*Lucas:

—Eu não sei porque beijei a Celina. Não sei se foi impulso do momento, não sei se foi porque eu tinha acabado de descobrir que ela gosta de mim ou se foi porque o Gabriel me perguntou se eu gosto dela. Eu não consegui responder não sinceramente, e também não consegui responder sim porque eu não sei. Eu gosto da Amanda, eu sonho com ela desde o primeiro dia de aula e depois de quase 6 meses eu consegui namorar com ela e tudo pra quê? Pra trair ela com a Celina, uma menina que eu sempre considerei como amiga e nunca senti atração nenhuma, quer dizer na verdade no fundo eu sentia sim só não queria admitir porque sou estupido. A Mandy é loira, alta, descolada, tem um corpão é linda, mas não é só isso que eu vejo nela. Ela é legal, divertida, tem os mesmos gostos que eu, gosto da companhia dela. Já a Celi é ... como eu posso dizer sem parecer idiota ... desajeitada, vive envergada por conta da timidez sempre de cabeça baixa e empurrando os óculos pra não caírem, óculos esses que são enormes e quase escondem o rostinho de boneca dela. Mas não é só isso que eu vejo na Celina. Ela é inteligente, atenciosa, tem um inocência que é fofa e eu sinto que devo protege-la. A Celina é encantadora e na hora que eu beijei ela eu esqueci de tudo, da Amanda, dos "defeitos" da Celi que na verdade são só características físicas que tiram a atenção de garotos babacas como eu pra ela. E agora eu não sei o que fazer. A Amanda está brava comigo porque ri do seu pedido de namoro e a Celina deve estar com a cabecinha muito confusa depois de eu ter subido em uma árvore e entrado no quarto dela no meio da noite pra beija-la. O que eu faço?

— Primeiro: vou te aconselhar como mãe e não como psicologa porque isso é contra a nossa ética. Você precisa dar a Amanda uma explicação e o mais importante é pedir desculpas. Ela te pediu em namoro e eu entendo seu estranhamento, nessa sociedade de valores patriarcais ver uma garota pedindo um garoto em namoro, uma mulher pedindo um homem em casamento, etc. ainda é meio incomum apesar de não haver nada de errado. Estamos no século XXI onde se discute feminismo mais do nunca e são esses valores que eu quero passar pra você meu filho então de desculpe com ela. Conte a verdade seja sincero, diga que você beijou a Celina, fale tudo isso que se passa na sua cabeça, ela pode ficar chateada no inicio mas depois ela vai entender e vocês vão poder seguir amigos o que é o mais importante.

—Amigos? então a senhora quer dizer que vamos terminar.

—Ai é que está. Não sou eu quem está dizendo, é você. Lucas se você tem esse sentimento pela Celina, se você beijou ela, se você recusou o pedido de namoro da Amanda...

—Mas isso foi antes de saber que a Celina gostava de mim, eu até estava planejando pedir a Mandy em namoro. -Eu interrompi.

—Faça pra você mesmo essa pergunta: alguma vez você ja pensou na Celina enquanto estava com a Amanda? E você pensou na Amanda enquanto beijava a Celina? Quando você está em dúvida entre duas pessoas escolha a segunda, pois se existe uma segunda é porque seu coração não estava preenchido o suficiente com o sentimento pela primeira. E sei muito bem quem é a sua primeira e a segunda, e eu sei que a única vantagem que as separou foi a aparência.

Incrível a capacidade da minha mãe de entrar na minha mente. Claro ela é graduada nisso, mas toda mãe tem graduação em psicologia quando se trata dos filhos. 

Pensando em tudo que ela disse, refiz a noite de hoje na minha cabeça. No jantar com a Amanda eu fiquei fazendo um monte de perguntas sobre a Celi pro Gabriel, ja durante o beijo com a Celina, nem pensei na Amanda pois se tivesse pensado, esse beijo nunca teria acontecido. Sei que a primeira que eu gostei foi a Amanda, mas é o que minha mãe disse: a aparência dela ofuscou a Celina.

—Então é ela. Tomei minha decisão. Obrigada mãe! -Disse abraçando minha mãe.

—Estou aqui sempre que precisar meu amor. E tem mais uma coisinha: está de castigo.

—O que? por que?

—Invadir uma casa de madrugada. Amanhã você não vai poder sair pra lugar nenhum.

—Mas eu ia encontrar a Celina na praça.

—Castigo é castigo, encontra ela domingo, já está decidido.

* Amanda:

Estava sentada na mesa imóvel encarando minha tigela de cereal de um lado e meu celular do outro. Kurt ficava me rondando, ele sabia que eu não estava bem. Colocava a pata no meu colo, deitava debaixo da minha cadeira, ficava tão inquieto quanto eu estava quieta.

—Que milagre é esse você acordada tão cedo no sábado?- Perguntou minha mãe voltando da caminhada matinal. 

Olhei no celular, eram 9:06 da manhã. Nos sábados eu não levantava antes do meio dia.

Quando a Isabella acordou lá pras 10 horas, mamãe sussurou um "o que deu nela?" achando que eu não ia ouvir.

Finalmente comecei a comer meu cereal. Já estava muxo de tanto esperar pra ser comido.

—Ela está ali uma hora sem falar nada, sem comer, sem se mexer! - Disse minha mãe enquanto a Isa preparava seu cereal.

—Digamos que o encontro de ontem não foi dos melhores. -respondeu Bella.

—Oh filha! -Disse mamãe passando a mão nos meus cabelos.

Peguei meu celular e fui pro meu quarto sem dizer nada.

Kurt me seguiu e deitou na minha cama ao meu lado.

—Kurt porque os garotos são tão complicados? - Eu disse acariciando seus pelos. -Eu achava que eu entendia eles, quer dizer, eu só convivi com eles a vida toda, ai me aparecem o Gabriel e o Lucas. Eu deveria ser lésbica como todos pensam que eu sou, mas eu não sou eu gosto deles. Eu tenho ciúmes do Gabriel com a minha irmã e tenho ciúmes do Lucas possivelmente me trocar pela Celina, mesmo que isso seja só coisa da minha cabeça.

*Gabriel:

—A Dra. Doris marcou uma terapia em família pra nós hoje a tarde. -Eu disse.

—Programão pra tarde de sábado. -Disse Gabriela largada no sofá mexendo no celular.

...

Chegamos primeiro que a Dra. e ficamos na sala de espera até que ela chegou junto com o Lucas.

—Desculpem o atraso, ta aqui o culpado. Eu tive que trazer ele a força pois da última vez que deixei ele de castigo, o danado fugiu então agora ele vai passar a tarde toda aqui com a Letícia e com os pacientes.

— Você ficou de castigo? - Eu perguntei pra ele.

—Pois é. Obrigada por aconselhar ela a me perguntar o que tinha acontecido ontem. - Ele disse.

— Era só não falar da parte da invasão de propriedade alheia no meio da noite. - Respondi.

Gabi caiu na gargalhada.

—Do que estão falando? -Perguntou minha mãe. 

— A senhora vai saber pois seu filho também está envolvido.- Respondeu Dra. Dóris.

— Entendi o motivo da terapia em família- eu disse me levantando e me dirigindo pra sala de terapia em grupo junto com minha mãe e Gabriela.

— Depois da consulta, enquanto mamãe, Dra. Dóris e a secretária Letícia conversavam, Lucas veio falar comigo e com a Gabi.

—Vamos lá fora. -Ele disse. Fomos até a calçada.

—Desembucha Justin. -Disse Gabriela.

— Gente minha mãe leva esse negocio de castigo a sério ela confiscou meu celular. Vocês podem avisar pra Celina por favor que por isso não pude encontrar ela na praça? Eu ia fugir pra encontra-la mas minha mãe percebeu e me trouxe pra cá.

—Não. -Disse Gabi.

—Claro! -Eu disse.

—De que lado você tá Gabriel? -Perguntou Gabriela.

—A Celi merece saber, coitadinha deve ter ficado plantada na praça. - Eu disse olhando pra Gabi mas ela olhou pro Lucas e continuou:

—Ela está com o Igor na praça. -Disse com um sorriso. 

Lucas ficou sério e disse: -Tudo bem.

— Poxa Lucas, eu esqueci de te contar sobre o Igor. Ele gosta da Celina e já faz um tempão. - Eu disse tentando contornar a situação. - Mas eu não sabia que ela ia encontrar ele.

—O Igor viu na Celina o que você nunca conseguiu. Só lamento você ter aberto os olhos tão tarde. Eu estava conversando com ela no whatsapp faz tempo ela me disse que estava esperando vocês dois, ela tinha marcado com o Igor antes de você invadir o quarto dela ontem a noite e ia conversar com ele na praça sobre o futuro dos dois. Ela ia falar na sua frente que escolhe ele. Você teve sorte de sua mãe ter te castigado mas azar de ter me encontrado. -Disse Gabi.

—Chega Gabriela, você passou dos limites, vai la dentro chamar a mãe pra irmos embora. - Eu disse.

Gabi deu de ombros e entrou.

—Me desculpa Lucas, a minha irmã é ...

—Ela tem razão. -Disse Lucas visivelmente abalado.

—Não, olha ... - Nesse momento saíram mamãe e Gabriela do consultório.

—Agente se fala cara- Eu disse dando um tapinha nas costas dele.

Andamos em silêncio até o ponto de ônibus e quando olhei pra trás o Lucas ainda estava lá imóvel e permaneceu até a mãe dele aparecer e levar ele pra dentro.

* Rosa:

Recebi uma mensagem do Igor antes do almoço.

"Bom dia Rositta, hoje eu vou ser dj de uma boate no centro, ta afim de ir?"

"Claro. Pode menor de idade né?"

"Se não pudesse eu nem teria sido contratado flor! #chegalogoanoquevem18tão, imagina o tanto de festa que vai surgir quando eu puder ser dj em todas elas?"

Ri da mensagem dele. Apesar do estranho quase beijo de ontem estava tudo bem.

"Só mais uma coisa: eu também vou convidar a Celina. Tudo bem pra você?"

"claro"

Preciso começar a aceitar de uma vez por todas o Igor apenas como amigo. Não vai ser fácil.

Vasculhei meu guarda-roupa e vi que não tinha nada legal pra se usar em uma balada.

—Mama, vou ao centro comprar uma roupa pra balada de hoje.

—Você deveria ter começado me pedindo permissão chica.

—Por favor mãe, vou com o Igor, ele vai estar de DJ.

—Ta mas quero você em casa ás 23:00

—Gracias! Disse abraçando ela.

Tentei chamar minhas amigas mas as duas estavam ocupadas então fui sozinha mesmo. Na volta encontrei o Gabriel no ônibus. A irmã e a mãe sentaram juntas e ele ficou em pé, até que a moça que estava ao meu lado desceu e ele sentou.

—Oi- Eu cumprimentei timidamente.

—Oi Rosa. -Ele respondeu parecendo triste.

—Tudo bem?

—Mais ou menos. Mas você não se importa não é?

—Igor e eu ja nos entendemos, ele não te contou?

—Sim, quer saber? me desculpe, eu não quero ficar mau com ninguém. -Ele disse me fitando com aqueles olhos azuis e erguendo o dedo mindinho como uma criança que quer ficar "de bem".

Sorri e dei o dedinho pra ele.

—Ta agora que você sabe que eu gosto... gostava dele, sabe o porque de eu te rejeitar não é?

—Sim. Compreensível, não é estranho como o amor pode bater em portas erradas até encontrar o caminho certo?

—Como assim?

—Sei la, eu gostava de você, você do Igor, ele da Celina, ela do Lucas, ele da Amanda, ela de mim e eu de você. Agora eu estou com Isabella, você está disponível pra gostar de mim e tem o triângulo do Lucas, Celi e Igor.

— Então pelo que parece ninguém encontrou o caminho certo, estamos todos ainda batendo nas portas erradas! 

—É. -Ele balançava a cabeça me olhando.

—Está chegando meu ponto! Agente se vê. - Eu disse me levantando.

*Igor:

Antes de encontrar a Celina precisava me certificar de que estava tudo bem com a Rosa. Mandei uma mensagem convidando ela pra festa que eu vou ser dj hoje e ela parecia estar numa boa. Pelo menos por mensagem.

Ás duas da tarde fui encontrar Celina na praça. Ela estava sentada, aparentemente nervosa. Eu levava nas costas um buque de flores só que a media em que eu me aproximava eu me arrependia de ter passado na floricultura. Ela estava muito séria.

—Igor antes de mais nada, pode ser que o Lucas venha também.

—O que?

—Senta que eu explico.

Fiquei sem ter como esconder as flores.

—Você comprou flores?

Entreguei o buquê pra ela e sentei.

—Olha Igor, ontem quando marquei esse encontro tinha absoluta certeza de que eu queria te dar uma chance. Logo depois o Lucas apareceu na minha janela e me deu um beijo.

—O que? Aquele ... - Se eu visse o Lucas na minha frente agora juro que daria um soco.

—Calma. Ele ... eu não sei o que deu nele, mas eu tive que expulsa-lo porque meu pai apareceu e...

—Celina eu agradeço sua sinceridade mas eu tenho que ir, não quero ficar aqui atrapalhando quando ele chegar e você escolher ele. Eu cansei de correr atras de você. Eu nunca pensei que seria tão complicado gostar de uma menina como você. Eu não imaginava ter que te disputar com um cara. Tem alguém que gosta de mim e eu nunca dei valor. Ela gosta só de mim por inteiro. - Me levantei e sai andando sem olhar pra trás porque se eu olhasse eu ia correndo abraça-la e me desculpar.

*Celina:

Eu estava em choque. Eu não ia escolher o Lucas. Nem o Igor. O plano era encontrar os dois na praça, explicar a situação e ver como eles reagiriam e o mais importante: como eu reagiria na presença dos dois. Eu nunca lidei com garotos antes e agora eu tenho dois que gostam de mim e eu nem passei por nenhuma transformação no visual como naqueles filmes de Hollywood. Era a mesma Celina de sempre, a nerd que ninguém dava bola. 

Igor apareceu com flores e depois me disse todas aquelas coisas visivelmente magoado e eu desejei voltar no tempo e não falar nada pra ele já que o Lucas nem se quer apareceu. Ele podia estar com pena ou bêbado ontem a noite ou sabe-se la porque ele me beijou, mas o Igor gosta de mim de verdade e eu nunca dei valor. Ele usou essa menina como metáfora pra se referir aos sentimentos dele por mim por isso ele inventou ela. O Lucas nunca me viu como ele vê a Amanda e o Igor me viu por trás dos meus óculos. 

Levei as flores pra casa e coloquei em um vaso no meu quarto. 

Estava exausta, só precisava dormir, mas no meio da noite não sei distinguir se foi um sonho ou se realmente ouvi outra batida na minha janela só que dessa vez não era o Lucas. Era o Gabriel.