me segue sem dizer nada, como se temesse que eu fosse quebrar ao som de sua voz. Quando chegamos no sétimo andar, ela me senta no sofá da sala e me dá uma pequena refeição constituida somente de sopa e pão, além de uma laranja, e como aquilo em minutos. Ela nos deixa sozinha por algum tempo, e é quando Blight decide falar comigo.

 — O que voce precisa? Está tudo bem?

 Eu faço que não com a cabeca quase impercitivelmente. Temo estar sendo observada. Ele não entende, obviamente, e eu me inclino na direção dele, sussurando e fingindo um abraço.

 — Snow quer que eu finja algo na entrevista, a população esta brava comigo. Ou não sei. Eu não sei. Protestando em alguns lugares, eu acho, ele não me deu nenhum detalhe. E eu não sei se devo dizer para não faze-lo. Eles me fizeram matar pessoas. Eles mataram 23 criancas por capricho.

 Blight se afasta de mim no mesmo segundo. Ele me encara no fundo dos olhos e me agarra pelo braço, e mesmo que não seja forte eu sinto a urgencia em seu tom de voz.

—  Johanna. O que voce fez? Eu não vi nada errado na sua participação na arena.

 — Muito fácil, segundo ele. Deveria ter me fodido mais. A 9 devia ter vencido. Acham que eu comprei a vitória.

— É isso. Eles sempre fazem isso.

 — Isso o que? Eles quem? Seja mais claro, por favor. Eu não entendo nada desde o segundo que meu nome foi chamado.

 — Acham um motivo para te mostrar o poder deles. Acham um toque de rebeldia em qualquer lugar da sua vida e te punem por ele. Mesmo que voce não faça nada.

 — O que voce esta querendo dizer?

 — Que voce não deve alimentar a chama. Qualquer atitude errada sua seria como jogar alcool num incendio.

 — Eu acho que isso é o certo a se fazer.

 — Por que? É pedir uma consequencia!

 — Eu matei pessoas. Várias. Eles me transformaram em um monstro. Eles merecem pagar. Se algum dia eu estiver no meio de uma rebelião, já sei em que lado estou. Eu estarei na primeira linha de batalha contra a Capital.

 — Voce NUNCA pode dizer isso. Olhe para mim. Prometa que não vai fazer nada na entrevista!

 — Eu não prometo nada.

 — Johanna. Não faça nada. Por favor. Eles inventam qualquer traço de rebelião em qualquer lugar de sua vida para ter um motivo para mostrar o poder deles. Nem pense em dar um motivo.

 — Eu preciso. Eles me fizeram matar 7 pessoas. 7. Eles me fizeram escolher entre a vida de 7 pessoas e a minha. Eu preciso fazer isso. Não incitar nada, mas, pelo menos, apoiar o que já acontece.

 — Eu estou te avisando. Não fale sobre isso com ninguém. Aqui é seguro, eu teria visto se colocassem cameras. Mas voce tem que me prometer que não vai fazer nada. Voce vai se arrepender. E, nada está acontecendo. Voce saberia se estivesse.

 — Vou pensar no assunto.

 — Não faça nada. Eu estou te implorando. Eles podem te matar.

— Olhe o que eu fiz. 7 vidas perdidas diretamente pelas minhas mãos! 7 futuros. 7 seres humanos. 7 crianças. Eu escolhi trocar a vida de 7 pessoas pela minha. E eu só escolhi isso porque fui obrigada. Que tipo de governo mata crianças por algo que aconteceu décadas atrás? Eu não consigo. Eu não consigo nem pensar no que eu fiz. Eu não vou conseguir vir até aqui a cada ano e enviar crianças sabendo que elas vão morrer. Eu não consigo desejar a morte de outros tributos para que os do meu distrito possam viver. Eu preciso parar isso.

 — Johanna, quem voce acha que é? Voce é uma única pessoa contra toda a Capital. Voce não é nada mais que uma ameaça a ser eliminada. Eu te vi lutar tanto para vencer isso, e não vou te deixar jogar sua vida fora por uma revolução que não existe!

 — Mas pode existir. Se eles tem tanto medo de uma nova vencedora que não tem a menor influencia, é porque eles sabem que algo está acontecendo. Que a população quer se manifestar. Que eles tem algum problema. Voce realmente acha que eles seriam tão controladores se estivesse tudo bem?

 — Isso não é problema seu. Não existe nenhuma revolução. Não existe nada assim. Voce está arriscando perder tudo o que ama por algo que não existe.

 — EU JÁ PERDI TUDO! MINHA FAMÍLIA, MINHA VIDA NO DISTRITO 7, MINHA VIDA! COMO VOCE ACHA QUE EU POSSO VIVER DE NOVO DEPOIS DE TUDO O QUE FIZ?

 — Do mesmo jeito que todo mundo. Voce não tem escolha. Eu vivo assim há anos. Todos nós vivemos. Voce aprende depois de um tempo. Eu sei como voce se sente, depois de tudo isso. Mas tem que aprender a se controlar. Voce venceu os Jogos, mas não tem a menor chance contra a Capital. E voce tem por quem voltar. Aquela mulher que foi se despedir de voce, não sei quem ela é. Volte por ela. Se ela apareceu lá, suponho que ela é importante de alguma forma.

 — Minha mãe.

— Volte por ela. Voce já passou pelo pior.

 — Ela não vai aguentar me ver assim. Seria melhor para todo mundo que eu tivesse morrido na arena. Eu não sou mais a mesma pessoa.

 — Mas ainda é a filha dela. Ela ainda te ama. Voce nunca vai precisar ser a mesma pessoa para ela te amar.

 — Como alguem pode me olhar depois de ver tudo o que eu fiz? Eu não devia estar aqui. Eu devia estar morta junto com os outros tributos. Minha própria mãe viu tudo o que eu fiz. Ela vai lembrar de todas as mortes que significaram minha vida. Ela vai me ver matando aquelas crianças toda vez que me ver.

 — Então voce quer se matar?

 — Se isso adiantar alguma coisa para tirar aquele presidente do poder, sim. Se mais uma morte significar a vida de dezenas de crianças, quem sou eu para achar a minha vida mais importante?

 — Voce não entendeu nada! Não existe rebelião! Voce não fez nada importante, nada excepcional! Eles querem te punir por algo que voce não fez! Eles querem mostrar como será seu futuro se voce pensar em fazer alguma coisa contra eles! Eles governam na base do medo, Johanna. E voce não tem medo por voce. Por isso voce é um pequeno perigo para eles. Pequeno. Minuscúlo. Se voce mostrar isso para eles, eles vão dar um jeito de te diminuir. Por favor, voce venceu a porra dos Jogos Vorazes, não vai arriscar a sua vida por algo inexistente!

 — Eu estou acostumada com a perspectiva de morrer. Não é nada estranho para mim. Desde que me entendo por gente estou correndo esse risco. Morrer por essa causa seria mais do que eu pude esperar.

 — Eles matam mais vencedores do que voce imagina. Mortes acidentais, aos olhos de todos. Incendios, envenenamento por alguma planta comprada clandestinamente, falha no coração, suícidio, assassinato, velhice. E isso acontece com qualquer um que protestar contra o governo. As mortes na praça nem chegam perto do total. Qualquer desculpa idiota é o bastante. Voce tem que andar na linha sempre, pelo resto de sua vida. Sua vida pertence a Capital agora. Nada vai mudar isso, e uma morte aos 17 anos depois de vencer os Jogos é a pior coisa que poderia te acontecer.

 — Não. A pior coisa que me aconteceu foi voltar para cá sem saber disso.

 — Mas voce voltou. Faça sua vida significar alguma coisa. Acima de tudo, não se mate nessa entrevista. Não foi por isso que voce voltou.

 — É. Eu voltei para ser uma espécie de cachorro da Capital. Para ser punida por coisas que não fiz.

 — Esse é o preço de viver. De acordar a cada manhã e respirar o ar puro. De se levantar a cada dia.

 — Não vale a pena.

 — Não. Mas voce se acostuma. Voce não vai dizer nada nessa entrevista. Voce vai fazer o que Snow manda. Voce vai voltar para casa e sobreviver pelos próximos anos, até ser capaz de viver de novo. E voce vai ficar bem.

 — Eu não posso fazer isso.

 — Mas voce vai. A cada dia voce vai fazer um pouco mais. Agora, voce tem que ir se arrumar para a entrevista. Já perdemos tempo demais discutindo coisas obvias.

 — Onde a estilista está?

 — Lá embaixo, ajustando suas roupas.

 — Ok. Eu vou até lá.

 —Na verdade eu tenho que te levar.

 — Mas eu sei onde é. Quero ir sozinha.

 — Eu sei que voce está brava. Comigo, principalmente. Mas me deixe te ajudar. Voce vai ver mais claramente depois de um tempo.

 Eu simplesmente resmungo, mas deixo ele me ajudar a andar até o sub-solo. Quando ele me deixa com a estilista, trocando um olhar que quase passou despercebido, eu tenho um tempo para pensar no que fazer. Minha vida já não vale mais nada. A decisão me parece bastante obvia, mas, como sempre, não pode ser tão simples. Se algo já está acontecendo, como Snow diz, deixarei frases implícitas. Se nada estiver acontecendo, como Blight me garante, essas frases não farão o menor mal. Se eu estou sendo testada, com certeza falharei, mas estou pouco me fodendo. Minha vida não vale mais nada. Queria ter visto isso antes. Alguns dias antes seriam ótimos. Não tenho a menor ideia de que dia é hoje. Não sei por quanto tempo estava desacordada. Não sei.

 Deixo minha mente viajar enquanto os ajudantes da minha estilista praticamente planam ao meu redor. Comentando sobre os Jogos, mas nunca sobre as vidas perdidas. Sempre fugindo desse assunto. Depois de serem ignorados pela vigésima vez, ouço minha estilista gritar de dentro da outra sala para que me deixem em paz. Depois disso eles só conversam entre si. Consigo desligar minha mente até me mandarem para a outra sala, onde vejo meu vestido. Preto, longo, com brilhos prateados como se fosse uma noite estrelada, mas com um grande decote reto. Realmente bonito, realmente o vestido digno de uma vencedora. De alguem que merece vencer. Enquanto deixo ela me vestir e depois fazer minha maquiagem, continuo com meu plano na cabeça.

 Como sempre fui ótima em criar planos, cerca de 15 minutos depois mando tudo a merda e penso sobre qualquer coisa sem importancia até minha maquiagem estar pronta e enquanto coloco minhas sapatilhas ( acho que todos chegaram a conclusão de que meu senso de equilibrio não vai me permitir usar salto hoje ) ­eu me preparo para passar as proximas 3 horas fingindo ser alguém que não sou.  E arriscando minha vida nisso, por algo que nem ao menos existe, como diz Blight.

 Eu deveria acreditar na pessoa que salvou minha vida ou em Snow? A resposta é obvia e me sinto idiota por perguntar isso a mim mesma.

 Mas eu nunca me perdoaria se não o fizesse. Eu não consigo me perdoar por acordar hoje.

 — Voce tem que vir. Nós vamos subir até o elevador em tres minutos.

 Eu a sigo sem dizer uma palavra, e espero enquanto ela se veste com um vestido azul marinho longo. Seus ajudantes se vestem tambem, com roupas iguais: as mulheres com um vestido creme apertado até o busto e solto até os joelhos, e o homem com um terno da mesma cor. Eu me admiro com sua rapidez. Eles quase parecem normais, vestidos como seres humanos.

 Sou levada até uma plataforma onde me deixam sozinha por alguns minutos. Com o passar do tempo, posso ouvir as outras pessoas chegando ao palco. Aquela pessoa maravilhosa que me escolheu para a morte quase certa, meu mentor que fez tudo por mim, a estilista que parece não me odiar tanto, as pessoas que praticamente me torturaram no dia em que cheguei aqui, e, finalmente, a estrela de hoje: a assassina louvada pela Capital. Se os cidadãos da Capital me vangloriam, eu não devo passar de um pedaço de merda. Minha plataforma começa a subir e eu ajeito minha postura enquanto subo. As luzes me ofuscam por um segundo, mas logo consigo ver milhares de criaturas coloridas comemorando minha vitória. Enquanto ando para a cadeira que me foi reservada, imagino o rosto dos familiares de minhas vítimas, vendo a menina que matou seus filhos sendo aplaudida e sorrindo, com uma vida de riquezas e divertimento na Capital pela frente.

 Afasto a imagem de minha mente e me sento nessa espécie de trono, que deve custar 10 vezes mais que minha casa. Minha casa já não é mais minha casa, na verdade. Uma casa na aldeia dos vitoriosos me espera. A casa digna de uma vencedora. Minutos depos, o amável público para de me aplaudir por eu ser tão incrivel e capaz de me sentar aqui, imóvel, sem fazer nada além de sorrir. A primeira pergunta de Caesar diz respeito a minha saúde, assim como a do presidente.

— Senhorita Mason, a Senhorita não tem ideia do quão felizes estamos por te ver aqui de novo! Como anda a sua saúde?

 — Nossa, Caesar, pena que as outras crianças não podem dizer o mesmo, não é?

 Obviamente eu não disse isso. Pelo contrario, fui bem legal com eles.

 — Igualmente, Caesar. É meu sonho virando realidade ver todos voces aqui! E estou bem, eu acho. Fui liberada hoje cedo.

 — Ficamos muito felizes em saber disso. Agora, vamos ao que nos interessa de verdade! Os melhores momentos dos Jogos!

 Ele sempre usa o plural. Nós. Nós estamos felizes por te ver. Nós estamos aplaudindo uma assassina. Nós estamos contentes pra caralho com a morte de 23 pessoas. Nós vamos te obrigar a assistir tudo de novo. Nós vamos te punir se voce não fizer o que mandamos. Nós aplaudimos o show de horrores. Nós damos risada de assassinatos a sangue frio.

 Eu não me sentiria culpada enfiando meu machado na cara de " nós ".

 Eu me sinto culpada por ter feito isso com essas crianças.

 Eu queria que " nós " simplesmente me mandasse para casa e me deixasse morrer em paz. Eu não vou viver nunca mais. Eu vou contar os dias até minha morte.

 Eu quero ir pra casa. Eu quero abraçar minha mãe e me mudar com ela para a Vila dos Vitoriosos. Eu quero me esconder em algum quarto e nunca mais sair de lá. Eu quero que tudo isso acabe de uma vez.

 Sou puxada de volta a esse palco pelas imagens que passam nesse imenso telão. Depois das vitímas da cornucópia, meu primeiro assassinato. Em vários angulos. Repetidas vezes.

— E então, o que achou?

 Eu queria simplesmente gritar e sair correndo. A pior parte disso é meu sorriso debochado depois disso.

 " E é aqui que eu começo ".

 Se essa menina estivesse armada e pronta para reagir, tudo seria diferente. Eu provavelmente não estaria aqui para contar a história, mas as cameras fariam isso por mim.

 Falando em cameras, eu ainda devo uma resposta. O país inteiro me encara. Em uma espécie de trono, distante mas ao mesmo tempo incrivelmente próximo, Snow me encara.  

 Voce pode ir se foder, Snow.

 — Achei a filmagem extremamente boa.

 — Voce sabe que não é disso que estamos falando.

 ­— O que voce quer dizer, então?

Não se abalando com minha resposta grossa nem com meu olhar assassino, Caesar sorri.

 — Obviamente falamos da sua primeira vitíma. O que voce achou?

De matar alguem? De assistir a vida de um ser humano saindo de si? De ver seu horror ao me olhar? De pensar na família dessa pessoa todas as horas, o dia todo, o tempo todo, sem um segundo de paz? Consigo sentir o olhar de Snow. Consigo sentir sua ameaça implicita. Mesmo sabendo que minha vida corre mais perigo do que no momento em que entrei na arena, tiro a coragem de algum lugar e respondo o oposto do que devia.

 — Achei que seria mais dificíl.  

 Não deixa de ser verdade. Nem ao menos tive o tempo de pensar naquele dia. Nem ao menos tive o tempo de pensar naquela arena. Agora, fica mais dificíl. Agora, eu assisto tudo isso e vejo a espécie de monstro que me tornei. Ainda tenho que aguentar essa entrevista. Eu tenho que assistir a minha edição dos Jogos. A edição que eu ganhei. A edição em que eu matei essas pessoas. Eu fui a melhor assassina.

 Caesar sorri. Esse homem é muito bom em sorrir. A Capital o ama, mesmo que ele tenha começado a relativamente pouco tempo. Algumas ediçoes, mas já é tão amado. Como eu. Alguns assassinatos e sou a filha amada deles.

 Depois, próxima vitíma. O menino do 10. Seu nome é citado, mas derrete em minha mente.  Não sei se quero saber. Não quero saber o nome de ninguém. Que isso tudo seja lembrado como um pesadelo. Pessoas de mentira, pessoas que não são pessoas. Eu me odeio por pensar assim, mas preciso sobreviver. Eu preciso me levantar todos os dias. Eu preciso me lembrar de respirar. Caesar continua com as perguntas idiotas sobre as minhas vitímas.

 — O que te levou a descer dessa árvore, mesmo sabendo que poderia se machucar e até morrer?  Voce poderia simplesmente ter ficado lá e seu braço estaria intacto durante sua participação nos Jogos.

 O que me levou a matar pessoas? Devo começar quando? Na hora em que me chamaram para os Jogos? Na hora em que o gongo soou e eu tive que correr pela vida? Na hora em que matei a primeira vitíma? Ou então na hora em que decidi descer da porra da árvore? Eu poderia ter ficado. Um assassinato a menos em minhas costas. Provavelmente outro algum mataria ele. Ou então meu destino mudaria e eu morreria na arena e outra pessoa teria ganhado. Não consigo ver essa possibilidade como algo tão horrível. Eu não teria que pensar em tudo o que fiz. Eu não teria que conviver com isso todos os dias de minha vida. Mal consigo suportar algumas horas do primeiro.

 — Bom, como eu disse, essa história de Jogos Vorazes é mais fácil do que eu imaginei. Poderia fazer tudo de novo facilmente. Um ano qualquer, quem sabe.

 Os espectadores adoraram essa declaração, pelo visto. Os aplausos e gritos preenchem o salão. Ouso olhar para Snow, mas ele não está me encarando com os olhos em fúria como imaginei. Ele está tomando um gole de sua taça com uma espécie de.... Sorriso? Não tenho a menor ideia do que concluir a partir disso. O silencio volta ao estúdio subitamente, quase como se fosse ensaiado. Deve ser. Estamos na Capital. Algumas cenas depois, todas de sofrimento e morte nesse show de horrores, chegamos ao " terceiro momento mais tenso dos Jogos, sem contar a final e sua luta na Cornucópia! " segundo Caesar. Duas pessoas. Ao mesmo tempo, praticamente. Duas vidas. Vidas de carreirristas, mas isso não me consola. Minhas respostas são praticamente as mesmas. Vazias, falsas, superficiais. Esses idiotas não deixam de aplaudir, entretanto. O público ri de minha estupidez quando eu como as malditas cenouras, e se divertem com meu humor auto-depreciativo sobre o assunto. O público ri mais ainda do menino que caiu em minha pegadinha, e eu rio com eles, apesar de saber que eu tornei os últimos dias de vida dele um inferno. A platéia tambem gostou do meu jogo dos números na parede da Cornucópia. Resumindo essas tres horas, eu assisti a pior parte da minha vida e ri disso, rindo abertamente na parte das mortes e fazendo comentários engraçadinhos. Depois de assistir a batalha final, e o meu resgate, nosso excelentissímo presidente Snow me coroa como a mais nova vencedora, suspirando um " tsc, tsc " quase inaudível atrás de mim. Muita enrolação depois, a transmissão é finalizada e eu me despeço de toda a Panem.

 Snow me encara profundamente enquanto saio do palco. Ele move seus labíos para me dizer alguma coisa de longe, mas eu não entendi uma palavra. Vou me foder no futuro por causa disso? Muito provavelmente. Mas também não posso fazer nada. Pego o elevador sozinha, em parte porque saí correndo desse andar assim que pude, em parte porque a única pessoa que me entenderia é tão importante para mim que me recuso a dividir isso com ele. A porta se abre no sétimo andar, mas eu não desço. Aperto os botoes e vou parar no décimo-segundo. Ninguém vai me procurar aqui.

 Ando até o corredor, e vejo que só uma luz está acesa. O distrito 12 só tem um mentor, já que eles nunca passam do segundo dia. Eu procuro a porta para o exterior do prédio, mas não consigo a achar de jeito nenhum. O que eu iria fazer? Me sentir melhor com o ar fresco? Pular dali? Nada disso resolveria meus problemas atuais. Então me sento encostada em uma parede e coloco a cabeça entre os joelhos. Lagrimas correm pelo meu rosto antes que eu perceba. Eu penso em tudo que evitei pensar desde que fui sorteada. Logo eu estou soluçando, e provavelmente chamando a atenção da metade do prédio. Mas eu não ligo. Eu estou sozinha. Eu fiz coisas impensáveis. Eu preciso ir para casa, se é que esse lugar ainda existe.

 — Que porra?

 Eu grito quando alguem sai da porta ao lado. Pelo visto escolhi soluçar do lado da porta do único mentor do 12. E a sorte sempre está a meu favor. Em uma mão, ele tem uma faca do mesmo tipo que usei para ameaçar Joshua. Eu tento levantar, mas falho miseravelmente.

 — O que voce está fazendo aqui?

— Eu não sei, eu não tenho a menor ideia. Eu não posso ir pra lugar nenhum?

— Que tal o seu andar?

Eu simplesmente volto a chorar e balanço minha cabeça negativamente. Ele revira os olhos.

— Johanna Mason, certo? Pode entrar.


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Notas finais do capítulo

Oiiiii de novo! - o comentario me deixou animada, desculpa '-'
Entao, gostaram? Varias pessoinhas me disseram que queriam um capitulo legal e sem discussao e sem treta e sem drama, mas fazer o que, é a vida né?
Estou me sentindo meio culpada, deixa quieto hahahah
Eu cortei boa parte da entrevista, mas nao tem como escrever uma entrevista de 3 horas ai, seria MEIO chato, mas imaginem a Jojo sendo a flor de pessoa que ela é com o Caesar e encarando o Snow e sendo V1D4 L0K4 ( ai que coisa mais 2008 mds )
Ok. Parei de falar.
Ah, nao parei nao... E esse final de capitulo? O que acharam? O que acham que vai acontecer? ( ta meio na cara, mas fazer o que hahahah ) Comentem, dai quem sabe assim teremos mais capitulos fora de hora! ( fora de hora mesmo, ja é quase meia noite '-' )
Ok, parei de falar. Acreditem no mentor, me desculpem pela treta e comentem muito!



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