Heart on Fire in Her Hands (Hiatus Indeterminado) escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 8
Capítulo 7: Cama de Espinhos


Notas iniciais do capítulo

Boa tarde, como vocês estão?

Mais uma vez - sei que está se tornando chato - peço desculpas pela demora em atualizar a fanfic. Dessa vez, eu tive sérios problemas de saúde na família e não tinha cabeça nem tempo para escrever :( As coisas ainda não estão 100%, mas, como eu já tinha boa parte do capítulo escrita, só precisei terminá-la.

Indico "Bed of Roses" do Bon Jovi para a leitura, em duas versões, na original e no cover da cantora Cassadee Pope.

Espero que gostem! Boa leitura!



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Quinn preferiu se poupar de maiores surpresas no restante daquele dia e em parte do dia seguinte - não era fácil evitar as belezas de Santa Monica, mas, ela realmente não queria encontrar Biff ou Rachel por aí - e estava satisfeita com o seu sucesso, afinal, até Santana desistira de chamá-la para os passeios que fazia com Brittany. Kurt, por sua vez, apreendendo mais do que o casal, desconfiava do que estava acontecendo e fazia companhia à amiga. Ele a respeitava e Quinn estava muito feliz por dividir silêncios com Kurt, ainda que se sentisse culpada por ele desmarcar compromissos com Sam por causa dela.

A futura designer estava determinada a permanecer em casa naquela noite, pretendia observar Santa Monica da sacada de seu quarto e dormir cedo. Contudo, ela percebeu - ou, talvez, fosse a sua ansiedade falando mais alto do que o seu juízo - que aquilo não aconteceria no instante em que Santana entrou determinada em seu quarto dividido com Kurt. Quinn sobressaltou-se com a irritação presente na voz de Santana:

— Nós vamos sair e você não vai inventar desculpa alguma dessa vez, branquela!

— Nossa, será que você não pode ser um pouquinho compreensiva? - Quinn abandonou a expressão concentrada que usava, até então, para testar o foco de sua câmera e abaixou-a, parecendo incomodada com a amiga. Santana franziu a testa preocupada e Brittany finalmente chegou, juntando-se à namorada. - Eu não estou passando bem, Lopez.

— Você poderia estar morrendo e eu não acreditaria! Você mentiu para mim ontem e em parte do dia de hoje, não sei se ainda merece o meu voto de confiança. - Santana respondeu de mal grado, ignorando totalmente a falta de vontade da amiga e levantando-se, a caminho da mala de Quinn que se encontrava bagunçada ao lado da cama. A latina começou a revirar o conteúdo e Quinn bufou, voltando a ajustar o foco de sua câmera. - Nós vamos sair hoje, Fabray.

— Brittany, por favor, será que você pode colocar um pouco de juízo na cabeça de sua namorada e fazê-la respeitar a vontade e o humor dos outros? - Quinn grunhiu irritada, escondendo, mais uma vez, tudo que sentia atrás de uma câmera fotográfica. A loira não percebeu que Brittany a observava atenta, mas, escutou quando a sua observadora disse com cuidado:

— Eu até diria isso se S estivesse exagerando, mas... Dessa vez, ela não está. Nós não vamos deixar você estragar as suas férias por causa de uma garota, Quinnie.

Quinn até tentou fingir que não foi abalada pelas palavras certeiras de Brittany, entretanto, falhou miseravelmente. A câmera praticamente caiu de suas mãos e ela fez um malabarismo enorme para segurá-la. Claro que essa atitude, tão desleixada com a sua preciosa câmera, não passou despercebida dos olhos escuros atentos de Santana e dos claros apaziguadores de Brittany.

Os seus olhos esverdeados estavam expostos e, como conseqüência, as suas dúvidas e os seus sentimentos também. Os olhos verdes eram as partes do corpo de Quinn que mais entregavam o que ela sentia ou pensava, eles destoavam completamente de sua timidez freqüente porque eram intensos e incontroláveis. E os seus olhos, naquele momento, dividiam-se entre o temor pelo súbito reaparecimento de Biff em sua vida e a ânsia de saber quem, de fato, era Rachel Berry.

Como sempre, a morena, dona do sorriso caloroso e dos olhos castanhos quentes, permaneceu em sua mente. Rachel se impôs e tomou todo o fluxo de seu pensamento, dominando, também, os seus sentimentos. Quinn não se surpreendeu pelo acelerar do seu coração ao recordar-se do pouco que tinha da morena, tampouco, não ficou surpresa com a súbita vontade de apanhar a sua câmera para vislumbrar as poucas fotos que tirara.

Quinn poderia decidir não se meter e nem se deixar levar por Rachel, mas, tudo o que sentia lhe indicava que seria uma tarefa absurdamente difícil.

A loira evitou olhar para o casal de amigas, mesmo sabendo que os olhos de cada uma estavam fixos e, principalmente, atentos ao seu comportamento, dispostos a apreender qualquer sinal de sua insegurança em relação às palavras de Brittany. Quinn respirou fundo, deu de ombros e voltou a segurar a câmera, antes de responder desentendida:

— Garota? Qual garota?

— Ok, talvez não seja uma garota e sim, um garoto. Quem sabe, sejam ambos... A questão aqui é que você não pode deixar uma pessoa, independente do gênero, estragar as férias que, supostamente, deveriam ser suas! - Santana irrompeu em mais uma de suas frases de efeito dotadas de agressividade exagerada. A latina até mesmo lançou as roupas que escolhera na mala para Quinn que, irritada, as segurou em suas mãos, sem saber o que fazer com elas. Brittany entrou em cena, segurou o pulso da namorada e o afagou, olhando de forma incisiva para ela. A latina respirou fundo e Brittany disse delicada:

— Santana está exagerando. Essas férias devem ser o que você quiser que elas sejam e nós estamos aqui para, ao menos, tentar fazê-las dignas de você. Espero que saiba que ainda pode contar com a gente... Somos uma trindade, lembra, Q?  

— É, somos uma trindade... Pouco sagrada e, aparentemente, muito profana. Mas, ainda somos uma trindade. Confie na gente, Fabray. - Santana completou mais tranquila e, ainda assim, cheia de sarcasmo. A latina ainda piscou conspiratória para Quinn que, inevitavelmente, riu.

A futura designer olhou frágil para a amiga e elas, enfim, se aproximaram. Quinn encolheu os ombros e Brittany sentou de seu lado esquerdo, enquanto Santana se sentava do lado direito, Quinn sentiu-se abraçada pelas duas e o calor, físico e emocional, daquele abraço a fez se sentir acolhida.

Era estranho que Quinn se sentisse tão pertencente a algo quando estava tão distante de sua família, ainda mais, considerando a rígida educação católica que fez parte de boa parte de sua vida. Mas, ela se sentia especial por ter aquele tipo de ligação com Santana, Brittany e Kurt. E era muito mais esquisito que aqueles três tipos considerados pecadores pela fé que vivera fossem justamente o que ela precisava.

Com certeza, Santana estava certa... As três eram uma espécie de trindade profana que, ainda assim, parecia ser certa e essencial.

— Ok... O que está acontecendo aqui? - A voz de Kurt interrompeu o confortável silêncio que as três dividiam, o moreno de olhos azuis olhava confuso para elas, os cabelos molhados pelo banho recente e o cheiro de sua delicada colônia masculina perfumando o quarto. Santana olhou para ele e, protetora, exclamou:

— Sem útero, sem opinião! Caia fora, Hummel!

Kurt revirou os olhos, era realmente estranho que ele fosse considerado o mais dramático do grupo, visto que Santana conseguia fazer um escândalo maior do que todos eles juntos. O rapaz ignorou a amiga e cruzou os braços, bastou um olhar mais atento dele para a figura encolhida de Quinn nos braços de Brittany para que ele entendesse o que estava acontecendo. Kurt suspirou e, com um sorriso encorajador, disse:

— Isso foi ofensivo, considerando que eu até acho que sou mais mulher do que você e seu precioso útero, Lopez... Contudo, ignorando isso, eu acho que Quinn precisará de todos nós aqui, certo?

A pergunta era retórica, afinal, Kurt já tinha se espremido na cama junto às meninas, empurrando Santana para o lado, a latina ainda arrumou uma força de empurrá-lo de volta. Ainda assim, Quinn acenou com a cabeça e o quarteto se ajeitou da melhor forma. Brittany recusou-se a deixar de abraçar a amiga e Quinn permaneceu, de bom grado, grudada a ela.

Quinn sentia que todos já sabiam ou, pelo menos, suspeitavam. Esse sentimento não tornava a situação mais fácil, mas, parecia deixá-la mais suportável. Ela sabia que os seus amigos, diferentemente dos seus pais, não a abandonariam... Contudo, admitir para eles também faria com que ela admitisse, em voz alta, o que estava recusando-se a pensar. Depois daquela conversa, as coisas mudariam e as suas férias, já repletas de confusão, poderia se tornar uma bagunça.

— Eu acho que estou gostando de uma garota. - Quinn decidiu que a melhor forma de dizer aquilo fosse essa, sem pensar ou se preparar. As palavras fluíram rápidas de sua boca e ela observou a reação ao seu redor. Nenhuma delas lhe surpreendeu, Kurt sorriu orgulhoso e Brittany apertou-a ainda mais no abraço, contudo, Santana explodiu em gargalhadas e desdenhou:

— Finalmente! Estava demorando, Fabray!

— Nós não somos a sua família, jamais íamos julgá-la por isso... E, também, não vamos abandoná-la. - Brittany disse gentilmente, com um sorriso tão doce quanto o perfume que ela, agradavelmente, usava. Santana parou de rir e apertou a mão de Quinn, carinhosamente. Kurt segurou a outra mão da designer e disse carinhoso:

— Estaremos aqui, para o que você precisar.

— Isso mesmo, a começar pelo seu ex-namorado insuportável. Você precisa ter foco na garota em questão, o que devemos fazer com ele? - Santana perguntou maldosa, a excitação brilhando em seus olhos escuros. Kurt acenou a cabeça negativamente para o comportamento psicopata da amiga e Brittany riu da interação dos dois. Quinn, porém, permaneceu calada e pensativa.

Ela não sabia o que fazer em relação a Biff, tampouco, sabia o que faria em relação a Rachel.

— Acho que seria um bom começo sairmos para você encontrar a sua garota e conversar com ela... Que tal irmos ao “Jewelry of the Coast? - Kurt sugeriu de forma cuidadosa, sabendo muito bem de toda a reserva de Quinn em relação a Rachel. O moreno até mesmo se sentia culpado por ter feito uma imagem tão ruim da morena, mas, ele realmente não queria que a melhor amiga tivesse a sua primeira decepção amorosa lésbica com alguém que ele poderia evitar. Quinn trocou um olhar intenso com ele, cheio de ressalvas e com muito rubor, os dois foram interrompidos, mais uma vez, por Santana que exclamou indignada:

— Eu realmente espero que a crush da Quinn seja a Clearwood e não uma da dupla dinâmica de New York!

O silêncio no quarto era culpado demais e deu a resposta que Santana queria, mesmo que ninguém tivesse dito palavra alguma. A latina olhou da namorada para o amigo e, por fim, para a amiga. O ar incrédulo cresceu em suas expressões e ela se levantou, estrondosa e dramática, para exclamar:

— Por favor, eu até consigo aceitar a loirinha de óculos, mas, a cópia do Frodo não!

A situação era conflituosa, porém, as risadas irromperam ainda assim. Brittany foi a primeira a explodir em gargalhadas diante da reação da namorada, depois, foi Kurt e, por fim, Quinn deu de ombros e o seu olhar culpado fez Santana jogar um travesseiro nela antes de sair do quarto grunhindo:

— O que eu fiz para merecer Quinn Fabray se apaixonando pela sapatão alpha de Santa Monica?

Brittany voltou a rir antes de beijar a testa de Quinn e sair atrás da namorada. Kurt ocupou o lugar dela e abraçou os ombros de Quinn, ele beijou-lhe a têmpora e, com um sorriso encorajador e uma voz aveludada, sussurrou:

— Vem, vamos nos arrumar. Quem sabe, você consiga botar uma coleira em Rachel Berry!

Quinn se deixou ser puxada e conduzida pelo amigo. Um dos muitos pesos de suas costas foi tirado e ela se sentia mais leve, contudo, logo estava sendo puxada, novamente, para baixo porque ela realmente queria acreditar nas palavras do melhor amigo.

Ela queria, mesmo, chamar a atenção de Rachel.

# # # # #

Em todos os verões passados em Santa Monica, o “Jewelry of the Coast” foi uma espécie de refúgio e de porto seguro para Rachel Berry. Contudo, naquele ano e, essencialmente, naquela noite, a morena não estava tão feliz por estar ali. As razões de todo o seu mau humor residiam em Ruby, Marley e, por último - e mais intensamente - em Quinn.

Rachel bem que gostaria de ser capaz de entender em que ponto Ruby e Marley aproximaram-se, assim como gostaria de entender porque aquela distância emocional que a separava de Quinn a incomodava tanto. Rachel nunca fora muito boa com sentimentos, mesmo antes, sentira demais e exageradamente e, depois do que aconteceu e de ter decidido não sentir tanto assim, ela se tornara uma ingênua em relação aos assuntos relativos à emoção e ao coração.  

Por isso, aquela noite no restaurante de Ruby estava sendo uma verdadeira tortura. A californiana não se aproximara dela desde que chegaram, concentrando-se nos demais clientes e praticamente ignorando-a, Marley, por sua vez, estava sendo ignorada pela própria Rachel e se instalara às mesas de sinuca com os rapazes enquanto a morena sentara junto ao bar.

A garrafa long neck de cerveja suava em suas mãos e um copo de tequila estava próximo. Rachel levou a cerveja aos lábios e tomou um gole, em seguida, virou a dose de tequila pura e seus olhos arderam, assim como a sua garganta queimou. A morena fechou os olhos, a ardência era incômoda, mas, melhor do que qualquer outra coisa que estava sentindo no momento.

Qualquer coisa era melhor do que aquele aperto que sufocava seu peito.

Rachel terminou a long neck, era a terceira ou quarta, ela não se lembrava e pediu mais uma juntamente com outra dose de tequila. Não precisou buscar Ruby com o seu olhar porque sentiu os olhos azuis preocupados com o seu bem-estar. Rachel gostaria de dizer a ela que ela não tinha mais esse direito, ainda mais agora que agregara Marley a sua lista de conquistas do Verão... Na verdade, Rachel gostaria de dizer muitas coisas a muitas pessoas, ela sequer sabia por onde começar.

A música ao redor dela continuava alta, assim como a movimentação de pessoas era intensa. Contudo, Rachel estava particularmente pensativa e distraída naquela noite, tudo o que queria era ficar sozinha. Mas, não podia negar um convite de Puck, nem de Sam e muito menos, de Finn. Eles sentiam saudade, assim como ela e mesmo estando imprestável naquela noite, ela se esforçaria para tornar as férias deles especiais.

Sempre fora assim... Rachel Berry pensava muito nos outros e se esquecia de pensar em si e, principalmente, de se mostrar. Tudo o que tinha era para os seus amigos e seus pais, o pouco que ainda possuía de si era escondido embaixo dos seus sorrisos calorosos, os seus olhares brilhantes e o aspecto leve de sua personalidade.

— Está rolando um campeonato de copo e eu não estou sabendo? - A voz de Puck tentara soar brincalhona, mas, Rachel o conhecia o bastante para perceber o discreto tom reprovador presente em suas palavras. Puck sentou-se ao lado de Rachel no bar e pediu uma cerveja, olhou preocupado para a expressão cansada e levemente ébria da amiga. Rachel, em vão, sorriu para ele e respondeu:

— Oficialmente, não. Mas, se quiser participar de um, podemos organizá-lo.

— Eu, honestamente, acho que a bebida não será a sua melhor companhia nessa noite. Por que não se junta a nós? - Puck estava mais sério agora, ele até bebericou um gole pequeno de sua long neck e apontou para trás de si. Rachel olhou na direção que ele apontara e encontrou Sam, Finn e Marley conversando com as recém-chegadas que eles conheceram na praia, no dia anterior, Harmony e Kitty. Harmony olhou na direção dos dois no momento em que Rachel a observava, ela corou e Rachel suspirou estranhamente cansada com aquele tipo de reação. - Harmony não para de perguntar sobre você.

— Ok, ok... Que fique claro que eu estou indo pela garota e não por você. - Rachel forçou um sorriso ao responder ao melhor amigo, porém, o sorriso satisfeito de Puck não foi forçado e ele estava realmente feliz ao apanhar a garrafa dela e entregá-la. Os dois brindaram e foi Puck quem virou a dose de tequila dessa vez para dizer eufórico:

— É assim que se fala, Rae!

Rachel brindou e bebeu com o amigo, sentindo-se absolutamente culpada por estar fingindo algo que não sentia. Mentir não combinava com ela, ainda que mentir em relação aos sentimentos se tornara algo comum, primeiro com ela e, depois, em menor intensidade, com Ruby.

Os passos de Rachel foram trôpegos em direção à mesa em que estavam os seus amigos e suas convidadas, ela até mesmo trombou em algumas pessoas no caminho e chegou inteira. Kitty e Harmony olharam, imediatamente, para a morena enquanto Marley abaixou os olhos, Sam e Finn voltaram a conversar entre si. Kitty estava em pé, uma das mãos dela deslizou sorrateira pela cintura de Rachel e ela cumprimentou:

— Olá, Rachel! Você não nos disse que tinha um grupo de amigos tão... Atraente.

— Ah, eles são bons, mas, eu sou a melhor dentre todos, garanto! - Rachel flertou de forma brincalhona, piscando para Kitty que revirou os olhos para a sua ousadia. Contudo, a morena não deixou de reparar que os olhos dessa recém-chegada não saíam de Marley, aparentemente, a sua melhor amiga se tornara expert em atrair loiras. Harmony se aproximara em silêncio, ela cutucou a cintura de Rachel que se virou rapidamente para ela, um leve desequilíbrio, e a morena só não caiu porque Harmony a segurou. A recém-chegada sorriu e os olhos claros brilharam ao dizer:

— Estava me perguntando se deveria ir buscá-la.

— Da próxima vez, não se pergunte e apenas vá. - Rachel respondeu intensa, erguendo a garrafa em uma espécie de brinde a Harmony, esta corou e voltou, rapidamente, ao seu lugar. Os demais se acomodaram, Marley estava estranhamente isolada dos demais por Kitty que parecia querer, a todo custo, a sua atenção. Porém, Rachel percebeu que os olhos azuis de sua amiga procuravam outra pessoa.

A morena poderia ficar perto de Harmony, afinal, estava evidente que ela queria a sua companhia. Porém, assim como o significado do “Jewelry of the Coast” mudara naquela noite, toda aquela situação com Harmony também se alterara. Rachel não queria, de forma alguma, se envolver para tentar apaziguar o que trazia no peito. Estava decidido que aquelas férias seriam sobre os seus amigos e não sobre si.

Ela deixaria os seus sentimentos, mais uma vez, para depois. De qualquer forma, não havia o que fazer se muito não estava compreendido.

— Boa noite, pessoal! Espero que estejam gostando da nossa noite! - A voz de Ruby trouxe Rachel de volta à terra, a californiana distribuía cerveja aos ocupantes da mesa. O mesmo sorriso avassalador, contudo, os olhos azuis dela estavam mais escuros do que normalmente e ela olhou, mais de uma vez, para Kitty. Rachel sufocou uma risada ao perceber aquele ciúme e a californiana apoiou a mão, gelada pelas bebidas, em seu ombro. Era um aviso para diminuir a quantidade de álcool ingerida e para não fazer graça diante dos sentimentos dela. - Essa rodada é por conta da casa!

Ruby os deixara tão rapidamente quanto chegara, os olhares da mesa foram destinados a ela, assim como muitos outros no restaurante. Marley suspirou tristonha e com uma carinha de cachorro abandonado que quase partiu o coração de Rachel. Mas, a morena parecia ter adotado a lei do silêncio naquela noite, voltando-se para a sua bebida e dedicando-se apenas a escutar as conversas da mesa.

Aliás, Harmony estava conseguindo distraí-la e só não obteve pleno sucesso nisso porque outra pessoa distraiu Rachel de tudo que a cercava. Como se tornara freqüente, a morena sentiu que o chão desapareceu aos seus pés e que estava, mais uma vez, flutuando em mar aberto. O fundo era esverdeado, assim como a cor dos olhos daquela que lhe provocava todas essas sensações e frio, assim como tudo que a outra fazia em relação a ela.

Quinn Fabray chegara ao “Jewelry of the Coast” em um timing tão perfeito que não poderia ser normal. Rachel, no auge de seu estado ébrio - ainda um pouco distante da completa embriaguez - verdadeiramente acreditou que aquilo só poderia ser uma peça do destino, mostrando que não existiria lugar para Harmony (ou Cassandra) enquanto Quinn ainda estivesse em Santa Monica.

E assim como o timing delas era perfeito, a conexão entre elas parecia ser inexplicável. Porque não demorou muito para que os olhos esverdeados se conectassem aos olhos castanhos. Contudo, Rachel se surpreendeu quando os verdes ficaram e não fugiram. Quinn lhe devolveu o olhar e, dessa vez, não existia o frio e sim, certa curiosidade. Mais uma vez, Quinn lhe perguntava com o olhar as questões que Rachel sabia e recusava-se a proferir em voz alta.

Era assustador como Quinn, tão desconhecida, parecesse saber mais de Rachel do que a própria. Diante de um olhar daqueles, a morena sentia-se ser explorada e revirada, e, de alguma forma, ainda assim, Quinn lhe entregava uma parte totalmente nova de si que parecia ser melhor do que a anterior. Mesmo no frio e no silêncio, Quinn parecia entregar mais do que Rachel queria ou merecia.

E tudo que Rachel mais queria era ser capaz, de alguma forma, de se aproximar. Mas, algo - o que ela sabia muito bem ser - a puxava para longe da Quinn na mesma intensidade que se sentia atraída por ela.

Uma medição de forças que, a qualquer momento, poderia arrebentar Rachel.

Ainda assim, a morena suspirou encantada e fez um esforço verdadeiro para não sorrir. Se sorrisse, tinha certeza que o seu coração se entregaria ao calor de uma experiência que ela não sabia se era capaz de suportar. Contudo, Rachel não deixou de olhar e, talvez, devesse ter deixado.

Porque, quando os lábios de Quinn pareciam prestes a desenhar algo - uma palavra ou, quem sabe, um sorriso - eles desapareceram. Uma figura masculina, alta e bem vestida, de cabelos bem penteados e sorriso fácil se interpôs entre Rachel e Quinn.

Para a tristeza de Rachel, o sorriso que poderia ser destinado a ela foi destinado a ele. Mais uma vez, a morena se entregou ao silêncio, mas, daquela vez, ela lhe deu uma companhia. E a bebida pareceu ser a melhor coisa que existia para sobreviver àquela noite.

Se Rachel estava entregando-se de livre e espontânea vontade ao silêncio, Ruby estava sendo sufocada pela contenção de suas palavras. A californiana bem que tentara não se deixar levar pelo ciúme, mas, estava quase sendo vencida por ele. Ainda que tivesse todo um bar e restaurante para gerenciar, a sua atenção estava, desde o começo da noite, em Marley.

A nova-iorquina parecia não perceber ou, sequer, acreditar, mas, aquela nova amiguinha do grupo de Rachel estava bastante interessada nela. E Ruby realmente se perguntava quem não estaria... Marley era apaixonante, a delicadeza dela, aliada à meiguice e à gentileza presente em cada ato, do sorriso ao modo de falar, era apaixonante. Contudo, Ruby gostava de acreditar que os outros não podiam admirá-la da forma como a admirava.

Era clichê e, de certa forma, vergonhoso, mas, Ruby julgava que era a única que podia entender tudo o que Marley era. Sobretudo, depois do beijo que trocaram e do abraço que dividiram. Elas tinham algo que aqueles outros, que a olhavam ou se esforçavam para conversar com ela, não tinham.

Ruby Clearwood, que sempre se achara sortuda por não se prender ao passado, gostaria verdadeiramente de estar presa ao presente e ao futuro de Marley Rose. E gostava, também, de pensar que poderia ser a única para a nova-iorquina.

Jamais imaginaria que estaria tão entregue ao ciúme e tão engasgada por ele, mas, tudo que queria era estar livre de todos os seus deveres relacionados ao empreendimento que tanto amava. Tudo que queria era sair daquela bagunça, deixar de escutar aquela música alta e entrar em seu carro com Marley. Queria levá-la ao silêncio da praia de Santa Monica à noite, queria que assistissem a maré mudar e que se beijassem quando isso acontecesse...

Ruby queria ficar sozinha com Marley onde ninguém pudesse alcançá-las.

E como se o universo estivesse testando até onde o seu autocontrole pudesse ir, outra pessoa chegou ao “Jewelry of the Coast”. Jake Puckerman parecia ter entendido que Marley valia toda a distância desde Venice Beach e se aproximara da mesa de Rachel. Ele e Puck não se viam há anos, mas, isso não pareceu incomodar o mais velho que o recebeu de braços abertos.

Ruby, observando a cena do bar, apertou a bandeja de metal em suas mãos. A tensão irradiou-se por todo o seu corpo e ela sentiu a adrenalina tornar os seus movimentos e feições ameaçadores. A californiana chamou o seu funcionário mais próximo e sussurrou o mais profissional que conseguiu:

— Diga ao Lance que ele pode tocar mais uma música, mas, teremos outra atração essa noite. E aproveite para cobrir a minha parte, eu fico no bar para você.

Ruby não sabia o que pretendia com aquelas ordens, exceto ir até a mesa de Rachel e se fazer presente, de alguma forma. Por isso, os seus passos decididos tornaram-se mais racionais à medida que ela se aproximava do grupo que se divertia. A sua presença, felizmente, chamou a atenção de Marley. A nova-iorquina sorriu para ela e Ruby se sentiu mal por não poder retribuir. Rachel as observava atentamente, a expressão não passando nada além da falsa neutralidade.

— Puck, será que você e os outros poderiam tocar um pouco para a gente hoje? - A californiana perguntou de forma educada, ainda que as palavras soassem forçadas nesse tom. Jake estava olhando para Marley e a outra garota, Kitty, sorria para a nova-iorquina. Ruby reviraria os olhos se pudesse. - Acho que o pessoal ficará satisfeito em ter você e os outros de volta. Vocês fizeram um tremendo sucesso no Verão passado!

Puck não entendera a sua verdadeira intenção, mas, parecia estar feliz diante da sugestão. Ele riu roucamente e chamou Sam e Finn, logo, os três estavam do lado de fora, apanhando os instrumentos no jipe e os trazendo para o “Jewelry of the Coast”. Rachel, contudo, permaneceu sentada, olhando distraída para a garrafa em mãos. Ruby, insegura, a cutucou e perguntou:

— Você não vai tocar?

— Não estou no humor, Clearwood. - Rachel respondeu de forma fria e invasiva, levantando-se da mesa e caminhando até o bar. Se antes os olhos de Ruby estavam cheios de ciúme, agora, eles marejavam o seu coração machucado.

Rachel não era mais a sua garota, mas, ainda assim, era uma parte da sua vida que ela prezava e amava muito. As coisas não deram certo entre elas, sobretudo, porque não queriam as mesmas coisas na época... Mas, ambas tinham progredido com a outra, muito do que tinham vinha daquela mágica relação que tiveram. Os beijos se foram, mas, ficaram os abraços assim como a paixão minguara e a amizade se estabelecera. Ruby não queria perdê-la e não queria ser forçada a escolher entre a morena e Marley.

Não saberia o que preterir se tivesse que escolher. Era o seu passado versus o seu presente e, talvez, o seu futuro. Era uma amizade de firmes raízes contra uma paixão de verão que poderia - e Ruby se esforçaria para tal - se tornar um amor de várias estações. Ruby amava Rachel da mesma forma que estava apaixonada por Marley. A californiana precisava das duas e não queria escolher. Ela não poderia escolher uma delas.

A partida da morena não chamou tanta atenção, mas, a forma como Ruby reagiu, sim. Quando a californiana voltou os seus olhos feridos e lacrimosos para a mesa, Marley a observava atenta. Por trás dos óculos de grau, existia algo nos olhos azuis claros que Ruby não conseguiu e nem teve tempo para determinar. Mais uma vez, elas foram interrompidas e para o incômodo de Ruby, fora Marley quem desviara os olhos, dedicando-os a Jake.

Ruby, sentindo-se fracassada pela sua tentativa de marcar presença para Marley, voltou à segurança de seu bar. Em sua volta, os seus passos não estavam decididos, tampouco, corajosos. Ela caminhou em silêncio até onde Rachel estava sentada, apenas o balcão de madeira as separava. A californiana manteve o silêncio quando colocou dois copos em frente a elas e serviu-os com tequila.

Rachel sequer ergueu os olhos para ela, mas, Ruby gostou de pensar que aquele poderia ser uma espécie de abaixar de armas da parte da morena. As duas beberam as doses no mesmo momento, um pouco antes de Puck, Sam e Finn começarem a tocar.

Os olhos azuis de Ruby prenderam-se em Marley que parecia ter desistido de olhar para ela naquela noite enquanto os olhos castanhos de Rachel estavam presos em Quinn que parecia distraída demais pela sua companhia masculina.

Naquele momento, tanto Ruby como Rachel estava, exatamente, no mesmo humor. As duas olhavam para as suas garotas sentindo-as, cada vez, mais distantes de si. O passado entre elas não significava nada para aquele momento. Contudo, a amizade delas poderia ter tornado as coisas mais fáceis.

Se Rachel não fosse tão teimosa - e não estivesse tão bêbada - ela poderia ver que a sua amiga estava, verdadeiramente, apaixonada por Marley. E se Ruby fosse um pouco mais corajosa e, naquele momento, tivesse escolhido Rachel, ela poderia ter dito à morena que ela estava, finalmente, deixando alguém entrar em sua vida depois de tudo que perdera.

# # # # #

Marley Rose nunca foi muito de pensar no significado do tempo em sua vida, ela não era uma garota que procurava significados desconhecidos a situações de definições consagradas, por mais que acreditasse no melhor de cada pessoa, ela não era do tipo que esperasse algo além do que julgasse certo receber. Por isso, era estranho pensar que 48 horas praticamente transmutaram o significado de suas férias.

Era a sua primeira viagem sem a mãe, acompanhada de sua melhor amiga cujo destino era um paraíso natural e, também, juvenil. Contudo, naquele momento, as suas férias pareciam tudo, menos, otimistas. O que era estranho, visto que beijara, pela primeira vez, alguém de quem gostara.

A nova-iorquina dividia a sua atenção entre um sorridente Jake Puckerman e uma mal-humorada Kitty Wilde. Marley sabia o que estava acontecendo ali, sabia que os dois tinham mais do que primeiras intenções com ela, contudo, ela também tinha plena noção do par de olhos azuis escuros que a observavam do bar sempre que podiam.

Toda a situação era absurda porque, de certa forma, era uma prorrogação do que ocorrera com Ruby em Venice Beach. Mas, Marley não sabia e nem conseguia determinar o que aqueles olhos azuis elétricos queriam dizer quando fora, praticamente, deixada de lado pela californiana.

Marley se sentia magoada e, principalmente, ressentida. Diante daquela situação, tinha plena certeza de que menosprezara a relação de Ruby e Rachel. Aparentemente, o silêncio da melhor amiga e a distância da californiana indicavam que nenhuma das duas superara o que acontecera no passado.

No começo daquela noite, Marley estava determinada a fazê-las se entenderem, nem que precisasse despertar o ciúme em Ruby ou a fúria de Rachel. Contudo, àquela altura da noite, com Ruby olhando-a apenas quando achava que não percebia e Rachel se entregando ao seu pior inimigo - o álcool - Marley estava dividida entre se irritar com ambas ou, simplesmente, deixar se decepcionar.

Claro que estava arrependida por ter dado conversa para Kitty e por ter sido simpática com Jake - ainda mais porque Ruby a alertara sobre ele - naquele instante, ela bem queria que os meninos terminassem o show e a levassem embora. Assim como pedia silenciosamente, com os seus olhos azuis límpidos de cachorrinho abandonado para que Rachel abandonasse o copo.

Mas, fora Kitty e Jake, ninguém parecia muito interessado por ela. E ela era acostumada a ser deixada de lado... Não por sua melhor amiga e doía ser praticamente ignorada por quem lhe beijara há um dia.

Por isso, Marley mal prestava atenção na conversa entre Kitty e Jake, concentrava-se em segurar a sua long neck e bebericá-la quando a adrenalina secava a sua garganta. A timidez e a falta de jeito com a interação social voltaram a ser suas melhores companhias e ela se viu, mais de uma vez, ajeitando os óculos em um claro sinal de nervosismo.

Voltara a ser a bolsista de New York, ainda que não estivesse em sua cidade.

Os seus ouvidos sensíveis às melodias reconheceram o fim de uma música e o início de outra. Jake, ao seu lado direito, abriu um enorme sorriso galante quando reconheceu os primeiros acordes da nova música. Não somente ele, mas, a maioria dos freqüentadores do “Jewelry of the Coast” gritaram animados e sorriram ao reconhecerem a música.

Era um clássico.

Marley ergueu os olhos e observou ao seu redor, pessoas batiam palmas e casais se aproximaram, muitos começavam a se balançar ao ritmo do som acústico. Puck sorria para o seu violão enquanto tocava as notas, Sam o acompanhava e Finn tocava o cajón enquanto balançava a cabeça no ritmo da percussão. Eles não tinham um piano ou um teclado entre eles, mas, eles eram bons... Muito bons.

Os olhos azuis claros de Marley percorreram o ambiente movimentado e, inevitavelmente, encontraram os olhos azuis escuros que a evitaram durante toda aquela noite. Contudo, daquela vez, Ruby não desviou os olhos e o sorriso prévio em seus lábios rachados se perdeu enquanto se encararam. Marley respirou fundo, naquele contato, ela gostaria de ter encontrado mais do que o mistério.

Ela queria Ruby em sua totalidade. A californiana acenou imperceptivelmente com a cabeça e também respirou fundo. Eram pequenos gestos que mostravam que a californiana podia parecer, mas, não estava alheia a tudo.

Ruby sabia e, principalmente, sentia.

Porém, Marley não teve tempo de determinar o que ela, de fato, sentia. A mão pesada e calejada de Jake Puckerman envolveu a sua e atraiu a sua atenção. Podia sentir os olhos de Ruby marcando sua pele, mais quentes do que o Sol da Califórnia. Jake suspirou e perguntou:

— Dança comigo?

— Quem dança “Bed of Roses”? - Kitty grunhiu irritadiça antes de bufar e se virar para a amiga, Harmony continuava de olhos fixos em Rachel que a ignorara desde que chegara à mesa. Marley, pelo canto dos olhos, viu Rachel virar mais uma dose de tequila. O seu coração se apertou e, dividida entre o fuzilamento dos olhos de Ruby e da irresponsabilidade da amiga, ela cedeu.

Ela colocou-se em pé e Jake a guiou até a pista.

Sitting here wasted and wounded

At this old piano

Trying hard to capture

The moment this morning I don’t know

‘Cause a bottle of vodka

Is still lodged in my head

And some blonde gave me nightmares

I think that she’s still in my bed

As I dream about movies

They won’t make of me when I’m dead

Rachel não cantava quando estava sóbria em meio a muitas pessoas, entretanto, o álcool em sua corrente sanguínea estava fazendo-lhe cantar a plenos pulmões. Os versos surgiam atrapalhados em sua língua embolada e, ainda assim, ela acreditava que estava fazendo um excelente trabalho. Não existiam muitas pessoas a repararem nela - quem ela queria que a notasse estava dando conversa, há mais de uma hora, a um mauricinho de cabelo ensebado - e o que importava, de fato, era o sorriso ébrio enorme em seus lábios.

Aquele sorriso não tinha o brilho familiar que fazia todos os que a cercavam sorrirem junto, pelo contrário, ela um sorriso vazio, feito de solidão e motivado, sobretudo, pela fantasia alcoólica que brincava em sua mente.

Era o sorriso feito do copo e da garrafa.

Rachel abriu os olhos castanhos, o copo erguido brindava os três garotos da sua vida que, literalmente, estavam quebrando tudo naquela noite. A morena tinha muito orgulho deles e os brindaria sempre que pudesse, observando o palco, os seus olhos também estavam na pista.

Ela não acreditou no que os seus olhos viram - talvez, a bebida tivesse sido demais, mesmo - mas, a ingênua Marley Rose trocara Ruby Clearwood pelo irmão caçula idiota de Noah e ainda estava sendo observada de forma mortífera pela amiga de Harmony da qual esquecera o nome. Era uma situação, no mínimo, irônica.

E Rachel, com vários centímetros cúbicos de álcool em sua corrente sanguínea, riu.

O seu peito e a sua cabeça, mesmo embriagados, saboreavam aquela situação. Ela procurou Ruby porque não sabia o que esperar, era uma das primeiras vezes em que a jóia da Califórnia se via trocada e queria saber qual seria a reação. Não precisou procurar muito, Ruby estava parada exatamente ao seu lado, de costas para o palco e a pista.

Rachel nunca tinha a visto com os olhos marejados, nem mesmo quando elas terminaram o que tinham - lá dentro de sua caixa torácica, em meio a todo o álcool que consumira, o seu peito apertou pela tristeza que enxergou nos olhos de Ruby - e ali estava, Ruby Clearwood, evitando olhar para alguém porque o simples ato de enxergar a machucava. A californiana empunhou a bandeja como se fosse um escudo, apanhou cada copo de tequila que Rachel bebera e os colocou sobre a superfície metálica. Em seguida, sem olhar para a amiga de anos e, totalmente fora do contexto de seus sentimentos, grunhiu:

— A partir de agora, cada dose de qualquer bebida custará o dobro para você!

A morena revirou os olhos de forma arrogante, como se aquela condição fosse capaz de pará-la. Os seus pais eram ricos, se não fossem, ela não viria todo o Verão para Santa Monica e, muito menos, seria capaz de pagar a viagem de outra pessoa. Os seus cartões tinham limites que Ruby não faria em uma noite boa no “Jewelry of the Coast”.

E Rachel teria dito tudo isso se as palavras não tivessem se embolado em sua língua e se ela não tivesse enxergado, por cima do ombro de Ruby, o outro casal que chegara a pista.

Quinn Fabray, a rainha de gelo, estava acanhada enquanto o mauricinho a puxava para perto. Rachel não a conhecia há muito tempo, mas, o rubor nas bochechas dela não era feito de nervosismo e sim, de pura vergonha, como se ela não quisesse que a vissem na companhia daquele garoto dançando uma antiga balada romântica.

Rachel, no auge de sua embriaguez, gostou de pensar - e sonhar - que, talvez, fosse a pessoa que Quinn não queria que a visse com aquele garoto. A morena gostou de imaginar que pudesse causar aquele tipo de sentimento e adorou imaginar que aquele simples rubor pudesse ser o começo de algo que marcaria aquele Verão.

Porém, Rachel estava bêbada e tinha plena consciência disso. Assim como achava saber o que Quinn sentia em relação a ela e não era nada do tipo, estava mais para desprezo mesclado à pena. Pena por Rachel ser incapaz de se entregar totalmente a alguém, pena pela morena ser feita de aparências e não de essências...

E, depois de tudo o que vivera, Rachel Berry detestava ser olhada com pena.

O rapaz girou o corpo de Quinn em seus braços e os olhos dela, esverdeados como esmeraldas e tão preciosos quanto essas pedras, se cruzaram com os olhos castanhos. Rachel não a deixou tê-la por muito tempo, ela rapidamente os desviou, muito por medo e pouco por desprezo.

A morena estalou os dedos e um dos garçons de Ruby reabasteceu a sua cerveja e a sua tequila. Ela virou ambas e se entregou ao que tinha naquela noite: o álcool.

With an ironclast fist I wake up and

French kiss the morning

While some band marching keeps

Its own beat in my head

While we’re talking

About all the things that I long to believe

About love and the truth and

What you mean to me

And the truth is baby you’re all that I need

— Eu tenho uma tolerância bem alta para cachaça, mas, aquela baixinha ali me venceu em todos os requisitos! - Santana comentou com um sorriso maldoso enquanto apontava para a direção em que os seus olhos estavam. Tanto Brittany como Kurt olharam para Rachel.

As expressões dos outros dois observadores divergiram entre si e em relação à da latina. Brittany tinha certa decepção nos olhos azuis sonhadoras que se mesclava à pena, era evidente que Rachel estava perdida ou não estaria se entregando ao álcool daquela forma. A loirinha se perguntava onde estavam os amigos dela e eles tocavam, mas, o vocalista já percebera que algo estava muito errado, assim como os outros dois.

Eles se importavam ainda que não tivessem muito que fazer quando toda platéia exigia as suas vozes e os seus instrumentos.

Kurt tinha uma expressão neutra, ele já vira Rachel agir daquela forma nas festas em que se cruzaram. A morena costumava estar próxima às garotas e aos garotos atraentes que a quisessem e, em algumas situações, entregue à bebida. Kurt nunca tinha pensado que ela tivesse algum motivo - fora a diversão - para beber. Mas, a neutralidade de sua expressão se perdia conforme ele pensava que, talvez, ela tivesse algo além da personalidade tão egocêntrica e efusiva.

Rachel olhava para os copos que virava como se eles pudessem lhe entregar algo que perdera e que há muito procurava.

O rapaz suspirou, era triste ver aquilo. Ainda mais quando a sua melhor amiga que, de certa forma, mexera com Rachel, estava dançando com o ex-namorado insistente. Biff McIntosh não era um cara chato, ele só era comum. E Quinn não precisava de alguém comum, Kurt começava a aceitar a ideia de que a sua tímida e meiga melhor amiga também guardasse algo poderoso dentro de si. E nada melhor do que Rachel, toda fora do eixo, para incendiar e trazer aquela profundidade à tona.

Ele poderia estar errado, mas, Rachel poderia ser a melhor coisa que aconteceria a Quinn antes de ela se entregar à normalidade e às convenções de sua vida que, mesmo distante dos pais, ainda era regrada e pré-determinada.

— Eu não sei se essas viradas de copo dela são, realmente, dignas de risadas. Ela não parece bem, S... - Brittany respondeu pesarosa, enlaçando a mão nos braços da namorada e aconchegando-se a ela. A loirinha sentia-se grata por ter alguém como Santana, Rachel parecia tão entregue justamente porque, no meio de tantos, ela não tinha alguém que realmente fosse seu. A latina ficou um pouco desconcertada pelas palavras da namorada e, insegura, perguntou:

— O que devemos fazer?

— Pelo pouco que eu conheço de Rachel Berry, nada pode pará-la se ela quer algo. - Kurt respondeu com um tom discreto, ele realmente tinha pleno conhecimento da determinação da morena. Ela não era a melhor aluna de sua turma à toa, todos sabiam o quanto ela se dedicava aos instrumentos de corda, o que se sabia na Julliard era que o que Rachel Berry queria, ela alcançava. O talento dela só não era maior do que a sua teimosia. O moreno tomou um gole de sua cerveja e voltou os seus olhos azuis ao palco, sendo pego no flagra por Sam que lhe sorriu, Kurt se sentiu corar e agitou a cabeça. - E se o que Rachel Berry quer é entrar em coma alcoólico, nem mesmo o AA seria capaz de evitar isso.

Santana concordou com o amigo e brindou com ele, Brittany, contudo, deixou-se observar por mais alguns segundos antes de suspirar e olhar para Quinn. A outra loira deixava que Biff falasse em seu ouvido e um gesto tão íntimo parecia ainda mais desconfortável em sua expressão incomodada. Santana era rápida em certas coisas e percebeu instantaneamente quando Kurt ergueu os olhos e, mais uma vez, corou diante de um sorriso de Sam. A latina sorriu para o seu copo, matou a sua long neck e acenou para mais uma antes de dizer divertida:

— E o que você faz quando quer alguma coisa, little Hummel?

Kurt até tentou não transparecer qualquer emoção, mas, foi inútil. Ele corou tão intensamente que o brilho em seus olhos azuis se destacou ainda mais, Santana riu e Brittany também. A loirinha apanhou a mão do amigo entre as duas e a beijou, Kurt, depois de muita carranca, também riu.

Era inacreditável que ele estivesse, mais uma vez, se encantando por um homem depois de tudo que Blaine fizera. Sam não era diferente do seu ex-namorado - na realidade, a gentileza e a leveza dos dois era bem parecida, contudo, Blaine era um homem da voz enquanto Sam era das cordas - e, ainda assim, parecia ser único. Sam parecia não estar incomodado com a atração que se espreguiçava diante deles, tampouco parecia assustado com o que parecia estar surgindo.

Na realidade, Sam parecia confortável, e até mesmo ansioso.

Era estranho ser um fator tranqüilo na vida de alguém, Blaine também era assumido, mas, a relação dos dois sempre foi regada ao drama, muito por Sebastian, o ex-atual-namorado de Blaine. Sam era parecido com Blaine, contudo, a forma pela qual ele enxergava a vida e as pessoas era totalmente diferente.

Blaine via a vida como um palco em que ele e Kurt eram os protagonistas, mas, o astro era ele. Enquanto Sam preferia enxergar a vida como uma estrada em que ele - e somente ele - era capaz de decidir para onde deveria ir, a platéia não existia porque ela não era necessária quando tudo que Sam queria era encontrar alguém para dividir a estrada.

E Kurt, de alguma forma, começara a acreditar nisso. O garoto de New York ergueu os olhos e estes encontraram os olhos azuis do californiano. Sam sorriu e fez uma mesura com a cabeça, ele estava particularmente bonito naquele dia, com um de seus chapéus inseparáveis. Kurt acenou para ele e sorriu.

Talvez, Sam tivesse visto nele a companhia para percorrer a estrada.

I want lay you down in a bed of roses

For tonight I sleep on a bed of nails

I want to be just as close as the Holy Ghost is

And lay you down in a bed of roses 

A voz de Puck era forte e cheia de sentimentos enquanto entoava o refrão, mas, não houve clímax para Ruby.

As palavras faltavam naquele momento, assim como as atitudes. Ruby nunca se viu naquela posição, desejando tão ardentemente estar com alguém que não podia alcançar. Ela não era uma mulher que perdia o que queria e sim, que corria atrás do que desejava. Por isso, toda aquela música estava sendo uma tortura.

Enquanto os acordes soavam em seus ouvidos, a letra se fazia entender em sua mente, os casais dançavam ao seu redor e as bebidas e petiscos eram servidos em modo automático por suas mãos, ela odiava. Não somente a música, quem segurava Marley e, também, Rachel.

Ruby odiava, principalmente, a si mesma.

A californiana detestava essa recém-descoberta incapacidade de agir quando deveria agir. Ruby não conseguia entender porque ainda estava atrás do bar enquanto a garota que beijara estava na pista com um cara desprezível e que sequer merecia olhar para ela. Deveria existir uma explicação para a sua passividade, mas, ela não conseguia encontrá-la.

O seu interior estava uma bagunça, ainda que seu exterior mantivesse o brilho em seus cabelos dourados, o bronzeado em sua pele perolada e o sorriso em seus lábios rachados. A única evidência de seu interior destroçado residia em seus olhos escuros que marejavam e que ela, a muito custo, segurava lágrimas.

Ruby Clearwood jamais chorou por causa de outra pessoa desde que sua mãe falecera. E, diante daquela circunstância tão particular, não era possível deixar de pensar que Marley era muito importante para deixá-la daquela forma. E, por mais que estivesse irritada com todo o comportamento autodestrutivo de Rachel, a morena também era muito importante.

Naquela situação que lhe fora imposta, ela perderia as duas. Rachel para a incompreensão e Marley para a ausência de respostas. Duas perdas jamais seriam pouco danosas. Quando o Verão ia embora, pouco restava de Ruby.

E, depois daqueles poucos dias, ela se viu precisando de ambas sem saber se deveria escolher uma ou a outra.

Na pista de dança, o braço cor de oliva de Jake Puckerman enlaçava a cintura de Marley. Ela estava encolhida nos braços dele, de uma forma que jamais estivera nos seus. A postura da nova-iorquina era tensa, como se ela quisesse sair daquela prisão musculosa que a cercava. E Ruby queria tirá-la dali, levá-la para onde fosse apenas uma garota da Califórnia, sem qualquer passado a ser exigido por Rachel Berry. Tudo que Ruby queria era que Marley fosse unicamente sua.

Porém, ela dançava nos braços de outro homem e ria das palavras que ele sussurrava em seus ouvidos. Era um sorriso forçado, Ruby sabia por que, quando Marley sorria de verdade - da forma como sorrira após se beijarem - ela parecia trazer o sol para os seus lábios rosados e aquele sorriso dado a Puckerman estava escondido em nuvens de nervosismo.

Jake se aproximou mais uma vez, a terceira naquela dança, e tentou beijar os lábios de Marley. Pela terceira vez, ela se afastou e virou o rosto de tal forma que, mais uma vez, os olhos azuis claros dela se encontraram com os escuros de Ruby.

Não houve reconhecimento de nenhuma das partes, Marley imediatamente apertou os ombros de Jake e se escondeu ali, da mesma forma que, anteriormente, se escondera nos ombros de Ruby. A californiana suspirou de forma pesada, uma lágrima quase manchou a garrafa que segurava e ela desviou os olhos.

E, por uma ironia extremamente desagradável do destino, os seus olhos encontraram Rachel.

A morena estava praticamente jogada no banco, totalmente bêbada, balançando-se de forma exagerada ao som da música. A bebida caía de seu copo conforme os movimentos ébrios do seu corpo. Rachel levantou-se do banco, abruptamente, girando de forma desengonçada e derrubando o que restava do álcool em seu copo. As pessoas ao redor dela se afastaram e Ruby, infelizmente, se aproximou.

Enquanto caminhava em direção à confusão, sentia os olhos de Marley acompanhando os seus movimentos e, mesmo que eles doessem, ela foi obrigada a escolher.

E tudo o que Ruby pensava era que aquele comportamento autodestrutivo de Rachel as destruiria, mais uma vez.

Well I’m so far away

That each step that I take is on my way home

A king’s ransom in dimes I’d given each night

Just to see through this payphone

Still I run out of time

Or it’s hard to get through

Till the bird on the wire flies me back to you

I’ll just close my eyes and whisper,

Baby blind love is true

— Eu e meus amigos velejaremos amanhã, o que acha de nos acompanhar? - A voz de Biff, infelizmente, parecia alta em meio à música porque ele estava próximo demais. Desde que pisaram na pista de dança e se permitiram balançar ao som da música, Biff se mantivera próximo e presente como se soubesse que alguém os observava. Quinn duvidava que ele fosse perceptivo dessa forma, ele estava só sendo quem era...

Um perfeito egocêntrico.

— Eu não sei, eu tenho algumas coisas programadas com os meus amigos. Seria complicado negar algo, ainda mais porque viemos juntos para Santa Monica. - Quinn respondeu de forma evasiva, tentando se afastar dele e sendo, mais uma vez, sufocada por seus braços fortes e sua colônia âmbar forte. Biff riu, girando-a de forma que ela estivesse de costas para o palco, e disse:

— Acho que eles não ficariam tão bravos de lhe perder por um dia, eu não ficaria e eu lhe perdi por quanto tempo? Um? Dois? Três meses?

— Não é a mesma coisa, você sabe disso. - Quinn foi mais insistente em sua resposta, ela até mesmo parou de se guiar pela melodia e se afastou alguns centímetros dentro do que o abraço de Biff permitia. Ele finalmente desapareceu com o sorriso e a risada, a expressão séria o fazia parecer mais sério e amedrontador. Biff apoiou as mãos na base das costas de Quinn e ela apoiou as suas em seu peito. Era um gesto familiar, mas, ele não trazia boas lembranças. - Nós terminamos, Biff.

Biff finalmente pareceu entender o que ela queria dizer. E, naqueles segundos, Quinn foi do céu ao inferno. Tudo porque, enquanto Biff procurava palavras, Quinn encontrava Rachel.

A morena passara a noite bebendo, já estava muito mais na embriaguez do que na sobriedade e, agora, também parecia não saber o que fazia. Ela se levantara, dançara e derrubara bebidas em que a cercava. Houve reclamação, xingamentos e, até mesmo, empurrões.

E Quinn viu quando Rachel fechou os punhos, pronta para a briga. Contudo, isso não foi necessário porque Ruby Clearwood, a dona do “Jewelry of the Coast” rapidamente entrou em cena, puxando o pequeno corpo de Rachel junto ao seu. A morena pareceu perceber quem a segurava e avançou, para um beijo ou para uma agressão, mas, Ruby estava preparada para aquilo e a imobilizou, empurrando-a para uma porta aos fundos do estabelecimento.

Quinn viu como Rachel estava alterada e deveria estar preocupada, porém, a única coisa que conseguiu foi ver a forma familiar pela qual a morena se aproximara... Como se conhecesse Ruby a fundo, a ponto de fazer aquilo mais de uma vez. As duas tinham um passado, era evidente.

A quantidade de mulheres na vida de Rachel Berry parecia nunca chegar ao fim.

Os olhos esverdeados se voltaram para Biff, o rapaz a mantinha no lugar, a expressão envergonhada e as mãos sem saber o que fazer. Quinn olhou fixamente para ele e ele evitou o seu olhar, as mãos da loira abandonaram o peito do rapaz e seguraram os seus ombros. Ela suspirou diante do aperto em seu peito.

Parecia que, por mais que tentasse e quisesse, era incapaz de mudar algo em sua vida.

Quinn apertou os ombros de Biff e esse ato o fez olhar para ela, a loira sorriu e, a voz trêmula pelo choro segurado e pela insegurança, disse:

— Tenho certeza que os meus amigos entenderão. Vamos velejar amanhã!

Os braços de Biff a envolveram e a abraçaram, mas, os olhos de Quinn não abandonaram a porta dos fundos pela qual Rachel fora levada.

I want lay you down in a bed of roses

For tonight I sleep on a bed of nails

I want to be just as close as the Holy Ghost is

And lay you down on a bed of roses

Depois de alguns segundos na pista de dança com Jake, Marley entendeu que seria incapaz permanecer alheia aos olhares de Ruby.

Estavam distantes, tanto física quanto emocionalmente, só que a conexão entre elas era tão intensa que Marley podia sentir os olhos azuis escuros acompanhando cada balançar do seu corpo envolvido pelos braços de Jake. Não estava confortável naquela situação, na verdade, não esteve confortável durante toda a noite.

Marley sentia falta da leveza com a qual suas férias se iniciaram. Agora, tudo se como se nuvens nubladas estivessem estacionado em seu céu ensolarado e que poderia, a qualquer momento, transformar-se em um ciclone que, com toda certeza, deixaria casualidades.

A nova-iorquina sentia-se no centro de uma tempestade tropical, mais precisamente, no olho de furacão.

Contudo, Marley queria que aquilo se resolvesse. Não sabia o que motivara o súbito afastamento de Ruby, mas, diante da atitude de Rachel, era bem plausível que uma era a razão da outra. A situação poderia inflamar a qualquer momento, mas, Marley ainda queria uma justificativa de ambas. Não poderia fingir que nada estava acontecendo.

Não podia dançar com Jake e nem dar esperanças a Kitty quando estava mais do que envolvida por Ruby. Também não podia contentar-se com Finn, Sam e Puck quando sentia falta do que dividia com Rachel.

Marley não sabia se ainda poderia ter ambas em sua vida, mas, ansiava por elas. Não queria abrir mão de alguma.

Por isso, os olhos azuis de Marley se arregalaram quando ela viu Rachel se exaltar e Ruby interceder, e a nova-iorquina paralisou quando viu a sua melhor amiga avançar em direção à californiana. Não podia determinar a natureza daquele movimento, ainda mais àquela distância, mas, não pode deixar de pensar que aquela proximidade só poderia ser resultado de algo que não ficara no passado.

Será que não existia espaço para ela, na vida de Ruby, enquanto Rachel estivesse presente?

Marley não estava satisfeita com o que pensava, contudo, o seu cérebro estava tomado de emoção e ela não escondeu o ciúme, nem o ressentimento, ao presenciar quão próximas as duas eram, mesmo envolvidas em uma briga. Rachel tinha absolutamente tudo e, ainda assim, parecia querer mais, precisamente, Rachel parecia querer o seu passado e tudo o que Ruby representava nele, de volta. Ela afastou-se lentamente de Jake e o rapaz a olhou, preocupado. Marley suspirou e explicou-se:

— Acho que a minha amiga precisa de mim. Nos falamos depois, ok?

Marley não esperou pela resposta de Jake, ela deu às costas ao rapaz e caminhou em direção à porta dos fundos. No caminho, a sua mão direita ajeitou os seus óculos e ela não pode deixar de notar que tremia com esse gesto.

Não sabia bem porque estava nervosa, mas, tinha um pressentimento que aquela noite não esgotara as suas possibilidades de se tornar pior do que já estava.

The hotel bar hangover whiskey’s gone dry

The barkeeper’s wig’s crooked

And she’s giving me the eye

I might have said yeah

But I laughed so hard I think I died 

Rachel tinha noção de quão dominadora Ruby poderia ser, porém, o aperto em sua nuca que a direcionava para o exterior tinha algo a mais nele. Era violento e, sobretudo, envergonhado.

A morena estava bêbada, só que conseguia sentir a tensão da californiana residente em cada um dos empurrões bruscos aplicados em seu corpo. Nunca a tinha visto daquela forma - tão determinada e tão indignada - e o seu cérebro repleto de álcool era incapaz de determinar a razão daqueles sentimentos. Rachel já ficara bêbada, mais de uma vez, no “Jewelry of the Coast”, também já brigara e até mesmo arrumara alguns hematomas e contusões... E nessas outras vezes, Ruby apenas cuidou dela.

Só que, agora, Ruby parecia ser capaz de passar um corretivo em Rachel.

A californiana deu um último tranco brusco na nuca de Rachel e ela tropeçou pelos dois degraus da soleira da porta dos fundos do bar antes de desequilibrar-se e bater com o corpo na enorme lata de lixo. A lateral do corpo moreno sentiu a contusão e ela, cheia dor e de álcool, grunhiu desorientada. Ruby fechou a porta atrás de si e apoiou as mãos nos quadris, vociferando:

— Achei que tivesse deixado claro que você não ia exagerar hoje!

— Como se alguma de suas condições fosse capaz de me fazer parar. - Rachel respondeu com um sorriso irônico que, nas entrelinhas, continha maldade. Ruby franziu a testa, confusa, para as palavras que a morena dissera. Contudo, logo as lembranças do relacionamento delas veio à mente e ela suspirou, não por saudade e sim, por impaciência. Rachel se aproximou perigosamente e esforçando-se para parecer sedutora em meio à embriaguez, cobriu uma das mãos de Ruby com a sua. - Você sabe muito bem que eu não obedeço você e é isso que torna a nossa relação mais divertida.

— Você está bêbada e confundindo as coisas, Rachel. - Ruby respondeu dura, segurando as mãos de Rachel que faziam menção de continuar tocando-a. A expressão sedutora da morena se contorceu pela negativa, ela voltou a assumir o ar irônico e a maldade lampejou em seus olhos escuros opacos pela bebida. A californiana engoliu em seco, ela já vira aquela expressão e sabia o que viria a seguir.

Rachel era uma garota que muito perdera e que não sabia administrar bem o que ainda possuía. Ela também era muito cruel consigo mesma, julgando que não merecia ter o que os outros tinham... E eram esses aspectos de sua personalidade que a jogavam de encontro a algo tão destrutivo que, infelizmente, atingia a todos.

Em sua tentativa de não se envolver, Rachel, infelizmente, machucava quem se via envolvido por ela.

E Ruby sabia que aqueles olhos e aquela boca a machucariam no instante em que a negou. Também sabia que, mais cedo ou mais tarde, aquele confronto ocorreria. Quando terminaram, elas disseram tudo que a situação pedira, mas, jamais disseram verdadeiramente como estavam sentindo. Rachel tentou não machucar Ruby e a californiana tentou não se machucar ao se afastar da morena.

— Você não negaria se algo não estivesse acontecendo... É agora que você diz que está apaixonada pela Marley? - O sarcasmo na voz ébria de Rachel deixava evidente o quanto ela não acreditava no que falava. Ruby sentiu uma onda de fúria propagar-se pelo seu corpo somando-se ao incômodo que ela sentia em seu peito por ver que Rachel ainda estava tão perdida quanto sempre esteve. A morena se afastou, mas, a crueldade em sua voz não se dissolveu. Ela estava ácida e feria. - Jura que quer me fazer acreditar nisso? Nós não nos apaixonamos, somos iguais e por isso demos certo, Ruby.

Now as you close your eyes

Know I’ll be thinking about you

While my mistress she calls me

To stand in her spotlight again

Tonight I won’t be alone

But you know that don’t

Mean I’m not lonely I’ve got nothing to prove

For it’s you that I’d die to defend

Ruby olhava incrédula para Rachel.

As duas tinham suas semelhanças, mas, ela realmente não queria ser igual a ela. Aliás, não queria que outra pessoa se sentisse daquela forma tão miserável. Nenhuma pessoa merecia uma vida de solidão por acreditar que todos, em algum momento, sairiam de sua vida... Rachel não merecia isso.

A californiana caminhou a passos duros e decididos em direção à morena, Rachel pareceu adquirir um pouco de bom senso em meio à tontura de seus pensamentos e se afastou, um passo dado para trás repleto de temor. Ruby não se intimidou e a alcançou, segurando os braços morenos com força enquanto respondia ferida:

— Irônico você dizer isso quando eu me apaixonei, verdadeiramente, por você. Não esse espectro que você insiste em mostrar para o mundo e sim, aquela Rachel que eu vi e que você sabe que existe por debaixo de toda essa caricatura!

O barulho da porta dos fundos se abrindo atraiu a atenção das duas. Marley encontrava-se no portal, olhando de uma para a outra, os olhos azuis claros lacrimejavam feridos e ela segurava a maçaneta da porta como se esse ato fosse o único a mantê-la em pé.

Rachel riu - desorientada e bêbada - para o que provocou na melhor amiga. Ruby a soltou como se ela fosse feita de brasa e, sôfrega, sussurrou:

— Marley, não...!

A nova-iorquina deixou mais uma pessoa para trás e voltou para dentro do “Jewelry of the Coast”. Ruby até tentou ir atrás dela, mas, o bar estava cheio e Marley logo desapareceu no meio da multidão. A californiana preferiu não olhar nos olhos de Rachel ao dizer friamente:

— E foi exatamente esse comportamento autodestrutivo e cruel que me fez desistir de tentar no passado.

A porta dos fundos bateu quando Ruby voltou para dentro do estabelecimento. Rachel encarou o lugar em que a californiana estivera, esperando que ela pudesse voltar, mas, Ruby não voltou.

Rachel não estava em um bom estado para pesar as conseqüências do que acontecera e, por isso, levantou-se com esforço e deu de ombros, caminhando para o calçadão e andando a esmo pela noite festiva de Santa Monica.  

Naquele momento, a bebida consumida não a deixava sentir muito além do alívio. Ela estava feliz por ter tirado aquele peso dos ombros, por ter deixado claro o que achava de Marley e Ruby juntas... Era óbvio que aquilo não daria certo, Ruby a abandonara no passado e era incapaz de construir algo ao longo prazo.

Essa história de “para sempre” ou “enquanto durasse” não existia. Era simplesmente uma desculpa absurda para que as pessoas acreditassem que algo pudesse dar certo. Nada dava certo, as pessoas iam e vinham e tudo que tinham que fazer era aproveitá-las e, até mesmo, usá-las.

Rachel acreditava em coisas palpáveis, como o prazer e o material. Algo tão inconstante como o futuro não fazia parte do que achava necessário para viver.

I want you lay down in a bed of roses

For tonight I sleep on a bed of nails

I want to be just as close as the Holy Ghost is

And lay you down on a bed of roses

Quinn desvencilhou-se dos braços de Biff e caminhou até as varandas do “Jewelry of the Coast”, a desculpa dada era de que precisava respirar quando, na verdade, estava curiosa por saber o que acontecera a Rachel. Ruby voltara sozinha dos fundos e os rapazes que tocavam recolheram seus instrumentos a constatar isso.

Puck, Sam e Finn, inclusive, estavam caminhando pela orla da praia à procura da garota, mas, foi Quinn quem a encontrou exatamente onde não queria.

Demorou um pouco para discernir os contornos das curvas de Rachel naquela escuridão, mas, a baixa estatura e as longas pernas não passaram despercebidas quando Quinn as encontrou, alguns metros à frente, escondida entre a penumbra das luzes dos outros estabelecimentos. Quinn preparava-se para chamar os rapazes quando viu Rachel entrar em um carro.

Diferentemente do reconhecimento da morena, ela não demorou a identificar os cabelos da mesma loira que cumprimentara Rachel na praia, dias atrás. E também não teve dificuldades de ver que as duas se beijaram antes da loira dar partida e arrancar com o carro.

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Notas finais do capítulo

Tenho a ligeira impressão de que muitos leitores odiarão a Rachel depois desse capítulo... Mas, eu asseguro que tudo será explicado mais para frente. E eu espero não ter destoado da personalidade dela na série, para mim, uma Rachel Berry sempre será destrutiva e isso é um aspecto que não pode ser deixado de lado Hahahaha

Ruby e Marley que pareciam tão felizes foram atingidas pelos fragmentos da explosão de Rachel... Será que elas se resolverão?

E Sam e Kurt?


Bem, depois de tanto álcool e de tantos mal entendidos, só podemos aguardar pelas ressacas morais e físicas no próximo capítulo. Certo?

Espero que tenham gostado, deixem suas opiniões em formas de comentário e crítica! Beijos e até a próxima!
(@redfieldfer)