. . .

O som do combate já se fazia presente, a Clave havia enviado um número alto de caçadores de sombras, que destruíam demônios com graça e brutalidade. Simon pensou nunca ter visto tantos demônios como vira naquele dia, ele poderia jurar que eles pareciam sair de um buraco mágico de outra dimensão, e tremeu levemente ao descobrir que seu palpite estava certo.

Ele havia se distanciado de Isabelle em meio a toda aquela confusão, lembrava do breve beijo que trocaram quando ficaram para trás em busca do chicote dela, que aparentemente era precioso demais para simplesmente ser esquecido. Ele pode presenciar o modo como os olhos dela adquiriram um brilho a mais, ou o modo como o seu corpo reagia com a simples menção de matar demônios.

. . .

O rubi no pescoço de Isabelle brilhava freneticamente, era como se ele tivesse ganhado vida própria e pulsasse em sincronia com as batidas de um coração, o modo como o mundo parecia voltar ao eixo quando ela via demônios se desintegrarem a incentivava a lutar contra qualquer cansaço que tentava se instalar.

E mesmo que aquele sentimento fosse extremamente fantástico, ela não conseguiu distanciar seus pensamentos de Simon, que havia se machucado gravemente na invasão de Alicante, ela torcia para que ele estivesse bem, porque ela precisava do bem estar dele para garantir o seu.

. . .

Jace gritava alto e parecia perdido em meio ás ordens que compartilhava com seu parabatai, ele sentia que não deveria estar ali, era como se seu corpo estivesse sendo puxado em direção ao interior do barco, o rápido manear de cabeça de Alec indicava que ele lhe cobriria enquanto descia, logo estaria de volta com a irmã, e ele odiava chamá-la assim.

Desceu os degraus de modo rápido, seus passos coordenados e cheios de graça, procurou por inúmeros corredores, dando de cara com Sebastian que fazia o caminho inverso e subia em direção ao convés.

— Esse problema eu resolvo daqui á pouco. - sussurrou,

Continuou explorando os corredores, até ouvir uma voz conhecida.

. . .

Talvez, se subisse sobre uma das grades conseguiria uma visão melhor, Simon pensou, equilibrando o peso e iniciando repetidos ataques nas cabeças de demônios, ele oferecia apoio aos demais caçadores, mas obviamente não possuía alguém que estivesse lhe fazendo tal favor. E quase teve o corpo arremessado contra o piso, sendo salvo por segundos pela lâmina que George segurava, o escocês ofereceu um sorriso sincero ao amigo antes de voltar a sua luta, o anjo claramente havia lhe presenteado com um excelente amigo.

— Simon! - automaticamente virou em direção a voz que o chamava, encontrando Alec que apontava para as grades do outro lado, uma ordem silenciosa. Simon impulsionou seu corpo sobre a grade e se apoiou sobre o arco antes de se posicionar onde Alec apontara, iniciando novamente seu trabalho dessa vez de um ponto diferente.

De lá ele tinha uma visão privilegiada da namorada, que partia ao meio inúmeros demônios com seu chicote, e por um rápido momento ele a viu sorrir, como se aquilo fosse seu programa preferido para uma tarde, e talvez fosse, concluiu.

. . .

Jace tentou romper o cadeado da sela com sua lâmina, mas não foi bem sucedido, então começou a chutar as grades, a imagem de Clary atrás dela era desesperadora demais para ele.

— Você está com a estela? - Clary quebrou o silêncio, recebendo um olhar acentuado de Jace que enfiou as mãos no bolso e a entregou o pequeno objeto.

Na mente de Clary aquilo parecia ser uma tarefa fácil, ela traçou delicadamente uma runa sendo fiel ao desenho em sua mente e de repente viu a porta abrir, Jace a encarou, mas não proferiu nenhuma palavra, afoito demais em seus pensamentos para pensar em qualquer outra coisa.

Nenhum dos dois esperava o clima estranho que se instalara ao redor deles a partir daquele momento.

. . .

Simon estava mais alto que os demais, podia até dizer que tinha uma vista de todo o convés, observava a escadaria a espera de ver algum movimento que sinalizasse a volta de Jace, sua atenção se dividia entre Isabelle, as escadas para o convés e os demais caçadores que lutavam.

E então ele o avistou entre a multidão, o olhar fixo enquanto rodeava os corpos de caçadores de sombras largados sobre o piso, todos pareciam presos demais em suas tarefas para notá-lo, e ele sabia disso, se dirigiu lentamente até o local de saída dos demônios e o fluxo aumentou, a cada segundo mais demônios eram lançados naquela dimensão. Sebastian sabia exatamente o que estava fazendo, e todos deviam temer aquilo.

Simon calculou mentalmente os soldados que ainda lutavam e o número de demônios, amaldiçoou céus e terras ao constatar que naquele ritmo aquela batalha se tornaria uma missão suicida.

— Merda. Merda. Merda. - praguejou ao se mover lentamente em direção a Sebastian.

Sentia as costelas doerem em conseqüência das fraturas, mesmo que ele soubesse que em maioria já tivesse sido curadas, observar Sebastian de tão perto lhe trazia calafrios. Ele havia conseguido proximidade suficiente para acertá-lo, lançou seguidas flechas em partes diferentes de seu corpo, conseguindo uma expressão de surpresa do rapaz a sua frente, que revidou rapidamente com sua lâmina, seguidas investidas, flechas e alguns ferimentos eram as lembranças de Simon daquele momento.

Sentiu o impacto das costelas recém curadas no chão, levantando em seguida, contrariando não só as expectativas, mas também as ordens do seu corpo que pediam que ele ficasse no chão. Perdeu o controle de sua lâmina, que se embrenhou entre as águas o deixando apenas com o arco, foi novamente ao chão, dessa vez permanecendo mais tempo, sentia as gotas quentes de seu suor se misturando ao sangue.

As investidas de Sebastian cessaram, ele estava entretido em um combate com Jace, e Simon observou o quanto seus golpes se pareciam, eles talvez tivessem sido treinados pela mesma pessoa, Simon levantou novamente, dessa vez aproveitando que seu inimigo estava de bruços e o chutou repetidas vezes nas costelas, ele queria causar uma dor semelhante a que lhe foi causada, seu ódio era dispensado em forma de chutes.

Sebastian girou a perna de Simon e o lançou em direção as grades, as segurou firmemente e uniu toda a força que lhe restava para se erguer de volta ao barco e usar seu próprio peso como investida final contra Sebastian, que se desestabilizou tempo suficiente para Jace tomar o controle da luta, Simon se sentia esgotado quando se deu por vencido e caiu ao chão, sua mente repassava tudo que havia vivido nas últimas semanas, muito de Isabelle dominava suas memórias. E então a agonia da dor voltou ao seu corpo, uma lança parecia atravessar sua perna, e aquilo era pior do que qualquer coisa que havia sentido antes.

Morrer em batalha é um troféu para os caçadores de sombras, troféu esse que seria eternizado na cidade dos ossos, onde os corpos dos guerreiros Nephilins inspirava as demais gerações a fazer o mesmo. Aquelas foram as palavras de Isabelle durante as suas primeiras aulas como tutora, e naquele momento Simon não entendeu exatamente que força os dominava para fazê-los tratar a própria vida como algo pequeno comparado a humanidade, aquele era o traço do divino no sangue deles, se importar com a maioria além de si mesmo, e naquele momento Simon entendeu aquele sentimento que tomava conta de seu corpo, ele lamentava, porém, não ter a chance de conhecer as novas gerações, a geração da qual seus filhos talvez participassem, se segurou nas lembranças dos planos que fizera com Isabelle naquela manhã em seus últimos segundos consciente, e então ele havia voltado a escuridão.

. . .