Aprendendo a Mentir escrita por Starsky


Capítulo 40
Capítulo 39 — Sr. e Sra. Malfoy.


Notas iniciais do capítulo

Eu estou no gás! On fire! Sabem o que é isso? Era a ansiedade em mostrar os Malfoy FINALMENTE! Às vezes o Scorpius pensa um pouco nos pais e tem algumas memórias, mas finalmente eles estão dando as caras hahaha. Estou ansiosa para o que vão achar!
Boa leitura!



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Capítulo 39: Sr. e Sra. Malfoy.

Rose

 

Os Weasleys passavam o Natal nA Toca.

Quando era menor, Rose achava honestamente que essa tradição ia parar logo após o falecimento do Vovô Weasley e que iriam levar a Vovó Weasley para a casa de Tio Harry ou para a sua. Não foi bem assim. Mais do que nunca, os Weasleys fizeram questão de se unir no período de Natal e enfurnar todos de uma só vez em qualquer buraco que a casa possuía.

Ela havia sido reformada, mas nem por isso tinha mais espaço. Resultado: Rose, Roxanne, Dominique, Lily Luna, Molly e Lucy dormiam quase empoleiradas num quarto, enquanto a sala distribuía de forma quase assustadora todos os netos homens. James geralmente dormia com uma perna em cima de Fred, que roncava alto e deixava o sono de Albus inquieto, que, por sua vez, lutava contra Hugo com socos e chutes.

Hugo raramente dormia. Voltava para casa com olheiras imensas e um péssimo humor. A única coisa que o fazia gostar mesmo dos feriados nA Toca era o tricotar com a vovó Weasley. E Rose sabia disso… Tanto que não o deixou em paz.

— Por favor, por favor, por favor. Olha, eu já falei "por favor" três vezes, o mínimo que você podia fazer era me escutar!

Hugo fez uma careta e continuou andando em direção ao jardim.

— Mãe! Diz pra Rose parar de encher o saco!

Mas antes que ele pudesse cruzar a porta, foi puxado pela orelha com vários gemidos de "au au au". Rose o levou com os dedos prensando o lóbulo na direção da cozinha e só soltou o irmão depois que cruzaram com tia Angelina e seu pai, que prendiam alguns enfeites acima da guarnição.

— Sabia que não é assim que se pede um favor a uma pessoa?! — resmungou o menino ruivo, massageando a orelha. — Doeu  poxa!

— Eu pedi com toda a delicadeza, você que já estava querendo negar antes mesmo de eu dizer o que era o favor. — Rose cruzou os braços acima dos seios e ergueu uma sobrancelha. — Vamos lá, Hugo! Sabe que vai amar me dizer que não estou dando os pontos direito nem falando corretamente os termos.

Hugo ia dizer algo, mas o pai deles passou ao fundo, gargalhando gritando para fora com uma gargalhada:

Mione! É Leviosa, não Leviosá!

Os dois irmãos se entreolharam com as expressões franzidas e deram de ombros. Às vezes Ron Weasley podia ser bem estranho com suas referências ao passado obscuro dele. Rose apenas esticou o pescoço para se certificar de que o pai tinha ido embora para suspirar e voltar a falar com Hugo.

— Por favor.

— Tricô não é para aprender de um minuto para o outro — disse seriamente, também cruzando os braços, imitando-a como um espelho. — Fora que eu te conheço, você é teimosa demais para seguir minhas instruções. Por que não pede para a vovó?

Porque Rose achou que seria uma boa ideia passar um tempo com seu irmão, mas nunca diria isso em voz alta.

— Porque a vovó já está ocupada demais com as coisas para o Natal. Vamos, Hugo! São cinco dias, não cinco minutos!

Ele balançou a cabeça, mas suas orelhas ficaram vermelhas ainda assim. Estava pensando! Isso!

— Vai ter que prometer não implicar com nada que eu explicar.

— Juro solenemente não dizer nada de mal. — Rose balançou rapidamente a cabeça.

— E se não terminar a tempo, a culpa é sua.

— Prometo não falar da sua incapacidade como professor.

— Três vacilos, e você está fora — sentenciou com os olhos pressionados.

Rose abriu a boca, hesitou e soltou os braços. Acabou assentindo. Era por uma boa causa.

— Começamos hoje à noite? Há algo que preciso fazer antes.

— Que precisamos! — A voz de Roxanne ecoou bem alta, assim como resmungos e grunhidos.

Entrando pela cozinha, lá vinha Albus sendo arrastado pelo pulso por Roxie. Ele xingava em murmúrios, resmungava e praguejava mais coisas do que Rose já havia escutado antes. Hm! Sempre bom aprender novas formas de brigar com alguém.

— Eu não vou me meter nisso — disse Hugo, jogando os braços para cima. — Sete horas, na lareira. Se atrasar, eu não ajudo mais, Rose!

Ela sorriu animada para Roxanne, que assentiu enquanto Hugo saía da cozinha. Lá estavam os três primos sozinhos novamente.

Era claro como faltava o quarto elemento daquele grupo.

— Eu não quero conversa com a Rose — brigou Albus, ainda sem conseguir se soltar de Roxie e recusando-se a olhar para ela. — Ela sabe o que fez e não há nada que possa fazer para me convencer a-

— Eu preciso pedir desculpas a ele. — Rose foi para a frente de Albus, forçando-o a encará-la. — Eu sei que errei, então preciso dizer tudo o que sinto por ele, Albus.

Os olhos do Potter a encararam furiosos ainda. Era raro vê-lo tão intenso com chateação e raiva, podia sentir a diferença entre seu jeito com ela e como ficou quando brigou com Scorpius tanto tempo antes. 

Porém, naquele instante, também havia algo um pouco mais brando surgindo calmamente. Albus estava magoado com ela, no entanto era tão raro ver Rose admitindo os próprios erros que algo até mesmo o abrandou.

— O que aconteceu, Rose? — Albus umedeceu os lábios e suspirou. — Você tem noção de como ele ficou?

Roxanne soltou o braço de Albus e apoiou a cintura numa das bancadas da cozinha, falando:

— Não o poupe de detalhes, não importa quais sejam, querida.

Foi necessário fechar a porta da cozinha para contar tudo. A história era longa demais para ser dita sem medo de outras pessoas chegarem. Com tanta gente distribuída nA Toca, era até difícil que isso não acontecesse em certo ponto.

Mas não foram interrompidos.

Rose explicou como fez com Roxanne, destrinchando menos sua dor e suas dúvidas. Roxie ficou calada em toda explicação, assim como, por um milagre, Albus também. Observaram e escutaram sobre o dia do resgate em Hogsmeade, sobre os sentimentos de Rose, sobre o nervosismo com a aparição de Jasper e sobre a decepção que foi o reencontro com ele.

Jasper Wood foi, por tempo demais, a pessoa que Rose mais admirava. Ele era inteligente, bonito, charmoso e determinado. Todos gostavam de estar perto dele. Rose amava! Sentia-se importante quando dizia que ela era linda e inteligente demais, mais que ele. Mas o deslumbre foi se desfazendo devagar, feito véu levado pelo vento. E quando ele foi grosseiro com Scorpius, Rose teve real dimensão de que não queria estar com ele ao seu lado.

Quem ela queria de verdade foi uma descoberta maravilhosa.

— Não estou culpando Jasper…

— Mas a culpa é dele — interrompeu Roxanne num assobio.

Rose ergueu o queixo, imbuindo-se da coragem e do orgulho que sempre teve para voltar a falar:

— Eu não voltei e me arrependo disso. — Calor corria pelas suas veias. — Se pudesse refazer meus passos naquela noite, eu sequer o teria deixado. Albus, você precisa entender e me ajudar porque Scorpius...

— Scorpius está arrasado.

— Essa é a semana de interromper Rose Weasley?! — rosnou ela, virando o rosto para Roxanne, que ria. — Certo. Boa Rose. Boa Rose não briga por bobagens.

Precisou respirar fundo para se voltar novamente em direção ao primo. Albus podia ser tonto, mas não era uma pessoa ruim. E ela estava tentando mostrar que também não era. Se ele acreditasse nas suas palavras, havia alguma chance de Scorp também acreditar.

— E quanto a Jasper… — Ele pausou um segundo e deu um meio cuspe sem graça no chão. — E você se beijando?

A cara de Rose se contorceu em níveis que ela sequer achava que eram possíveis.

— Isso foi terrivelmente nojento. Sabe que a vovó vai esfregar seu rosto no chão para limpar, não sabe?

— Ele está imitando Nate Parkinson — disse Roxanne com uma risada. — Nate odeia o Jasper.

Nojento. Mais do que nojento, foi ridículo. Ainda assim, precisou espanar o vento na frente de seu rosto para espantar aquele pensamento e voltar o foco ao assunto original.

— Vou contar sobre o beijo. — Olhou para Roxie, que assentiu com a cabeça. — Nós temos chance ainda de...

— Não pode contar a ele.

Quase mecanicamente, os rostos de Rose e Roxanne se viraram para Albus.

— Isso é um péssimo conselho. — Roxie balançou a cabeça. — Não. É melhor contar.

— Significou alguma coisa? — Ele encarou Rose com seriedade. — Porque Scorpius é um cara mais sensível do que parece. Se ele descobrir que você e o Wood se beijaram, pode pensar que só está voltando atrás dele para ter os dois na palma da mão.

Aquela linha de raciocínio parecia com a de Jasper, como se Rose só quisesse mesmo a atenção e não necessariamente estar com qualquer um dos dois. Mas ela sabia com quem queria estar.

— Eu soquei Jasper — falou seriamente. — Isso responde sua pergunta?

— Peça desculpas, diga que sente muito, mas não fale do beijo. Scorpius está muito magoado para ficar ainda mais arrasado. — Albus baixou o olhar e suspirou. — Se é só um beijo inútil que ninguém além de nós sabe e ninguém sequer viu, não precisa contar.

Roxanne não parecia nada feliz com aquilo. Franziu a cara e continuou negando com a cabeça.

— Esqueceu que, além de nós três, Jasper Wood sabe? Mentiras nunca ficam escondidas por muito tempo. É assim que planeja começar um relacionamento com ele? Baseado numa mentira? Rose, vamos lá, pondere comigo.

Os primos a encararam, mas a ruiva realmente ficou em dúvida do que fazer. Scorpius não precisava saber do beijo, não seria enganação com ele se ela omitisse o que aconteceu. No entanto, também não seria verdade agir como se Jasper não tivesse tentado nada. Aquilo era sobre Jasper ou sobre Scorpius?

— Vou contar a ele — murmurou Rose, erguendo o queixo confiante e dando de ombros. — A Loucaline também o beijou, lembra? Estamos quites.

Ela sabia que Roxanne discordava dessa linha de raciocínio e que estava fazendo uma careta desagradada, por isso não se deu ao trabalho de olhar para a prima. O importante era ter Albus ao seu lado para seu plano funcionar. O que não parecia tão difícil depois de explicar seu lado da história. Lá estava ele coçando a nuca, pensativo.

Por que tinha que ser tão lento pensando no óbvio?! Calma, Rose… Boa Rose. Lembre-se, é a boa Rose agora.

— Eu vou amanhã à casa dele a pedido da mamãe. — Albus suspirou e endireitou-se. — Ela quer convidá-lo para o Natal para fazer companhia à Lily, acho que chegou a comentar com vocês na festa do Slug e...

— Vai hoje — sentenciou Rose sem mesmo pestanejar. — E vai me levar.

Albus olhou para Roxanne, procurando um auxilio, mas ela só fingiu que não estava vendo.

— Não é assim que…

— A banda toca da seguinte forma, Albus. — Rose deu um passo para mais perto dele, sorrindo ao passar as mãos nos ombros dele. — Agora eu sou a boa Rose, e a boa Rose pede por favor. Então, por favor, me leve na casa dos Malfoy hoje. Preciso da confirmação ainda hoje de que Scorpius irá, senão meu presente para ele vai por água abaixo.

Ela parou e piscou duas vezes, tentando ser o mais simpática possível com seu sorriso de mostrar os dentes.

— A boa Rose me assusta mais do que a Rose de sempre — murmurou ele, sacudindo a cabeça. — Você é realmente assustadora fazendo essa cara, sabia?

— Albus!

— Tá, tá! — O Potter pigarreou e sacudiu as mãos dela para fora dos seus ombros. — Mas se ele te mandar ir embora, nós vamos, ouviu? Você vai ser a primeira amiga além de mim a pisar na casa dos Malfoy. Não podemos esquecer da farsa de que ele é popular. Não que agora não seja verdade, mas… Você entendeu.

Com um rápido assentir de cabeça, Rose zarpou para fora da cozinha, correndo para o quarto que as meninas dividiam no segundo andar. Sua mala estava bem organizada, ao contrário da mala de Roxanne ao lado dela. Trocou a camisa simples do Seminário das Bruxas por uma lisa e verde com mangas que iam até seus cotovelos. Colocou um casaco de lã branco por cima e prendeu os cabelos ruivos num rabo de cavalo alto.

A voz de Albus lhe chamando soou, mas ela não ligou. Estava ansiosa como raramente admitia ficar. Lembrar de como Scorpius a olhou naquela manhã, no Expresso Hogwarts, causava essa ansiedade. Não era raiva o que estava nos seus olhos. Ah, não. Era o mesmo nojo que Rose demonstrou quando viu Albus cuspir no chão.

Precisava recuperar o que estava no precipício de se perder. Ah, isso não deixaria.

— Albus me disse que vão na casa do Scorpius. — Lily surgiu na porta com uma sobrancelha erguida. Rose assentiu com a cabeça, e a prima sorriu. — Façam as pazes logo.

— É o intuito.

Desceu às pressas, o peito frenético no peito não tinha freio. Nem seus passos. Acabou por tropeçar nos últimos dois degraus, engolindo o xingamento em voz alta para que seus pais não corressem para dentro da casa a fim de saber o que estava acontecendo e para onde ela estava indo.

Roxanne quis dar um último conselho, mas Rose sorriu com confiança. Era maníaca por estar certa e estava armada até os dentes com a persistência de que arrumaria as coisas com Scorpius antes de voltar para A Toca.

Não havia chance de levar um “não” quando estava determinada assim. Coitados eram aqueles que se metessem na sua frente quando estava com aquele fogo no olhar. Scorpius viu o fogo. Ela extinguiria o mundo para alcançá-lo outra vez.

— Eu ia amanhã porque o Sr. e a Sra. M iam para a casa da tia do Scorpius, então a barra estaria limpa — avisou Albus enquanto os dois entravam na lareira com os punhos cheios de pó de flu. — Então se prepare que ele pode não gostar muito da nossa visita. Você sabe, considerando toda a mentira da popularidade, de ter amigos demais que não pode levar para casa.

— Eu o ajudei com essa popularidade — sentenciou muito certa de si. — Não vamos estragar os planos dele, confie em mim.

— Quando alguém pede “confie em mim”, é aí que mora o problema.

Os dois fizeram uma careta um para o outro e lançaram o flu ao chão, chamando em uníssono pela casa dos Malfoy.

Desde que Albus e Scorpius se tornaram amigos, as lareiras eram conectadas. Tanto dA Toca quanto do Largo Grimmauld, nº 12, lar dos Potter. Isso Rose sabia porque vez ou outra, nos feriados, espiava o primo desaparecendo na lareira para ir encontrar o Malfoy. Ginny não reclamou quando Rose o dedurou, apenas pediu que o fizesse em horários comerciais para não incomodar a família Malfoy. Tio Harry não gostou tanto da ideia, mas disse que na sua época já fez pior.

De dentro da lareira, viu o interior aconchegante da casa de sua avó desaparecer entre brasa e fagulhas quentes, enquanto uma nova visão surgia diante de si.

Era uma grande sala de paredes brancas. Os olhos de Rose percorreram rápido o local, muito analíticos e perspicazes, notando rapidamente que a maior parede era inteiramente de vidro transparente, dando espaço à visão do jardim como se fosse quase uma estufa com pouco sol de inverno.

Ela deu um passo para fora da lareira, seguida do primo. Sentia o cheiro de limpeza recente, algo bem incomum de se sentir quando estava nA Toca. Era um lugar lustroso, bem cuidado e cheio de luz.

— Hollis! Meu irmãozinho filho de outra mãe! — A voz estridente de Albus quebrou a concentração de Rose. — Meu Malfoy está acorrentado no jardim da Sra. M? Aposto que ela está forçando ele a podar tudo que o braço alcança.

Foi só então que a moça percebeu que ele estava falando com um quadro numa das paredes brancas, onde um mordomo de nariz afilado o estreitava ainda mais. Havia outros, alguns deles com o mar e navios. No entanto, o retrato do mordomo certamente estava olhando de volta para ele.

— O jovem mestre está ocupado, Sr. Potter. Gostaria de deixar recado? A Sra. Malfoy está na cozinha, e as instruções do jovem mestre são…

— Tá seguro. A gente já resolveu o problema de popularidade dele. — Albus deu uma piscadela para o quadro e acenou para que Rose o seguisse. — Vem, antes que ele a veja.

Ele estava do outro lado do vidro, no jardim? Rose imaginou que sim. Era o jardim que tanto reclamava. Bom, ao menos aquela sala da lareira parecia muito aconchegante, mesmo em um Dezembro frio como o que estavam. De frente para ela, havia sofá azul ardósia e alguns móveis tão brancos quanto as paredes. Ao fundo, um grande piano de cauda preto contrastava com tudo. Era um ar muito charmoso e rico, mas o piano certamente tinha uma localização privilegiada.

A Sra. Malfoy tinha bom gosto.

— Ei, Albus! Espera! — Seguiu-o na direção da porta, saindo por uma espécie de corredor com algumas pinturas em tons azuis também, mas muito suaves, como o branco das paredes. — Para onde estamos indo? Scorpius está no jardim, então…

— Relaxa, eu só quero dar um oi para a mãe dele. — Ele empurrou outra porta, virando a esquina do corredor. — Vai ver, a Sra. M é…

Bastou abrir a última porta para que um objeto fosse jogado na direção dos dois, colidindo numa velocidade monstruosa contra a parede e quebrando-se em vários pedaços num barulho de causar pânico!

— Eu falei para ele, Daphne! — Uma voz feminina ecoou no cômodo junto ao som de outro prato quebrando violentamente.

Era a cozinha! Espaçosa com uma grande bancada ao centro e, da mesma forma que a outra sala, uma parede inteiramente de vidro que dava para o jardim. Foi quando uma figura alta de cabelos escuros à altura dos ombros surgiu caminhando rápido por ela, sendo seguida por uma carta e uma caneta flutuante.

— Não é a primeira nem última vez que organizo um jantar. — Ela falava, e a caneta remexia contra o papel. Ficava agitando a varinha enquanto vários utensílios da cozinha se moviam, inclusive outras duas panelas no forno e duas tigelas de massa duvidosa. — Estou só treinando para não desperdiçar comida na noite que a sogrinha aparecer e…

A mulher ergueu o olhar e encarou os dois jovens congelados na soleira da porta. Todos os utensílios pararam, e uma das tigelas caiu no chão. Imediatamente, a lembrança de Rose veio à mente com as fotografias no Clube do Slug: Astoria Malfoy. No entanto, bastou ela sorrir para que a certeza fosse dada. Era o mesmo sorriso de Scorpius.

— Albus Severus Potter — exclamou ela compassadamente, passando as mãos no avental que cobria seu corpo e guardando a varinha no bolso melado de massa. — Dois anos sem vir na minha casa e é assim que você me aparece? Esgueirando-se na minha cozinha como um ratinho?

Astoria Malfoy possuía cabelos escuros bem cuidados e olhos grandes como bolas de bilhar. Era alta, mais alta que Rose ao menos, usando um vestido bonito e suave de tecido fluido azul claro, mas com um avental branco lhe marcando a cintura feito uma boneca majestosa. Scorpius disse que ela trabalhava na Central de Obliviação porque tinha uma doença, mas era tão vívida ao sorrir que Rose nunca diria isso se não soubesse.

Albus saiu andando na frente e ofereceu o punho fechado para ela, como se fosse a coisa mais comum do mundo. Era mesmo maluco!

— A culpa é do seu filho bobão, Sra. M. Amigos demais para trazer em casa, sabe como é, né?

Ela deu uma gargalhada e retribuiu o soquinho dele.

— Ele está de castigo, podando minha cerejeira porque vocês dois se meteram em confusões demais neste semestre — disse com um erguer de sobrancelhas, colocando as mãos na cintura. — Veio ajudar meu filho bobinho? Tem sempre uma tesoura de sobra para garotos trabalhosos.

— Infelizmente, estou em uma missão muito importante. — Albus deu de ombros e se virou para Rose. — O que me lembra: não estou sozinho! Sra. M, essa aqui é minha prima, Rose.

Os olhos claros de Astoria Malfoy encontraram Rose como se finalmente tivessem dado conta de que ela estava ali na porta. Nunca na vida, Rose Granger-Weasley tinha se sentido apreensiva e tão interessada em agradar alguém. Porém, havia algo nos olhos da mulher na sua frente que trazia a ruiva para perto, caminhando devagar na sua direção. Eram olhos astutos, desses que cruzariam fogo por quem amava.

E ela era fogo. Rose até engoliu a seco.

— Deixe-me adivinhar. — Ela passou por Albus como se silvasse na direção de Rose. — Cabelos ruivos. Vestes de segunda mão. Você deve ser uma Weasley.

Todo o sangue do rosto de Rose desapareceu.

— Eu…

— Estou brincando, querida! — Astoria gargalhou e abraçou Rose como uma mãe faria, primeiro envolvendo-a e depois apertando. — Quando seu pai me disse que Draco falou isso para ele na época da escola, nunca mais deixei meu marido em paz. — Devagar, ela afastou o rosto, ainda segurando nos ombros da ruiva. — Pode ter o ruivo dos Weasley, mas você é a cara da sua mãe.

De repente, Rose percebeu que estava sorrindo. Não tinha percebido antes, foi surpreendente! Como se o ar tivesse ficado mais quente ou a presença dela puxasse naturalmente alegria. Scorpius estava certo, sua mãe faria até mesmo o velho Severus Snape sorrir.

— Mesmo? — Ela pigarreou, pestanejando. — Não diga isso ao meu pai, ele não admitiria que eu pareço mais com mamãe do que com ele.

— Juro. Reconheci na hora que entrou com o bisbilhoteiro.

— Não estava bisbilhotando! Eu vim justamente falar com a senhora e é assim que me recebe?! — Albus já estava sentando numa bancada da cozinha, olhando para dentro de uma bacia suja. — Uh, isso é massa de bolo?

Subitamente, Rose riu pelo nariz, chamando atenção dos dois na sua direção.

— Ah, os famosos bolos! — Ela entreabriu a boca por um momento e sorriu para Astoria, pois, de repente, sentia-se à vontade com ela. — Mamãe fala que seus bolos são famosos no Ministério. Scorpius também sempre diz que está com saudade deles… mesmo solados.

Astoria sorriu de lado, curiosa.

— Mesmo solados? — falou rápido, quase desafiadora, tornando a colocar as mãos na cintura marcada pelo avental. — Bem que ele disse que era uma menininha sem noção. Gostei de você, Rose Weasley. Por que Scorpius nunca me falou que eram amigos? Achei que se odiassem.

— E odiávamos — confessou Rose com uma risada. Não que ele não a estivesse odiando naquele exato momento. — Fizemos as pazes esse ano numa detenção.

Ela balançou a cabeça com um suspiro desaprovador, 

— Ai ai ai, meu filho é um rebelde. Está tudo bem, eu também odiava o pai dele quando o conheci.

— Já está me difamando para crianças, Astoria Malfoy?

A voz masculina surgiu da porta que Rose e Albus vieram. Quando ela virou o rosto, ali estava uma cópia mais velha de Scorpius, branca e loira como ele era. Draco Malfoy, ela imaginou, sentindo o pescoço e os braços coçarem. Era um homem alto de cabelos loiros presos por uma fita escura, muito bem arrumado com um casaco de lã escuro preso em seu braço que levava uma pasta também escura de couro brilhoso.

— Só contando nossa história de amor, querido. — Astoria virou o rosto para Rose e sussurrou audivelmente: — Ele era insuportável. Podem me chamar de “cura para chatice”.

— Contou a eles também dos poemas românticos que me mandava? — O pai de Scorpius se aproximou da esposa e beijou o lado de sua testa enquanto usava a mão livre para roubar a beirada da massa de bolo da tigela, lambendo o dedo rapidamente. — Vai solar.

Ela fez uma careta para o marido, que apenas abrilhantou mais o sorriso antes de encontrar Rose com o olhar. Astoria notou aquilo, indo para trás da moça com as mãos em seus ombros.

— Querido, esta é Rose, filha de Hermione e Ron. Aparentemente, eles fizeram as pazes.

A evidência na frase foi clara. Foi impossível não imaginar o que Scorpius teria dito aos seus pais sobre ela. Sobre eles. Não, não havia chance de ter contado sobre o que houve na noite da festa, senão eles jamais seriam tão simpáticos com ela. Ao menos Rose não seria se alguém fizesse o que ela já fez com Scorpius com seu único filho. Talvez relevasse um pouco se ele merecesse.

— Queríamos convidar Scorpius para ir nA Toca no Natal. — “Comigo” era o que ela queria acrescentar. Mas era a boa Rose. — E era mais rápido vir fazer o convite pessoalmente. Mais eficaz também.

Assim não corriam o risco de ele sequer abrir a carta convite.

— Mamãe insistiu porque ele e Lily se tornaram muito amigos esse ano, e a minha irmã precisa… ficar perto de pessoas que façam bem a ela. — Albus deu de ombros. — Nem que seja apenas uma passada lá. Teddy também vai estar lá, e eu sei que vocês são… primos? Tios? Parentes?

Draco Malfoy curvou a boca num meio sorriso e olhou para a esposa com as sobrancelhas erguidas.

— Minha mãe vem passar o Natal conosco, mas não vejo nenhum problema em ele ir depois do jantar.

— Isso significa que ele vai me deixar sozinha? Com a sua mãe? — Astoria cruzou os braços. — Me lembre de comprar mais vinho.

A curva se tornou um riso de verdade na cara do Sr. Malfoy. Rose decidiu que compraria um vinho de mandaria para ela de presente. Estava realmente esperançosa!

— Isso que dizer que ele tem permissão?

O pai de Scorpius assentiu com a cabeça.

— Se ele quiser, claro. Apenas… Animem ele, certo? Scorpius me pareceu para baixo quando fomos pegá-lo. 

— Como ele escreveu que estava felizmente ansioso para a festa de Slughorn, achamos estranho — completou a Sra. Malfoy.

Se pudesse dar um nome à dor puntiforme e fina que sentiu em seu peito naquele momento, Rose certamente diria: arrependimento. Os dois primos sabiam a razão do desânimo, mas sabiam também que o clã Weasley-Potter era capaz de qualquer coisa.

— Tia Ginny está louca que ele vá — falou Rose, sentindo que era seu dever assegurá-los de algo. — Não só ela, se eu for ser bem sincera.

— Estou curioso sobre como essas pazes aconteceram. — Draco pendeu a cabeça de lado e se encostou de lado na bancada. — Da última notícia que tive de vocês, estavam quebrando uns aos outros naquela loucura de quadrisolo.

"Quebrando" era uma boa palavra para o banho de sangue daquele dia no sétimo ano.

— Teddy contou sobre a nossa grande vitória sobre os Potter? O irmão do Albus ficou uma semana inteira com raiva suficiente para explodir a escola.

O homem assentiu com a cabeça devagar. Não parecia mesmo com a ideia que ela tinha do Comensal da Morte, mas com um homem suave e curioso com a vida misteriosa do filho.

— Edward que nos mantém um pouco informados. Scorpius tem a terrível mania de ficar silencioso durante o período letivo. Vocês são todos assim? É coisa de geração?

Rose deu de ombros.

— Scorpius é quieto para equilibrar com a carência por atenção do Albus.

— Carente? — soou o garoto. — Eu sou a melhor coisa que já aconteceu para Scorpius Malfoy. Não sou, Sr. M?

Foi aí que ele ergueu o punho fechado para o pai de Scorp com as sobrancelhas levantadas e uma cara de quem tinha certeza que ia conseguir apoio moral.

Rose estapeou a própria testa. Era mesmo um idiota.

— Sr. M, pode confiar em mim! Vamos, só um soquinho para mostrar como o senhor conta com a minha capacidade de animar o nosso Scorpius favorito!

Ele olhou para o punho fechado de Albus e para ele de novo, suspirando:

— Potter…

— Por que sempre soa legal quando o Sr. M me chama assim? — Albus gargalhou, voltando-se para a Sra. Malfoy. — Uma vez ele encontrou papai na Plataforma 9¾ e foi hilário os dois se encarando.

— Eu sei, eu estava lá! — Astoria riu também, fazendo uma cara emburrada logo em seguida. — Potter…

Albus também fez uma e mexeu num óculos invisível, como se imitasse tio Harry ao dizer:

Malfoy…

Draco Malfoy tentou segurar um sorriso, virando-se para Rose para sussurrar:

— Acho que estamos sobrando nessa conversa.

— Completamente supérfluos nela — concordou a moça. — Desnecessários até.

— Triviais, eu diria — completou ele.

— E cochichadores! — Astoria interrompeu os dois com os olhos grandes bem abertos. — Querem compartilhar com a audiência?

Rose e o Sr. Malfoy se entreolharam e depois voltaram-se, cúmplices, para a Sra. Malfoy.

— Só falando o quão radiante você está hoje, querida.

Ela estreitou os olhos para o marido e depositou um beijo estalado na bochecha do marido, sendo rapidamente envolvida na cintura por um abraço dele. Era interessante ver esse tipo de interação entre os dois porque não era algo que a “Rose de seis meses atrás” esperaria dos Malfoy. Muito pelo contrário, esperava algo sombrio, assustador e possíveis menções às artes das trevas na mesa de jantar.

— Quando foi que você desaprendeu a mentir, Draco meu bem?

— Provavelmente no dia que me casei com você. — Ele deu de ombros, sorrindo meio de lado. — Ficar calado no “fale agora ou cale-se para sempre” foi minha última mentira.

Os dois riram um para o outro. Esse era o motivo de Scorpius mentir há tantos anos. Ali, Rose compreendeu com exatidão. Havia paz na sua casa, risadas e graça entre eles. Para fazer seu pai sorrir orgulhoso, ele mentiria por todos os anos que pudesse; esse era o tipo de pessoa que Scorpius era.

Os olhos de Rose foram para o jardim, atrás das portas de vidro. Sabia que ele estava ali, mas não o via. Observava a grama bem verde e bem cuidada, na verdade. Aproximou-se até que finalmente pudesse ver que havia um grande teto também de vidro acima da cabeça, o que impedia o frio do inverno de atingir aquele jardim. Olhando com mais atenção, podia entender que era mesmo uma espécie de estufa. Devia ser retrátil para pegar o calor do verão. Ao menos era isso que ela faria se tivesse algo do tipo.

Scorpius odiava jardinagem, sempre dizia isso com muito sofrimento na voz. Ainda assim, ele cuidava daquele lugar. Só eram os três na casa, não havia nenhum elfo ou mesmo empregado. Deviam dividir bem os afazeres de casa, pareciam o tipo de família que fazia isso. Comparada com a sua que era regada a gritos e às organizações de sua mãe. Hermione ia gostar de Scorpius, iam conversar sobre livros e trocar recomendações. Hugo tinha seu pé atrás mais por causa de Rose do que pelo próprio Scorpius. Já seu pai… Era difícil saber qual seria a reação dele. Para ser sincera consigo mesma, era difícil imaginar a reação de todos eles se Rose dissesse ainda “Então, eu estou apaixonada por Scorpius Malfoy! E arruinei tudo!”.

Parabéns, Weasley, você… destruiu tudo por ser uma covarde em uma única noite.

— Rose. — A voz de Astoria soou mais amorosa que antes, e Rose virou o rosto para ela, vendo-a sorrir. — Se for direto, basta virar à direita na macieira. Scorpius deve estar pendurado na escada, distraído demais para ouvir nosso barulho.

Albus conversava com o Draco Malfoy. Ou melhor, tagarelava algo e sacudia os braços enquanto o pai de Scorpius o escutava com cara de quem queria fugir dali.

— Certo. — Rose sorriu e abriu a porta de vidro. — Vou lá fazer o convite a ele. Volto já.

— Aproveite e avise que o jantar de hoje é dele — disse Draco Malfoy, ainda de braços cruzados. — Eu fiz os dois últimos, ele não me enrola mais.

Rose riu e assentiu com a cabeça, abrindo às pressas a porta de vidro e respirando o ar puro do jardim. Só mesmo Scorpius engomadinho para odiar aquele cheiro de terra suave.


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Notas finais do capítulo

Eu absolutamente AMO a Astoria. Minha princesa puro-sangue ♥ desde o primeiro planejamento a história, eu queria apresentar os Malfoy assim hahaha. Construí o Draco com grande peso nas costas pelo passado, então queria muito que a Astoria fosse essa pessoa leve. Scorpius é a junção dos dois na minha cabeça! Espero que tenham amado como eu amei escrever ♥ ♥ ♥
E agora? Será se vem o perdão?



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