Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 91
XCI


Notas iniciais do capítulo

*Rindo de nervoso porque faz muito tempo que não apareço*
Então, eu comecei um projeto paralelo em Julho, no NaNoCamp (o que explica meu sumiço no outro mês) e em Agosto foi quase impossível conseguir ânimo para escrever. Realmente meus problemas pessoais me deixaram esgotada, mas eu agradeço muito quem veio conversar comigo, ver o que tava acontecendo e também me cobrar um tiquinho hahah
Espero que esse capítulo esteja à altura.



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Quando Bucky Barnes abriu os olhos, um pouco de claridade já entrava no quarto. Ele soltou um resmungo confuso, olhou para o relógio e notou que não era tarde quanto achou que era. Tivera um sono sólido. E então, espreguiçando-se, viu que longos cabelos castanhos se apoiavam no travesseiro ao lado, já um tanto embaraçados. 

Wanda.

A memória da noite adentro - do som, dos toques, do calor - invadiu sua cabeça de súbito, fazendo seu rosto arder. Soltou um suspiro entre a vergonha, o sono e a vitória; sem conseguir impedir seu corpo de virar e abraçá-la por trás. Depositou um beijo delicado em seu pescoço, aspirando o perfume de seus cabelos e sentindo-se um tolo quando Wanda murmurou o nome dele de forma preguiçosa. Ela esticou-se e virou-se, primeiro esfregando os olhos com as pontas dos dedos antes de encará-lo. Depois veio aquele sorriso bobo que o obrigou a sorrir de volta.

— Bom dia.

Bom dia.

Wanda franziu a testa e ergueu apenas uma das sobrancelhas, desconfiada pelo tom usado por ele.

— O que foi? Parece até surpreso de me ver aqui.

Hm, eu achei que você não estaria aqui pela manhã.

A expressão dela se torceu em choque, um pouco de ofensa e depois humor. Entendera o que ele quis dizer com isso, já que Wanda tinha um pequeno hábito de desaparecer em momentos inoportunos. Ainda assim, ela riu. Não era só uma noite para nenhum dos dois é a feiticeira não iria sumir daquela forma, o que deixava os nervos dele mais tranquilos.

— Eu não sou assim, James. Tenho um coração. E aliás… — Segurou o queixo dele com ternura. — Eu estava com saudades do seu café da manhã.

Bucky avançou sobre ela, beijando seu pescoço com delicadeza e depois com voracidade. Somente se sentiu saciado quando provou de novo seus lábios e lhe arrancou um riso curto, seguido de um derretido suspiro. Foi nesse instante que parou, mas algo na expressão dela dizia que ela não queria que parasse - e existia certa vitória nisso também. Havia vantagens de se ter um braço mecânico, como o fato dele poder ficar apoiado sobre Wanda sem se cansar muito, igual fazia agora. Ofereceu um sorriso de lado para Wanda, ajeitando o cabelo dela.

— É bom saber que você tem razões pra voltar. Está com fome? Posso preparar algo na cozinha.

— Sim, mas… Você acha que alguém viu, ou… Ouviu?

— O que? O nosso fondue?

Fondue

Houve uma pausa. Bucky queria gargalhar do rosto confuso e inocente dela, no entanto apressou-se em finalmente explicar o que era a tal expressão estranha.

— A menos que queira uma nova demonstração do que é, acho que a senhorita entendeu muito bem o que é fondue.

Ela abriu a boca incrédula, seu rosto tão vermelho quanto seus poderes.

— Ai, minha nossa. MinhanossaMinhanossaMinhanossa. Que vergonha! —Wanda se escondeu debaixo do edredom. — Eles falaram pra eu não aproveitar fondue no meu aniversário, lembra? Eles sabem.

— Bom, talvez eles saibam. Ou ao menos suspeitem. De qualquer forma, não é nada de errado.

Só ouviu-se um resmungo abafado pelo tecido do edredom.  

— Eu sei, é que… — Wanda descobriu parcialmente o rosto, deixando somente os olhos à vista. — Eu não estou acostumada com isso.

Ele coçou a barba por fazer, palavras constrangedoras entaladas na garganta.

— Eu também não. Se isso te conforta, a estrutura de Outer Heaven é pesada, tem uma boa… hhm, isolação acústica. — Não era como se eles tivessem  feito muito barulho, no entanto a afirmação pareceu deixar Wanda mais nervosa, mais vermelha. Tentou falar outro argumento que lhe servisse de consolo: — E ao menos que alguém tenha ficado à espreita na sala ou nas câmeras, acho que não deu tempo de ver. 

Não pareceu causar efeito na Feiticeira, que cobriu de novo o rosto e soltou um murmúrio indistinto. Bucky sabia que ela se preocupava com o que seus colegas iam pensar, mas não achava que seria algo ruim, na verdade. Se é que tivessem visto ou ouvido alguma coisa, para começo de conversa.

Tentou mudar de assunto:

— Mas… A gente vai para a cozinha, então?

— Sim. — Ela suspirou conformada. — Eu deixo o fondue pra outras oportunidades. Acho que não vai faltar.

Bucky sentiu um arrepio atravessar seu corpo. 

— Eu espero que não.

Ela riu e puxou os lençóis para si, saindo da cama devagar. Estava com o cabelo um tanto bagunçado, mas a visão dela caminhando pelo quarto com o tecido enrolado no corpo era algo que ele poderia muito bem se acostumar a ver todas as manhãs. Wanda observava o cômodo com atenção, demorando-se em objetos deixados no criado-mudo e na prateleira. O iPod de Sam. O celular de Remy LeBeau. A moeda que era de Agatha e que a Feiticeira havia lhe dado depois. O boné cinza. Bucky notou o sorriso dela ao passar as pontas dos dedos pelos poucos livros na prateleira e tirar o “Uivo no Breu” dali. Observava a capa.

— Vendo minha desordem, boneca?

— Eu tinha Pietro, lembra? — Respondeu com saudade. — Isso está bem longe de uma bagunça de verdade. Eu…

A frase se desfez na boca dela.

— Wanda? — Bucky disse gentilmente, ao perceber que muitos pensamentos rondavam a cabeça dela. Sentou-se ainda no colchão, curioso. — Você o que?

— Eu realmente gosto disso. — Wanda suspirou e deu de ombros antes de colocar o livro no lugar. — Na primeira vez que fui até ao seu quarto, lá em Wakanda… Achei tudo tão impessoal. Bem, eu não sei se é presunção minha achar que sei de tudo, mas parecia que você se impedia de criar um espaço seu. Um espaço pra voltar, e eu… Sei como isso dói. Mas esses objetos têm história. Tem vida. E isso me fazem lembrar de quanta coisa mudou.

O soldado assentiu.

— É… Nem parece que eu era só um cara congelado há alguns meses.

Wanda riu e se aproximou de novo dos pés da cama, seus lábios mais silenciosos, contemplativos. Algo dentro de Bucky sempre estremecia quando a Feiticeira o encarava longamente, seus olhos verdes muito brandos, indecifráveis. Esperava que ela murmurasse algo profundo, mais uma de suas palavras passionais, mas ela somente sorriu e disse:

— Eu vou me teleportar pro meu quarto. Só pra ficar mais natural. 

— Tudo bem. Mais natural. — Ele debochou de leve. — Só não esquece suas roupas aqui.

Ele juntou uma peça de roupa que estava no chão ao seu lado da cama, a saia, e balançou a sua frente, oferecendo-a em zombaria para Wanda enquanto ficava agora de joelhos no colchão. O rosto dela ardeu de vergonha e logo a Feiticeira se inclinou para pegá-la das mãos dele; no entanto, assim que ela juntou a roupa com a mão, Bucky a puxou para si, fazendo-a se desequilibrar e cair de novo na cama. Ela riu e exclamou seu nome, sem negar seus beijos e nem mesmo quando ele avançou sobre seu corpo, desnudando o lençol que cobria sua pele.
Antes do café, outro fondue.

*

Wanda realmente se teletransportou para seu próprio quarto antes de sair para a Ala Comum e encontrar seus amigos. Quis tomar um banho primeiro, trocar de roupa e ficar mais apresentável para se encontrar com Steve, Sam, Nat... Sua intenção era montar uma máscara de inocência, porém não conseguia deixar de pensar no que tinha feito na noite anterior. E pela manhã também.

Seu sorriso constrangido a denunciaria? Alguma expressão que a Viúva Negra captaria em apenas um vislumbre? Ou Steve Rogers farejaria o perfume de fondue sob seu teto? Céus. O que Sam faria se soubesse?

Independente da resposta, Wanda imaginava que qualquer reação dos três seria menos violenta que a Erik Lensherr ao saber que James Buchanan Barnes tinha sido esperto demais, justamente o contrário que o mutante havia lhe pedido no mesmo dia.

Ela tentou escorrer suas preocupações no banho enquanto lavava o cabelo, agradecida por itens de higiene pessoais fazerem parte do arsenal de cada quarto, incluindo... Bem, incluindo os preservativos que estavam nas gavetas no criado-mudo.

Ao secar as pontas das madeixas com a toalha, Wanda cogitou que aquilo sim - o desaparecimento de preservativos - denunciaria o adorável crime dos dois, mas em seguida deu de ombros. Bucky estava certo, afinal. Não fizeram nada de errado e nem mesmo tinham sido irresponsáveis. Ela se encarou no espelho por alguns segundos, já vestida.

Sem olheiras. Ainda era possível ver o reflexo opaco de cicatriz do ferimento causado por uma Dora Milaje na sua sobrancelha, quase imperceptível. Era uma marca antiga agora, seu triste significado abafado por um sorriso tolo no rosto. Sua pele estava corada, saudável. Ela tinha batalhado muito para enfim chegar nesse estado e... Pietro gostaria de vê-la assim. Bem.

Wanda estava bem. 

É isso também a fez lembrar de quanta coisa acontecera nesse meio tempo. Coisas terríveis, coisas boas. Ela também tinha alguns itens em seu próprio quarto - como o arco, Agneta, que tinha sido colocado junto a seus pertences pela equipe de wakandanos responsáveis pelos preparativos de Outer Heaven - Mas a maioria de seus itens pessoais ainda estavam na loja de Agatha Harkness. A tiara vermelha junto com suas roupas dobradas ao pé da cama a alertava que deveria voltar para a companhia de sua mestra em breve… Mas ela apenas deu de ombros, ciente que daria conta.

Talvez estivesse florescendo, de fato.

Quando a Feiticeira Escarlate saiu de seu quarto e rumou pelo corredor, logo viu uma das portas dos dormitórios aberta. Estava tão preocupada com a possibilidade de seus amigos saberem de coisas íntimas entre ela e James que passou direto no primeiro momento, mas depois voltou para conferir de quem era o quarto e o porquê estava aberto.

Olhou, não enxergou ninguém. A curiosidade falou mais alto e a feiticeira não resistiu adentrar o cômodo, encantada com o que tinha encontrado: dúzias e dúzias de desenhos pendurados na parede, alguns rascunhos espalhados e um caderno de bolso acima da escrivaninha, ao lado de um porta-lápis. Ela reconheceu o caderno e sorriu. O dormitório era simples e com uma imensa janela assim como os demais, decorado por cores sóbrias entre o azul, branco e preto. Os tais desenhos concediam mais personalidade ao recinto, indicando indiscutivelmente quem era o dono do quarto:

Steve Rogers.

Penduradas na cortiça da parede, havia ilustrações de coisas pequenas, objetos e plantas. Haviam memórias também, como cenas do Brooklyn de uma outra era e da Guerra. Pessoas que a Feiticeira Escarlate não conhecia, mas que sabia que tinham sido importantes para Steve. Lugares pelos quais viajara. Ela se aproximou para ver detalhes, tocou em um dos papéis. E então viu ilustrações de rostos conhecidos: Bucky. Sam. Tony. Banner. Thor. Até mesmo ela própria. E Natasha.

Muitas Natashas.

— Wanda! — A voz suave de Steve veio dos fundos do quarto, onde ficava o pequeno closet e o banheiro. — Está de pé. 

Ela se virou devagar, com um sorriso incerto e hesitante. A aura de Steve era azul e calma, mas Wanda ainda se sentia envergonhada por ter sido flagrada ali dentro. Ele carregava um objeto na mão, um dispositivo eletrônico no que Wanda reconheceu vagamente.

— É, eu… Desculpe invadir, é que vi a porta aberta e…

— Tudo bem. Vim só pegar o comunicador que esqueci aqui e… — Ele fez um gesto, mostrando o aparelho, e ergueu uma sobrancelha. — E esse seu hábito não é nenhum segredo. 

Riu e cruzou os braços em resposta.

— Em minha defesa, as pessoas deixam as portas abertas. Eu só entro por elas e… Descubro coisas incríveis. — Wanda se virou de novo para poder observar a parede e o Capitão América acompanhou seu movimento. Ficou ao seu lado. — Você é um artista e tanto, Steve.

Ele soltou um riso breve, agradecido.

— Você e Sam reclamaram sobre não terem aulas de artes comigo no Instituto Xavier. Nós poderíamos arrumar algumas aqui em Outer Heaven. Não falta espaço, só não tenho tanto material.

— Eu definitivamente vou aceitar isso. Preciso de desenhos bonitos para meu grimório… Mas você me ouviu lá em Genosha. Só tenho que terminar uma última coisa com minha mentora.

Os dois se encararam.

— E o que é?

— É melhor eu não te falar.

— Não posso dizer que não fico preocupado, mas quer saber? — Ele inclinou o rosto, passando a mão pela sua barba espessa. Wanda notou que Steve a encarava de um modo que não enxergava apenas sua imagem atual, mas sim comparando-a com a Wanda de muitos meses atrás, com olheiras e ferimentos causados por combates com as Dora Milaje. Ele também passou um instante observando um ponto pouco acima de sua sobrancelha esquerda, onde agora jazia apenas uma cicatriz de um machucado que levou pontos. — Acho que você dá conta. Sempre dá.

Ela engoliu seco, sentindo emoções ondularem por debaixo de sua pele. Há minutos, ela própria tinha se olhado no espelho e visto a diferença. Ver tal progresso pelos olhos e pelos pensamentos de Steve a fez lembrar-se de novo que tudo aquilo tinha sido real: a dor, as lágrimas e depois o que conseguiu cultivar em meio ao vazio.

Talvez ele não entendesse a razão por qual o choro alcançou a beirada de suas pálpebras; talvez, como um bom artista, ele compreendesse completamente. A voz de Wanda saiu miúda ao dizer:

— Vou arrumar uma forma de manter contato.

— Posso só imaginar como. — Ele sorriu, deixando implícito que se referia aos meios mágicos de Wanda aparecer e possivelmente mandar lembranças aos Vingadores Secretos. Antes que a Feiticeira pudesse responder, houve um bipe no comunicador. Steve encarou a tela por alguns segundos, lendo, antes de deixar escapar uma expressão desconfiada, divertida. — Clint mandou um oi para você. Disse que algo sobre você “voltar pra fazenda no Outono”, o que é interessante já que ele me disse que não tinha visto nada fora do normal quando você sumiu. E eu perguntei à ele em dois momentos diferentes.

Wanda soltou uma gargalhada, embora se sentisse um tanto culpada. Mas fez uma anotação mental de aparecer na fazenda Barton para comer tortas de abóbora no Outono.

— Você ainda está bravo? Por eu ter sumido?

— Ah, Wan. Não. Fiquei morto de preocupação, mas não bravo.

Assentiu, aliviada. Sua atenção vagou de novo pelos desenhos em papéis diferentes, alguns rascunhos feitos em jornais e papéis rasgados. Em um deles, viu um casal sonolento numa cabine de trem muito familiar.

— Sou eu e o James! Eu não tinha visto você desenhando na viagem até São Petersburgo.

— Porque eu não desenhei lá. Sabe, por causa do soro… Minha memória é bem nítida. — Wanda suspirou, pois entendia como tal coisa poderia doer. — Isso pode ser ruim em alguns momentos, mas ajuda nessa parte. Fiz esse depois.

— Você sabia?

— Do quê?

— De nós dois.

Ele levou um tempo para responder.

— Depois de um tempo. Não tinha certeza sobre você, mas conheço meu melhor amigo e sei quando a cabeça dele está em outro lugar. E acho que fez bem ao Bucky ter mais alguém. 

Ela voltou seus olhos à parede, um tanto constrangida e simultaneamente lisonjeada com as palavras de Steve. Não conseguia deixar de pensar no sorriso de James Barnes e ouvir da boca de outra pessoa que Wanda fazia bem à ele deixava seu coração morno.

Foi quando notou que existia um brilho diferente nos desenhos Natasha, mas não como se ele tivesse usado algum material diferente para ilustrá-los. Como se… Se de alguma forma, ele também enxergasse a doçura nela, em sua aura. Wanda riu dos próprios pensamentos, pois a verdade era simples: Steve a amava.

Talvez fosse um tanto confuso para ele, já que tivera - ou ainda tinha? - uma espécie de relacionamento com Sharon Carter. Foi algo que começou em 2014, quando ela ainda estava sob o disfarce de enfermeira, morando no mesmo prédio que Steve. Sam havia comentado que eles se beijaram no aeroporto na Alemanha no ano passado, antes do combate. Em resumo, Carter parecia uma pessoa decente, boa. Na época, tinha até mesmo se arriscado em levar todo o equipamento e os trajes para eles, e ocasionalmente colaborava com as investigações dos Vingadores Secretos. Em outras circunstâncias, talvez ficassem juntos, mas…

Não estavam. 

Por mais que o começo e o suposto fim de tal romance fosse nublado, a nitidez da dinâmica entre Steve e Natasha era clara.

E talvez a russa também tivesse feito bem pra ele.

— Falando nele, — O Capitão América continuou. — Bucky ainda não levantou. Não costuma acordar tarde.

— Ah. — Wanda assentiu de forma um tanto mecânica demais, um sorriso tolo escapando de sua face. — Aconteceu muita coisa ontem.

— É. — Ele pareceu convencido com o argumento, totalmente alheio ao que de fato ocorrera - para o alívio da Feiticeira Escarlate. — Vai comer? Eu estava voltando pra cozinha.

— Estou faminta.

 *

Encontrou menos pessoas que considerava encontrar na cozinha. Steve sentou-se para comer cereais e frutas por conta de sua dieta balanceada enquanto Natasha terminava um sanduíche. Sam, por sua vez, infestava a cozinha com cheiro de fritura ao preparar bacon e ovos. Wanda deu-lhes um tímido “bom dia”, seguindo para o balcão. Não tinha pensado ainda no que comer, portanto abriu os armários para checar suas opções, tamborilando os dedos. Cumprimentou também Shuri, que já parecia ter tomado café e não lhe deu muita atenção, grudada em notícias pela sua joia kimoyo; Anne Marie estava na outra mesa, dando um copo de água e aspirina para Remy, completamente de ressaca. 

Ninguém pareceu se importar muito com sua presença, o que era perfeito. Ororo e Logan estavam no lado de fora, apreciando a vista das nuvens; Jean e Scott chegavam só naquele instante, comentando que conversaram com professor Xavier e todos X-Men voltariam para casa naquele mesmo dia.

Até o momento, ninguém perguntara nada sobre o final da festa à Feiticeira Escarlate.

— Dificuldades para escolher algo pra comer?

— Ah, Sam. Eu...

— Hm, eu gostei do seu perfume. Um alívio pro cheiro desse bacon gorduroso. — Natasha entrou no meio, em direção à pia para lavar seu próprio prato. O comentário parecia inócuo, mas Wanda não pôde evitar de vasculhar ligeiramente seus pensamentos. Não viu nenhuma suspeita. — Por que não tem um perfume assim no meu quarto, Vossa Alteza?

Shuri nem desviou o olhar do artigo que lia.

— Porque você ocupou todo o espaço com produtos de cabelo, Romanoff.

A espiã assentiu, considerando a explicação justa. Quando a sokoviana considerou que estava a salvo de questionamentos, Steve também veio lavar seus pratos. Expulsou Natasha, dizendo que lavava a louça em seu lugar, e começou a organizar os utensílios na pia. A espiã virou-se para Wanda, seu tom preocupado e sua aura rosa:

— Estranhei ter acordado tarde. Geralmente você é uma das primeiras a tomar café, Wanda.

— Ah, eu... Fiquei bem cansada.

— Deixe a coitada. — Sam interviu ao fundo. — Desintegrou Zola ontem, acho que merece horas a mais na cama.

Seguiram numa conversa banal até que Bucky adentrou a cozinha.

De cabelos também úmidos.

Wanda o encarou por um segundo a mais, num diálogo silencioso com o soldado. Por que ele tinha que lavar o cabelo também? Droga. Bastaria ligar um ponto a outro para que a conclusão fosse óbvia e ninguém ali em Outer Heaven era tolo. Wanda e Bucky sumiram ao final da festa. Os dois acordaram tarde. Uma mente mais fantasiosa, ao ver ambos de cabelos úmidos, poderia até imaginar que tinham se banhado juntos naquela manhã.

Naquele instante, ela confessou a si mesma que estava sendo apenas paranóica, mas também queria folga para sua cabeça, sem ter que explicar coisas constrangedoras ou ter a necessidade de apagar alguns minutos da memória de alguém. Em resposta, Bucky franziu a testa e fez aquela expressão adorável de quem não estava entendendo muita coisa, mas que pedia desculpas mesmo assim. Engoliu seco brevemente antes de perguntar:

— Hã, você quer panquecas?

Wanda só conseguiu sorrir e aceitar a oferta. Ficou ao lado de Natasha, bebericando uma xícara de chá e contribuindo com respostas vagas na conversa superficial que todos travavam. Ninguém parecia muito focado ou muito preocupado depois da noite comemorativa, ainda um tanto exaustos. Só Sam Wilson mastigava e falava com entusiasmo, contando que viu as histórias em quadrinhos baseadas em mutantes que Logan havia mencionado no dia anterior; Natasha se vangloriou por ter fãs na internet depois da afronta no Congresso americano. Scott, sempre tão sério, entretia-se com a ligeira disputa.

Um estralo baixo de algo no fogão captou a atenção da Feiticeira.

Bucky tinha virado a panqueca na frigideira e Wanda lembrou-se imediatamente do apartamento em Bucareste. Era inevitável se recordar das manhãs folgadas na capital da Romênia ao assistir o soldado cozinhar com um pano de prato sobre um dos ombros, vestindo uma blusa simples e escura. Ela não fazia ideia de qual era a necessidade de ter aquele pano de prato no ombro, mas ele ficava muito bem assim.

E então notou que sua expressão naquele instante deveria ser a mais tola e apaixonada de todas. Droga. A Feiticeira sondou os devaneios do colegas.
Steve terminava de secar a louça e divagava sobre o sorriso de Natasha, enquanto a russa admirava o traseiro dele do balcão. Sam lembrava de discos de jazz. Shuri flutuava em variáveis matemáticas e questões de diplomacia. Nada anormal, nada suspeito. Agora, Jean Grey…

Wanda cruzou o olhar com a telepata, em pânico. Tinha protegido os próprios pensamentos, pois era um hábito natural depois de tanto tempo, mas não os de Bucky… E a Feiticeira compreendia de perto o quanto os devaneios do soldado poderiam ser altos demais.  A ruiva lhe deu um sorriso vulpino em silêncio, tomando seu café do outro lado do balcão.

Sabia.

Mas não disse nada, para o sossego da Feiticeira Escarlate.

Wanda achava que o café da manhã seguiria em paz - embora não pudesse encarar Jean ou Bucky nos olhos - mas antes que a Feiticeira pudesse se distrair, um pergunta foi lançada em sua direção:

— Sabe quem mais gosta de panquecas? — Natasha se virou para Wanda, que quase pulou de susto. Se a russa percebeu, não deixou transparecer. Estava apenas as de braços cruzados sobre o balcão, parecia pensativa. — Rooskaya.

— Oh. Sim. Ela está na Ala Médica, não?

— Eu vou vê-la. — Assentiu com a cabeça, seus olhos desfocados e sua mente em outro lugar. Depois voltou ao momento presente, encarando diretamente Wanda. — Não quer ir comigo?

— Bem, James não terminou as panquecas ainda e eu…

Natasha cortou-a:

— Bucky pode levar até o quarto de Belova. Não é mesmo, Bucky?

Ele levantou os olhos para as duas, seu rosto desconfiado. Wanda sabia que a outra russa estava cansada, ferida e, pela conversa em São Petersburgo, sabia que Yelena adorava panquecas também, então nada mais justo que presenteá-la com uma dose delas feitas por Bucky Barnes, seu mentor no inverno siberiano.

E ele não conseguiria dizer não à Natasha, nem a Yelena. Só suspirou e concordou em silêncio.

Ótimo. — Pegou o antebraço de Wanda. — Vamos indo.

A Feiticeira apenas tomou um último gole de seu chá antes de ser arrastada pela base, recebendo um último olhar deveras entretido de Shuri e de Steve. Mas o que poderia fazer? Também não conseguia dizer não à amiga.

Durante o caminho, sondou sua aura de leve, pois tinha receio de que Natasha a flagrasse lendo seus sentimentos de novo, afinal, a primeira vez que fez isso com a russa tinha sido bem danoso. Aos poucos, conseguiu captar suas palpitações. Podia ver que estava ligeiramente agitada, quase preocupada… E sua mente focava-se num tom de branco perolado.

Belova.

De repente fez sentido a razão por qual Natasha quisesse trazer Wanda até ali. Geralmente as conversas, pensamentos e memórias envolvendo a outra espiã afloravam demasiado sofrimento. Culpa. Agora as duas estavam no mesmo ambiente e… Tinham que arrumar uma forma de conversar, talvez. Esclarecer as coisas, no mínimo. Wanda, uma telepata e amiga de Romanoff, poderia servir muito bem numa conversa frágil.

Natasha só queria apoio.

Yelena não estava deitada em seu leito quando a porta automática se abriu, revelando o quarto claro. Ela jazia de pé, ao lado da janela e iluminada pela cor pálida da manhã, se alongando com movimentos de ballet. Natasha adentrou o recinto e encostou o ombro na parede, em silêncio ao observá-la. Depois riu e disse em russo:

— Você não está fazendo isso direito.

— Oh, Natalia. — Afinal notou alguém no cômodo, distraída com as canções de Tchaikovsky que existiam somente em sua cabeça. Wanda inclinou o rosto, pensando em como as notas das músicas rodopiavam a mente dela, tais quais flocos numa nevasca. Yelena deu um passo à frente, apalpando o próprio ombro com uma careta de dor e ajeitando a tipoia —  Eu nunca conseguiria fazer igual você.

O sorriso de Natasha vacilou, lembranças em cacos a alfinetaram. Ela desviou da questão é mudou de assunto, adentrando mais ainda o quarto. Wanda também se aproximou, logo ouvindo o estalo da porta automática fechando-se atrás de si.

— Como está o ombro?

— Baleado. — Respondeu, sentando-se na cama. — Mas bem melhor, obrigada. 

Houve um segundo de silêncio, Natasha se sentou na beirada do colchão. A Feiticeira, ainda de pé, meneou a cabeça num aceno breve somado à um sorriso, numa forma de cumprimentar Belova, e mencionou o que Bucky havia comentado na noite anterior:

— Ouvi dizer que você vai... Vai voltar à ativa. Se aliou com Sable para montar uma equipe,huh?

Natasha inclinou o rosto lentamente para a outra, sua expressão afiada. Não sabia daquilo e pareceu cobrar de Belova sérias explicações. Como não sabia daquilo? Wanda se considerou uma idiota por deixar aquilo escapar, mas o rosto da bailarina mal se abalou.

— Esse heroísmo… — Encarou as pontas do próprio cabelo loiro, logo ajeitando-o num rabo de cavalo. Passou a contemplar fundo os olhos de Natasha e mencionou a atuação da Viúva Negra nos Vingadores, no mundo: — Essa exposição não é para mim. Prefiro algo mais discreto, já que pelo visto não consigo escapar dessa vida. Vai ser bom, suponho. Ajudar garotinhas iguais a que um dia fomos. Mulheres em zonas de guerra.

Wanda murmurou:

— Você vai ser tudo o que um dia precisei.

— Acho que... Que você sempre foi assim, Rooskaya. — Natasha disse, sua aura trêmula e seus olhos com uma vermelhidão quase imperceptível. No entanto, sem lágrimas. — Faz o certo sem os holofotes.

A despeito dos elogios e do momento doce, Yelena apenas riu.

— Eu mal acreditei quando vi notícias suas no Congresso em 2014. Anos protegendo a própria identidade para se expor daquele jeito. Seria vergonhoso para uma espiã se não fosse você. — Soltou um estalo com a língua, numa falsa desaprovação. E então suspirou, mais uma vez sentindo dor no ombro. Seu tom na frase seguinte foi nostálgico, quase em paz com o passado: — A prima ballerina nos palcos, a outra nas coxias.  Quem mais falta?

 A resposta foi uma batida discreta na porta, uma voz suave. Yelena respondeu em sua língua materna, permitindo a pessoa adentrar o quarto, e logo James Buchanan Barnes aproximou-se com uma bandeja simples no braço, trazendo três pratos com panquecas perfeitamente empilhadas. Fez menção de se despedir para deixá-las a sós, mas Wanda segurou sua mão metálica antes que partisse.

— É, fique, soldado. — Yelena deu uma garfada na massa macia da panqueca. Ainda falava em russo, sua voz pulando de consoante a outra num ritmo adorável. — E lembre Natalia quem era melhor nas missões que envolviam camuflagem.

Ele riu, já Wanda comentou que conseguia fazer feitiços de transmutação e alterar um pouco a aparência - coisa que fez Yelena comentar que seria uma ótima espiã, enquanto Natasha murmurava que isso era trapaça. Em resumo, Wanda ficou, sentou-se numa das cadeiras ali perto e também passou a falar russo, seu tom ligeiramente rouco como o vento. Conhecia o idioma pela proximidade da língua com o sokoviano, mas era diferente observar os três conversando tão à vontade. Todas as suas preocupações tolas e tão humanas dissiparam-se ao som das palavras e memórias soltas, que fluíam pelo quarto como a nevasca finalmente chegando ao fim.

O café da manhã foi mais doce que ela imaginava. Mais do que as panquecas.

 *

Não demorou muito para os X-Men partirem de volta para seu país. Havia muito o que se resolver, muito a se explicar. Partiu seu coração se despedir dos galanteios inócuos de Remy LeBeau, pois Wanda achava graça de seus poderes, seu sotaque e de seu relacionamento interessante com Anna Marie. Sair de perto do brilho poderoso de Ororo Munroe também era terrível. Scott prometeu manter contato com Steve, assim como Logan - que agradeceu os charutos da noite anterior. Wanda não conseguia olhar para Jean sem querer rir de nervoso.

Eles retornariam a aeronave de Steve à Outer Heaven assim que o próprio jato deles estivesse consertado. 

Era tarde e o céu estava branco de tantas nuvens quando seus aliados decolaram para longe. Wanda, Bucky, Steve, Sam e Natasha só puderam observar do convés naquele instante de silêncio. Yelena Belova, por sua vez, continuou em seu quarto na Ala Médica, ainda em repouso depois de tanto movimento na base.

Também não demorou para Shuri voltar para Wakanda, mas essa foi uma despedida que doeu mais na Feiticeira Escarlate. Uma nave triangular veio buscar a princesa, pilotada por uma equipe de Dora Milaje. Já tinha trocado últimas palavras com os Vingadores Secretos, mas antes de subir a bordo, ainda manca pela perna recentemente quebrada, Shuri se virou para a amiga:

— Até mais, otária.

— Até, babaca.

Wanda não resistiu em ir ao seu encontro e lhe dar um abraço apertado.

— Vou sentir sua falta.

— Seria mais fácil manter contato com você se ainda tivesse a joia kimoyo que te dei.

A crítica no tom da princesa foi nítido, o que obrigou Wanda sorrir e se lembrar que o presente de miçangas vermelhas ainda existia.

— Ei, eu ainda tenho! — Desfez o abraço e deu um passo para trás, para que seus gestos fossem mais seguros ao invocar o adereço. Se fez um breve lampejo de luz escarlate e logo a pulseira estava ali, nas palmas das mãos da feiticeira. — Quebrou depois de alguns… acidentes.

Para a surpresa dela, Shuri apenas riu.

— Pode usar só como uma pulseira mesmo,se quiser. Tomei a liberdade de fazer outra pra você, embora tenha ficado tentada em apenas lhe dar um piercing de septo. — Ela arqueou uma sobrancelha, depois tirou algo do bolso de seu casaco. Era uma pulseira que parecia normal no primeiro momento, feita de um metal escuro e leve, mas tinha uma única conta vermelha no centro. Wanda supôs que era ali que ativaria o contato com Shuri ou com Outer Heaven, assim como fazia na joia kimoyo. O que mais fez seu coração ficar morno foi o detalhe da fechadura, com uma pequena estrela de seis pontas. — Mais discreta. Não quebre dessa vez. E nem perca.

— Não vou.

Wanda a puxou para outro abraço, mas logo Shuri reclamou e se remexeu como um gato incomodado. No entanto, a Feiticeira sabia que ela não estava tão incomodada assim. Disse poucas palavras a mais e partiu em sua aeronave elegante, voltando para sua bela nação.

Ela estava mais a frente no convés, sentindo sua roupa tremular com o vento. Não trajava o mesmo sobretudo dramático que confeccionara com meio de magia, mas seu casaco vermelho era largo o suficiente para guardar a tiara. 

Girou os calcanhares para observar seus amigos do outro lado, todos tão saudosos pelas despedidas quanto a Feiticeira. Ela veio caminhando na direção deles muito lentamente, seu sorriso vacilante entregando suas intenções à Sam, o primeiro a rapidamente notar - ou o primeiro a dizer - que havia algo diferente na expressão da jovem.

— Ah, não. — Ele disse enquanto Wanda gesticulava outro feitiço para guardar seus presentes de Shuri. — A senhorita não vai embora agora. Me preparei emocionalmente apenas para algumas partidas.

— Vou voltar antes que sintam minha falta.

— Não vamos sentir sua falta se ficar.

Ela lhe ofereceu um sorriso gentil.

— Chega um dia em que os pássaros deixam o ninho, Sam.

— Você é uma coruja muito esperta. — Ele rebateu, já Natasha reclamava com Steve a recorrência daquela comparação com aves. A irritava um pouco, pois preferia ser uma aranha mortal do que um cisne. Steve teve que lembrá-la que aquela conversa inteira não fazia sentido.— Não sei como foi cair nas graças desse pato.

Bucky, quieto até então, se mostrou ofendido com o comentário.

Bucky, the Ducky.

— Você não ouviu em Wakanda, Sam? Eu sou o Lobo Branco.

— Isso é tão presunçoso quando sai da sua boca.

Natasha soltou um arquejo, Sam gargalhou. Wanda teve a bondade de se aproximar dele e abraça-lo de lado, quase como se o protegesse fisicamente do constrangimento com seu corpo menor que o dele.

— Não fale assim. Ele é uma graça.

— Wanda, ele arrancou o volante da minha mão em 2014. 

— Pare de interromper o momento. — Natasha interveio, depois usou seu tom sério. Wanda desfez o abraço com o soldado, inteiramente concentrada nas palavras  e no rosto da Viúva Negra. — Sempre mande notícias, certo? É uma ordem.

— Entendido, Natasha.

Steve deu um passo à frente, passou uma das mãos na barba e parou, apoiando as mãos no cinto. 

— Eu também ficaria mais confortável se viesse nos visitar. Aulas de artes, lembra?

— Eu não poderia ficar longe de vocês por muito tempo. — Ela sacudiu o rosto de leve, já sentindo falta deles. — São minhas auras favoritas. 

Eles não tinham como entender aquilo, talvez não completamente. Sam, com seu brilho de sol e seu sorriso enviesado, era perspicaz em captar o que Wanda sentia, mas era uma pena que não pudesse ver as cores que ela via. A Feiticeira desejava que ele pudesse ver o amarelo de sua aura, tão próspera, tão leve… Era como o jazz que ele tanto escutava.

Natasha chegava perto também. Rosa, doce, letal. A pureza do branco, a violência do vermelho. Ah, Natasha a entendia muito bem, mesmo sem enxergar tudo. Talvez Steve  também estivesse próximo daquele entendimento, com o azul intenso de seus contornos e de sua compreensão.

Sorriu.

Tantas cores que ela havia visto e sentido até aceitar o vermelho e o caos dentro si. Agora, ele rugia… Com saudades.

E então veio a escuridão de James Barnes, acolhedora, calma, profunda. Ele deu um passo em sua direção, quieto enquanto um sorriso de canto crescia em sua boca. Wanda tentou não pensar no momento secreto dos dois, falhando miseravelmente. Ele pensava naquele momento também. Estendeu as mãos para poder soldado, que retribuiu e segurou-as em resposta. James, mais que todos, entendia que ela iria voltar.

— Até mais, boneca.

Wanda comprimiu os lábios, franziu a testa. Mal acreditava como seu coração ficava calmo em sua presença, ao mesmo tempo em que transbordava. Seu James, seu amante. Desfez o enlace com as mãos para poder segurar o queixo dele e beijá-lo primeiro com vigor, depois com gentileza.

— Até, James.

Ouviu-se um assovio.

— Não vou dizer que estou surpresa, mas… — Natasha fez uma careta e trocou um olhar com Steve, em seguida encarou-a. — Menina.

Sam gargalhou novamente, enquanto Bucky passava a mão pela barba, sem graça. Wanda nada fez senão abraça-lo mais uma vez, enterrando o rosto no seu peitoral morno. Jurava ter um ouvido um “parabéns” sussurrado de Steve para seu melhor amigo.

— Ah, é. Você não viu o beijaço que ela deu nele lá na batalha? 

— Isso aconteceu e eu não vi? Um ultraje. — A russa reclamou da revelação de Sam, depois seus olhos se fixaram num ponto mais adiante do convés. — Ei, aquilo é um gato?

Wanda e Bucky se viraram para o ponto indicado e responderam em uníssono:

Ebony.

O corpo esguio do felino vinha caminhando da beirada do convés em direção ao grupo. Não disse nada, o que fez a feiticeira ficar um tanto quanto… desconfiada. Embora também entendesse que ele estava lá apenas para acompanhá-la, não para levá-la a força. O gato, amargo de vez em quando, havia dito que não a deixaria sozinha… E tal promessa era reconfortante. Esperou até que ele chegasse perto e roçasse com o focinho em sua perna para pegá-lo no colo.

Steve se indagou como que o gato teria chegado até ali, mas Natasha ignorou a questão e acariciou um ponto atrás das orelhas dele.

— É o bichano falante que James e Sam tanto fofocaram? — Ergueu as sobrancelhas, nada impressionada com o ronrom dele. — Mentirosos. Não sei como cai nessa, ele é bem normal. Será que conhece o Liho?

Ebony abriu bem o seu par de olhos amarelos antes de responder:

— E o que te faz achar que não conheço ele?

Natasha recolheu a mão.

Wanda soltou uma risada falsa para aliviar o clima, segurando o gato preto enquanto caminhava devagar para trás. Xingou-o mentalmente, mas ele não ligava para ofensas comuns - o que deixava a feiticeira mais brava ainda. Encarou-o bem, ciente que ele captaria seus pensamentos:

“Para quem sabe o peso das palavras, você consegue ser bem inconveniente, seu gato tonto”

“Mais um de meus charmes irresistíveis, bruxa boba.”

Sam pigarreou. 

— Então… Vai ficar fuzilando o gato mesmo?

É claro que ninguém havia ouvido nada e a imagem de Wanda encarando o bichano com uma careta era deveras… Estranha. A Feiticeira suspirou ao ver que Nat e Steve seguravam o riso, mas ao menos Bucky a olhava com carinho, acostumado com esquisitices envolvendo ela e o gato.

— Hã, acho melhor ir agora. — Disse, luz escarlate faiscando em seus olhos e em torno de seu corpo. — Já sabem o que fazer se precisarem de mim.

Lançou uma última piscadela para James Barnes, que retribuiu com um sorriso de canto. 

Ele sabia, afinal. 

Era só seguir a cor escarlate.


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Notas finais do capítulo

*Talvez vocês tenham notado certo tom de despedida nesse capítulo e é verdade. Vazios tá chegando ao fim... Agora veremos uma breve aventura da Wanda em Wundagore e eu imagino que vá levar no máximo uns 10 caps.
*Se notarem algum erro de continuidade, me avisem! Fiquei um tempo sem escrever e posso ter me confundido com uma coisa ou outra.
*O capítulo foi revisado, mas existe a possibilidade deste arquivo ser sabotado pela HYDRA. Caso encontre algum erro, favor reporte à Shalashaska.