O Rebelde de Ferro escrita por ValentinaV


Capítulo 7
O homem mais miserável


Notas iniciais do capítulo

Eu quero agradecer muito a nossa princesa Mizinha2, que fez uma linda recomendação dessa história. Sinceramente, eu precisava desse ânimo para continuar. Obrigada pelas maravilhosas palavras. Incentivaram-me muito!
Gratidão ♥



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Se me perguntassem em que arma eu sou melhor, diria “espada” na hora.

Claro que florete e sabre também estavam inclusas em minha lista.

Para a competição ir mais rápido, fizemos duas lutas ao mesmo tempo, valendo “melhor de três”. Amora, porém, ficou sentada assistindo enquanto os garotos se digladiavam de forma civilizada por alguma atenção dela.

Quando chegou a minha vez de lutar contra Josh – que tinha ganho as últimas três lutas seguidas – vesti o uniforme sem ajuda e subi no palco, sabendo que dali ninguém mais me tiraria.

Os erros de Josh eram grotescos e eu não sabia como ele vencera três vezes seguidas, mas o tirei da luta rapidamente. O próximo veio, e depois mais um, e mais outro. Um por um, eliminei todos os concorrentes até que eu fosse o vencedor que iria competir com o outro vencedor que lutava paralelamente a mim.

Como ele já estava vestido, não pude ver seu rosto. Pensei que teria outra vitória fácil, mas assim que começamos, o oponente me deu um golpe tão rápido que fez um a zero sem termos chegado a cinco segundos de luta.

Endireitei minha postura e respirei fundo. Só havia visto aquele tipo de golpe em meus treinamentos na Facção, e de certo não eram comuns em academias de esporte ou em competições estaduais. Aquela estratégia significava que quem quer que estivesse atrás da máscara tinha muita habilidade com a espada e que faria o que fosse para vencer, inclusive ferir o oponente.

Eu sabia disso desde os meus cinco anos, as múltiplas estratégias corriam por minhas veias desde cedo.

Partimos para a segunda tentativa. Agora eu já estava precavido e venceria.

Fui para trás rapidamente quando ele quis me atingir na perna. Típico de quem quer vencer no susto, de quem é impulsivo. Girei minha espada e bati na dele, forçando que recuasse.

Trocamos golpes por muito tempo, até que eu começasse a suar e a ter os dedos endurecidos e doloridos, de tantos movimentos repetitivos que faziam. Eu nunca ficara daquele jeito, a não ser quando treinava com Eduardo, o melhor esgrimista do país e braço direito do meu pai.

A cada golpe a minha curiosidade aumentava, mas junto com ela, um alerta de perigo. Quem estava atrás da máscara? Poderia ser alguém infiltrado da inteligência de Ilea, ou poderia ser um membro de outra Facção. Ambas as possibilidades não me deixavam em um bom terreno, ou havia alguém do governo me observando, ou outra Facção queria dar um golpe, e se nós, da Facção Vermelha, não sabíamos disso, significava que a outra facção não cooperaria.

Pisei em falso e quase levei um golpe. Eu precisava me concentrar mais.

O barulho ao redor começou a aumentar, a cada minuto que continuávamos lutando. Não conseguia identificar o que gritavam, mas sabia que os outros caras estavam torcendo por mim e pelo meu oponente.

Finalmente consegui uma brecha na postura daquele cara e dei meu golpe perto da virilha. Uma zona perigosa, pois poderia ser falta, mas não chegou a ser.

Endireitei-me novamente e dei uma rápida olhada para a princesa. Ela tinha os olhos grandes mais arregalados que o normal, e sua boca ligeiramente aberta mostrava certo fascínio pela luta, talvez um pouco de descrença também.

No último ponto, porém, quando o guarda anunciou o início da luta, ouvimos um barulho de explosão do lado de fora.

Tirei a máscara ao mesmo tempo que o meu oponente.

— Shang? – perguntei totalmente descrente.

Ele me olhou assustado.

— O que foi isso?

Os guardas começaram a correr em suas formações, e três deles se colocaram ao redor da princesa, ao mesmo tempo que a levavam para os fundos do ginásio.

Os candidatos entraram em pânico e começaram a se empurrar e se puxar para saírem dali, típico comportamento de manada. Eu e Shang descemos as escadas do palco e começamos a ir em direção a dois soldados, que sinalizavam para corrermos para os fundos também.

— É um ataque! – Shang gritou – Só pode ser!

Eu ainda não acreditava que era ele com quem eu estava competindo há segundos atrás.

— Quem é você? – eu perguntei enquanto corríamos – Como sabe lutar daquele jeito?

— Meu tio me ensinou! – ele disse, e se virou para trás – Oh meu Deus!

Acompanhei seu olhar e vi um bando de homens encapuzados entrarem. Olhei para o lado onde Amora estava sendo levada, mas os guardas não haviam a escondido a tempo suficiente, e os invasores começaram a correr em direção a ela.

Os candidatos se embolavam e corriam para as arquibancadas, procurando as muretas para se esconderem.

Eu não entendia o que gritavam, mas sabia que não era ninguém da Facção Vermelha.

Mudei de direção fui até um portão lateral que estava aberto. Shang me acompanhou, enquanto perguntava o que diabos eu fazia.

— Se não prestou atenção, há três guardas com a princesa e mais de trinta caras indo atrás deles! – eu gritei enquanto ia mais rápido ainda para a direção da saída por onde a princesa deveria aparecer se não fosse pega antes – Chegaremos mais rápido por fora!

Até então, eu não havia ouvido nenhum barulho de tiro, mas quando eles começaram, não pararam mais. Meu coração batia tão rápido que eu achei que poderia enfartar enquanto corria.

— Não consigo te acompanhar! – o oriental disse bem atrás de mim – Mas estou logo aqui! Cuidado com os tiros!

Ainda empunhando a espada, cheguei na esquina do ginásio e virei, praticamente ao lado da saída que a princesa deveria aparecer.

Olhei por dois ou três segundos ao redor, calculando nossa rota de fuga mais segura e sem levar tiros. A poucos metros o terreno fazia um grande declive que parava apenas na lagoa de criação de peixes do castelo. A queda devia ser o suficiente para quebrar algum membro, mas não nos mataria. Ao menos era o que eu esperava.

Cheguei ao portão e vi apenas um soldado correndo com a princesa, quase chegando em mim, quando de repente, dois tiros disparados fizeram-no cair no chão morto.

A princesa gritou, mas não parou. Os invasores estavam a não mais que três metros de distância dela quando passou pelo portão e eu a empurrei para frente, agarrando sua nuca e um de seus braços para que ela se abaixasse mas não caísse.

Corremos cinco passos assim, até que vários tiros dispararam atrás de mim. E provavelmente teriam me acertado em cheio, se eu não tivesse despencado alguns metros até a água, junto com Amora.

Quando a água gelada entrou em meu uniforme e me fez afundar mais ainda pelo peso, pensei imediatamente em Shang, que ficara para trás. Esperava profundamente que ele tivesse se escondido.

Um pouco desnorteado com a água escura e lodosa, tentei nadar para cima, mas uma mão agarrou minha perna e me puxou para baixo. Droga, eu tinha soltado a princesa durante a queda e ela estava tão perdida quanto eu.

O ar preso em minha boca já havia saído totalmente e meus pulmões começavam a reclamar. Fui puxado novamente para baixo e resolvi encolher-me até encontrar a mão dela, para desgarra-la de meu tornozelo. Eu não enxergava nada, só podia me mover pelo tato.

E foi então que um pensamento sombrio passou pela minha cabeça, quase como uma cobra, uma víbora prestes a matar sua presa:

Eu posso matar a princesa aqui mesmo.

Tirei a mão dela de mim.

O ataque será em nome daqueles invasores e a Facção Vermelha não terá que sujar o nome dessa forma.

Comecei a soltar seus dedos dos meus.

O rei e a rainha serão pegos e eu chamarei a Facção para acabar com quem sejam esses invasores. Nosso número é bem maior.

Seus dedos tentaram agarrar os meus em uma última tentativa. Eu estava matando a princesa.

Tão fácil.

E foi então que seus grandes e inocentes olhos azuis apareceram em minha visão. Tomei um susto, pois tudo estava escuro, e ela já estava longe o suficiente. Aqueles olhos estavam dentro de minha mente.

"Foi o destino outra vez – ela me interrompeu, com inesperada sinceridade – Ele anda me pregando peças ruins ultimamente, mas estas duas realmente foram boas."

Uma pontada cravou meu coração, diminuindo-o até virar migalhas. Que tipo de monstro eu era? Ela não podia morrer. Ela não tinha nada a ver com as decisões dos pais dela, e embora eu tivesse sido treinado para passar por cima de algumas pessoas para conseguir o Bem Maior de Ilea, eu acabara de descobrir que não poderia matá-la. Dei um impulso para baixo, às cegas, e estendi meu braço até encontrar uma mão inerte.

Quando a puxei, o corpo da princesa, totalmente inerte, veio para cima e eu comecei a bater as pernas, com os resquícios de força que eu ainda tinha.

Minha cabeça latejou novamente, e com um movimento involuntário meus pulmões puxaram água para dentro. Abri a boca e puxei mais água, tentando escapar da morte.

Debati-me para cima mais duas vezes. E na segunda vez, minha cabeça irrompeu no ar livre, e eu não sabia se cuspia água ou puxava o ar para dentro. Ergui a cabeça da princesa para fora, mas ela já não se movia. Não consegui equilíbrio para sentir sua respiração, então bati em seu rosto algumas vezes e puxei-a para a margem a poucos metros dali.

Empurrei o corpo dela para a terra e arrastei-me até cair em cima dela, sem forças. Seus lábios estavam roxos e seu peito não se movimentava.

Apertei suas delicadas narinas com força, e abri sua boca com a outra mão.

Encaixei minha boca em seus lábios gelados e empurrei todo o ar de meu pulmão. Soltei sua boca e seu nariz e juntando as duas mãos em seu peito, pressionei em ritmo de reanimação cardíaca. Eu treinara isso um milhão de vezes na academia da Facção. Tinha que dar certo.

Alternei a reanimação para outra lufada de ar em sua boca.

Voltei a fazer a reanimação. Na terceira vez, quando eu começava a pensar em me matar por ter feito aquilo, o peito de Amora subiu com força e ela cuspiu água, engasgando-se e tentando respirar sozinha. Seus olhos se arregalaram e seu corpo tentou virar para o lado. Saí de cima dela, e ela virou a barriga para baixo, cuspindo ainda a água que tinha engolido.

O barulho que ela fazia por estar engasgada era lancinante.

Apoiei uma mão em suas costas dando alguns tapinhas na região de seus pulmões.

— Feche a boca e tire a água que está nas narinas – eu sussurrei, não conseguindo falar mais alto que aquilo.

Ela expirou o ar com força pelo nariz e gemeu. Aquilo ardia muito, eu sabia, mas ela tinha de fazer.

Ainda de costas para mim, Amora tossiu mais vezes. Sua pele começava a manchar de roxo, e o braço em que ela se apoiava tremia assustadoramente.

— Precisamos sair daqui – eu disse olhando para cima. Felizmente não havia ninguém no topo da encosta por onde caímos, mas ainda restavam muitas dúvidas sobre o que havia acontecido no castelo – Vamos.

Levantei-me um pouco tonto, mas não perdi tempo em puxar a princesa pelos braços. Ela ainda estava de costas para mim, mas quando conseguiu firmar os pés no chão, seu rosto se virou e seus olhos cheios de gratidão fizeram com que eu me sentisse o homem mais miserável do mundo.


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Notas finais do capítulo

"O homem mais miserável do mundo sou eu."



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