Heart on Fire in Her Hands (Hiatus Indeterminado) escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 9
Capítulo 8: Verdades ébrias e ressacas morais


Notas iniciais do capítulo

Boa noooooite!
Como vocês estão?

Eu sei, mais uma vez, demorei milênios para atualizar... Como expliquei nas minhas outras atualizações, passei por alguns problemas de saúde na família que, além de me tirarem o tempo, também tiraram a inspiração. E justamente nesse capítulo que marca, efetivamente, a mudada de rumo nessa fanfic.

Bem, tinha tanto para acontecer e eu espero, mesmo, ter feito um bom trabalho para renoovar o carinho de vocês por essa história! Indico, de cara, duas músicas: "Girl of the Summer" do Kip Moore e "Beat of The Music" do Brett Eldredge, ambas se encontram na playlist feita para fanfic no Spotify. Cujo link é esse:
https://open.spotify.com/user/fernandaredfield/playlist/1hNaGElSYVa2DTnKbvDquN

Bem, espero que curtam! Boa leitura!



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Talvez, uma das sensações mais comuns a serem experimentadas depois de um bom porre e no início de uma ressaca dolorosa, seja a desorientação. Rachel a conhecia bem, afinal, levando a vida sem freios como levava, era até comum acordar em uma cama que não sabia a quem pertencia. Em muitas ocasiões, a morena recebia a desorientação de braços abertos - essa era uma boa justificativa para os seus sumiços quando as garotas de uma noite a procuravam - mas, com o pouco que se lembrava da noite anterior, Rachel estava aterrorizada por não saber onde estava.

O pouco que lembrava era feito de borrões e palavras sem sentido. Rachel conseguia ver os rapazes, o grupo de Kurt, o “Jewelry of the Coast”... Porém, um aperto sempre maltratava o seu coração quando queria pensar em Marley, Ruby e - de forma misteriosa e incompreensível - Quinn. E esse aperto era desesperador como a desorientação. Rachel queria saber o que acontecera, mas, tinha medo do que poderia descobrir.

O corpo moreno estava dormente em várias partes, os cabelos castanhos estavam embolados e o gosto amargo na boca de lábios cheios apenas tornava evidente como era deplorável o estado em que Rachel se encontrava. Todos esses aspectos, somados à dor de cabeça excruciante transformavam o ato de despertar em uma verdadeira batalha. Ainda assim, Rachel conseguiu se sentar e observar o quarto ao seu redor.

O que a surpreendeu foi o ar impessoal do quarto, demorou a entender que se tratava de um hotel e só compreendeu quando os seus olhos semicerrados pela luminosidade encontraram uma mesa ao lado da cama, posta com um reforçado café-da-manhã que apenas fez seu estômago enjoado revirar. Rachel franziu a expressão para suas conclusões, mas, sequer teve tempo de pensar sobre elas porque uma voz irônica e conhecida chegou aos seus ouvidos:

— Achei que você estivesse morta, Berry.

Dentre todas as vozes que temia escutar, a de Cassandra July era a pior.

Por breves minutos de desespero e agonia, Rachel esqueceu-se da dor de cabeça, do formigamento pelo corpo e do gosto amargo em sua boca, nesses segundos, ela ergueu os lençóis até o queixo e se encolheu na cama. Não era possível que tivesse dormido, novamente, com aquela mulher deplorável! Será que o seu “eu bêbado” era tão inconseqüente assim?

Cassandra gargalhou divertida para os gestos inquietos da morena. A loira mais velha usava um roupão e tinha os cabelos soltos, a sua pele estava livre de maquiagem e, diferentemente de Rachel, as suas feições não manifestavam qualquer sinal de ressaca. Cassandra apanhou uma maçã na mesa do café-da-manhã e a mordeu, enquanto a mastigava, sibilou venenosa:

— Não precisa se esconder, você sabe muito bem que eu já vi tudo que você tem embaixo desses lençóis...

— O q-que eu estou fazendo aqui? - Rachel perguntou baixinho, mais para si mesma do que para a dona daquele quarto, porém, o seu temor era audível e as palavras chegaram, da mesma forma, aos ouvidos de Cassandra. A mais velha abocanhou mais um pedaço da maçã e sentou-se aos pés da cama, fazendo com que Rachel se encolhesse mais de encontro à cabeceira. Cassandra dissimulou uma ofensa e perguntou:

— Ah é? Não consegue mais se lembrar do que faz comigo durante a noite, Berry?

— Oh, droga! Isso não pode estar acontecendo! - Rachel grunhiu impaciente e, ignorando as dores e a vergonha, passou os olhos pelo quarto à procura de suas roupas e, também, de sua dignidade. Cassandra não parava de rir enquanto observava os olhos castanhos frenéticos a se movimentarem pelas superfícies do quarto de hotel.

A situação era estranha e incômoda, muito porque Rachel não queria, de forma alguma, se envolver com Cassandra de novo. O que tiveram no Verão passado fora louco e intenso até para os seus parâmetros que não eram lá muito normais, Cassandra era uma mulher muito difícil e as duas, literalmente, só se entendiam na cama.

Rachel olhou para os seus ombros e colos e não encontrou qualquer sinal de mordida ou chupão, a busca por suas roupas terminou ao encontrá-las dobradas na cômoda ao lado da cama. A morena, com a testa franzida e a expressão curiosa, voltou-se para Cassandra que mordiscava, distraída, a maçã. Quando, finalmente, a loira ergueu os olhos, um sorriso irônico brincava em seus lábios rosados ao dizer:

— Não está acontecendo e sequer aconteceu... Fique tranqüila, você cumpriu a sua promessa e não voltou a ficar comigo, Berry.

— Isso é sério?! - Rachel perguntou entusiasmada, sem impedir que um sorriso aliviado finalmente se formasse em seus lábios. Cassandra revirou os olhos para a sua reação, a morena a conhecia bem para saber que, de fato, ela estava ofendida. A mais velha lhe deu às costas e Rachel aproveitou para se trocar embaixo dos lençóis, quando estava pronta, ficou em pé e Cassandra voltou a buscar os seus olhos. Rachel encolheu os ombros, sentia-se culpada e não sabia a razão. - Seja lá o que tenha rolado, eu peço desculpas.

Cassandra voltou a gargalhar, contudo, havia frieza na forma como ela ria, era quase que ressentimento. Rachel voltou a franzir a expressão, confusa por aquele comportamento. A mais velha passou por ela e sentou-se à mesa de café-da-manhã, ela cruzou as pernas e o roupão de seda que usava subiu alguns palmos, revelando a pele bronzeada de suas coxas. Rachel não conseguiu desviar os olhos e suspirou, antes de desviar os olhos ao mesmo tempo em que lembranças da noite anterior castigavam a sua cabeça.

Ela viu Quinn nos braços de um garoto qualquer. Essa lembrança provocou uma pontada de dor no meio de sua testa, Rachel fechou e apertou os olhos, o ar também lhe faltou e ela ofegou. De olhos fechados, parecia que uma bateria maltratava a sua cabeça - uma bateria ritmada e que estava acelerada, Rachel não sabia, mas, esse era o seu coração - Rachel foi até o banheiro lavar o rosto e escutou sons no quarto, Cassandra estava com os pés esticados em outra cadeira ao gritar:

— Aliás, não é para mim que você deve desculpas. Na verdade, me parece que você deve muito mais do que desculpas a outra pessoa.

— Outra pessoa? Nós tentamos fazer ménage com alguém?! - Rachel gritou exasperada do banheiro, respingando água no espelho e na pia, o seu reflexo estava assustado e ela perdera-se entre pentear o cabelo e escovar os dentes. No quarto, Cassandra bufou antes de se levantar e caminhar até o banheiro. Ela se encostou ao portal e observou Rachel terminar a sua higiene.

A morena cuspiu a pasta de dente e secou o rosto, sentia-se melhor, fisicamente, por mais que estivesse em plena agonia emocional. Rachel mal terminara de colocar a toalha no lugar quando Cassandra a apanhou firme pelo cotovelo, arrastando-a até a porta do quarto. Ali, a morena sentiu-se ser jogada para o corredor e Cassandra, antes de fechar a porta em sua cara, grunhiu irritadiça:

— Seja lá quem for Quinn, ela merece muito mais do que você chamando por ela enquanto está na cama com outra mulher.

A menção ao nome de Quinn simplesmente reativou todas as lembranças que suprimira. No corredor, Rachel observou uma porta se fechar na sua cara enquanto tantas outras abriam em sua cabeça e, principalmente, em seu coração. Dentro do seu peito, esse órgão bateu desanimado e se encolheu, ainda assim, sentiu a onda de calor propagar-se do seu peito para o resto do corpo. E a onda veio e a dragou para um oceano de profundezas desconhecidas e de águas mornas que pareceram acariciar todas as feridas que a impediram de mergulhar nos últimos anos.

Imediatamente, era como se a ressaca física não existisse. Entretanto, a ressaca emocional estava ali porque a bebida entrara e a verdade - que ela tentara negar veemente - finalmente saíra.

Estava verdadeiramente apaixonada por Quinn e não suportaria perdê-la para outro homem, que dirá, um mauricinho como aquele da noite anterior. A necessidade era enorme, Rachel sentia que precisava de Quinn para que esse Verão funcionasse.     

 

Quinn estava de olhos bem abertos muito antes de o seu celular despertar e vibrar junto ao seu travesseiro. Na escuridão artificialmente refrigerada de seu quarto, ela pensava na decisão que tomara e, principalmente, tentava determinar se ela valera ou não à pena.

A noite anterior ainda estava bem vívida em sua cabeça, resultando em olheiras embaixo de seus olhos graças à insônia que a acompanhou na maior parte do tempo em que deveria estar dormindo. Ela passaria grande parte de seu dia no mar, deveria ter descansado, mas, sem que pudesse evitar, estivera novamente entregue à bagunça que se instalara em seu peito desde que Rachel Berry apareceu em sua vida cantando em cima de um jipe azul.

Quinn não estava acostumada a tanta intensidade e a tantos extremos, a sua vida era baseada em sua timidez e pautada na tranqüilidade. Porém, aquela morena chegara como um tsunami, derrubando a sua infra-estrutura e fazendo-a agir como sequer tinha imaginado agir. Quinn jamais pensara em flertar com uma mulher, muito menos, imaginava sentir ciúmes de alguma e sequer cogitava discutir com uma pessoa simplesmente porque ela estava sendo insistente.

Mas, isso foi antes daquele Verão começar e, essencialmente, antes de conhecer Rachel.

Por isso, Quinn não estava surpresa por ter pensado tanto em Rachel na noite em que passara acordada. Nunca vira alguém tão entregue aos próprios demônios daquela forma, tampouco, vira uma pessoa tão intensa a ponto de derrubar a maioria daqueles que a cercavam. Rachel se assemelhava a uma bomba e, como tal, explodiria na noite anterior e dispersara estilhaços que atingiram muitos outros. Se a morena ainda tivesse um pouco de bom senso, esse dia que se iniciava não seria um dos melhores para ela... E mesmo com um baita estilhaço ardendo em seu próprio peito, Quinn se perguntava se ela estaria bem.

Era bobagem se perguntar aquilo. Rachel era grandinha e saíra acompanhada do “Jewelry of the Coast”, por mais embriagada e fragilizada que estivesse, a morena dera a entender que era uma daquelas pessoas que se curavam após uma boa noite de sexo... Ela dera a entender, mas, isso não significava que Quinn acreditava. Afinal, ela passara boa parte da vida esperando o melhor das pessoas, vinda de uma família em que as aparências pesavam mais do que o afeto, Quinn agarrava-se à esperança para não se perder em sua realidade.

Ainda assim, acreditar nas pessoas machucava, Quinn sabia disso.

E, talvez, fosse esse estilhaço em seu peito aliado à decepção que relutantemente sentia em relação a Rachel - afinal, a garota não era alguém para ela, era um flerte que se perdera em uma série de mal-entendidos, não era? - que a fizera aceitar aquele convite trivial de Biff para velejar.

Quinn sabia que aquela viagem era para ser dividida com os seus amigos, mas, precisava ficar sozinha e colocar a cabeça no lugar e Biff, com toda a sua superficialidade latente, era bem capaz de deixá-la sozinha mesmo que falasse sem parar. Tudo que Quinn precisava fazer era sorrir, piscar e se manifestar nas horas certas. Quem sabe, no final daquele dia, ela estaria melhor do que estava agora mesmo perdendo parte de suas férias com o seu ex-namorado raso.

Com esses pensamentos em mente, Quinn conseguiu se erguer na cama. Ela se vestiu com destreza, usando a lanterna do celular como guia e, ao sair do quarto, Kurt permanecia ferrado no sono. Quinn não pode deixar de sorrir para ele, se tinha uma pessoa que merecia ter um Verão inesquecível e descomplicado, essa pessoa era Kurt. Ele merecia ser feliz depois de tudo o que ocorrera.

O apartamento estava silencioso, Quinn caminhou nas pontas dos pés - afinal, não queria levar mais um sermão de Santana a respeito de sua decisão - e chegou à cozinha. Apanhou uma maçã e a mordeu, checando o conteúdo de sua mochila antes de rumar para a sala e, consequentemente, para a porta.

Ao abri-la, pontualmente às dez horas, encontrou Biff parado em frente ao apartamento, encostado à parede do corredor. O rapaz a sorriu, o sorriso branco e brilhante que, há alguns meses, também a fazia sorrir e, educadamente, cumprimentou:

— Bom dia, pronta para um dia no mar e nos ventos?

— Claro que sim! - Quinn respondeu com um sorriso destoante da animação que ela tentava passar, porém, não havia perigo tratando-se de Biff McIntosh. O rapaz era superficial e essencialmente egocêntrico, ele não seria capaz de reconhecer um desânimo nem mesmo se a pessoa falasse a ele que sentia isso. Com Biff, não havia perigo de ser mal-interpretada porque ele não fazia questão de interpretá-la. - Vamos?

Biff acenou com a cabeça e, de forma cavalheiresca, apanhou a mochila de Quinn, carregando-a pela alça com a mão enquanto lhe oferecia o braço. A loira o segurou e juntos, rumaram para o elevador. Biff cheirava à âmbar, completamente diferente do cheiro cítrico e natural que Rachel exalava, ele também não lhe passava a segurança, ao guiá-la, que Rachel lhe passara ao impedi-la de cair nas areias da praia... Quinn não conseguia evitar as comparações.

Os dois destoavam completamente um do outro, enquanto Biff era feito do simples e seguro, Rachel significava o complicado e perigoso. Quinn estava a caminho de um veleiro, mas, no momento, ela queria mesmo naufragar... De preferência, no fundo dos olhos castanhos que tanto a pegaram desde o primeiro dia em que a encontraram.

Quinn queria um dia sem pensamentos e até poderia tê-lo, contudo, os sentimentos sempre estariam presentes. Estes eram imprescindíveis, tais como as mudanças de marés e o encontro da água do mar com a areia da praia. Rachel estava impressa em si, feita de calor, queimando o seu coração enquanto ela mesma tentava, em vão, refrescar nas águas frias que Biff lhe entregava.

 

O zumbido era conhecido, mas, Kurt fingia que nunca escutara tal som. A sua audição era apurada pelos diversos nuances vocais que deveria aplicar quando atuava e, por isso, ele conseguia reconhecer o vibrar de um smartphone mesmo que esse estivesse enfiado debaixo de vários travesseiros e cobertas. E pior que esse som era irritante e Kurt detestava qualquer coisa que conseguisse ser mais irritante do que ele mesmo.

Por isso, ele xingou baixinho enquanto passava a mão direita no rosto sonolento e, com a esquerda, tateava a cama à procura de seu aparelho. O smartphone foi encontrado quase aos pés da cama e ele franziu a expressão para quem o ligava. Kurt não se lembrava de ter passado o seu número para Rachel Berry e sequer se lembrava onde arrumara o dela, mas, ali estava a morena, sorrindo na foto que indicava quem o ligava.

Mesmo sem resolver esse mistério do por que tinha o número dela e ela, o seu, Kurt sabia muito bem por que ela estava ligando. E, sabendo o motivo, Kurt não estava muito à vontade para atender. Ele conhecia a fama de Rachel Berry, sabia que quebrar corações era algo normal para ela, tão normal quanto respirar ou tocar aqueles infernais instrumentos de corda que ela tocava tão bem. O rapaz não queria que a sua amiga tivesse o coração destruído por alguém tão egocêntrico, a sua opinião em relação a Rachel nunca fora das melhores e só piorara depois do show etílico na noite anterior.

A chamada caiu, o smartphone parou de tocar e ele pensou que poderia voltar a dormir, porém, menos de um minuto depois, o celular voltava a vibrar histericamente, obrigando-o a sentar na cama. Ao sentar-se, notou que Quinn já se fora com a samambaia que chamava de ex-namorado, também não aprovava o comportamento da amiga, mas, era melhor ter alguém como Biff do que outro como Rachel.

Kurt fungou e, finalmente, aceitou a chamada. Do outro lado da linha, ele escutou os sons urbanos de carros passando e pessoas conversando. Rachel respirou fundo e, simpática, cumprimentou:

Bom dia, Hummel!

— Ora, Berry... Poupe-me da sua boa educação. O que você quer? - Kurt não estava preocupado em ser simpático ou gentil. O jovem ator tinha sono, estava preocupado com o coração da sua melhor amiga e não gostava de nenhum dos dois que tentavam roubá-lo. Rachel estalou os lábios e ele não deixou de sorrir para a impaciência dela, bem diziam que a morena não sabia esperar. Rachel pigarreou e, mais séria, respondeu:

Eu sei que nunca nos falamos em Julliard e também sei que você não gosta tanto assim de mim, mas, eu gostaria que me ajudasse.  

— Primeiramente, você está errada em dois aspectos de sua fala. Nós já nos falamos em Julliard, mas, você foi tão desnecessária na ocasião que eu praticamente ignoro a existência dessa memória e eu até gosto de você, admiro, só não gosto de suas atitudes. - Kurt não acordara no melhor de seus humores, era perceptível. Porém, ele estava falando com Rachel Berry que era a personificação da insistência louca e da teimosia desproporcional. A morena ficou em silêncio e quando ela retomou o ar para iniciar um dos seus monólogos defensivos, Kurt voltou a interrompê-la. - Em segundo lugar, eu não vou ajudar você em relação a Quinn.

Nós dois sabemos que eu sou melhor do que aquele mauricinho com quem ela dançou na noite anterior... — Rachel respondeu rapidamente e pela velocidade de sua resposta, era evidente que ela estava ofendida. Kurt revirou os olhos para o comportamento e bufou irritado. Rachel, aparentemente, percebeu porque a sua voz se abrandou no outro lado da linha. - Olha, eu só preciso que passe o telefone para ela. Eu só vou me desculpar, juro.

— Nós dois sabemos que quando você pede desculpas, você também flerta... É inerente a sua personalidade, Berry. - Kurt respondeu entediado e ele quase não acreditou no suspiro lisonjeado que Rachel soltou do outro lado da linha. Realmente, aquela morena era o completamente oposto de Quinn, a sua amiga jamais faria algo do tipo diante de uma reprimenda. Kurt apanhou a sua bermuda pendurada na cabeceira da cama e prendeu o aparelho entre a orelha e o ombro enquanto a vestia. - De qualquer forma, não tem como eu passar a chamada para ela. Quinn saiu cedo.

Eu imaginava e também imagino que ela tenha dito aonde ia... — A voz de Rachel foi sugestiva, ela esperava que a sua súplica amolecesse o coração de Kurt, mas, o rapaz só revirou os olhos, mais uma vez. Rachel teria que ser mais persuasiva do que aquilo. - Você sabe que eu posso ajudar você também, não sabe, Hummel?

Kurt ficou em silêncio. Rachel estava referindo-se a que? A sua mente ainda estava bastante sonolenta para que ele pensasse, rapidamente, sobre o que ela falara. Contudo, quando, enfim, chegou à conclusão, Kurt corou da cabeça aos pés e o seu coração acelerou mais do que o desejado. Por fim, o seu nervosismo se manifestou por meio de palavras trêmulas:

— Eu não sei do que você está falando.

Ah, claro que sabe... Não se faça de bobo porque eu sei que você não é, Hummel. Seja um bom menino e a vida sorrirá para você. — Kurt apertou o smartphone em sua mão direita enquanto a esquerda se fechava em um punho, toda aquela agressividade tentava canalizar a irritação e a vergonha que sentia. E, mesmo distante de Rachel Berry, ele pode sentir todo o escárnio presente no sorriso vitorioso dela. Kurt respirou fundo e, de mãos atadas pelo sentimento que brotava em seu peito, ele respondeu derrotado:

— Ela foi velejar com Biff.

Velejar? Sério? Esse mauricinho consegue ser ainda mais brega do que eu imaginava... Mas, velejar onde? — Rachel parecia ter se esquecido completamente que Kurt estava do outro lado da linha, ela estava no meio de um monólogo e ele revirava os olhos. Jamais entenderia o que uma garota como Quinn vira em uma como Rachel, elas eram mais um mistério do brejo que ele achava conhecer e que, ainda assim, o surpreendia. Kurt apertou a ponte entre os olhos e impaciente, grunhiu:

— E você ainda diz que conhece a California... Por Deus, Berry! Ela foi a Marina Del Ray com ele!

Eu estaria abusando demais se pedisse, também, o nome do veleiro dele? — A voz de Rachel parecia mais leve do que no começo da conversa e, de certa forma, até parecia charmosa. Kurt não demorou a perceber que ela estava tentando arrancar mais informações dele, entretanto, essa informação não possuía (acreditava que nem Quinn sabia qual o nome do barco de Biff). Kurt pigarreou, interrompendo mais uma das súplicas infundadas de Rachel e respondeu:

— Eu não sei o nome, você terá que se virar.

Isso não será problema para mim... O céu é o limite tratando-se da sua amiga! Muito obrigada, Hummel! — Rachel falou rapidamente, como se estivesse ligada na mais alta voltagem existente. Kurt afastou o telefone do ouvido e o contemplou com a sobrancelha arqueada, mal teve tempo de pedir pela sua parte do acordo e duvidava muito que Rachel o recompensasse por algo...

Todavia, parecia que a morena estava de muito bom humor. Enquanto Kurt despertava por completo, seu celular voltou a vibrar. Era uma notificação de um aplicativo de mensagens, o sorriso brilhante de Rachel apareceu no canto da tela junto ao seu nome e apenas um número, com o código telefônico da California, foi enviado.

Kurt voltou a sentir o seu pescoço queimar. Tinha o número dele, mas, o que deveria fazer agora?!

# # # # #

Os orbes azuis foram revelados quando as pálpebras finalmente se abriram, ainda assim, Marley sentia que não tinha dormido direito. Aliás, como dormir bem depois de tudo que vira na noite anterior? Era muito a ser processado e aquele Verão parecia muito quente, não contribuindo em nada para que a sua cabeça funcionasse. No calor, nas férias e em Santa Monica, tudo levava a entender através do sentimento. Na liberdade do Verão, não existia tempo para as amarras racionais das outras estações... Contudo, Marley sentia que, talvez, usando da racionalidade, ela pudesse entender o que acontecera e não amargar o que presenciara.

Ela acordou mais de uma vez durante a noite. Nas primeiras vezes, tudo foi motivado pelo trabalhar incansável de seu cérebro e pelo bater acelerado e repleto de adrenalina de seu peito, entretanto, conforme a noite se passava e a madrugada chegava, Marley passou a acordar não somente por seus motivos e, também, por causa de Rachel.

Claro que estava magoada com a sua melhor amiga, precisaria de algum tempo para digerir aquela Rachel que não conhecia. Marley sempre desconfiou que Rachel escondia algo, só não esperava que, na verdade, a morena estivesse aprisionando uma parte de si - a mais destrutiva e demoníaca - de todos os que a cercavam. Marley estava preocupada com o que esse segredo podia trazer, mas, sentia-se traída, tanto pelas suas próprias percepções quanto pela ausência de palavras de Rachel. Ela deveria ter percebido e indagado e Rachel deveria, de alguma forma, ter falado. 

A amargura que encontrara nos olhos de Rachel, na noite anterior, destoava completamente com o aconchego que tantas vezes eles possuíram. O tom irônico não lembrava o brincalhão que foi usado, mais de uma vez, para tirar sarro da falta de tato de Marley com as pessoas. E toda aquela embriaguez entrava em conflito com a sobriedade, ainda que ébria, com a qual Rachel enfrentava a vida. Rachel costumava achar graça das desgraças que lhe aconteciam, só que, ontem, ela parecia estar em seu limite e, diante desse esgotamento, ela arremessara todos os seus desgostos em quem se importava com ela.

Rachel assemelhava-se muito com uma bomba que, ao terminar o seu pavio, explodira. E nessa explosão, vários fragmentos e estilhaços se espalharam e alguns deles, talvez os maiores e mais perigosos, penetraram e sangraram Ruby e, por conseqüência, Marley.

A nova-iorquina não sabia dizer o que esperava da antiga relação de Rachel com Ruby, mas, envolvera-se na certeza de que tudo estava acabado. A sua melhor amiga, com toda a sua insensatez, deixara claro, nas entrelinhas, que tudo estava acabado. Entretanto, Rachel exigira mais de Ruby e Marley presenciou tudo. Talvez, tenha visto mais do que deveria, mas, naquele momento, no lado de fora do “Jewelry of the Coast”, Marley sentiu-se como intrusa.

Tudo era novo, Marley era a novata naquele Verão e não tinha exigência alguma sobre o passado - e o presente? - que Rachel possuía com Ruby. Jamais estaria em plena igualdade com as duas e, talvez, também não fosse digna de se meter em uma relação tão intensa e que, aparentemente, permanecia repleta de carinho e dedicação. Caso contrário, Ruby não estaria tão empenhada em abrir os olhos de Rachel na noite anterior.

Marley não sabia o que pensar, nunca fora boa com pessoas e, por isso, os sentimentos pareciam presos em sua garganta, apertando-a e sufocando-a. Ela sabia as palavras que deveria dizer, contudo, elas se perdiam no nó em seu pescoço e, no local delas, vinham as palavras repletas de fúria, de ciúme e de decepção.

Não deveria sentir aquelas coisas, mal conhecia Ruby e Rachel era a sua melhor (e única) amiga. Marley sabia que deveria tentar compreender ambos os lados, sabia que deveria esperar por explicações... Só que não queria abandonar a si mesma em favor dos outros, a sua vida fora feita de doações e consentimentos e, daquela vez, ela queria exigir e não entregar. Marley queria uma parte de Ruby, talvez, a que ainda estivesse presa a Rachel.

A nova-iorquina não se orgulhava de seus sentimentos, só que também não conseguia deixar de senti-los. Por isso, perdida na bagunça instalada dentro de si, Marley se levantou e tomou um banho, escovou os dentes e procurou deixar a sua cabeça vazia. Quem sabe assim, o seu coração se acalmasse o bastante para que ela não fizesse besteira. Ela praticamente arrastou-se pela casa de Puck, remexendo nos cabelos loiros e respirando profundamente enquanto caminhava, uma dor de cabeça irritante instalara-se em suas têmporas, piorando o que já estava ruim.

Na cozinha, Marley encontrou Puck parado junto à máquina de café e Sam olhando confuso para o seu smartphone. Os dois levantaram os olhos quando ela tropeçou em um dos baquinhos espalhados em torno da mesa da cozinha, Sam sorriu amigavelmente para a sua falta de jeito, Marley corou e Puck grunhiu preguiçoso:

— Bom dia, miss New York!

— Bom dia, meninos... - Marley resmungou desanimada e jogando-se em um dos bancos e esticando-se para alcançar a jarra com suco de laranja. Pelo menos, naquela manhã, os meninos estavam sóbrios e saudáveis o bastante para prepararem um bom café-da-manhã. Marley também alcançou alguns donuts e deu uma bela mordida em um, o seu estômago contorceu-se deliciado e ela, mesmo sem motivos, sorriu. Comida era algo que conseguia amenizar a ruindade de seus piores dias, dias como aquele, aliás. Sam sentou-se ao seu lado, finalmente abandonando o smartphone e, preocupado, perguntou:

— Conseguiu dormir bem?

— Não foi uma das minhas melhores noites, acordei várias vezes... Acho que estava preocupada com Rachel. - Marley respondeu nervosa, não estava mentindo, por mais que estivesse, na maior parte do tempo, com vontade de dar um bom sermão em Rachel e não de recebê-la de braços abertos quando voltasse. Sam sorriu compreensivo, Puck, porém, fez um barulho exagerado ao retirar a jarra de vidro da máquina de café e colocá-la sobre o tampão da pia. O olhar nublado de Marley foi até ele e encontrou o bad boy de cenho franzido, bebericando o café. A nova-iorquina franziu os lábios. - Tem algo a dizer, Puck?

O tom de voz de Marley saiu mais inquisidor do que ela pretendia, os seus olhos também denotavam a insatisfação que ela tentara dissimular através das palavras e a sua expressão transformou-se de desânimo em defesa. Puck não precisou observá-la por muito tempo para entender o que se passava em sua cabeça - toda a sua mágoa e decepção estavam latentes e Marley nunca fora boa em esconder como se sentia -, ele suspirou e repousando a xícara quente na pia, disse cuidadoso:

— A noite de ontem não foi uma das melhores para a Rae... Tente não julgá-la, ela tem os motivos dela para ser como é.

— E esses supostos motivos dela também justificam o que ela faz para os outros? - Marley perguntou de expressão fechada, a indignação evidente em cada uma de suas palavras e, também, na dor presente em seu olhar. O tom azul estava vívido agora, elétrico e machucado. Puck desviou os olhos dela, o seu perfil, denunciava a tensão em seu rosto. O bad boy defenderia Rachel até se ela matasse alguém. Marley agitou a cabeça e abandonou a discussão, respirou fundo e voltou-se para o suco.

Nesse silêncio incômodo, em que Sam olhava de Puck para Marley, Finn chegou com o seu sorriso torto e felicidade inocente. O grandalhão cumprimentou todos de forma genérica e sentou-se do outro lado de Marley, puxando a jarra de suco para si enquanto terminava com os donuts existentes na caixa. Sam limpa a garganta e, tentando soar o mais animado possível, sugere:

— Poderíamos ir ao píer e, depois, almoçarmos fora. Garanto que Rachel estará conosco até o almoço e poderemos esclarecer grande parte da situação.

— Eu acho uma excelente ideia, só esperem um pouco porque faz muito tempo desde que encontrei um café-da-manhã tão bem feito na casa de Puck. - Finn respondeu aos risos e olhando para o bad boy, imediatamente, a carranca dele se desfez e ele esmurrou os enormes ombros de Finn antes de lavar a sua xícara na pia. Sam bateu palmas e se levantou, apanhando as chaves do jipe próximas à porta.

Marley, mais do que ferida, sentiu-se deslocada. Aqueles garotos eram os amigos de Rachel e, subitamente, quis sair correndo e trancar-se no seu quarto. A sensação de estar sendo observada a distraiu desses pensamentos e, ao erguer os olhos, encontrou Puck a observando. Marley não conseguiu determinar, com exatidão, a natureza daquele olhar, apreendeu poucas coisas e nenhuma delas lhe agradou.

A nova-iorquina levantou-se da mesa, sem terminar o seu suco ou o seu donut. Decidida, Marley chegou ao jipe do lado de fora e ocupou o lugar no assento do carona. Sam apenas a olhou de lado, mas, não ousou fazer pergunta alguma. Cerca de dez minutos se passaram até que Puck e Finn saíssem e trancassem a casa. O trajeto até o píer foi feito em silêncio, destoando totalmente da bagunça promissora que recepcionara Marley em Santa Monica.

Era cruel pensar que, talvez, Rachel tivesse destruído o Verão de todos... Mas, era exatamente isso que parecia ter acontecido.

 

O jipe foi estacionado em silêncio e, da mesma forma, todos desceram e bateram as portas do carro ao chegarem às areias próximas ao píer e em frente ao “Jewelry of the Coast”. Puck, Sam e Finn estavam com os seus óculos escuros assim como Marley, porém, enquanto os três rapazes estavam atentos ao movimento no píer, a nova-iorquina estava distraída com a fachada do restaurante.

Na verdade, os seus pensamentos estavam além do local, concentrados, especificamente, em sua dona. Mesmo chateada, Marley se viu perguntando se Ruby estaria lá dentro e, mais intimamente, também gostaria de saber se ela pensara no que ocorrera na noite anterior. Ela não saberia se não perguntasse e Marley temia pela resposta que teria independente do sim ou do não, não ficaria feliz com o que teria.

O sim significaria que Ruby pensava, de alguma forma, em Rachel e o não poderia representar que a californiana não se importava tanto com o passado, levando Marley a se perguntar se ela se preocupava com algo, de fato.

Marley era uma pessoa de palavras, a sua timidez e a sua insegurança faziam com que ela buscasse por permissões e segurança, por isso, ela gostava quando deixavam tudo às claras por meio de uma conversa... Entretanto, naquele momento, Marley queria que algo acontecesse e que esse algo não envolvesse palavras e sim, ações...

— Marley! Você não vem? - A voz de Sam, naturalmente animada e leve, interrompeu o fluxo de pensamentos da nova-iorquina, trazendo-a de volta para a realidade e pelo sol matinal já intenso de Santa Monica. Marley virou-se em direção aos rapazes, Puck e Finn já estavam a caminho do píer e Sam ficara para trás, sorrindo compreensivo para ela. Ela suspirou e rompeu a distância entre eles, Sam a recebeu com um abraço de lado. - Vamos entender se você quiser ficar por aqui, pretendemos voltar para o almoço.

— Eu não sei se devo... Na verdade, mal sei o que quero, no momento. - Marley respondeu insegura, retirando os óculos de sol e massageando as pálpebras. Os olhos azuis límpidos estavam cansados e avermelhados, como se a luz estivesse castigando-os naquela manhã, mesmo protegidos pelas lentes dos óculos de sol. Sam manteve o sorriso e inclinou a cabeça, ele afastou Marley de si apenas para colocá-la frente aos seus olhos e segurá-la carinhosamente pelos ombros. Sam suspirou e gentil, aconselhou:

— Não é como se o Verão exigisse muito do nosso pensar... Estamos falando das férias de sol, mar, praia e bagunça. Não há muito que pensar quando se tem muito a fazer.

Por mais que as palavras fossem um conselho, Marley pode compreender que Sam também dizia aquelas palavras a ele mesmo. Assim como a sua atração por Ruby era visível, a de Sam por Kurt também era. E Marley realmente invejava como os rapazes eram tranqüilos em relação a isso, não existia um drama absurdo pesando sobre eles, nem existia necessidades porque eles levavam tudo com muita calmaria e tranqüilidade. Enquanto Ruby e Marley foram, efetivamente, pegas no tornado de Rachel com todos os seus sentimentos engasgados.

Sam soltou Marley e, sem chamá-la uma segunda vez - provavelmente, sabendo qual seria a próxima atitude dela antes mesmo que ela decidisse o que fazer - atravessou a avenida à beira-mar para juntar-se aos garotos no píer. Marley voltou a olhar para a fachada do “Jewelry of the Coast” e os seus olhos azuis rapidamente venceram a batalha contra a ardência, ela recolocou os óculos escuros e firmou a postura.

Não se deixou levar pela razão e jogou-se nos braços da inconseqüência. Ruby lhe devia algo e ela cobraria, com certeza.

O sorriso de Sam Evans se encaixava bem as suas feições, mesmo que ele tivesse uma boca anormalmente grande para os padrões normais. Ao sorrir, ele harmonizava os contornos de seus lábios e esse sorriso era sempre cheio de gentileza e carinho. Sam era naturalmente feito de boas energias... Mesmo magoado, ele podia despertar o melhor naqueles que gostava e, por isso, dissera aquelas palavras a Marley que, inexplicavelmente, também tocaram o seu coração.

A indecisão nos olhos de Marley contrastava com a própria certeza devidamente protegida em seu peito. Sam não se preocupava com muita coisa além da sua constante busca pela felicidade. O rapaz não era fã de conflitos, nem de fofocas, muito menos, de arrependimentos... Por isso, o que batalhava no peito de Marley já era uma guerra vencida dentro do seu.

Sam não pensava que se apaixonaria naquele Verão, tampouco imaginava que seria diferente de tudo que já vivera... Mas, era o que o deixava feliz. Era o que acelerava o seu coração diante da possibilidade de um encontro surpresa, era o que abria um sorriso bobo em seu rosto ao vê-lo e, principalmente, era o sentimento que, mesmo tão jovem, já o transformara em alguém melhor... Um rapaz mais feliz, com menos preconceitos e muito mais compreensão.

O garoto da California realmente se orgulhava de como lidara com a situação. Mas, tampouco, se surpreendia. O amor era amor, independente da sua natureza ou de sua orientação.

O sorriso caloroso ainda estava presente em seus lábios grossos ao encontrar Puck e Finn parados em frente a um cartaz pregado próximo a um dos quadros de avisos no Píer de Santa Monica. Sam aproximou-se dos amigos e Puck, ao perceber o seu sorriso, comentou brincalhão:

— Droga, cara. Você fica muito esquisito quando sorri feliz desse jeito.

— Pare de ser inconveniente, Puckerman! - Sam respondeu rindo do amigo, abraçando-o e o puxando para um cascudo na careca. Puck se desviou dele aos socos e pontapés e Finn, em sua postura naturalmente tranqüila, sequer se incomodou, ele estava muito ocupado lendo o anunciado no cartaz. Sam empurrou Puck e adiantou-se para o cartaz, mas, os ombros largos de Finn o impediam de ler qualquer coisa. - O que vocês estão fazendo parados aqui?

— Puck teve uma ideia, uma das suas muitas ideias idiotas... - Finn respondeu irônico, revirando os olhos para Puck que, no momento, encontrava-se emburrado e ofendido. O gigante finalmente se afastou do cartaz e Sam pode lê-lo. Assim que constatou o interesse de Puck por ele, foi a vez de Sam revirar os olhos. Era impressionante como o amigo bad boy conseguia ser inconseqüente independente da situação. Sam suspirou e censurou delicadamente:

— Você não vai nos inscrever num festival de bandas amadoras, cara.

— Por que não? - Puck perguntou curioso e tanto Sam quanto Finn podiam enumerar mil e uma justificativas, desde o fato de que eles não eram, efetivamente, uma banda formada até o fato de que Rachel estava em um dos seus péssimos momentos e de que não tinham um vocalista. Contudo, Puck estava totalmente envolvido em seu devaneio para escutá-los ou perceber as suas desaprovações para aquilo, ele abriu um sorriso cheio de intenções, Sam e Finn se encolheram. As ideias de Puck sempre eram péssimas e os colocavam em confusão. - Vocês e Rachel estudam enquanto eu limpo piscinas e toco na noite. Considerando que vocês sempre vêm para cá no Verão, meu orçamento fica seriamente comprometido porque essa é a melhor época para eu ganhar dinheiro e eu não trabalho para acompanhar vocês!

— Ok, cara... A gente pede desculpas por atrapalhar os seus ganhos, talvez, a gente nem volte no ano que vem. Mas, você não vai nos inscrever em um festival de bandas amadoras. - Finn voltou a sentenciar severo, ignorando completamente o drama que, com toda a certeza, Puck aprendera com Rachel. Sam ficou ao lado do gigante, acenando afirmativamente para tudo que ele dizia. O bad boy não se deu por vencido, ele ainda tinha uma expressão obstinada nos olhos e voltou a responder animado:         

— Eu não reclamo de nada disso, pelo contrário, sempre quero vocês de volta, ano após ano! Mas, eu quero férias leves, sem brigas... E, levando em conta o show que Rachel fez ontem à noite, a gente talvez precise disso para salvar o nosso Verão.

Sam e Finn ficaram em silêncio diante da ideia, mesmo completamente maluca e arriscada, ainda assim, era uma boa ideia. A música era uma das poucas coisas que traziam Rachel de volta à racionalidade e, talvez, aquela fosse uma boa oportunidade de terem a sua baixinha preferida de volta. Finn olhou de lado para Sam que, mesmo inseguro, cedeu. Era uma boa ideia, contudo, ainda havia algo que não encaixava e foi Finn que, surpreendente, levantou a questão:

— Ok, mas, nós ainda não temos um vocalista, gênio.

— Quem disse que não? - Puck perguntou com um ar malévolo, apontando para a entrada do “Jewelry of the Coast”. Sam se virou e sorriu de lado, satisfeito, ao perceber que Marley não mais estava na calçada e sim, dentro do estabelecimento vazio e recém-aberto. Finn bateu com a mão espalmada na testa, visivelmente, desaprovando a atitude do amigo. Sam acenou negativamente com a cabeça e disse:

— Marley detesta cantar em público, sabe disso.

— É Verão e se ela foi capaz de ir se resolver com a Clearwood, ela será capaz de cantar em cima de um palco! - Puck respondeu despreocupado, prontamente se direcionando para a mesa posicionado mais a frente, onde um garoto estava com os formulários de inscrição. Sam observou chocado e demorou a agir até que jogou o corpo para frente, em uma tentativa de impedir o amigo de inscrevê-los. Finn ficou para trás, atendendo ao celular.

Puck já escrevera o nome e Sam precisou de um esforço anormal para decifrar a caligrafia relaxada do amigo. Animado, Puck escreveu o nome de cada membro e a função de cada um na banda. Ao chegar no final do formulário, ele se virou para Sam e com um sorriso sem vergonha, comentou:

— Precisamos de 50 dólares para finalizar a inscrição.

— Você é um idiota, Puckerman. - Sam respondeu contrariado antes de entregar uma nota de 50 dólares ao amigo. Puck a apanhou eufórico e antes que entregasse tudo ao rapaz, Sam finalmente conseguiu ler o suposto nome da banda e não conseguiu sufocar a risada diante da falta de jeito artístico do amigo bad boy. - New Directions? Jura? Não tinha nada mais sem graça?

— Qual é? Tem uma ideia melhor? - Puck perguntou ofendido e com as bochechas avermelhando, ele entregou tudo ao rapaz que destacou a porção inferior do formulário, entregando-a a eles, justamente com o recibo do valor da inscrição. Nesse momento, Finn chegou, o gigante estava pálido e, nervoso, disse:

— Eu preciso pegar o jipe emprestado.

— Aconteceu algo, cara? - Puck perguntou preocupado, estendo-lhe às chaves, mas, Finn já as apanhara e saíra correndo pelo píer antes mesmo que a pergunta fosse terminada. Sam franziu a expressão para a atitude do amigo enquanto Puck, com a sua despreocupação tranqüila, deu de ombros.

A dupla voltou a caminhar pelo píer, Puck vitorioso com a inscrição em mãos enquanto Sam procurava, através da multidão de turistas, por um par de olhos claros conhecidos e saudosos aos seus próprios olhos.

 

Ruby escrevia rápido no papel apoiado à prancheta que estava segurando. A californiana detestava contar o estoque porque a atividade era entediante e requeria muita atenção, porém, era justamente por causa dessas duas particularidades que, naquela manhã, ela estava conferindo tudo que tinha na dispensa em vez de estar no salão do restaurante, arrumando tudo para o horário do almoço.

Ao se envolver com os números de garrafas de cerveja, sacos de trigo e potes de conserva, Ruby dedicava a sua atenção ao que tinha e ao que deveria ser comprado. Sendo assim, não precisava pensar no que acontecera na noite anterior, nem em Rachel e, muito menos, em Marley. A californiana não sabia o que deveria digerir, muito menos, o que deveria sentir diante de toda a confusão.

Claro que estava magoada com Rachel, sabia dos motivos dela, conhecia o passado e todas as feridas que a morena possuía... Mas, não conseguia lidar com o fato de que fora um efeito colateral com o qual Rachel não pensara ao agir da forma que agira na noite anterior. A bebida era o motivo, mas, não uma boa justificativa. Porque, afinal, o álcool trouxera tudo que Rachel escondera à superfície.

Por isso, Ruby não deveria, porém, pensara no que Rachel lhe dissera sobre serem iguais e procurarem as mesmas coisas. Claro que existiam semelhanças em seus passados - sobretudo, em relação as suas perdas - entretanto, Ruby sempre pensara que quisera mais em tudo que dividiram, no romance daquele Verão mágico preso no passado até a amizade no presente conturbado. As perguntas de Rachel deram voz às próprias dúvidas que existiam tão silenciosas em seu interior.

E, ao se perguntar se queria e esperava por mais, Ruby imediatamente se voltava para Marley que era a porção mais complicada daquela equação. A nova-iorquina chegara de forma mansa e, ainda assim, avassaladora a sua vida... Ruby não tinha dúvidas de que estava apaixonada, porém, também se lembrava de ter se apaixonado por outra garota de New York que a abandonou, sem qualquer culpa, no fim de um Verão... Ruby não queria passar por isso de novo.

Além de todas as palavras caladas de Rachel que foram esbravejadas na noite anterior, esse era o outro motivo que tirara o sono de Ruby e que a fizera se fechar na dispensa, cercada de números que ela abominava: a partida de Marley.

Justamente no momento em que Marley a deixou, sem chance de explicar-se ou de desculpar-se - por algo que não fizera e pelo que, ainda assim, estava disposta a pedir perdão - Ruby entendeu que não suportaria se Marley fosse outra garota de New York ou mais uma das garotas de Verões passados em sua vida. Ruby não queria que ela dissesse adeus como as outras disseram, tampouco, gostaria que Marley transformasse em uma amiga.

Ruby queria que ela fosse diferente e quem sabe, uma das poucas para se tornar a única.

A californiana chacoalhou a cabeça, os longos cabelos loiros soltaram-se do coque parcamente preso que ela arrumara e a incomodaram, mas, ela evitou pensar neles e em Marley, procurando se concentrar nos números. Números, somas e subtrações eram as melhores alternativas para uma cabeça que insistia em procurar as razões do coração.

Contudo, a concentração de Ruby durou até o instante em que ela escutou a chave trancar a fechadura da dispensa. A californiana bufou impaciente e pronta para mandar o funcionário que fosse responsável por aquela interrupção. Porém, assim que se virou para enfrentar quem chegara, a prancheta e a caneta caíram de suas mãos porque os seus olhos se seguraram em outras coisas.

Os seus olhos azuis escuros, feito as águas mornas do Oceano Pacífico encontraram um par muito semelhante ao seu, olhos azuis límpidos, feito os céus da California. Porém, naquela manhã, esses olhos estavam ligeiramente avermelhados, denunciando certo cansaço, porém, ainda possuíam certa intensidade dentro deles e, atingida por ela, Ruby abriu a boca, mas, não conseguiu dizer palavra alguma.

Marley foi muito mais corajosa, a nova-iorquina deu um passo a frente e, ainda que estivesse visivelmente nervosa, se inclinou o bastante para invadir o espaço pessoal de Ruby e deixar a californiana visivelmente desejosa por mais. Marley suspirou, sorriu sem jeito e, com as bochechas corando em um rubor que só fez Ruby morder os lábios, deliciada, sussurrou:

— Eu acho que você me deve uma aposta.

— O que...? - Ruby balbuciou uma pergunta, mas, os seus lábios encontraram os de Marley antes que pudessem se deparar com a resposta. A nova-iorquina se lançou nos braços californianos, sempre a procura demais até que, enfim, Ruby sentiu as suas costas firmemente pressionadas de encontro à parede da dispensa. Marley segurou o rosto de Ruby, antes de suas mãos escorregarem para cintura bronzeada, arrepiando cada pedacinho de pele por onde passaram. A californiana espalmou as mãos nas costas da mais nova, procurando respirar entre os beijos que a afogavam, tomando o seu fôlego e a levando, cada vez mais, ao fundo.

Marley não tinha muita noção do que fazia, exceto, que os seus lábios estavam deliciando-se, mais uma vez, com os de Ruby. A nova-iorquina reconheceu cada rachadinho na boca californiana, assim como se arrepiou com cada arranhão que, inconsciente, Ruby aplicou em sua pele. As suas mãos apertaram a cintura californiana à procura de apoio porque as suas pernas tremiam. O oxigênio faltava e elas tentavam apanhá-los aos suspiros pesados e gemidos cada vez mais audíveis, nenhuma delas sabia direito como ainda estavam em pé quando, na verdade, estavam nadando nos oceanos de cada uma...

Com muito esforço, Marley se afastou. Ela, novamente, segurou o rosto de Ruby entre suas mãos e selou os lábios em um último beijo sôfrego e surpreendentemente inocente para os arranhões, lábios inchados e cabelos descabelados resultantes do que dividiram naquela dispensa. Marley sorriu um sorriso inocente que não combinava com a malícia presente em seus olhos, Ruby surpreendeu-se com o que encontrou e, se perdeu, quando a nova-iorquina sussurrou rouca pelo desejo em sua orelha:

— Foi muito bom ganhar a aposta.

Sem dizer mais nada - porém, lutando bravamente contra os seus impulsos - Marley deu às costas para Ruby e destrancou a porta da dispensa, antes de sair dali. A californiana olhou completamente desnorteada para porta e quando, finalmente, entendeu o que acontecera, sorriu encostada à parede e levou à mão aos lábios inchados. Um sorriso bobo brotou nos lábios levemente rachados e Ruby, extasiada, sussurrou para si mesma:

— O que foi isso?

A pergunta era retórica, Ruby sabia exatamente o que acontecera. Aquela atitude provara que Marley não era qualquer uma... Aquela nova-iorquina poderia ser, afinal, quem quisesse ser em sua vida.

# # # # #

Finn só era inconseqüente na direção de um carro quando a situação exigia menos bom senso do que ele estava acostumado a possuir. Ele não sabia dizer se uma ligação desesperada de Rachel Berry se encaixava nesse tipo de situação ou se ele estava sendo protetor em relação à amiga depois da noite que ela tivera, mas, no fim das contas, ele fizera um trajeto de 15 minutos em, exatamente, dez minutos.

Depois de praticamente furtar o jipe de Puck, ele estava em Marina Del Rey, o lar das casas flutuantes - as lanchas, os iates e veleiros - que ele somente freqüentava quando alguém precisasse que ele quebrasse um galho no motor de algum barco ou em situações totalmente sem sentido como aquela. Marina Del Rey era uma região a oeste de Los Angeles em que o ritmo de vida era tranqüilo, completamente diferente da loucura que ele e o seu grupo de amigos constantemente viviam toda vez que Rachel chegava a California.

Por isso, era intrigante que a morena tivesse o intimado a vir até ali. Ainda mais depois que ele, quando questionado, dissera que tinha alguns conhecidos que lhe deviam favores naquela região.

Finn mal estacionara o jipe e já encontrara Rachel andando de um lado para o outro no calçadão que terminava em uma grade, separando os barcos da terra firme. Assim que o viu, a morena marchou em sua direção e praticamente o tirou de dentro do jipe.

O gigante sempre se impressionara com a força de Rachel, ainda mais quando ela estava ansiosa, ela praticamente o estava arrastando para um dos prédios próximos em que ele dissera que tinha conhecidos. Finn, com muito esforço, parou na metade do caminho e perguntou confuso:

— Qual o seu problema, mulher?!

— No momento, você, Hudson! - Rachel respondeu impaciente, ela usava óculos escuros, mas, Finn a conhecia o bastante para perceber que ela semicerrava os olhos e fizera uma careta pela elevação do tom de sua voz. A ressaca, com certeza, não estava sendo boazinha com ela e ainda assim, ela estava ali, debaixo do sol. Com certeza, deveria existir um bom motivo para isso. Rachel respirou fundo e colocou as mãos na cintura. - Eu preciso que você me ajude a descobrir tudo sobre um veleiro que, provavelmente, está no mar nesse momento. Quero que descubra onde ele está atracado, quem são os donos e quanto tempo pretendem ficar aqui.

— Você sabe quantos veleiros tem em Marina Del Rey, Rach?! - Finn questionou alarmado, ele já podia sentir que suava de nervosismo debaixo daquele sol que começava a escaldar. Rachel o empurrou furiosa em direção ao prédio que, na verdade, era uma oficina. Finn tentava firmar os passos no chão, sem sucesso algum. Era patético que ele pudesse agüentar os trancos dos jogadores de futebol no campo e não conseguisse, sequer, resistir a sua amiga baixinha. - Vamos demorar muito até acharmos esse maldito veleiro!

— Então, é melhor começarmos logo! - Rachel ordenou autoritária e Finn obedeceu mais por bom senso do que por concordar com toda aquela história sem sentido. Os dois caminharam pelo calçadão e finalmente chegaram à oficina.

Era um estabelecimento antigo e até mesmo, sombrio, levando-se em conta que era bastante escuro comparado às outras construções da Marina. Finn caminhou à frente e Rachel, mesmo ansiosa, sorriu para a atitude protetora do amigo que desapareceu com as feições simpáticas, olhando feio para qualquer mecânico sujo de graxa e outros fluidos, que olhasse mais de duas vezes para a sua amiga.

Finn e Rachel foram até o fundo da oficina, sendo novamente recebidos pelo sol porque o escritório encontrava-se em um puxadinho em uma varanda aberta. Um homem estava sentado atrás de uma mesa e ele sorriu para Finn ao levantar os olhos. O chefe tinha cabelos enegrecidos e estava sujo pela graxa, ainda assim, ele olhou interessado para Rachel e perguntou charmoso:

— O que uma lindeza como você faz na minha oficina acompanhada pelo Hudson?

— Cai fora, Tony... Ela não é para você. - Finn soou extremamente fraternal e duro naquela resposta, Rachel cutucou o amigo nas costelas e sorriu agradecida para ele. Esse sorriso pareceu ser um energético para Finn porque ele aprumou a postura e pigarreou. - Eu preciso de algumas informações e creio que você pode me dá-las. Afinal, você me deve uma... Uma não. Muitas, na verdade.

— Isso é só porque você realmente salvou a minha pele em algumas situações... O que quer saber, Hudson? - Tony estava visivelmente desanimado por ter sido tão violentamente repelido por Finn, mas, parecia disposto a ajudar. O mecânico permaneceu em pé e Finn sorriu agradecido para ele, antes de perguntar:

— Você ou um de seus rapazes fez revisão em algum veleiro ou ficou sabendo de algum veleiro novo que atracou na Marina recentemente?

— Acho que não... Você sabe que o movimento, geralmente, é antes do Verão. E eu não me lembro de nenhum veleiro que tenha estragado ou algo do tipo. - Tony foi bastante seguro e profissional em sua resposta, ele até mesmo checou alguns papéis em cima de sua mesa. Finn olhou derrotado para Rachel e a morena respirou fundo, Finn era a sua única esperança e ela não queria perder a oportunidade de fazer algo decente por Quinn, se perdesse aquela oportunidade, provavelmente, voltaria a fazer algo bem ruim como o que fizera na noite anterior. Tony continuava a checar as suas informações em seus papéis e algo lhe chamou a atenção, Rachel cutucou Finn e ele logo entendeu o que ela vira. Tony tossiu. - Na verdade, um dos rapazes foi chamado por um veleiro hoje de manhã. Mas, aparentemente, não foi nada... Os mauricinhos que estavam por lá não entendiam muito da mecânica do veleiro. Alarme falso.

— Mauricinhos? - Rachel perguntou interessada e Tony acenou com a cabeça, mais uma vez, a morena sorriu em meio à ressaca que dava agulhadas em sua cabeça. Realmente, Quinn deveria ser muito importante para ela estar sorrindo em meio a tanta dor e mal estar. Finn olhou confuso para a amiga e ela segurou-lhe o braço, puxando-o para baixo até que a orelha dele estivesse na altura de sua boca. - São eles, eu preciso que descubra o nome do veleiro e onde ele está atracado, por favor.

— O veleiro se chama, vergonhosamente, Pacific Beauty e está atracado uns quinze metros a frente, mas, não adianta muita coisa... Eles saíram assim que resolveram o problema, devem estar no mar agora. - Tony respondeu de prontidão e assim que Rachel se virou para ele, ele piscou galanteador para ela e a morena riu alto, divertindo-se com a atitude dele. Porém, o rosto dela voltou a se fechar quando ela compreendeu as palavras do mecânico.

O seu plano de “roubar” Quinn dos braços do mauricinho caíra por terra, na verdade, fora levado pelo mar e agora, ela não tinha muito que fazer. Rachel estava abatida, ela realmente esperava que pudesse resolver aquilo de uma vez, mas, parecia tudo muito complicado e distante de suas mãos e aquele empecilho referia-se, somente, a porção que cabia a Quinn na equação. A morena sabia que ainda deveria conversar e se resolver com Marley e Ruby... Porém, diante daquela decepção, tudo se tornara mais complicado.

De uma forma estranhamente confortadora, Rachel sabia que se resolvesse o que havia de pendente com Quinn, grande parte de seus problemas seriam solucionados. E não era porque Quinn era a razão de todos eles e sim porque ela parecia ser a solução para muita coisa que não fazia sentido em sua vida desde que ela se fora...

Finn percebeu a discreta mudança no humor da pequena, ele poderia ser um amigo recente, contudo, era um dos que mais se perdida em observar à morena. No começo, foi porque se apaixonara por ela, mas, depois, ele desenvolvera um carinho extremamente especial por ela... Finn não conhecia as tristezas que nublavam o passado de Rachel, porém, sabia que elas faziam chover no presente da pequena e, por isso, não lhe negara ajuda naquele dia e nunca negaria.

Rachel fora a sua paixão de Verão e que, generosamente, se tornara a sua amiga para a vida inteira. Ele não iria abandoná-la, jamais.

Por isso, o grandão voltou a aprumar a postura. Novamente, o ar de irmão se apossara dele e ele engrandeceu diante da pequenez de Rachel frente àquele obstáculo. Finn não sabia por que Rachel precisava chegar àquele barco - desconfiava que fosse por causa de alguma mulher e saberia, com certeza, se fosse um pouquinho mais observador - e, ainda assim, estava disposto a ajudá-la. Ele virou-se novamente para Tony e disse animado:

— Nós vamos precisar de uma das lanchas que você usa para chegar aos barcos estragados, cara...

Tony abriu a boca para negar só que não continuou. Ele conhecia Finn há um bom tempo e sabia que ele estava decidido no que pedia. O mecânico não teve escolha a não ser apanhar uma das chaves nos ganchos da parede e jogá-la ao rapaz. Imediatamente, Finn e Rachel saíram desabalados para o ancoradouro da oficina e ele mal pode ditar-lhes as recomendações, temendo verdadeiramente pela situação em que receberia uma de suas lanchas.    

 

Quinn achava que teria um pouco de paz ao estar cercada por Biff e seus amigos, e estava extremamente enganada a respeito disso. A designer se esquecera que, com Biff, o falatório superficial a respeito de posses, clubes, sociedades e negócios era interminável. Aquela situação no veleiro era semelhante aos jantares em sua casa em Lima e Biff era o genro que o seu pai - o conservador e retrógrado, Russel Fabray, - desejava ter.

Naquele momento, encostada à grade a bombordo do veleiro, enquanto todos estavam a estibordo, Quinn perguntava-se porque aceitara vir até ali e, principalmente, porque dera atenção a Biff. Ela sabia, exatamente, o que a aguardava naquele dia no veleiro e ainda assim, preferira àquilo à companhia de seus amigos.

Na verdade, Quinn bem sabia o que a levava até ali. Era algo inerente a sua personalidade: ela sempre procurava familiaridade porque o que era novo e diferente a assustava. E, na noite anterior, diante de tudo que vira Rachel Berry fazer, ela experimentara sensações completamente novas e, até então, desconhecidas. A verdade era que ela vinha sentindo tudo novo desde que cruzara com aquela morena de sorriso hipnotizante e olhares escaldantes.

Rachel representava a inconseqüência e a liberdade que Quinn não fora permitida experimentar. A morena era feita de escolhas erradas, mas, de experiências inesquecíveis; de amigos tão loucos quanto ela e, acima de tudo, fiéis; de vivências momentâneas e sensações eternas... Rachel era o seu oposto e, mesmo assim, atraía Quinn de uma forma inexplicável e irracional. A loira sabia o que sentia, confessara aos amigos o que sentia, contudo, isso não queria dizer que ela não temia.

Quinn sentia-se que estava aquém do que Rachel poderia ter. Mesmo assim, a atitude destruidora e desleixada da morena na noite anterior a machucara. Mesmo sem possuir qualquer vínculo com Rachel, vê-la partir com outra a machucou mais do que poderia prever... Sobretudo, porque mesmo tão aquém do que parecia ser o parâmetro de Rachel - levando em conta Ruby Clearwood - Quinn sentia uma vontade absurda de protegê-la porque, mais uma vez, de forma inexplicável, parecia enxergar nela uma solidão que nenhum outro vira.

As atitudes de Rachel foram totalmente inesperadas e, por isso, Quinn pensava tanto nelas. Não tinha uma ideia formada sobre a morena, mesmo sabendo que estava diante da Rachel que se mostrava para o mundo e a que se fechara para ele. Queria cada uma delas, mesmo sabendo que poderia não ter alguma. E mesmo querendo, Quinn estava decepcionada. Era possível que pudesse admirar, se apaixonar e, ainda assim, decepcionar-se com alguém? Quinn pensava que era isso que dava certo realismo aos seus sentimentos desgovernados...

Ela podia estar apaixonada por Rachel - mesmo sem falar direito com ela - mas, isso não queria dizer que fecharia os olhos para os defeitos dos quais ela também era feita.

Os olhos esverdeados de Quinn encontraram as águas do Oceano Pacífico, a loira sorriu triste para a sua conhecida solidão e respirou a maresia que a envolvera desde o começo da manhã. Os seus ouvidos tentaram se distanciar do falatório, da música e dos risos plásticos que a acompanhavam no balanço do mar desde o começo da manhã e eles, de fato, se distanciaram. Mas, não foi o seu esforço em esquecê-los e sim, o som de outro motor a se aproximar.

Uma lancha acabara de emparelhar com o veleiro, era guiada por um garoto alto que ela, imediatamente, reconheceu como sendo Finn. Ele sorriu e acenou com uma das mãos enquanto a outra guiava a pequena embarcação, ao seu lado, Rachel Berry estava com os charmosos óculos escuros e o seu sorriso escaldante e fácil. Quinn engoliu em seco, ela beliscou-se para ver se não estava sonhando e surpreendeu-se ao sentir dor. A loira olhou inquieta por sobre o ombro, mas, todos no veleiro estavam muito distraídos em seus mundos superficiais para notar uma lancha próxima a eles.

— Surpresa! - Rachel gritou de forma envergonhada, agitando os braços e provocando um discreto sorriso em Quinn. A designer poderia até estar chateada com o comportamento da outra, mas, isso não a impedia de se surpreender pela audácia dela em vir até ali. O coração de Quinn acelerou-se diante dessa conclusão. E Rachel, parecendo nutrir de coragem a partir do sorriso dado pela loira, sorriu ainda mais. - Você não parece muito feliz em cima desse veleiro!    

O sorriso de Quinn aumentou porque a sua timidez impedia que ela escondesse sentimentos ou que ela os maquiasse. Também existia uma pequena parte de si, aquela esperançosa e naturalmente gentil que sabia perdoar - ainda mais vindo da família que ela vinha - que estava eufórica por Rachel, mesmo depois de tudo, estar ali. Quinn não conseguia determinar porque a morena continuava a importar tanto, mesmo depois da noite diabólica que tiveram e da distância que elas ainda tentavam transpor, mas, essa era uma daquelas situações inexplicáveis da vida.

O tipo de situação que, em outra ocasião, Quinn teria impedido que se aprofundasse. Mas, ela estava seduzida pela liberdade das férias de Verão e, principalmente, encantada por Rachel. Essas duas particularidades tornavam toda a situação irresistível.

— Eu estava tirando uma folga de toda aquela movimentação... - Quinn respondeu envergonhada, corando as bochechas enquanto apontava, de costas, para toda a agitação na extremidade oposta do barco. Rachel acompanhou o seu olhar e, mesmo a certa distância, Quinn percebeu as feições morenas determinarem uma careta julgadora e novamente riu. Finn parecia confuso, só que a careta irônica em seu rosto denunciava que ele julgava tanto quanto a amiga. Rachel retirou os óculos escuros e Quinn recepcionou, de bom grado, os olhos castanhos escaldantes, a morena deu um sorriso elétrico e estonteante antes de propor:

— Levando em conta que você está fugindo da suposta animação, eu acho que você ficaria melhor se simplesmente largasse esse pessoal aí e viesse conosco. Mais especificamente, comigo.

Finn sorriu satisfeito para a atitude corajosa e espontânea da amiga enquanto Quinn engolia em seco, sem saber o que deveria responder. Claro que existia uma parte de si que queria ir com Rachel, contudo, outra parte pedia para que ela tivesse parcimônia e, principalmente, paciência. Por mais que tudo em Rachel fosse sedutor, Quinn ainda tinha uma parte de si, a razão, dizendo para que ela fosse com calma e, principalmente, para que ela se lembrasse do que acontecera na noite anterior.

Rachel era intensa e não a conhecia tão bem a ponto de, simplesmente, abrir mão de um compromisso para fugir com ela... Então, por que estava esforçando-se para resistir bravamente a essa proposta?

— Quinn?! - Não houve resposta e sim, a voz de Biff ecoando entre elas e rompendo, rudemente, o contato visual tão particular que tinham estabelecido. Quinn observou o sorriso de Rachel perder a potência, a pergunta sem resposta nublou as feições tão animadas e a morena abaixou a cabeça, recolocando os óculos escuros e ajeitando um boné sobre os cabelos castanhos. Imediatamente, Quinn sentiu falta dos olhos dela e amaldiçoou Biff. - O que está fazendo aí sozinha? Quem são esses?

Biff percorrera a extensão do veleiro em poucos passos, a postura sempre orgulhosa, evidenciando o seu bom nascimento e, principalmente, a sua arrogância. Quinn agitou a cabeça para essas perguntas, incapaz de respondê-las por que tudo o que queria era, novamente, se perder dentro dos olhos castanhos que a observavam tão intensamente. Finn parecia ser o único são entre todos eles, o gigante aprumou a postura protetora e gritou do leme da lancha:

— Desculpe incomodá-lo, senhor. Estamos à procura de um veleiro que entrou em pane nas proximidades, achamos que fosse o do senhor.

— Esse veleiro dando pane? Quem foi que deu essa informação tão equivocada? - Biff retrucou irônico, com uma autoridade humilhante e desnecessária na voz. Quinn viu Rachel fechar os punhos ao lado do corpo, por alguns segundos, a Rachel intensa e determinada estava de volta, com bastante agressividade em cada pedaço de sua pequena estrutura corporal.

Finn soltou o leme, olhou com desagrado para Biff e segurou a mão de Rachel. A pequena desviou os olhos de Biff apenas para acenar afirmativamente com a cabeça e os dois, sem nada a responder, navegaram para longe dali com a lancha. Sozinha, novamente, Quinn virou-se para Biff e incomodada, resmungou:

— Isso foi desnecessário.

— Eles nos incomodaram por causa de uma informação mal dada, acho que foi necessário para que percebessem que estavam interrompendo a nossa diversão. - Biff respondeu frio, com um sorriso vitorioso nos lábios. Ele tentou abraçar Quinn, mas, foi repelido elegantemente. Quinn caminhou para a extremidade movimentada do veleiro, o pequeno sorriso em seus lábios desaparecera e ela, mais uma vez, estava entregue ao humor solitário anterior à presença relâmpago de Rachel.

Daquela vez, Quinn não quis ficar sozinha com os seus pensamentos e sentimentos enquanto era cercada por Biff e seus amigos superficiais. Dessa vez, Quinn queria ter tido a oportunidade de dizer sim... Ela gostaria de ter fugido com Rachel, mesmo sabendo de todo o perigo que correria. Com Rachel, ela viveria. E viver, com certeza, era melhor do que o que estava tendo agora.

# # # # #

Sam revirou os olhos para Puck que, pela terceira vez desde que se inscreveram no festival de bandas amadoras, estava dando em cima de alguma turista qualquer que dera o azar de ser bonita e de caminhar no Píer de Santa Monica. Sam tinha vergonha do amigo quando ele ligava aquele modo macho alpha e fazia questão de dar em cima de qualquer mulher bonita o bastante que passava por ele, além de ser machista, era humilhante. E o loiro detestava ainda mais quando Rachel resolvia fazer algo semelhante.

Por isso, Sam estava caminhando de volta para o “Jewelry of the Coast”, tinha a mais absoluta certeza de que, naquele momento, Marley precisava muito mais dele (Puck parecia estar perfeitamente bem com três loiras o cercando). E, por mais que o destino tivesse pregado uma peça nele e em seus outros amigos ao permitir que Puck enxergasse aquele maldito cartaz, agora, estava presenteando-o. Sam mal chegara à avenida e já localizara o Old Beetle conversível preto estacionado próximo. Novamente, o sorriso harmonizou os contornos de sua boca.

Os olhos de Sam passaram a procurar Kurt e o encontraram em pé, na areia em frente ao “Jewelry of the Coast”, ele estava sozinho e olhava para o relógio, com certeza, estava à espera das garotas. Sam tentou se aproximar com cuidado, mas, Kurt o interceptou a alguns passos de distância, totalmente por acaso após dar mais uma olhada no relógio. Assim como Sam ao perceber o carro, Kurt sorriu delicado e as bochechas dele coraram. Sam colocou as mãos nos bolsos da bermuda praiana e, bem-humorado, cumprimentou:

— Nós precisamos parar de nos esbarrar por aí.

— Eu discordo, eu meio que gosto disso. - Kurt respondeu rapidamente, em uma tentativa de soar charmoso e sedutor, aparentemente, ele se arrependera de suas palavras e agora, corava furiosamente. Sam riu para a atitude dele, Kurt não precisava daquele tipo para ser perfeitamente agradável aos seus olhos e, sobretudo, ao seu coração. Sam suspirou e confessou sincero:

— Não vou negar que também gosto, ainda assim, acho que precisamos marcar algo, efetivamente. Não sei se confio tanto no destino depois de hoje...

Sam deixou as palavras no ar, atiçando a curiosidade de Kurt e disposto a contar a ele sobre as peripécias anteriores de Puck, tudo que queria era que aquela conversa se prolongasse e que ele pudesse ter um pouco de Kurt, sozinho e sem outras pessoas os interrompendo frequentemente. Kurt arqueou a sobrancelha castanha para ele e sorriu de lado, um sorriso curioso que estava prestes a se transformar em uma pergunta até que alguém chegou desabalado entre eles, interrompendo completamente o mundinho no qual eles viviam nos últimos minutos.

Marley Rose estava ofegante, apoiada nos joelhos enquanto tentava inspirar oxigênio, ela tinha as bochechas vermelhas e uma expressão de desespero no rosto. Kurt, rapidamente, se compadeceu por ela e massageou-lhe as costas curvadas enquanto Sam, olhando ao redor em busca do que poderia ter causado essa reação, perguntava agoniado:

— O que aconteceu, Marls?

— N-não f-foi nada... Só... Só me tira daqui, eu preciso almoçar em um lugar diferente. - Marley, sempre bem articulada e contida em suas palavras, estava praticamente atropelando-as enquanto aprumava a postura e virava-se para o restaurante. O “Jewelry of the Coast” continuava aparentemente deserto e Sam não deixou de perceber que isso provocou certo alívio na tensão de Marley. O loiro substituiu Kurt nas massagens nas costas da loira e Kurt, prestativo, respondeu:

— Bem, eu estava esperando as garotas para almoçarmos no “Jewelry of the Coast”, mas, eu posso acompanhar os dois... Se vocês quiserem.

— Claro, K! Será ótimo ter você conosco! - Marley respondeu verdadeiramente animada, Sam sorriu para a euforia dela, mesmo percebendo certo nervosismo em sua voz. Aparentemente, Marley estava disposta a aceitar qualquer coisa desde que saísse, o quanto antes, dali. O trio virou-se para caminhar pela orla, guiados por Sam até que escutaram, do outro lado da rua, Ruby chamar:

— Marley!

A nova-iorquina paralisou nos braços de Sam e tanto ele quanto Kurt ficaram sem saber o que fazer. Do outro lado da rua, Ruby sorria eufórica e acenava para eles, esperando por uma trégua no tráfico para atravessar. Contudo, Marley, em vez de esperá-la, puxou os garotos e eles saíram praticamente correndo pela orla.

Só pararam quando já estavam a três quadras do “Jewelry of the Coast”. Kurt ofegava e o seu cabelo, até então perfeitamente penteado, encontrava-se desalinhado - Sam mordeu a língua quando estava prestes a dizer que preferia os fios castanhos daquela forma -, o futuro ator respirou fundo e perguntou:

— O que foi que você fez, Rose?!

— Honestamente, não sei. E nem quero pensar nisso agora, muito menos, nas conseqüências do que fiz... Melhor eu sofrer mais tarde do que por antecipação. - Marley respondeu inquieta, caminhando a frente dos rapazes e provocando risos em ambos. Sam cutucou Kurt nas costelas e comentou aos risos enquanto observava a nova-iorquina revezar-se entre caminhar e olhar por cima dos ombros:

— Ela, com certeza, deu uns bons amassos em Ruby Clearwood.

Kurt concordou enquanto ria, a risada dele soou como música aos ouvidos de Sam e o loiro, inconscientemente, também se viu rindo. Muito mais do que toda a atrapalhada de Marley, ele riu por causa de Kurt e, sobretudo, junto dele.

 

Rachel não sabia há quanto tempo estava sentada na madeira do deck onde, supostamente, o Pacific Beauty deveria ser ancorado. Porém, tinha uma vaga noção que já passara o horário do almoço, principalmente porque a movimentação na Marina Del Rey diminuíra, assim como a intensidade do sol no céu límpido.

A morena decidiu cruzar as pernas e olhar o horizonte, porém, aquela tarefa extremamente calma e a sua ansiedade a impedia de concentrar-se por mais de alguns minutos. Finn fora praticamente mandado embora por ela - o grandalhão estava verde de fome e ele fizera tudo o que poderia para ajudá-la -, de agora em diante, somente Rachel poderia consertar a imensa bagunça que fizera.

Rachel sabia que era muito difícil que Quinn quisesse algo mais dela, ainda mais pela falta de resposta dela quando estavam em alto mar, mas, ainda assim, tentaria. Essencialmente, porque era muito teimosa e insistente e, também, porque, àquela altura de descoberta de seus sentimentos, até mesmo uma amizade poderia saciar, ainda que parcialmente, toda a loucura em que se transformara a sua cabeça e o seu coração.

Era estranho perceber que dedicara um dia, praticamente, para uma garota e que, mesmo diante de negativas, ainda a esperava... A pequena riu para quão estranho aquele comportamento parecia, geralmente, Rachel não corria atrás de meninas, elas que sempre voltavam e era ela que, quase sempre, as reprimia. Porém, Quinn era diferente. Rachel demorara a perceber, só que agora sabia muito bem o que sentia e não estava disposta de perder sem tentar, precisava, ao menos, consertar as coisas.

Aquele Verão podia ser seguro como todos os outros, mas, Rachel estava disposta a entregar-se ao desconhecido se pudesse ter Quinn, de alguma forma, ao seu lado.

Os pensamentos de Rachel foram interrompidos pelos sons de vozes e os barulhos relativos ao ancoradouro de um barco à marina. Os olhos castanhos foram, mais uma vez, libertos dos óculos escuros e a morena levantou-se, girando o corpo à procura da origem daqueles sons. Para a sua surpresa, errara por pouco. O Pacific Beauty estava ancorado há alguns passos de distância, em sua imponência branca e azul marinha, ofuscando as pequenas embarcações mais próximas.

Os ocupantes desciam aos poucos e, mesmo àquela distância, Rachel reconheceu os cabelos loiros que tanto se tornaram familiares naquele curto espaço de tempo. A morena segurou-se para não correr pela madeira do deck, mas, isso não impediu que caminhasse rapidamente e que o seu coração não acelerasse a cada passo. Antes mesmo de se aproximar a uma distância próxima, Rachel percebeu que sorria sem motivo aparente e que ainda assim, aquela era uma das melhores sensações que experimentara.

Rachel, com o pouco de paciência que ainda lhe restava, retirou o boné e esperou que Quinn estivesse relativamente sozinha para se aproximar. A loira estava deslocada enquanto o grupo maior conversava e, praticamente, a excluía do que dividiam. Rachel franziu a testa para aquele comportamento e julgou cada um dos mauricinhos e das garotas fúteis que formavam aquele grupo, só depois, pigarreou e chamou a atenção de Quinn:

— Você não parece feliz, mesmo depois de um dia no mar com eles.

— R-Rachel?! O que faz aqui? - Quinn gaguejou o nome da morena e isso eletrificou o sorriso já potente, o nervosismo na voz da loira também preencheu o seu coração de uma energia quente que se irradiou do centro às extremidades de seu corpo. Era possível que alguém adquirisse câimbra por sorrir? Rachel desconfiasse que poderia sentir algo do tipo depois daquele dia. A morena deu um passo à frente, o espaço pessoal de Quinn continuava intacto, mas, seriamente ameaçado por aquela proximidade. A pequena ajeitou uma mecha loira que saíra do lugar e respondeu gentil:

— Bem, você não respondeu a minha pergunta.

— Ah sim... É... - Quinn continuava a gaguejar, ela parecia surpresa além de nervosa e mais uma vez, Rachel sentiu-se cheia de uma energia cálida que acalmava a loucura com a qual estava tão acostumada a conviver. Quinn engoliu em seco, sorriu sem jeito para a própria falta de tato e suspirou. - Desculpa, qual foi a pergunta?

— Aquela do mar... Eu ainda quero saber se você quer sair comigo. - Rachel respondeu prestativa e o sorriso não abandonava os seus lábios. Pela primeira vez, ela experimentou certo temor diante da resposta de uma garota. Aquela sensação desconhecia até então apenas provava que Quinn era muito mais importante do que imaginava. Rachel não tinha a mínima noção de quando aquilo acontecera, mas, não estava disposta a macular tudo de novo. A noite de ontem lhe mostrara o que valia a pena ter naquele Verão.

Porém, o mundo não era feito somente delas e, mais uma vez, elas foram interrompidas. Biff voltou a interrompê-las, ele sequer preocupou-se em cumprimentar Rachel e foi logo falando, diretamente para Quinn e de costas para a morena:

— O pessoal quer saber se podemos contar com você e seus amigos na festa, amanhã à noite. É uma festa fechada, em Santa Monica Boulevard, é preciso confirmar presença.

— Ahm, Biff... Eu prometi falar com Santana e os outros. E não sei se percebeu, mas, estou no meio de uma conversa aqui. - Quinn o interrompeu, mais educada do que a sua impaciência permitiu, Rachel sorriu para a urgência na voz dela e deliciou-se com a expressão de desprezo nos olhos de Biff ao reconhecê-la como um daqueles que estavam na lancha.

A morena não fugiu dos olhos claros do rapaz que, astutamente, estudavam os seus cabelos desalinhados, os seus shorts desfiados e a sua blusa larga. Rachel era o oposto das garotas superficiais e materialistas que estavam no veleiro com ele. Ela sorriu dissimulada para Biff e acenou para ele, como se ele ainda não a tivesse enxergado. Biff revirou os olhos e resmungou:

— Que seja.

Ele voltou a se juntar ao grupo, visivelmente chateado. Rachel cruzou os braços e riu abertamente do comportamento mimado do rapaz, quando ele estava distante o bastante, a morena voltou os seus olhos para Quinn. A loira continuava nervosa, apertando uma mão de encontro à outra. Rachel sorriu, Quinn realmente era diferente de qualquer garota que conhecera, a morena esticou a própria mão e segurou as dela. Um arrepio gostoso percorreu o seu braço e a pequena, agigantando-se em sua coragem e compreensão, sussurrou charmosa:

— Eu volto a entrar em contato contigo. Fique tranquila, Quinn...

Mesmo que não parecesse, aquilo era uma promessa. Rachel deu às costas para Quinn e os superficiais do veleiro, enquanto caminhava pelo deck de volta ao calçadão, pode sentir os olhos de Quinn em si e diferente das outras vezes, eles estavam amenos. Rachel não mais sentia que estava adentrando em uma tromba d’água violenta e, sim, sentia que flutuava em águas calmas, sentindo o seu corpo levitar. A morena tirou o celular do bolso para ligar para Finn, porém, teve uma ideia melhor.

Rachel ligou para Puck e o seu amigo, sem decepcioná-la, atendeu-a no primeiro toque. Ela sorriu para o som das ondas se quebrando do outro lado da linha e, com um sorriso obstinado nos lábios, ela anunciou maliciosa:

— É bom que você ainda tenha alguns contatos na alta roda de Santa Monica, Puck... Nós precisaremos deles para invadir uma festa amanhã à noite.

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Notas finais do capítulo

O que acharam?

Eu meio que estou me apaixonando pela Rach dessa história! Hahahaha E vocês? Também?
Como perceberam, Faberry já começou a acontecer e Ruby/Marley continuam com toda a sua intensidade... E Surt? *-* Eu, particularmente, adoro esses dois juntos!

Mas, chega de falar de mim! Deixem as suas críticas, elogios, xingamentos pela demora e etc nos comentários e se me acharem digna, deixem uma recomendação Hahahaha

Nos vemos na próxima, beijos!
Fernanda Redfield (@redfieldfer)