Ainda de noite, após supostamente morrer, Dylan acordou. Vários olhos o olhavam de cima. Ele se via em um ambiente levemente iluminado, era estranho, pois era como se os vagalumes se concentrassem mais naquele local. As árvores também pareciam brilhar mais, dando uma agradável visibilidade do que estava ao seu redor. Do lado de Dylan estavam cinco elfos, sendo que dois eram fêmeas. Sentia uma certa dor de cabeça, e uma sensação estranha por dentro. Mas apesar disso, se sentia mais poderoso por algum motivo. Ele olhou com certa gratidão para os elfos, esperando algum dizer deles.

— Fazia tempo que não víamos um humano por aqui. Não um vivo. -  disse o Elfo mais próximo.

— Vocês salvaram minha vida. Sou grato à vocês por isso. - respondeu.

— Apenas te acordamos. O que aconteceu à você? - perguntou o Elfo.

— Um homem com...

Nesse momento Dylan se surpreendeu com a reação dos Elfos, que imediatamente começaram a se encarar com certa surpresa.

— O que foi? - perguntou Dylan.

— Um homem? Humano? Só existem três na extensão dessa grande e admirável floresta, contando com você. - contou o Elfo.

— Ele carregava uma espada negra. Fez pouco de mim, da minha motivação de vingança. E eu não conseguia sentir a presença dele, o que me faz pensar que ele é nascido de outro reino. Mas mesmo assim, ele afirmava ser irmão de minha falecida mãe. - respondeu Dylan.

— Então ele ainda vaga por aí... isso é bom. Existem muitas histórias por trás dessa floresta. Dificilmente você tem mais ódio no coração do que o homem que se encontrou. Não faço a mínima ideia de quem tenha sido sua mãe, ou de quem seja você. Mas sabemos toda a lenda sobre ele, e... bem, é a mais obscura que já ouvimos. - contou o Elfo.

— Um invasor que conseguiu se infiltrar nas fronteiras de nosso gigante reino? - perguntou Dylan.

— Sente-se, menino... vou te contar uma história de horror. Uma história que explica de um jeito bem mais macabro o fato de você não ser capaz de o sentir. Pois ele é desse reino sim. - disse o Elfo.

Dylan apenas olhava com atenção.

— Há séculos atrás, a floresta Melrir tinha humanos, elfos, trolls e goblins. Todos viviam em certa paz, apesar dos Trolls serem sempre desordeiros. Todos conseguiam se alimentar normalmente, e treinar suas capacidades místicas. Porém, os humanos que viviam nas grandes cidades, sempre gananciosos, passavam aqui para coletar o máximo de recursos apenas para enriquecer e levar para cidade da qual você veio, Mihard. Mesmo nossa mãe natureza sendo generosa, começou a faltar comida e plantas mágicas. Nossas crianças começaram a morrer de fome, e eles não paravam pois não faziam diplomacia graças ao seu poder bélico. Aqui, existia somente um clã de humanos, que discordava das ações da nobreza da cidade de Mihard, e não queriam se submeter à eles indo morar em suas dependências. Consequentemente, faltaria recursos para eles também. Foi quando os goblins, espertos como sempre, fundaram uma união entre tal clã, eles e os Trolls. Nós apenas nos comprometemos a cuidar das informações, já que somos seres de paz. - contou o Elfo.

— Prossiga. - disse Dylan, olhando perplexo.

— Juntos, invocamos uma magia que avisa todo mundo que está a no máximo 300 metros, sempre que alguém adentra na Floresta. Com isso, conseguiram patrulhar qualquer tropa, e assassinaram todos humanos que entravam na Floresta, com exceção do clã que já vivia aqui e participou da união. Mihard mandava mais tropas, só que o clã era muito forte, e a força dos Trolls combinadas com as ilusões dos Goblins também eram, principalmente a medida que aprendiam as táticas de combate com o tempo. Até que os humanos desistiram da Floresta, e conseguimos voltar a viver em paz. Só que de uns anos pra cá, aconteceu algo aqui dentro. Algo que se originou a maior lenda da história da floresta de Melrir, uma história de vingança. Uma história de terror, só que real. Os Goblins, como sempre se consideraram os mais espertos, e são gananciosos como humanos, se viram ameaçados. Para eles, os humanos da união poderiam facilmente tomar o poder da Floresta, no futuro, pois isso faz parte da natureza humana, segundo eles. Então, eles roubaram um menino em segredo, e começaram a treinar ele utilizando todo conhecimento que haviam reunido, não só sobre outros humanos, mas sobre nós e sobre os Trolls também. Fizeram isso para obter um poder bélico maior e alguém de confiança dentro do clã dos Humanos, para os pegar de surpresa. Se fosse somente eles e os Trolls aniquilar os humanos, perderiam. É aí que começa a lenda. - contou o Elfo.

Dylan já imaginava que os Goblins conseguiram exterminar os humanos da Floresta, já que só existiam três no momento.

— Dentro dos clãs dos humanos, existiam duas crianças consideradas prodígios. Mesmo sendo muito novos, eles já manuseavam espadas e dominavam o estilo de luta daquele clã. Um se chamava Elder, e outro se chamava Thi. Os pais deles eram desafetos, mas ambos nutriam uma amizade, por mais que tudo favorecesse uma intensa rivalidade entre eles. Elder era um ano mais velho que Thi, e por algum motivo era mais arrogante, talvez por se sentir na obrigação de ser mais forte e honrar o seu pai que era o mais ressentido. Mas ele não demonstrava isso, preferia preservar a amizade. Enquanto isso, Thi apenas treinava para melhorar a si mesmo, não por competição. Mas tinha a personalidade forte, nunca abaixava a cabeça dele, mesmo sendo mais novo. E por isso, parte do clã torcia para ele de certa forma. Sei lá, achavam legal. Até que certo dia, aconteceu.

— O que exatamente aconteceu? - perguntou Dylan.

— Os Goblins armaram uma armadilha. Eles utilizaram plantas ilusórias avançadas para causar um confronto entre os dois garotos, e todo o clã assistiu para ver quem ganhava. No fim da batalha, o mais novo saiu vitorioso, e o outro, Elder, não soube lidar com isso. O pai de Elder ficou extremamente irritado e renegou seu próprio filho, passando a dar mais atenção e treinamento para seu outro filho. Foi quando os Goblins atacaram, eles foram até a Elder, o capturaram fora das dependências de seu clã. Ele estava andando na Floresta junto com Thi, e ambos tentaram resistir, porem perderam a luta. Thi ficou completamente ferido e perdeu a visão nos dois olhos. Já Elder, foi levado por eles. Contaram o plano deles para dominar a floresta Melrir, e que o haviam escolhido para ser seu principal guerreiro, que vai viver em fartura junto com os Trolls, e obter poder ao ponto de ser o mais forte da Floresta. Reconheceram ele, disseram que ele tem mais potencial que seu amigo Thi, enfim, fizeram tudo que ele queria e o manipularam perfeitamente.

— E os humanos não fizeram nada? - perguntou Dylan.

— Quando encontraram Thi, acreditaram que aquilo foi obra de Trolls renegados. Não acreditaram em sequer uma palavra que o garoto disse, pois já havia sido "passada a informação" na união que Trolls renegados tinham roubado alguns feitiços ilusórios para se disfarçar e criar uma briga entre Goblins e Humanos. Ficou por isso mesmo. Thi ficou cego, mas não parou de treinar. Pode parecer absurdo, mas ele conseguiu desenvolver seus outros sentidos ao ponto de que se tornou o mais forte do clã dos humanos, e continuou fazendo jus ao seu título de prodígio, mesmo cego. Ele formou uma família, e se tornou o futuro líder do clã. Ele sempre dava valor aos laços, então a família era tudo pra ele, especialmente sua filha. Mas não adiantava, ele nasceu pra luta, mesmo cego, era um monstro em batalha. Ele carregava em suas veias o sangue de uma família originária do norte oriental do reino, tradicional em combate. Thi não era mais conhecido pelo seu nome, mas sim por Lobão, graças à sua maestria em seu estilo de combate antigo, chamado Lobo Solitário. Enquanto isso, os Goblins e Trolls treinavam Elder com toda intensidade e conhecimento que tinham. Até o dia em que ele completou 25 anos, era o dia de dizimar os humanos, e tornar a floresta limpa dessa raça. - contou o Elfo.

— E o que aconteceu? - perguntou Dylan.

— Os Goblins armaram uma armadilha para Lobão deixar as dependências do clã. Disseram existir o conjunto principal de Trolls Renegados, com um total de 10, o que é um número alto. Ele foi sozinho e deixou os guerreiros restantes protegendo as dependências. Quando Lobão chegou lá, era uma armadilha, para a decepção dele. Estava boa parte dos Trolls da elite de combate que existem na Floresta, um total de 50. Enquanto isso, Elder e todos os outros invadiram as dependências do clã dos humanos, dizimando todos, e o único que ficou lá foi Elder, para o caso de Lobão ter sobrevivido. E foi o que aconteceu, pois ele, furioso, assassinou toda a divisão de elite de combate dos trolls, sozinho. E voltou caminhando, todo ferido, de volta para o território de seu clã. - contou o Elfo.

— E então eles se enfrentaram? - perguntou Dylan.

— Sim. Quando Lobão chegou lá, encontrou todos mortos, cheiro de sangue e vibrações de pura morte. Ele experimentou o terror de presenciar tudo que ele tinha, inclusive sua filha, sendo arrancado brutalmente dele. Foi quando Elder, feliz, tomado pela maldade, se revelou para ele. E disse que estava na hora da revanche, perguntou se é bom ter seus sonhos arrancados de si. Só há uma pessoa nessa floresta que sabe a sensação de não poder chorar lágrimas, por não ter olhos, mas no lugar de lágrimas, naquele dia ele chorou sangue. E partiu com tudo, mesmo ferido e com o braço quase caindo do corpo, para cima de Elder. Por mais que tenha deixado uma cicatriz gigante no meio do rosto de Elder, Lobão perdeu aquela luta, e foi assassinado por Elder. Não conseguiu vingar sua família. Ele morreu, e nós encontramos o corpo dele depois. Foi quando passamos a nos esconder, para evitar sermos escravizados pelos Trolls e Goblins.

— Peraí, como assim ele morreu? Ele está vivo. Eu vi ele. - contestou Dylan.

— Essa é a parte assustadora da lenda. Pois no dia seguinte, o corpo de Lobão não estava mais lá, pelo contrário, existia um boneco de Voodo do Elder todo destruído no lugar do corpo dele. E a aura daquilo era demoníaca, dos níveis mais profundos do inferno. A lenda diz que o ódio que cresceu no coração dele foi tão grande, mas tão grande, que não restou nada em sua alma, além do desejo de vingança. Aquilo superou, e muito, qualquer amor que ele tinha pela sua família e sua filha. Ele só queria ver morte, só queria ver os Goblins e o Elder morto. O que dizem é que aquilo foi tão intenso, que o próprio demônio subiu das profundezas do inferno para ir de encontro com ele, interessado naquele sentimento. Haviam animais estraçalhados por toda volta do boneco de Voodo. Ele fez uma oferta para Lobão. Ofereceu uma saída. Ofereceu mais uma chance. Disse que poderia reviver ele, dar uma nova vida, não só isso, mas devolver à ele a luz de seus olhos. Em troca disso, Lobão daria à ele sua alma, e não só isso, mas traria a de Elder para ele, e então ele poderia levar os dois para o lugar mais escuro e fundo da morte, um lugar onde Elder seria eternamente torturado, e Lobão se tornaria um demônio. Ele aceitou. Por isso você não consegue sentir ele mesmo ele sendo desse reino, Dylan, Lobão não está exatamente vivo. A espada negra dele tem a capacidade de matar e trancar a alma da pessoa no inferno por 10 anos, foi um dos presentes do capeta. - disse o Elfo.

— Não fala assim. Eu tenho medo dessas coisas. - disse Dylan.

— Enfim, ele vive para a vingança. A única razão dele ainda estar aqui, é a morte de Elder. Com sua visão de volta, ele ficou muito mais forte do que antes, justamente por ter se acostumado a lutar cego durante toda sua vida. É como se tivesse tudo sido um treinamento absurdo. Enfim, é incrível que esteja vivo. Desde que soubemos dessa lenda, nós esperamos, com esperança, que um dia ele seja capaz de matar Elder e os Goblins parem de tentar dominar a floresta para si... nosso maior desejo é experimentar um mundo como era há séculos atrás, onde havia paz. Bom, pelo menos agora você conhece o que é uma história de vingança de verdade. - disse o Elfo.

Dylan estava perplexo com aquela situação, mas não sabia o que fazer. Foi quando ele lembrou que havia comido a maçã. Era o momento perfeito para perguntar o que diabos ele tem.